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Depressão, ansiedade e sonolência diurna em cuidadores primários de crianças com paralisia cerebral

Depresión, ansiedad y somnolencia diurna en cuidadores primarios de niños con parálisis cerebral

Resumos

OBJETIVO: Avaliar os níveis de depressão, ansiedade e sonolência diurna excessiva em cuidadores primários de crianças com paralisia cerebral, relacionando-os às condições socioeconômicas do cuidador e às características neurológicas da criança e comparando-os a cuidadores de crianças saudáveis. MÉTODOS: 45 cuidadores de crianças com paralisia cerebral e 50 cuidadores de crianças saudáveis foram aleatoriamente incluídos no estudo e responderam a um questionário semiestruturado. Avaliaram-se os níveis de depressão, ansiedade e sonolência diurna excessiva por meio das escalas de Beck, ansiedade estado-traço e Epworth, respectivamente. RESULTADOS: A maioria dos entrevistados eram mães com baixo nível socioeconômico. Os que se autoavaliaram como ansiosos e depressivos apresentaram resultados comprobatórios de ansiedade e depressão com as escalas de ansiedade estado-traço e Beck para os cuidadores de crianças com paralisia cerebral. Os níveis de sonolência diurna excessiva estiveram relacionados a elevados níveis de depressão. O comprometimento neurológico das crianças não influenciou os resultados sobre os cuidadores. CONCLUSÕES: Depressão, ansiedade e problemas relacionados ao sono foram comuns em cuidadores de crianças com paralisia cerebral. O nível de funcionalidade neurológica da criança não influenciou os resultados.

paralisia cerebral; cuidadores; depressão; ansiedade; sonolência


OBJETIVO: Evaluar los niveles de depresión, ansiedad y somnolencia diurna excesiva en cuidadores primarios de niños con parálisis cerebral relacionándolos a las condiciones socioeconómicas del cuidador y a las características neurológicas del niño y comparándolos a cuidadores de niños sanos. MÉTODOS: Se incluyeron aleatoriamente en el estudio a 45 cuidadores de niños con parálisis cerebral y a 50 cuidadores de niños sanos, y contestaron a un cuestionario semiestructurado. Se evaluaron los niveles de depresión, ansiedad y somnolencia diurna excesiva mediante las escalas de Beck, ansiedad estado-rasgo y Epworth, respectivamente. RESULTADOS: La mayoría de los entrevistados eran madres con bajo nivel socioeconómico. Los que se autoevaluaron ansiosos y depresivos presentaron resultados comprobatorios de ansiedad y depresión con los inventarios de estado-rasgo y Beck para los cuidadores de niños con parálisis cerebral. Los niveles de somnolencia diurna excesiva estuvieron estadísticamente relacionados a los elevados niveles de depresión. El comprometimiento neurológico de los niños no influenció los resultados sobre los cuidadores. CONCLUSIONES: Depresión, ansiedad y problemas relacionados al sueño son comunes en cuidadores de niños con parálisis cerebral. El nivel de funcionalidad neurológica del niño no influencia los resultados.

parálisis cerebral; cuidadores; depresión; ansiedad; somnolencia


OBJECTIVE: To evaluate depression, anxiety and excessive daytime sleepiness (EDS) levels in primary caregivers of children with cerebral palsy (CCP) and to trace the relationships with their socioeconomic conditions and child neurological characteristics, as compared with caregivers of typical children (CTC). METHODS: 45 CCP and 50 CTC were randomly chosen and answered a semi-structured questionnaire. We evaluated EDS on the Epworth scale. Beck depression inventory (BDI) and the state-trait anxiety inventory (STAI) identified depressive and anxious symptoms, respectively. RESULTS: The majority of subjects were mothers with low socioeconomic level. Self-perception of anxiety and depressive symptoms of CCP were confirmed through BDI and STAI. EDS was statistically related to high levels of depression. Children's disabilities did not influence the results. CONCLUSIONS: Depression, anxiety symptoms and sleep disruption were common in CCP. Child functional level did not influence the results.

cerebral palsy; caregivers; depression; anxiety; somnolence


ARTIGO ORIGINAL

Depressão, ansiedade e sonolência diurna em cuidadores primários de crianças com paralisia cerebral

Catherine MarxI; Erica Masruha RodriguesII; Marcelo Masruha RodriguesIII; Luiz Celso P. VilanovaIV

