Acessibilidade / Reportar erro

Retalho ósseo pré-fabricado com osso homógeno: estudo da maturação óssea em um modelo experimental

Prefabricated homogenous bone flap: bone maturation study as an experimental model

Resumos

As opções convencionais de tratamento de perdas ósseas, como enxertos e retalhos não são satisfatórias. Com isso uma nova categoria de retalhos, o retalho pré-fabricado (RPF), passou a ser estudada. Foram retirados 42 ossos metatársicos-I das patas traseiras de 21 ratos Wistar. O grupo I (n=21) foi descalcificado e liofilizado e o grupo II (n=21) foi não descalcificado e congelado a -70°C. Após 3 semanas os ossos foram enxertados em 21 animais sobre os vasos epigástricos inferiores nas regiões inguinal direita e esquerda, individualizados por uma lâmina de silicone. Os grupos I e II foram divididos em três subgrupos cada, de acordo com o tempo de permanência (1, 2 e 4 semanas) após a pré-fabricação do retalho. No estudo histológico macroscópico os grupos apresentaram diferenças em morfologia e consistência: o grupo I mostrou perda da arquitetura óssea e da rigidez e grupo II mantiveram sua forma, rigidez e consistência. Na análise qualitativa alterações foram observadas nos fragmentos do grupo desmineralizado e liofilizado, especialmente no subgrupo de 2 semanas. O grupo II não apresentou alteração no aspecto do tecido ósseo mineralizado entre os diversos subgrupos. É nítida a diferença histológica entre os RPF com osso descalcificado e liofilizado quando comparado ao não descalcificado e congelado. A reabsorção óssea gradual sugere que a rotação do retalho deve ocorrer precocemente. Este estudo demonstra a aplicabilidade do osso homógeno para pré-fabricação de retalhos.

Retalhos cirúrgicos; Osteogênese; Osso; Transplante ósseo; Ratos


As conventional options for bone repair are not satisfactory, a new flap category was developed, the prefabricated flap (RPF). 42 metatarsic-I bone were obtained from 21 Wistar rats, and divided in two groups: group I (n=21) the bones were freeze- dryed and decalcified and group II (n=21) was frozen to - 70º C. After 3 weeks the bones were grafted in 21 rats, onto the left na right inferior epigastric vessels wrapped in silicon sheet. Groups I and II were subdivided in 3 groups each, following the period of permanence (1,2 or 4 weeks). In macroscopic histologic study, group I revealed loss of bone architecture and group II manteined its concistency and shape. In quantitative analysis, alterations were observed in group I, mainly inthe 2 weeks group. There is a histologic difference in prefabricated bone flaps betwenn groups I and II. Gradual bone reabsorption suggests that the flap should be rotated early. This study shows the applicability of homogenous bone for flap prefabrication.

surgical flaps; Osteogenesis; Bone; Bone transplantation; Rats


RETALHO ÓSSEO PRÉ-FABRICADO COM OSSO HOMÓGENO: ESTUDO DA MATURAÇÃO ÓSSEA EM UM MODELO EXPERIMENTAL1 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR.

Alfredo Benjamim Duarte da Silva2 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR. , Leandro Rodrigues3 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR. , Wanda Jorgetti4 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR. , Júlio Morais Besteiro5 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR. , Marcus Castro Ferreira6 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR. , Luciane Machado dos Reis7 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR. , Anne Karoline Groth8 1 . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru. 3. Acadêmico de Medicina. 4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP. 5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP. 7. Mestre em Medicina pela USP. 8. Acadêmica de Medicina da UFPR.

Duarte da Silva AB, Rodrigues L, Jorgetti W, Besteiro JM, dos Reis LM, Groth AK. Retalho ósseo pré-fabricado com osso homógeno: estudo da maturação óssea em um modelo experimental. Acta Cir Bras 2000; 15(supl.3): 65-68.

