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O uso das curvas de crescimento da Organização Mundial da Saúde em crianças e adolescentes que vivem em regiões de altitude moderada

El uso de curvas de crecimiento de la Organización Mundial de la Salud en niños y adolescentes que viven en regiones de altitud moderada

Resumos

OBJETIVO: Determinar a aplicabilidade do uso das curvas de crescimento da Organização Mundial da Saúde (OMS) em escolares que vivem em regiões de altitude moderada. MÉTODOS: Estudo transversal cuja população foi constituída por uma amostra probabilística estratificada com 955 crianças e adolescentes de seis a 12 anos, sendo 473 meninos e 482 meninas que frequentavam escolas públicas da área urbana da Região de Arequipa (Peru). As variáveis avaliadas envolveram medidas de massa corpórea (kg) e estatura (m) e índice de massa corporal. Para as comparações, utilizou-se o escore Z e o teste t para medidas pareadas. RESULTADOS: Os meninos apresentaram valores similares de massa corpórea quando comparados com a referência. No entanto, as meninas mostraram valores superiores à referência nas idades de seis, sete e dez anos (p<0,001). No caso da estatura e do índice de massa corporal, houve diferenças (p<0,001) entre a referência e os escolares de moderada altitude em todas as idades e em ambos os sexos, com estatura inferior à referência e, consequentemente, maior índice de massa corporal, sendo o escore Z para os meninos: 1,0 (seis anos), 0,69 (sete anos), 0,50 (oito anos), 1,20 (nove anos), 0,75 (dez anos) 0,41 (11 anos) e 0,82 (12 anos); para as meninas, 0,36 (seis anos), 0,53 (sete e oito anos), 0,48 (nove anos), 0,89 (dez anos), 0,55 (11 anos) e 0,43 (12 anos). CONCLUSÕES: O índice de massa corporal não deve ser aplicado a crianças e adolescentes de moderada altitude devido ao retardo no crescimento linear, o que compromete o resultado final deste índice.

escolares; crianças; adolescentes; índice de massa corporal; altitude


OBJETIVO: Determinar la aplicabilidad del uso de curvas de crecimiento de la Organización Mundial de la Salud en escolares que viven en regiones de altitud moderada. MÉTODOS: Estudio transversal, cuya población fue constituida por una muestra probabilística estratificada con 955 niños y adolescentes de seis a 12 años de edad, siendo 473 muchachos y 482 muchachas, que frecuentaban escuelas públicas de área urbana de la Región de Arequipa (Perú). Las variables evaluadas implicaron medidas de masa corporal (kg) y estatura (m) y el índice de masa corporal. Para las comparaciones, se utilizó el escore Z y la prueba t para medidas pareadas. RESULTADOS: Los muchachos presentaron valores similares de masa corporal cuando comparados con la referencia. Sin embargo, las muchachas mostraron valores superiores a la referencia en las edades de seis, siete y diez años (p<0,001). En el caso de la estatura y del índice de masa corporal, hubo diferencias (p<0,001) entre la referencia de los escolares de moderada altitud en todas las edades y en ambos sexos, con estatura inferior a la referencia y, como consecuencia, mayor índice de masa corporal, siendo el escore Z para los muchachos: 1,0 (seis años), 0,69 (siete años), 0,50 (ocho años), 1,20 (nueve años), 0,75 (diez años), 0,41 (11 años) y 0,82 (12 años) y, para las muchachas, 0,36 (seis años), 0,53 (siete y ocho años), 0,48 (nueve años), 0,89 (diez años), 0,55 (11 años) y 0,43 (12 años). CONCLUSIONES: El índice de masa corporal no debe ser aplicado a niños y adolescentes de moderada altitud debido al retraso en el crecimiento lineal, lo que compromete el resultado final de este índice.

escolares; niños; adolescentes; índice de masa corporal; altitud


OBJECTIVE: To determine the applicability of the World Health Organization growth curves in school children that live in areas of moderate altitude. METHODS: A cross-sectional study, using a stratified random sample of 955 children and adolescents aged 6 to 12 years-old (473 boys and 482 girls) attending public schools in the urban area of Arequipa (Peru). The evaluated variables included body mass (kg) and height (m) values and the body mass index. Z score and the t test for paired measurements were applied for statistical analysis. RESULTS: The boys had similar values of body mass when compared with the reference. However, girls showed higher values than the reference at ages six, seven, and ten years-old (p<0.001). For height and body mass index, differences (p<0.001) were noted between the reference and the school children living in areas of moderate altitude for all ages and genders, being the height lower than the reference and the body mass index higher than the reference. Z scores for the body mass index were: boys - 1.0 (six years-old), 0.69 (seven years-old), 0.50 (eight years-old), 1.20 (nine years-old), 0.75 (ten years-old), 0.41 (11 years-old) and 0.82 (12 years-old); girls - 0.36 (six years-old), 0.53 (seven and eight years-old), 0.48 (nine years-old), 0.89 (10 years-old), 0.55 (11 years-old), and 0.43 (12 years-old). CONCLUSIONS: The body mass index should not be applied to children and adolescents that live in regions of moderate altitude. The linear growth retardation presented by this population directly compromises the results of this index.

