Resumo
O divertículo de Zenker é um divertículo de pulsão localizado na transição faringo-esofágica. Trata-se de uma patologia bastante rara, sendo a etiologia de 0,11% de 20000 exames radiológicos de esôfago. Incide mais em pacientes acima de 60 anos e afeta mais homens, na proporção de 4:1 segundo a literatura. Dos 24 pacientes operados, 23 divertículos foram à esquerda e o único caso à direita tinha antecedentes de uma cervicotomia do mesmo lado. Apresentamos inclusive um caso de mãe e filho com esta doença. Apresentamos a nossa experiência no referente à clínica, diagnóstico e resultados cirúrgicos em 24 casos operados.
Divertículo faringo-esofágico; divertículo; divertículo de pulsão; divertículo de Zenker
DIVERTÍCULO DO ESÔFAGO
ANÁLISE DE 24 PACIENTES PORTADORES DO DIVERTÍCULO DE ZENKER
ESOPHAGEAL DIVERTICULA
ANALYSIS OF 24 PATIENTS WITH ZENKER'S DIVERTICULA
Nelson Okano(1 1 Professor Doutor e Chefe da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 2 Professor Doutor da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 3 Professor Doutor da Disciplina de Angiologia Periférica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 4 Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 5 Médico Residente (R3) da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP ); Eulógio Corrales Vargas(2 1 Professor Doutor e Chefe da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 2 Professor Doutor da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 3 Professor Doutor da Disciplina de Angiologia Periférica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 4 Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 5 Médico Residente (R3) da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP ); Takashi Moriya(3 1 Professor Doutor e Chefe da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 2 Professor Doutor da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 3 Professor Doutor da Disciplina de Angiologia Periférica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 4 Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 5 Médico Residente (R3) da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP );
João José Carneiro(4 1 Professor Doutor e Chefe da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 2 Professor Doutor da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 3 Professor Doutor da Disciplina de Angiologia Periférica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 4 Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 5 Médico Residente (R3) da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP ); Antonio Mauro Elias Junior(5 1 Professor Doutor e Chefe da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 2 Professor Doutor da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 3 Professor Doutor da Disciplina de Angiologia Periférica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 4 Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP 5 Médico Residente (R3) da Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica - Departamento de Cirurgia e Anatomia - HCFMRP - USP )
FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRAO PRETO - USP
Departamento de Cirurgia -
Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica
Resumo: O divertículo de Zenker é um divertículo de pulsão localizado na transição faringo-esofágica. Trata-se de uma patologia bastante rara, sendo a etiologia de 0,11% de 20000 exames radiológicos de esôfago. Incide mais em pacientes acima de 60 anos e afeta mais homens, na proporção de 4:1 segundo a literatura. Dos 24 pacientes operados, 23 divertículos foram à esquerda e o único caso à direita tinha antecedentes de uma cervicotomia do mesmo lado. Apresentamos inclusive um caso de mãe e filho com esta doença. Apresentamos a nossa experiência no referente à clínica, diagnóstico e resultados cirúrgicos em 24 casos operados.
Unitermos: Divertículo faringo-esofágico, divertículo, divertículo de pulsão, divertículo de Zenker.
Key Words: Pharyngoesophageal diverticula, diverticula, pulsion diverticula, Zenker's diverticula
Introdução: Divertículo do esôfago é uma dilatação localizada, de tamanho variável, formado pela parede total ou parcial do esôfago e com uma cavidade que se comunica com a luz(1). Aparece na transição faringo-esofágica, torácicos e torácicos justa-cárdicos.
O divertículo torácico, em geral, localizado na porção média do esôfago, ao nível do estreitamento aorto-brônquico, é chamado de divertículo de tração ou divertículo verdadeiro e possui todas as camadas do esôfago mucosa, submucosa e muscular na realidade é uma dilatação de todo o órgão causado por aderências de processos inflamatórios, geralmente, de etiologia tuberculosa, dos gânglios peri-esofágicos e pouco sintomático.