RESUMO: As opções convencionais de tratamento de perdas ósseas, como enxertos e retalhos não são satisfatórias. Com isso uma nova categoria de retalhos, o retalho pré-fabricado (RPF), passou a ser estudada. Foram retirados 42 ossos metatársicos-I das patas traseiras de 21 ratos Wistar. O grupo I (n=21) foi descalcificado e liofilizado e o grupo II (n=21) foi não descalcificado e congelado a -70°C. Após 3 semanas os ossos foram enxertados em 21 animais sobre os vasos epigástricos inferiores nas regiões inguinal direita e esquerda, individualizados por uma lâmina de silicone. Os grupos I e II foram divididos em três subgrupos cada, de acordo com o tempo de permanência (1, 2 e 4 semanas) após a pré-fabricação do retalho. No estudo histológico macroscópico os grupos apresentaram diferenças em morfologia e consistência: o grupo I mostrou perda da arquitetura óssea e da rigidez e grupo II mantiveram sua forma, rigidez e consistência. Na análise qualitativa alterações foram observadas nos fragmentos do grupo desmineralizado e liofilizado, especialmente no subgrupo de 2 semanas. O grupo II não apresentou alteração no aspecto do tecido ósseo mineralizado entre os diversos subgrupos. É nítida a diferença histológica entre os RPF com osso descalcificado e liofilizado quando comparado ao não descalcificado e congelado. A reabsorção óssea gradual sugere que a rotação do retalho deve ocorrer precocemente. Este estudo demonstra a aplicabilidade do osso homógeno para pré-fabricação de retalhos.

DESCRITORES: Retalhos cirúrgicos. Osteogênese. Osso. Transplante ósseo. Ratos

Duarte da Silva AB, Rodrigues L, Jorgetti W, Besteiro JM, dos Reis LM, Groth AK. Prefabricated homogenous bone flap: bone maturation study as an experimental model. Acta Cir Bras 2000; 15(supl.3): 65-68.

SUMMARY: As conventional options for bone repair are not satisfactory, a new flap category was developed, the prefabricated flap (RPF). 42 metatarsic-I bone were obtained from 21 Wistar rats, and divided in two groups: group I (n=21) the bones were freeze- dryed and decalcified and group II (n=21) was frozen to - 70º C. After 3 weeks the bones were grafted in 21 rats, onto the left na right inferior epigastric vessels wrapped in silicon sheet. Groups I and II were subdivided in 3 groups each, following the period of permanence (1,2 or 4 weeks). In macroscopic histologic study, group I revealed loss of bone architecture and group II manteined its concistency and shape. In quantitative analysis, alterations were observed in group I, mainly inthe 2 weeks group. There is a histologic difference in prefabricated bone flaps betwenn groups I and II. Gradual bone reabsorption suggests that the flap should be rotated early. This study shows the applicability of homogenous bone for flap prefabrication.

SUBJECT HEADINGS: surgical flaps. Osteogenesis. Bone. Bone transplantation. Rats.

INTRODUÇÃO

As perdas ósseas causadas por ressecções de tumores, infecções e traumas são um desafio em cirurgia reconstrutiva 5. As opções convencionais de tratamento são a enxertia óssea8,9,11, o uso de materiais aloplásticos e a transferência de retalhos ósseos. Ainda, os enxertos de osso apresentam riscos de infecção, grau significante de reabsorção óssea, além de uma morbidade secundária da área doadora4. Os materiais aloplásticos usualmente evoluem para infecção e extrusão do material11 e os retalhos apresentam vantagem sobre os enxertos e materiais aloplásticos por serem nutridos por um pedículo determinado, não necessitando da vascularização do leito receptor12. Contudo, existe número limitado de áreas doadoras, maior morbidade além de requererem técnicas cirúrgicas complexas e conseqüentes riscos4.

Devido a essas limitações uma nova categoria de retalhos denominados retalhos pré-fabricados (RPF) 7 foi desenvolvida. O enxerto sobre um vaso específico é utilizado para pré-fabricar o retalho1,7,12. Esta técnica é realizada por estágios: no primeiro tempo o enxerto é revascularizado pelo vaso e em segundo período, é transferido6,7.

