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Cicatrização de anastomoses do cólon esquerdo com doença inflamatória: estudo experimental em ratos

Healing of the left colon anastomosis with inflammatory bowel disease: experimental study in rats

Resumos

Complicações relacionadas com a anastomose são descritas com freqüência nas cirurgias para o tratamento da doença inflamatória do cólon. Para conhecer a interferência da inflamação na cicatrização de anastomoses 40 ratos Wistar são utilizados e divididos em 2 grupos. Um deles serviu de controle e no outro induziu-se doença inflamatória com ácido acético 10% por sondagem retal. No sétimo dia procedeu-se à laparotomia em ambos os grupos, colotomia e anastomose término-terminal com pontos separados em plano único. Avaliadas no terceiro e sétimo dias, pode-se verificar que o número de complicações no grupo de animais com doença inflamatória foi maior assim como a mortalidade. As deiscências com peritonite foi a situação mais comum (p=0,0222). A capacidade de suportar pressão, nas anastomoses que evoluíram sem complicações foi menor nestes cólons, porém a diferença quando comparada ao controle não foi significante (p=0,0836). Verificou-se que as anastomoses construídas em cólons com doença inflamatória apresentavam maior concentração de colágeno total, com predomínio de colágeno imaturo (tipo III) (p=0,0000) enquanto que nas feitas em cólons normais predominava colágeno maduro (tipo I) (p=0,0102). Observou-se ainda que a organização do colágeno era menor, no terceiro dia, nas anastomoses com doença inflamatória. Entretando a análise da reação inflamatória ao nível da anastomose foi semelhante nos dois grupos. Estes resultados permitem sugerir que a doença inflamatória leva a aumento do número de deiscências provavelmente pelo atraso da maturação e ordenação do colágeno.

Cicatrização de feridas; Cólon; Colite ulcerativa


Complications related to anastomosis failure are frequently described in the surgery of inflammatory bowel disease. The aim of the present study was to evaluated colonic wound healing in an inflamed bowel. Forty Wistar rats were divided in 2 groups: the control and experimental groups. In the experimental group, colitis was induced by the infusion of 10% acetic acid per rectum to understand how inflammation interferes with the healing process of intestinal. On the7th post-operative day an end to end colonic anastomosis was performed with interrupted suture. On the 3rd and 7th post-operative days, the anastomosis were evaluated. We observed that mortality and the number of complications were greater in the group of animals with inflammatory bowel disease. Dehiscence with peritonitis was the most common complication(p=0.0222). The bursting strength in the colons without leakage was lesser than those in the control group, however this difference was not statistically significant (p=0,0836). It was verified that the anastomosis performed in colons with inflammatory bowel disease showed greater total collagen concentration, with a predominance of immature collagen (type III) (p=0.0000). The mature collagen (type I) was the predominant collagen in the wounds of normal colon. (p=0.0102). On the 3th post-operative day It was also observed that the organization of collagen was poorer on the third day in the colonic wounds with inflammatory bowel disease. Nevertheless, the analysis of the inflammatory reaction at the level of the anastomosis was similar in both groups. These results suggest that inflammatory bowel disease increases the risks of anastomosis dehiscence, probably because of the delay in the maturation and the organisation of collagen.

Wound healing; Colon; Colitis


CICATRIZAÇÃO DE ANASTOMOSES DO CÓLON ESQUERDO COM DOENÇA INFLAMATÓRIA

ESTUDO EXPERIMENTAL EM RATOS1 1 . Estudo realizado na Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade Católica do Paraná (PUCPR) 2. Professor Titular de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professor Adjunto de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR. Doutor em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 3. Professora Coordenadora da Disciplina de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR, Professora Adjunta de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professora Titular de Experimentação em Clínica e Cirurgia da FEMPAR, Doutora em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 4. Alunos de Iniciação Científica da Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR

Fernando Hintz Greca2 1 . Estudo realizado na Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade Católica do Paraná (PUCPR) 2. Professor Titular de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professor Adjunto de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR. Doutor em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 3. Professora Coordenadora da Disciplina de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR, Professora Adjunta de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professora Titular de Experimentação em Clínica e Cirurgia da FEMPAR, Doutora em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 4. Alunos de Iniciação Científica da Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR , Maria de Lourdes Pessole Biondo-Simões3 1 . Estudo realizado na Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade Católica do Paraná (PUCPR) 2. Professor Titular de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professor Adjunto de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR. Doutor em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 3. Professora Coordenadora da Disciplina de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR, Professora Adjunta de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professora Titular de Experimentação em Clínica e Cirurgia da FEMPAR, Doutora em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 4. Alunos de Iniciação Científica da Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR , Sergio Ioshi4 1 . Estudo realizado na Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade Católica do Paraná (PUCPR) 2. Professor Titular de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professor Adjunto de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR. Doutor em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 3. Professora Coordenadora da Disciplina de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR, Professora Adjunta de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professora Titular de Experimentação em Clínica e Cirurgia da FEMPAR, Doutora em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM. 4. Alunos de Iniciação Científica da Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR , Eduardo A. Andrade dos Santos5, Eduardo Wei Kin Chin5, Imad Izat El Tawil5, Fábio Lúcio Stalhschmidt5

Greca FH, Biondo-Simões MLP, Ioshi S, Santos EAA, Chin EWK, El Tawil II, Stalhschmidt FL. Cicatrização de anastomoses do cólon esquerdo com doença inflamatória: estudo experimental em ratos. Acta Cir Bras 2000; 15 (supl 3): 41-46.

RESUMO: Complicações relacionadas com a anastomose são descritas com freqüência nas cirurgias para o tratamento da doença inflamatória do cólon. Para conhecer a interferência da inflamação na cicatrização de anastomoses 40 ratos Wistar são utilizados e divididos em 2 grupos. Um deles serviu de controle e no outro induziu-se doença inflamatória com ácido acético 10% por sondagem retal. No sétimo dia procedeu-se à laparotomia em ambos os grupos, colotomia e anastomose término-terminal com pontos separados em plano único. Avaliadas no terceiro e sétimo dias, pode-se verificar que o número de complicações no grupo de animais com doença inflamatória foi maior assim como a mortalidade. As deiscências com peritonite foi a situação mais comum (p=0,0222). A capacidade de suportar pressão, nas anastomoses que evoluíram sem complicações foi menor nestes cólons, porém a diferença quando comparada ao controle não foi significante (p=0,0836). Verificou-se que as anastomoses construídas em cólons com doença inflamatória apresentavam maior concentração de colágeno total, com predomínio de colágeno imaturo (tipo III) (p=0,0000) enquanto que nas feitas em cólons normais predominava colágeno maduro (tipo I) (p=0,0102). Observou-se ainda que a organização do colágeno era menor, no terceiro dia, nas anastomoses com doença inflamatória. Entretando a análise da reação inflamatória ao nível da anastomose foi semelhante nos dois grupos. Estes resultados permitem sugerir que a doença inflamatória leva a aumento do número de deiscências provavelmente pelo atraso da maturação e ordenação do colágeno.

DESCRITORES: Cicatrização de feridas. Cólon. Colite ulcerativa.

Greca FH, Biondo-Simões MLP, Ioshi S, Santos EAA, Chin EWK, El Tawil II, Stalhschmidt FL. Healing of the left colon anastomosis with inflammatory bowel disease: experimental study in rats Cicatrização de anastomoses do cólon esquerdo com doença inflamatória: estudo experimental em ratos. Acta Cir Bras 2000; 15(supl 3): 41-46.

SUMMARY: Complications related to anastomosis failure are frequently described in the surgery of inflammatory bowel disease. The aim of the present study was to evaluated colonic wound healing in an inflamed bowel. Forty Wistar rats were divided in 2 groups: the control and experimental groups. In the experimental group, colitis was induced by the infusion of 10% acetic acid per rectum to understand how inflammation interferes with the healing process of intestinal. On the7th post-operative day an end to end colonic anastomosis was performed with interrupted suture. On the 3rd and 7th post-operative days, the anastomosis were evaluated. We observed that mortality and the number of complications were greater in the group of animals with inflammatory bowel disease. Dehiscence with peritonitis was the most common complication(p=0.0222). The bursting strength in the colons without leakage was lesser than those in the control group, however this difference was not statistically significant (p=0,0836). It was verified that the anastomosis performed in colons with inflammatory bowel disease showed greater total collagen concentration, with a predominance of immature collagen (type III) (p=0.0000). The mature collagen (type I) was the predominant collagen in the wounds of normal colon. (p=0.0102). On the 3th post-operative day It was also observed that the organization of collagen was poorer on the third day in the colonic wounds with inflammatory bowel disease. Nevertheless, the analysis of the inflammatory reaction at the level of the anastomosis was similar in both groups. These results suggest that inflammatory bowel disease increases the risks of anastomosis dehiscence, probably because of the delay in the maturation and the organisation of collagen.