O divertículo faringoesofagiano e torácicos justa-cárdicos epifrênicos ou subfrênicos são constituídos exclusivamente da mucosa do esôfago, também denominados divertículo de pulsão, é formado pela pressão exercida dentro da luz do órgão, pelo ato de deglutição sobre as paredes do esôfago. É uma verdadeira hérnia de mucosa, portanto, falso divertículo, que progride através de um ponto fraco da musculatura esofagiana, aumenta progressivamente e causa compressão distal. Os divertículos epifrênicos e subfrênicos são raros, sendo mais comum o faringoesofagiano, também denominado de divertículo de Zenker.
O divertículo faringoesofagenao foi descrito pela primeira vez por Ludlov, em 1764, mas o nome Zenker tornou-se ligado a esta afecção porque em 1878, ele e Von Ziemssem juntaram 22 casos da literatura e 5 casos de sua casuística(2). Von Bergmann descreveu em 1892 os sinais clínicos desta doença e efetuou com êxito a intervenção cirúrgica de um divertículo cervical, mas a primeira ressecção, com sucesso, foi realizada por Whealer, em 1886.
O divertículo de Zenker representa 0,11% de 20.000 estudos radiológicos do esôfago e um caso em cada 16.000 internações, 1,8% dos doentes com disfagia e 4% dos doentes com afecção do esôfago. É mais frequente em homem na proporção de 4:1 e muito raro na infância, sugerindo ser moléstia adquirida.
A etiopatogenia do divertículo de propulsão apresenta algumas hipótese como restos das bolsas branquiais, traumática e incoordenação motora relacionado a alguma anormalidade neuromuscular(2). A hipótese da acalásia do músculo cricofaríngeo, não foi confirmada pelos estudos de motilidade, embora um certo número de pacientes foi tratado, com sucesso, pela miotomia cricofaríngea(2).
O sintoma mais comum é a disfagia que se apresenta de maneira interessante.
O doente engole bem até o meio da refeição, quando manifesta a obstrução que o impede de deglutir. Através de manobras o saco diverticular é esvaziado e o doente volta a deglutir normalmente até novo enchimento do divertículo e compressão distal. Por isso, é também referido, como característica dessa doença, a disfagia que ocorre no "meio" da alimentação.
Outro sintoma constante é a regurgitação, que na forma espontânea, segrega o paciente do seu convívio social. Da mesma forma, a deglutição ruidosa, ouvida à distância, concorre para que as pessoas evitem refeições em companhia. A regurgitação pode, também, levar a manifestações clínicas pulmonares.
Halitose e perda de peso são também queixas frequentes nesses doentes.
A perfuração do saco diverticular pode ocorrer de forma espontânea ou através de sondagem e endoscopia mal feitas. A associação com câncer já foi descrita.
O diagnóstico radiológico, através da seriografia convencional com contraste baritado é o mais fidedigno, sendo dispensável o exame endoscópico na maioria dos pacientes e o tratamento de escolha é o cirúrgico.
Material e Método: No período de 1988 a 1999 foram tratados 24 pacientes na Disciplina de Cirurgia Geral e Torácica do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
Dezessete pacientes do sexo masculino e sete do sexo feminino, proporção de 3,4:1, sendo 23 de cor branca e 1 mulato.
A incidência maior foi nos pacientes acima de 60 anos, correspondendo a 80%, sendo o mais novo com 48 anos e o mais idoso 88. Nenhum paciente abaixo dos 40 anos.
A disfagia esteve presente em todos os pacientes, desde 1 ano de duração até acima de 40 anos. A hérnia hiatal foi a doença associada mais frequente em 5 pacientes e o megaesôfago estava associado em 2 casos.
A seriografia do esôfago foi realizado em 21 pacientes, sendo que nos outros três foi realizada apenas a endoscopia digestiva alta.
Todos os pacientes foram submetidos a tratamento cirúrgico, sob anestesia geral, e o doente em decúbito dorsal horizontal com um coxim sob os ombros, com hiperextensão da cabeça.