O osso homógeno não apresenta morbidade da área doadora e esse procedimento têm sido utilizado para a pré-fabricação de retalhos. Entretanto, não se sabe em que período ocorre a revascularização para que o mesmo possa ser transferido como retalho local ou microcirúrgico. Além disso, as diferentes técnicas de preparo e armazenamento do osso homógeno2 podem influenciar no processo de maturação do retalho pré-fabricado.

O objetivo deste estudo é determinar o tempo de revascularização, evidenciando o período ideal de transferência do retalho e a influência das diferentes técnicas de preparo e armazenamento na maturação do RPF.

MÉTODOS

O animal de experimento foi o rato Wistar-Furth, macho, adulto , pesando entre 250 e 350 gramas. Durante a pesquisa, os animais permaneceram no biotério da Disciplina de Cirurgia Plástica da Universidade de São Paulo, em gaiolas unitárias, com temperatura e luminosidade controladas e dieta "ad libitum".

A indução anestésica dos animais foi realizada com pentobarbital sódico intraperitoneal, na dose de 30 mg/kg

De 21 ratos foram retirados os metársicos-I das patas traseiras, totalizando 42 ossos divididos em dois grupos: grupo I, grupo descalcificado e liofilizado (n=21), no qual os ossos foram submetidos ao preparo descrito no quadro 1 e permaneceram armazenados em temperatura ambiente e grupo II, grupo não descalcificado e congelado (n=21), no qual os ossos foram limpos de tecido muscular e armazenados em freezer a -70°C. Os metátarsicos-I ficaram estocados por 3 semanas.


Após este período os ossos foram enxertados, como homógenos, em 21 animais sobre os vasos epigástricos superficiais inferiores nas regiões inguinais esquerdas e direitas dos ratos para realização do retalho pré-fabricado. O conjunto de: osso, tecido perivascular e vasos foi separado da gordura subcutânea adjacente por fina lâmina de silicone com tamanho de 0,8 cm por 0,8 cm.

Os metatársicos-I foram retirados das regiões inguinais do rato em diferentes períodos de pós-operatório do primeiro estágio da pré-fabricação do retalho, criando-se quatro sub-grupos do grupo I e quatro sub-grupos do grupo II.

Após a retirada da região inguinal o material foi tratado da seguinte maneira: etanol a 70%, etanol a 100%, tolueno, solução A (metil metacrilato 75% + dibutilftalato 25%), permanência do bloco em estufa a 37º C até o seu endurecimento.

Os blocos obtidos foram seccionados em cortes, seguindo o sentido longitudinal, de cada blocoforam obtidos dez cortes, e coradas duas lâminas com azul de toluidina e em uma lâmina foi realizada coloração de Von Kossa.

O estudo histomorfométrico foi realizado com microscópio. Todas as lâminas foram vistas pelo mesmo observador sem identificação quanto à origem do material examinado. Foram analisados: 1) número de vasos por campo (aumento de 125 vezes); 2) espessura cortical em micra em quatro pontos eqüidistantes ( aumento de 50 vezes); 3) espessura inter-cortical em micra (aumento de 50 vezes); 4) espessura da fibrose em micra (aumento de 50 vezes); presença ou ausência de mineral através da coloração de Von Kossa (aumento de 50 vezes).

A comparação estatística entre os grupos foi feita com teste t-não pareado, e o teste Anova foi utilizado para avaliar as variações nos três diferentes tempos. Foram considerados significativos os níveis descritos para p < 0.05 .

RESULTADOS

No estudo histológico macroscópico os grupos apresentaram diferenças em morfologia e consistência: o grupo I mostrou perda da arquitetura óssea e da rigidez a medida que permaneciam mais tempo, terminando por apresentar "consistência coloidal" no sub-grupo de quatro semanas; já os fragmentos integrantes do grupo não desmineralizado e congelado mantiveram sua forma, rigidez e consistência.