SUBJECT HEADINGS: Wound healing. Colon. Colitis.

INTRODUÇÃO

A doença inflamatória inespecífica do cólon também denominada retocolite ulcerativa inespecífica, foi descrita por Wilks e Moxon em 1975. É uma doença que acompanha o paciente ao longo da vida e caracteriza-se por períodos de exacerbações e remissões qunado o doente apresenta-se com evacuações diarrêicas de muco, sangue e/ou pus. A extensão do cólon acometido determinará a gravidade da diarréia3.

Doença de etiologia desconhecida, não possui até agora, tratamento que promova sua cura. A terapêutica clínica utilizada leva apenas a remissão das crises. Dentre as opções terapêuticas encontra-se o emprego da sulfasalazina e mais recentemente do ácido 5-amino-2-hidroxibenzóico (5-ASA), fração molecular ativa da sulfasalazina 2,10,11,15,27,32,33. Também muito empregada é a corticoterapia. Além destas, várias têm sido as terapias alternativas com diferentes drogas e diferentes dietas.

Dentre as complicações tardias desta doença, a mais temida é a malignização descrita na literatura com percentais que chegam a 42% 9,12,14,23,30. Sabe-se que o risco de malignização é proporcional à freqüência com que as crises se repetem e com a gravidade delas30. Daí a importância da busca de tratamentos que possam curar ou pelo menos promover a remissão rápida das crises, aumentando o intervalo entre elas.

O tratamento cirúrgico é reservado para situações de insucesso da terapia clínica, quando se tem um quadro clínico exacerbado com incapacitação do doente, fistulização ou obstrução e quando se observa displasias severas ou malignização. O tratamento cirúrgico esta ainda indicado nas condições de emergência como: megacólon tóxico e hemorragia severa4,5.

A terapia cirúrgica radical promove a cura da doença, contudo, submete o paciente a uma grande mutilação. O tratamento radical proposto é a proctocolectomia com ileostomia definitiva. Este procedimento entretanto além das alterações metabólicas que acarreta é acompanhado de baixa aceitação pelos doentes, perocupados com seu conforto, sua auto-estima e com as interações sociais.

Diante disso, considerando-se a possibilidade de se acompanhar o reto com facilidade em exames seqüenciais, introduziram-se tratamentos alternativos como a colectomia total com íleo-retoanastomose e ainda os reservatórios pélvicos com anastomose íleo-anal. A permanência de 15 centímetros de reto mantem intacto o esfíncter anal além de não exigir a dissecção pélvica evitando as possíveis lesões do sistema nervoso autônomo e portanto salvaguardando a função sexual, especialmente nos doentes de sexo masculino (binderons...) Estes procedimentos entretanto, não são livres de complicações. As taxas de mortalidade variam de 0 à 7%, as deiscências parciais chegam à 12% e a falência da anastomose exigindo a realização de ileostomia definitiva à 57% 1,8,13,19,22,,28,29.

Considerando que os pacientes submetidos à anastomoses íleo-retais ou íleo-anais têm como efeito colateral o aumento do número de evacuações chegando a 9 deposições ao dia26 surgiu a possibilidade de criar-se um reservatório pélvico. Esta modalidade técnica também apresenta altas taxas de complicações. BREEN e col. (1998) relataram 5,7% de deiscências totais, 6,5% de fístulas, 2,9% de sepsis, 4,5% de estenoses e 10% de perda do reservatório8.

Entre as causas de perda da anastomose intestinal se destacam as fístulas e as deiscências. Muitos fatores de risco predispõem a estas situações como: a preparação pré-operatória do cólon, a técnica cirúrgica e o estado nutricional do paciente. Kirshner (1980) e Blomquist (1984) citam a doença inflamatória do intestino como condição predisponente para o desenvolvimento de fístulas anastomóticas7,20. A presença do processo inflamatório no local da anastomose poderia aumentar a chance de complicações.

O objetivo do presente estudo é verificar a influência da colite induzida por ácido acético nos processos cicatriciais de anastomoses colônicas, através da análise histopatológica da parede do cólon, da determinação qualitativa e quantitativa do colágeno incorporado a ela e da relação com a capacidade de suportar pressão.