A via de acesso em 23 pacientes foi uma cervicotomia esquerda, oblíqua, ao longo da borda anterior do músculo esternocleidomastoideo, a partir da fúrcula esternal, com cerca de 8-10 cm de extensão. Apenas em um paciente a via de acesso foi à direita, porque a radiografia mostrava o divertículo estar localizado à direita do esôfago, o que foi confirmado pelo exame endoscópico. Essa paciente apresentava como antecedente importante uma cervicotomia à direita há 7 anos para artrodese de coluna cervical e as queixas disfágicas tiveram início no pós-operatório dessa cirurgia.
Em 23 pacientes foi realizado a exérese do divertículo e em apenas um foi feita a inversão do saco diverticular. Em todos os pacientes foi praticada a miotomia do músculo cricofaríngeo. O fio empregado na sutura do esôfago foi sempre o mononylon 4.0. Um dreno cervical foi deixado em todos os pacientes, sendo removido em geral no 3º dia de pós-operatório. Antibioticoprofilaxia em todos os pacientes, não mais do que 24 horas.
A evolução pós-operatória foi sem complicações em 22 pacientes, sendo que em dois ocorreram fístula, que fecharam no 14º e 21º dia após a cirurgia, utilizando-se a nutrição parenteral total associada com cauterização com ácido clorídrico a 1%. Não houve mortalidade nessa série.
Até o presente momento não foi observado nenhum caso de recidiva com tempo de seguimento de 1 a 17 anos.
Discussão: Entre os divertículos do esôfago, o de localização faringo-esofágico também chamado divertículo de Zenker é o mais frequente. A sua etiologia continua indefinida até hoje, sendo a mais aceita a incoordenação motora relacionada alguma anormalidade neuromuscular.(3)
A literatura refere uma maior incidência nas pessoas acima da quinta década, mas na nossa casuística 80% dos pacientes tinham mais de 60 anos.(4)
As manifestações clínicas são características e a radiologia é o exame complementar mais indicado para estabelecer o diagnóstico, sendo a endoscopia rígida ou flexível dispensada, exceto nos casos com suspeita de associação com neoplasia maligna, associação essa muito rara.
A maior discussão é em torno do tratamento cirúrgico, sendo descrito o endoscópico, a miotomia isoladamente do músculo cricofaríngeo, a miotomia com diverticulopexia, a diverticulopexia sem miotomia, a diverticulectomia isoladamente e a diverticulectomia associada à miotomia.
O tratamento endoscópico foi preconizado por Mosher, em 1916, e muito empregada nas décadas de 30 e 40, utilizando-se do esofagoscópio rígido(2). Com o advento do endoscópio flexível esse tratamento pode ser realizado sob anestesia tópica da orofaringe e consiste na secção do septo que separa o divertículo do esôfago atingindo o músculo cricofaríngeo, permanecendo o saco diverticular. Entretanto nos divertículos menores a secção, geralmente, é feita em uma única etapa, mas nos maiores, em várias sessões, o que é uma desvantagem para o paciente.
A única vantagem é o tratamento ser realizado com anestesia tópica da orofaringe, já que a doença é mais comum nas idades mais avançadas com os doentes muitas vezes com comprometimento cárdio-respiratório, impossibilitando uma anestesia geral, mas as correções cirúrgicas descritas também podem ser realizadas sob anestesia local.
A nossa preferência pela miotomia associada à exérese do saco diverticular é a baixa incidência de recidiva referida na literatura(3), o que foi comprovada nessa série até o presente momento.
As complicações em torno de 10%, não apresentam dificuldades para o diagnóstico, sendo mais frequente a fístula esôfago cutânea, cujo tratamento não oferece dificuldades.
- 1. Davis C. Clínica cirúrgica, Guanabara-Koogan, W.B. Sanders, London, 1978.
- 2. Pinotti HW. Tratamento cirúrgico do aparelho digestivo, Atheneu, Săo Paulo, Vol. 1, 1994.
- 3. Raia AA, Pinotti HW, Pollara WM. Divertículos do esôfago. In Raia AA, Correa Netto. A.: Clinica cirúrgica Alípio Correa Netto, 4Ş ed.ver.ampl., Sarvier, Săo Paulo, 1988; 145-54
- 4. Schackelford RT.: Surgery of the alimentary tract, W.B.Saunders, London, 1978.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
26 Mar 2001 -
Data do Fascículo
2000