Instituição: Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), São Paulo, SP, Brasil

IMestre em Neurologia Infantil pela Unifesp; Médica Assistente da Neurologia Infantil do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Unifesp, São Paulo, SP, Brasil

IIMestre em Ciências pela Unifesp; Psicóloga do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Unifesp, São Paulo, SP, Brasil

IIIDoutor em Neurologia Infantil pela Unifesp; Professor Adjunto da Disciplina de Neurologia Clínica do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Unifesp, São Paulo, SP, Brasil

IVDoutor em Neurologia Infantil pela Unifesp; Professor Associado da Disciplina de Neurologia Clínica do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia da Unifesp, São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Catherine Marx Rua Botucatu, 720 CEP 04023-900 - São Paulo/SP E-mail: marxcatherine@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar os níveis de depressão, ansiedade e sonolência diurna excessiva em cuidadores primários de crianças com paralisia cerebral, relacionando-os às condições socioeconômicas do cuidador e às características neurológicas da criança e comparando-os a cuidadores de crianças saudáveis.

MÉTODOS: 45 cuidadores de crianças com paralisia cerebral e 50 cuidadores de crianças saudáveis foram aleatoriamente incluídos no estudo e responderam a um questionário semiestruturado. Avaliaram-se os níveis de depressão, ansiedade e sonolência diurna excessiva por meio das escalas de Beck, ansiedade estado-traço e Epworth, respectivamente.

RESULTADOS: A maioria dos entrevistados eram mães com baixo nível socioeconômico. Os que se autoavaliaram como ansiosos e depressivos apresentaram resultados comprobatórios de ansiedade e depressão com as escalas de ansiedade estado-traço e Beck para os cuidadores de crianças com paralisia cerebral. Os níveis de sonolência diurna excessiva estiveram relacionados a elevados níveis de depressão. O comprometimento neurológico das crianças não influenciou os resultados sobre os cuidadores.

CONCLUSÕES: Depressão, ansiedade e problemas relacionados ao sono foram comuns em cuidadores de crianças com paralisia cerebral. O nível de funcionalidade neurológica da criança não influenciou os resultados.

Palavras-chave: paralisia cerebral; cuidadores; depressão; ansiedade; sonolência.

Introdução

A paralisia cerebral (PC) é um dos comprometimentos neurológicos mais comuns em crianças no mundo todo, sendo especialmente prevalente em países em desenvolvimento, com assistência médica e de parto precárias(1).

A última definição de PC, publicada em 2007, descreve-a como um grupo de desordens permanentes do desenvolvimento e da postura que causam limitações das atividades, sendo atribuídas a distúrbios não progressivos que ocorreram no cérebro do feto ou do lactente em desenvolvimento. As alterações motoras da PC estão frequentemente associadas a distúrbios de percepção, distúrbios sensitivos, cognitivos, de comunicação, comportamento, epilepsia e problemas musculoesqueléticos secundários(2-4).

Não existe cura para essa condição, mas terapia, educação e tecnologia podem maximizar o potencial de cada criança ao melhorar sua habilidade funcional e qualidade de vida(5). A melhora geral das crianças parece também estar diretamente relacionada à dedicação e preocupação de seu cuidador(6). Comprometimentos psicológicos e físicos são comuns entre cuidadores de crianças que sofrem de alguma condição médica crônica(7-9).

A depressão e a ansiedade são doenças psiquiátricas comuns na população geral, mas parecem ser mais prevalentes entre os cuidadores de pessoas com doenças crônicas. Recentemente, Tyrer (10) definiu a ansiedade e a depressão como uma única doença, devido à frequente associação entre as duas, que, muitas vezes, também se relacionam aos distúrbios do sono e à sonolência diurna(11-13). Crianças com PC geralmente sofrem de distúrbios do sono, afetando a qualidade de vida de seus cuidadores do mesmo modo(14-16).

O objetivo deste estudo foi avaliar os níveis de depressão, ansiedade e sonolência excessiva diurna (SED) em cuidadores primários de crianças com PC. São eles mais comuns nos referidos cuidadores do que na população em geral? Os resultados são influenciados pelas deficiências dessas crianças ou pelas condições socioeconômicas do cuidador?