MÉTODOS

Utilizaram-se 40 ratos Wistar (Rattus norvegicus albinus, Rodentia mammalia), fêmeas, com idade entre 100 e 130 dias e peso entre 250 e 300g. Os animais permaneceram no Biotério Central da Pontifícia Universidade Católica do Paraná em caixas padronizadas para a espécie, com número máximo de quatro ratos por caixa, sob temperatura e luminosidade naturais. Recebiam água potável e ração padrão comercial em regime livre. Nas 24 horas precedentes ao procedimento de indução de colite, os animais tiveram acesso somente à água.

Dividiu-se o lote de animais em dois grupos de 20 ratos denominados grupos controle e experimento conforme sofressem ou não a indução de colite. Conforme o tempo de aferição, os animais do grupo controle constituiram os subgrupos A e B, isto é, submetidos à anastomose colônica na ausência de colite induzida e com tempo de aferição de 3 dias (Grupo A) e 7 dias (grupo B). Os do grupo experimento, constituíram os subgrupos C e D, isto é, submetidos à anastomose colônica após indução de colite, com tempo de aferição de 3 dias (Grupo C) e 7 dias (Grupo D).

Nas 24 horas precedentes ao procedimento de indução de colite, os animais tiveram livre acesso à água mas não à ração. Realizou-se inicialmente limpeza do cólon através da colocação dos ratos em recipientes contendo um lencól de 1,5 cm de água gelada, induzindo deste modo à evacuação, devido à baixa temperatura. Após este procedimento, introduzia-se no reto, um cateter de polietileno, medindo 0,7mm de diâmetro e 90mm de comprimento, apresentando extremidade distal fechada e perfurações laterais distribuídas nos seus quadrantes e separadas entre si por 5mm. Conectou-se na extremidade proximal do catéter uma seringa de 1ml.

Nos animais do Grupo Experimento injetou-se 0,5 ml de ácido ácético à 10% e nos do Grupo Controle 0,5 ml de solução salina 0,9%. Segui-se então a injeção de 0,2 ml de ar, em ambos os grupos, para que todo o conteúdo do cateter atingisse a luz do cólon.

No 7º dia, após a indução da colite, realizou-se a anastomose colo-cólica.

Induziu-se a anestesia com éter etílico a 97% em campânula fechada e manteve-se a anestesia, com o mesmo anestésico em sistema aberto.

Realizou-se tricotomia da região ântero-lateral do abdômen e fixação à mesa cirúrgica na posição decúbito dorsal. Procedeu-se a limpeza mecânica e a anti-sepsia da região operatória com polivinilpirrolidona - iodo ativo 1%. Seguiu-se a colocação de campo cirúrgico estéril, fenestrado, sobre a área cirúrgica.

Fez-se laparotomia mediana e identificou-se o cólon esquerdo. Quando aderências estavam presentes, foram delicadamente desfeitas. Segui-se a secção transversa do cólon e a realização de anastomose término-terminal com oito pontos separados, eqüidistantes, em plano total. Para tal foi utilizado fio monofilamentar de nylon 6-0. Procedeu-se à laparorrafia com a aplicação dois planos de sutura: o primeiro, músculo-aponeurótico, com pontos separados simples realizados com fio monofilamentar de nylon 3-0 e o da pele através de sutura contínua intradérmica com fio monofilamentar de nylon 6-0.

Sacrificaram-se os animais dos Grupos A e C no 3º dia de pós-operatório e os dos grupos B e D no 7º dia de pós-operatório. Procedeu-se à nova laparotomia. Na avaliação macroscópica procuravam-se: seromas, hematomas, discências, fístulas, abscessos e aderências.

Ressecou-se um segmento de cólon esquerdo contendo a anastomose, lavou-se com solução salina isotônica 0,9% e colocou-se dentro de um recipiente cúbico contendo água. Este recipiente apresentava na região média de uma de suas paredes internas uma entrada de ar, com válvula unidirecional, sob a forma triangular. Fixou-se a extremidade proximal em torno da entrada de ar de modo que a estrutura triangular ficasse dentro da luz do cólon, por uma ligadura dupla com cadarço cirúrgico número 5-0. Desta forma, o catéter de oxigênio introduzido na entrada de ar adentrava à luz do cólon. Em sua extremidade distal realizou-se sutura em bolsa e as extremidades do fio foram ancoradas ao fundo do recipiente, de modo que o segmento de cólon ficasse em posição horizontal e totalmente submerso na água. Introduziu-se então um catéter de 0,7mm de diâmetro e 70mm de comprimento pela entrada de ar, o qual penetrou a luz do cólon por 20mm. Este catéter apresentava extremidade proximal de 3 vias. A primeira via foi conectada à um cilindro de oxigênio 100% o qual forneceu fluxo de 1 litro por minuto. A segunda via foi ligada à um transdutor, e deste a um polígrafo Bese (7.0, capaz de registrar os valores pressóricos intraluminais, aumentados gradativamente pelo fluxo de oxigênio permanente. Registraram-se os valores pressóricos do momento da rotura (Pressão de Ruptura ou PR) do cólon ou vazamento de ar para dentro do recipiente.