Na análise qualitativa alterações foram observadas nos fragmentos do grupo I, que apresentou aspecto cartilaginoso, especialmente no sub-grupo de 2 semanas.gura 1). Após esse período o aspecto microscópico mostra um tecido desorganizado com tecido fibroso circundante. O grupo II não apresentou alteração no aspecto do tecido ósseo mineralizado entre os diversos sub-grupos.

A análise quantitativa de vasos, espessura cortical, distância intercortical e espessura da fibrose peri-osso estão expressos na tabela 1.

DISCUSSÃO

Com a utilização de retalho pré-fabricado será possível construir um retalho na forma e no local desejado6.

A utilização do tecido homógeno apresenta a vantagem de não possuir morbidade e área doadora ilimitada. Porém, existem diferentes técnicas de preparo e armazenamento do osso que podem influenciar no processo de maturação do retalho ósseo pré-fabricado. Além disso, este tecido causa uma resposta imunológica enxerto-hospedeiro que pode influenciar no processo de incorporação óssea15.

Neste trabalho estudamos a maturação e vascularização, em diferentes períodos da primeira fase da pré-fabricação do retalho ósseo com enxerto de osso homógeno preparado e armazenado de duas formas diferentes.

A incorporação do osso homógeno apresenta cinco estágios: 1) inflamatório, promovendo uma resposta celular do hospedeiro; 2) revascularização do tecido; 3) osteocondução, na qual o enxerto tem a função de arcabouço para o crescimento de vasos e formação de osso; 4) osteoindução, na qual células mesenquimais do hospedeiro são induzidas, por proteínas (BMPs) encontradas no enxerto, a se transformarem em osteoblastos e 5) remodelação óssea, com características de formação e reabsorção contínua de osso3,8,9.

No grupo I foi realizada a desmineralização óssea, já que as proteínas osteoindutoras (BMPs), encontradas na matriz óssea, apresentam grande atividade quando o osso é submetido a descalcificação pelo ácido clorídrico3,8,9. Provavelmente, isso ocorre devido a um maior contato das proteínas da matriz com células mesenquimais do hospedeiro e uma diminuição da resposta imunológica, em conseqüência de serem eliminados os restos de células ósseas e endoteliais com grande atividade antigênica11.

Outro fator que influencia na osteoindução do enxerto homógeno é o modo de estocagem desses ossos11,13,15. A liofilização para armazenamento do osso consiste no resfriamento do osso a -70oC por um período após o qual o material é colocado em um liofilizador. Esse aparelho forma um vácuo enquanto a temperatura é mantida a -35o C, retirando até 95% da água13. Porém, tanto a liofilização quanto a desmineralização alteram a força mecânica do osso, impedindo seu uso em locais do esqueleto que necessitem de grande suporte10,11,15. Provavelmente, essa seja a causa, associado a reabsorção óssea e hidratação do tecido, que fizeram com que os ossos desse grupo se apresentassem na macroscopia com características amolecidas. Isso é reforçado pela microscopia, em que observamos tecido avascular muito semelhante à cartilagem.

No grupo II o preparo do osso consistiu na limpeza e no armazenamento em congeladores especiais, a -70ºC, já que em temperaturas maiores enzimas líticas permanecem ativas destruindo as propriedades osteoindutoras13,15. Neste grupo, o material ósseo manteve sua forma e característica, porém microscopicamente o tecido parecia estar sendo gradativamente e lentamente absorvido por osteoclastos, que abrem lacunas no osso calcificado por onde crescem vasos e chegam células inflamatórias6,11,13. A incorporação do osso homógeno não descalcificado ocorre com maior lentidão porque o enxerto desencadeia uma maior resposta imunológica interferindo na osteoindução e na revascularização14.