Método

Trata-se de um estudo transversal que envolveu 45 cuidadores de crianças com paralisia cerebral (CCP) e 50 cuidadores de crianças controles (CCC). Todas as crianças tinham entre seis meses e 12 anos de idade. Em nossa amostra, não havia criança abaixo de seis meses de vida, e 12 anos é a idade limite de atendimento no ambulatório de Neurologia Infantil da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Foi utilizado um questionário pré-estabelecido nas entrevistas com os cuidadores.

Foram considerados como cuidadores aqueles que eram realmente responsáveis pelas decisões da vida da criança, independentemente do sexo ou do grau de parentesco. Os cuidadores responderam a questões como o total de tempo gasto com a criança e sua percepção pessoal quanto aos sintomas de ansiedade e depressão, de forma objetiva, com a pergunta: "você se considera ansioso ou depressivo?" A sonolência excessiva diurna foi avaliada por meio da escala de Epworth. Trata-se de uma escala validada composta por oito questões simples sobre atividades diárias regulares e a chance de dormir ao realizar cada uma dessas atividades, graduando-as em diferentes níveis(17,18). Para o diagnóstico de depressão, utilizou-se o inventário para depressão de Beck (BDI, do inglês Beck depression inventory)(19); já os sintomas de ansiedade foram identificados por meio do Inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE). O inventário de ansiedade traço (IDATE-T) refere-se a diferenças individuais relativamente estáveis na tendência a reagir a situações percebidas como ameaçadoras, com elevações de intensidade no estado de ansiedade. O inventário de ansiedade estado (IDATE-E), por sua vez, analisa os sentimentos subjetivos de tensão que podem variar de intensidade, de acordo com o contexto(20).

Os CCP foram observados e interrogados sobre o nível funcional de suas crianças, classificando-as em um dos cinco grupos, de acordo com o sistema de classificação da função motora grosseira (GMFCS, do inglês gross motor function classification system)(21). Foram obtidas informações sobre uso de medicações, programa de reabilitação atual e equipamentos usados pelas crianças.

Os CCP foram escolhidos aleatoriamente no ambulatório de Neurologia Infantil da Unifesp e convidados pessoalmente a participar do projeto durante as consultas regulares de suas crianças. Se tivessem faltado à consulta da criança, o convite era feito por meio de contato telefônico, solicitando-se que comparecessem ao hospital para a entrevista. Foram contatados 50 pais em quatro meses; dois não puderam comparecer, pois seus filhos estavam em fase de convalescência pós-operatória (cirurgia ortopédica), um não falava o Português (por ser de origem indígena) e outros dois se recusaram a participar do estudo. De forma similar, 52 CCC foram escolhidos de forma aleatória na população geral (trabalhadores do hospital, pessoas que frequentavam os estabelecimentos comerciais ao redor do hospital e pessoas nas ruas). Dois se recusaram a participar do estudo. Antes de iniciar a entrevista, perguntava-se eram responsáveis pelo cuidado de alguma criança para que pudessem participar do estudo. Procurou-se convidar pessoas que aparentemente apresentavam o mesmo nível socioeconômico e educacional para equilíbrio dos dois grupos (CCP e CCC).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unifesp e foi realizado de acordo com os padrões éticos da Declaração de Helsinki, estabelecidos em 1964. A assinatura do Consenso de Informação Livre Esclarecido foi obtida de todos os participantes antes de sua inclusão no estudo.

A análise inicial, ou seja, a prevalência de depressão, ansiedade e de SED nos CCP e CCC foi obtida utilizando-se o BDI, a IDATE e a escala de Epworth, respectivamente. A análise seguinte envolveu a determinação de quais fatores familiares, socioeconômicos, aspectos demográficos e características da criança relacionaram-se aos níveis de depressão, ansiedade e SED em cada grupo. Relacionaram-se as características demográficas dos CCP e CCC, obtiveram-se os resultados de cada inventário (BDI, IDATE, Epworth) em cada um dos grupos e, então, comparam-se os resultados entre os grupos. O grau de funcionalidade motora de cada criança (GMFCS) foi relacionado com os resultados dos níveis de depressão, ansiedade e SDE do grupo de CCP.