Imergiram-se as peças cirúrgicas contendo a anastomose, abertas pela borda antimesenterial e colocadas sobre papel filtro em formalina, para estudo anátomo-patológico. Os cortes histológicos com 4 micrômetros de espessura forma corados com hematoxilina - eosina e picrosírius.

Pela coloração da hematoxilina-eosina analisaram-se os seguintes parâmetros: reação inflamatória, fibrose e ordenação do colágeno. Classificaram-se estes parâmetros, qualitativamente, em: ausentes, dicretos, moderados e intensos.

Analisaram-se os cortes histológicos corados pelo picrosírius com 400 aumentos, utilizando fonte de luz polarizada. As fibras colágenas mais espessas e fortemente birrefringentes apresentam coloração vermelho-alaranjada (colágeno I) e as fibras mais finas e dispersas, fracamente birrefringentes, apresentam coloração esverdeada (colágeno III).

Capturaram-se as imagens com uma câmera Sony (CCD 101), transmitidas a um monitor colorido Trinitron Sony (congeladas e digitalizadas através de placas oculus TCX). Finalmente, realizou-se a análise das imagens através do aplicativo Optimas (6.0 para " Windows" em microcomputador da linha Pentium).

A calibração do sistema foi baseada na densidade óptica dos pontos de resolução (pixels) que formam as imagens, selecionando-se o valor limite de melhor resolução (threshold). Quatro campos com ampliação de 400 vezes foram colhidos para cada lâmina, localizados nas porções superior, inferior, lateral direita e lateral esquerda.

No sistema RGB (Red, Green, Blue) foram considerados valores para preto (fundo), para tons de vermelho (colágeno I) e para tons de verde (colágeno III). Áreas entre os valores 0-50 para o vermelho, 0-50 para o verde e 0-80 para o azul foram interpretadas como preto. Limites de 70-225 para o vermelho, 0-102 para o verde 0-115 para o azul foaram considerados para as tonalidades de vermelho da lâmina e correspondem às fibras de colágeno tipo I, coradas nessa cor. Valores determinados de 4-110 para o vermelho, 51-225 para o verde e 42-125 para o azul correspondem aos tons de verde, gerado pelas fibras de colágeno tipo III (Junqueira, Cossermelli e Brentani, 1978)18.

A quantidade de fibras avermelhadas e esverdeadas presentes nos cortes histológicos permitiu a realização de cálculo do percentual da área ocupada por estas fibras. Desta forma, o valor de colágeno total correspondeu à soma dos valores das áreas vermelhas e verdes.

Sumeteram-se os resultados à tratamento estastítico pelo teste de exato de Fisher para avaliar as complicações (deiscências e óbitos), a reação inflamatória, a fibrose e ordenação do colágeno. Utilizou-se o teste t de student avaliação da pressão de ruptura e quantificação do colágeno, conforme os resultados fossem paramétricos ou não. Foi considerado p £ 0,05 para rejeição da hipótese de nulidade.

RESULTADOS

Registrou-se número maior de deiscências (p=0,0222) bem como de óbitos (p=0,1154) no Grupo Experimento.

Todos os animais apresentaram aderências ao nível da anastomose. Entre as estruturas aderidas estavam o mesosalpinge, o intestino delgado e o baço.

No terceiro dia não foi possível avaliar a pressão de ruptura, pois na maioria dos segmentos de cólon de ambos os grupos ela foi nula. A capacidade de suportar pressão foi semelhante nos dois grupos no sétimo dia, sendo a média do grupo controle igual a 169,7 mmHg e a média do grupo experimento igual a 149,6 mmHg (p = 0,0836) (tabela 1).