É nítida a diferença histológica entre os retalhos pré-fabricados com osso homógeno descalcificado e liofilizado quando comparado ao não descalcificado e armazenado congelado. Porém, os resultados obtidos na análise da vascularização, associados à sugerida reabsorção óssea, apontaram a maturação vascular do retalho de ambos os grupos em 1 semana. Isso somado à reabsorção óssea gradual, sugere que a rotação ou transferência do retalho deve ocorrer precocemente, inclusive antes de que ocorra mineralização tecidual.

Os dados obtidos neste estudo reafirmam a aplicabilidade do osso homógeno para pré-fabricação de retalhos. Entretanto, novos estudos deverão abranger o comportamento desse osso quando em contato com outro osso, a interferência de drogas imunossupressoras e fatores de crescimento na maturação e incorporação do tecido ósseo.

NOTAS

  • 1. Abbase E-H A, Shenaq SM, Spira M, EI-Falaky MH. Prefabricated flaps: experimental and clinical review. Plast Reconstr Surg1995;96:1218-25.
  • 2. Barros TEP, Rossi JDMBA, Rodrigues CJ, Lage LA, Burchardt H. Biology of bone transplantation. Orthop Clin North Am 1987; 18(2):187-96
  • 3. Colen SR, Shaw WW, McCarthy JG. Review of morbidity of 300 free flap donor sites. Plast. Reconst. Surg 1986; 77:948-53.
  • 4. Converse JM, Kawamoto Jr HK, Wood-Smith, D. Deformities of the jaws. Philadelphia: Saunders, 1977.
  • 5. Costa H, Cunha C, Guimarăes I, Comba S, Malta A, Lopes A. Prefabricated flaps for the head and neck: a preliminary report. Brit J of Plast Surg 1993; 46:223-7.
  • 6. Erol OÖ. The transformation of a skin graft into a vascularized pedicle flap. Plast Reconstr Surg 1976; 58:470-7.
  • 7. Friedlander G. Current concepts review bone grafts. J Bone and Joint Surg 1987; 69:786-90.
  • 8. Goldberg MV, Stevenson S. Natural history of autografts and allografts. Clin Orthop Relat Res 1987; 225:7-16.
  • 9. Guo ZM, Xia SZ, Lin LB. The mechanical and biological properties of desmineralized cortical bone allografts in animals. J Bone Joint Surg 1991; 73-B:791-4.
  • 10. Hobar PC, Byrd HS. Implantation: bone, cartilage and alloplasts (overview). Select Read Plast Surg 1990; 6:1-28.
  • 11. Khouri RK, Upton J, Shaw WW. Principles of flap prefabrication. Clin Plastic Surg 1992; 19:763-71.
  • 12. Pappas MA. Current methods of bone storage by freezing and freeze-drying. Cryobiology 1968; 4:358-75.
  • 13. Reis PR. Poder osteogęnico dos enxertos ósseos. Estudo experimental comparativo entre enxertos autólogo, homólogo irradiado e homólogo AAA. Rev Bras Ortop 1989; 24:36-40.
  • 14. Tomford WW, Doppelt SH, Mandin HJ, Friedlaender GE. 1983 bone bank procedures. Clin Orthop Rel Res 1983; 174: 15-21.
  • 1
    . Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Plástica e Queimaduras da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
    2. Mestre em Cirurgia Plástica e Preceptor da Residência de Cirurgia Plástica do Hospital Univeritário Cajuru.
    3. Acadêmico de Medicina.
    4. Doutora em Medicina da USP, Médica da Disciplina de Nefrologia da USP, responsável pelo laboratório de Doença Ósseas da USP.
    5. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP.
    6. Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, Doutor em Medicina, Médico da Disciplina de Cirurgia Plástica FMUSP.
    7. Mestre em Medicina pela USP.
    8. Acadêmica de Medicina da UFPR.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Abr 2001
    • Data do Fascículo
      2000
    Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Pesquisa em Cirurgia https://actacirbras.com.br/ - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actacirbras@gmail.com