Para comparar os dados categóricos nominais, foi utilizado o teste do qui-quadrado (sem a correção de Yale). Os dados contínuos com duas variáveis, tanto independentes quanto dependentes, foram comparados usando-se o teste t de Student. Nos casos com duas variáveis de distribuição não paramétrica, o teste de Kruskal Wallis foi empregado. O coeficiente de correlação de Sperman (r) foi calculado para avaliar amostras contínuas, assim como o coeficiente de correlação ponto-bisserial (rpb) foi empregado quando variáveis dicotômicas foram envolvidas. Regressões lineares múltiplas foram utilizadas para investigar a relação entre variáveis dependentes e independentes. Os resultados foram calculados com teste de Wald. As hipóteses dessas análises foram verificadas usando-se o coeficiente de variação (r2). Dados faltantes foram excluídos. Todos os testes foram bicaudados, sendo significante p<0,05. Os intervalos de confiança (IC) de 95% foram calculados relacionados às diferenças médias. Para as análises, usou-se o SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) 11.5.2.1 software para Windows.

Resultados

Foram recrutados 102 cuidadores e 95 foram incluídos, 45 (47%) eram CCP e 50 (53%), CCC. A grande parte das crianças incluídas no grupo de CCP foi classificada como gravemente comprometida de acordo com o GMFCS (Figura 1).


Todos os dados demográficos, exceto a idade, foram diferentes entre os grupos. A renda dos CCP foi significativamente menor nos CCC. Os CCP permaneceram mais tempo no cuidado de suas crianças, apresentavam nível de escolaridade inferior, trabalhavam apenas algumas horas por dia fora de casa e viviam relacionamentos menos estáveis (Tabela 1).

A avaliação psicológica mostrou que os CCP apresentavam mais sintomas de depressão e ansiedade e significativamente mais SED se comparados aos CCC. O IDATE-E não apresentou resultados diferentes entre os grupos (Tabela 2).

A autopercepção de sintomas ansiosos foi menor nos CCC, apesar de objetivamente não ter existido diferença significante entre a média dos escores nas escalas IDATE-T e IDATE-E tanto nos CCC como nos CCP. Porém, em ambos os grupos de cuidadores, sujeitos com maior percepção de ansiedade apresentaram uma média de escores maiores no IDATE-T do que os que não se julgavam ansiosos. Os dois grupos demonstraram de forma semelhante autopercepção de sintomas depressivos. Ao comparar a média dos escores na escala de BECK com a percepção subjetiva de depressão, nota-se que, apenas nos CCC, a média de depressão medida pela escala BECK não diferiu significativamente da percepção subjetiva de depressão (Tabela 3).

A regressão linear múltipla foi usada para investigar a relação entre CCC e depressão, usando-se resultados obtidos com o BDI como variáveis dependentes e os resultados divergentes entre os grupos, como variáveis independentes (escolaridade, renda familiar, estado civil, tempo gasto com a criança, tempo de trabalho e escala de Epworth) e o próprio jeito de ser CCC. Aplicou-se o critério da razão de verossimilhanças um passo à frente (SFLR - stepwise forward likelihood ratio) para incluir as variáveis independentes.

Os dois maiores fatores de influência sobre os sintomas depressivos foram o fato de ser CCP por si só e os resultados da escala de Epworth. A SED apresentou alta relação com depressão, até mesmo no grupo de CC. O mesmo teste foi usado para avaliar os níveis de ansiedade, e, novamente, o fato de ser CCP e os resultados da escala de Epworth, combinados à SED, mostraram forte associação.

A Tabela 4 demonstra a análise do sono dos dois grupos. A SED, o fato de ser CCP, os resultados do IDATE-T e o número de horas de sono por dia influenciaram os resultados da escala de Epworth.

Finalmente, neste estudo, não se observou influência do grau de comprometimento da criança sobre os níveis de depressão, ansiedade e SED, embora metade das crianças tenha sido classificada como grau V pelo GMFCS (Figura 1). Em média, as crianças apresentavam ainda duas comorbidades (epilepsia, deficiência mental, déficit visual e/ou auditivo) e eram submetidas a dois tipos de reabilitação (fisioterapia, equoterapia, hidroterapia, terapia ocupacional e terapia fonoaudiológica). Nenhum desses fatores foi suficiente para influenciar os níveis de depressão, ansiedade e SED nos CCP.

Discussão

A prevalência de mulheres no grupo de cuidadores, como foi observado neste estudo, já havia sido demonstrada em trabalhos anteriores(22). O grupo de CCP foi composto principalmente por mães solteiras.