O exame histopatológico revelou, no terceiro dia, predomínio de infiltrado inflamatório agudo de intensidade moderada a intensa nos dois grupos (p=0,4737) e no sétimo dia embora tenha sido possível ver uma modificação das células inflamatórias com o aparecimento de células de características crônicas, esta transformação foi semelhante nos dois grupos (0,5882). A fibrose era ausente ou discreta no terceiro dia (p=0,0867) e aumentou no sétimo dia quando se apresentou de moderada à intensa nos dois grupos (p=0,1830).

O colágeno desorganizado na quase totalidade dos cortes histológicos do grupo experimento no terceiro dia (p=0,0495) e apresentava-se em organização nos dois grupos no sétimo dia (p=0,5555)

Com relação à concentração de colágeno total, o grupo experimento apresentou maior quantidade de colágeno comparada com o grupo controle (p=0,0031).

O percentual de colágeno imaturo (colágeno tipo III) foi maior no grupo experimento (p=0,0000) e o colágeno maduro (colágeno do tipo I) apresentou maior concentração no grupo controle (p=0,0102).

DISCUSSÃO

Embora altas taxas de deiscências e fístulas se encontrem descritas na literatura quando da realização de anastomoses íleo-retais ou íleo-anais1,8,13,19,22,28 não se encontrou estudos experimentais que estudassem o processo de reparação de anastomoses feitas em cólons com doença inflamatória.

Yamakawa e col. (1971) observaram marcada diminuição do conteúdo de colágeno, em cães, com diverticulite simulada31. Hawley (1973) estudou o conteúdo de colágeno em anastomoses colônicas infectadas encontrando significante aumento da lise de colágeno maduro que se acompanhavam do aumento da síntese de colágeno novo. Contudo, este autor estudava infecção e não doença inflamatória16. O mesmo foi relatado por Hesp e col. (1984)17. Muitos outros estudos são descritos, por diversos autores, porém a tônica é dada à presença de infecção e não à doença inflamatória.

No presente estudo procurou-se conhecer a evolução da cicatrização de anastomoses de cólon realizadas após a indução de doença inflamatória induzida com ácido acético pelo método descrito por McPherson e Pfeiffer (1978)24 e desenvolvido entre nós por Moraes (1989)26. As anastomoses foram realizadas no 7.º dia porque em estudo piloto prévio observou-se que o cólon se apresentava muito friável inviabilizando sua manipulação. Kirshner (1980) e Blomquist (1984) afirmam que a doença inflamatória é condição predisponente para o desenvolvimento de fístulas anastomóticas7,20.

Pode-se verificar que o número de complicações no grupo de animais com doença inflamatória foi maior assim como a mortalidade. As deiscências com peritonite foi a situação mais comum (p=0,0222). A capacidade de suportar pressão, nas anastomoses que evoluíram sem complicações foi menor nestes cólons, porém a diferença quando comparada ao controle não foi significante (p=0,0836). Verificou-se que as anastomoses construídas em cólons com doença inflamatória apresentavam maior concentração de colágeno total, com predomínio de colágeno imaturo (tipo III) (p=0,0000) enquanto que nas feitas em cólons normais predominava colágeno maduro (tipo I) (p=0,0102). Observou-se ainda que a organização do colágeno era menor, no terceiro dia, nas anastomoses com doença inflamatória. Entretando a análise da reação inflamatória ao nível da anastomose foi semelhante nos dois grupos. Estes resultados permitem sugerir que a doença inflamatória leva a aumento do número de deiscências provavelmente pelo atraso da maturação e ordenação do colágeno.

CONCLUSÃO

No presente estudo verificou-se que anastomoses realizadas em cólons com doença inflamatória são acompanhadas de maior número de deiscências e a maturação e ordenação do colágeno nessas anastomoses são mais tardias.

NOTAS

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    . Estudo realizado na Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da Faculdade de Medicina da Universidade Católica do Paraná (PUCPR)
    2. Professor Titular de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professor Adjunto de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR. Doutor em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM.
    3. Professora Coordenadora da Disciplina de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental da UFPR, Professora Adjunta de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR, Professora Titular de Experimentação em Clínica e Cirurgia da FEMPAR, Doutora em Cirurgia Experimental pela UNIFESP-EPM.
    4. Alunos de Iniciação Científica da Disciplina de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental da PUCPR
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Abr 2001
    • Data do Fascículo
      2000
    Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Pesquisa em Cirurgia https://actacirbras.com.br/ - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actacirbras@gmail.com