Educação, número de horas trabalhadas por semana e renda familiar foram menores no grupo de CCP. Alguns autores apresentaram descrição semelhante(7,8). Há aumento da sobrecarga financeira ao se cuidar de uma criança deficiente, e isso pode ser atribuído à impossibilidade de trabalhar em algum período ou em período integral(7). Cuidar dessas crianças requer atenção constante, não havendo tempo disponível suficiente para associar o trabalho fora de casa e o cuidado delas. Isso é especialmente válido entre aqueles que não recebem suporte familiar ou social adequado(23,24). Além disso, pessoas com baixa renda geralmente sofrem com a falta de assistência médica adequada, especialmente durante a gestação e o parto e, portanto, têm maiores chances de terem uma criança com PC(25).

Ao contrário de estudos anteriores, encontraram-se maiores taxas de relacionamentos instáveis no grupo de CCP(26,27). Vieira et al analisaram as atividades diárias de mães de crianças com PC no Brasil(24), e observaram que a quebra do relacionamento pai-mãe-criança comprometia o estado marital. Os efeitos eram atribuídos à falta de suporte terapêutico, familiar e social e à sobrecarga de responsabilidades da mãe. Não se investigou a causa dos relacionamentos fracassados, mas muitos deles não eram legalmente casados.

Cuidadores de pessoas com doenças crônicas já foram descritos como portadores de problemas de sono. Eles têm mais dificuldade em começar a dormir, têm despertares frequentes não provocados e SED(14). Estudos prévios de Gallagher et al indicam que a qualidade de sono ruim e maior sobrecarga estavam associados a níveis mais elevados de depressão e ansiedade(26). De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais (DSM-IV), o comprometimento do sono per se faz parte dos critérios diagnósticos para depressão e ansiedade e, por outro lado, o distúrbio do sono é um fator de risco para os sintomas depressivos e ansiosos, e estes levam à insônia(11,12).

Este estudo encontrou maiores escores na escala de Epworth em ambos os grupos, que não estavam relacionados a maiores escores nos inventários de ansiedade e depressão. Não foi estabelecida a relação entre SED e sintomas de depressão ou ansiedade. Os integrantes do grupo de CCP referiram a si próprios como possuidores de má qualidade de sono, mas não se investigou a qualidade do sono de suas crianças para verificar se influenciavam o sono de seus cuidadores.

Apesar de fazerem parte da amostra estudada os cuidadores de crianças com comprometimento grave, a independência funcional das crianças não esteve relacionada a qualquer aspecto de depressão, ansiedade ou SED de seus cuidadores. Esse achado é consistente com estudos prévios descritos por Manuel et al e Hamzat e Mordi(28,29). Os primeiros atribuem o resultado a um viés estatístico de seu estudo, já que a maioria dos autores considera a dependência funcional da criança um fator contribuinte importante no comprometimento mental e físico de seus cuidadores(7,8,23,24,27,30). Deve-se mencionar que o GMFCS é uma forma de classificação relativamente nova. Além disso, no presente estudo, não se considerou o comportamento da criança, algo que, em estudos prévios, mostrou grande influência na prevalência de doenças psiquiátricas de seus cuidadores(30).

Os sintomas de depressão e ansiedade parecem ser mais prevalentes entre os CCP. O comprometimento funcional da criança não influenciou os resultados desta pesquisa. Todos os CCP atendidos em clínicas de Neurologia deveriam ser direcionados a um grupo de apoio multidisciplinar, no qual houvesse a participação de psicólogos, assistentes sociais, psiquiatras e outros cuidadores para dividirem suas experiências e orientações quanto ao cuidado das crianças com PC, independentemente do seu grau de comprometimento. Deve-se estar atento aos CCP de crianças com baixo grau de classificação segundo o GMFCS, pois geralmente são esquecidos, uma vez que suas crianças são tidas como quase normais diante de tantas outras com maior comprometimento e com múltiplos fatores para se preocupar.

Deve-se salientar a grande diferença encontrada entre os dois grupos, no que se refere à SED e que não foi atribuída aos distúrbios de depressão e ansiedade, como esperado.

Fonte financiadora: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Processo regular FAPESP: 2009/52145-7

Conflito de interesse: nada a declarar

Recebido em: 4/12/2010

Aprovado em: 13/6/2011

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  • Endereço para correspondência:
    Catherine Marx
    Rua Botucatu, 720
    CEP 04023-900 - São Paulo/SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Fev 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      04 Dez 2010
    • Aceito
      13 Jun 2011
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