school; children; adolescents; body mass index; altitude


ARTIGO ORIGINAL

O uso das curvas de crescimento da Organização Mundial da Saúde em crianças e adolescentes que vivem em regiões de altitude moderada

El uso de curvas de crecimiento de la Organización Mundial de la Salud en niños y adolescentes que viven en regiones de altitud moderada

Marco Antonio Cossio-BolañosI; Thiago Santi MariaII; Rossana Gomez CamposIII; Eduardo Henrique F. PascoalIV; Jefferson Eduardo HespanholV; Miguel de ArrudaVI

Instituição:Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, SP, Brasil

IDoutor em Ciências do Esporte na Faculdade de Educação Física da Unicamp; Estagiário do Laboratório de Ciências Morfofuncionais da Faculdade de Medicina da Universidade de Córdoba, Córdoba, Espanha

IIMestrando na Faculdade de Educação Física da Unicamp, Campinas, SP, Brasil

IIIDoutoranda na Faculdade de Educação Física da Unicamp e na Universidade Católica de Valencia, Valência, Espanha

IVBacharel em Educação Física pela Unicamp, Campinas, SP, BrasilVDoutor em Educação Física na Faculdade de Educação Física da Unicamp; Professor da Faculdade de Educação Física da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), Campinas, SP, Brasil

VIDoutor em Ciências do Esporte na Faculdade de Educação Física da Unicamp; Professor Titular da Faculdade de Educação Física da Unicamp, Campinas, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Marco Antonio Cossio Avenida Erico Verissimo, 701 - Cidade Universitária CEP 13083-851 - Campinas/SP E-mail: mcossio1972@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Determinar a aplicabilidade do uso das curvas de crescimento da Organização Mundial da Saúde (OMS) em escolares que vivem em regiões de altitude moderada.

MÉTODOS: Estudo transversal cuja população foi constituída por uma amostra probabilística estratificada com 955 crianças e adolescentes de seis a 12 anos, sendo 473 meninos e 482 meninas que frequentavam escolas públicas da área urbana da Região de Arequipa (Peru). As variáveis avaliadas envolveram medidas de massa corpórea (kg) e estatura (m) e índice de massa corporal. Para as comparações, utilizou-se o escore Z e o teste t para medidas pareadas.

RESULTADOS: Os meninos apresentaram valores similares de massa corpórea quando comparados com a referência. No entanto, as meninas mostraram valores superiores à referência nas idades de seis, sete e dez anos (p<0,001). No caso da estatura e do índice de massa corporal, houve diferenças (p<0,001) entre a referência e os escolares de moderada altitude em todas as idades e em ambos os sexos, com estatura inferior à referência e, consequentemente, maior índice de massa corporal, sendo o escore Z para os meninos: 1,0 (seis anos), 0,69 (sete anos), 0,50 (oito anos), 1,20 (nove anos), 0,75 (dez anos) 0,41 (11 anos) e 0,82 (12 anos); para as meninas, 0,36 (seis anos), 0,53 (sete e oito anos), 0,48 (nove anos), 0,89 (dez anos), 0,55 (11 anos) e 0,43 (12 anos).

CONCLUSÕES: O índice de massa corporal não deve ser aplicado a crianças e adolescentes de moderada altitude devido ao retardo no crescimento linear, o que compromete o resultado final deste índice.

Palavras-chave: escolares; crianças; adolescentes; índice de massa corporal; altitude.

RESUMEN

OBJETIVO: Determinar la aplicabilidad del uso de curvas de crecimiento de la Organización Mundial de la Salud en escolares que viven en regiones de altitud moderada.

MÉTODOS: Estudio transversal, cuya población fue constituida por una muestra probabilística estratificada con 955 niños y adolescentes de seis a 12 años de edad, siendo 473 muchachos y 482 muchachas, que frecuentaban escuelas públicas de área urbana de la Región de Arequipa (Perú). Las variables evaluadas implicaron medidas de masa corporal (kg) y estatura (m) y el índice de masa corporal. Para las comparaciones, se utilizó el escore Z y la prueba t para medidas pareadas.

RESULTADOS: Los muchachos presentaron valores similares de masa corporal cuando comparados con la referencia. Sin embargo, las muchachas mostraron valores superiores a la referencia en las edades de seis, siete y diez años (p<0,001). En el caso de la estatura y del índice de masa corporal, hubo diferencias (p<0,001) entre la referencia de los escolares de moderada altitud en todas las edades y en ambos sexos, con estatura inferior a la referencia y, como consecuencia, mayor índice de masa corporal, siendo el escore Z para los muchachos: 1,0 (seis años), 0,69 (siete años), 0,50 (ocho años), 1,20 (nueve años), 0,75 (diez años), 0,41 (11 años) y 0,82 (12 años) y, para las muchachas, 0,36 (seis años), 0,53 (siete y ocho años), 0,48 (nueve años), 0,89 (diez años), 0,55 (11 años) y 0,43 (12 años).

CONCLUSIONES: El índice de masa corporal no debe ser aplicado a niños y adolescentes de moderada altitud debido al retraso en el crecimiento lineal, lo que compromete el resultado final de este índice.

Palabras clave: escolares; niños; adolescentes; índice de masa corporal; altitud.

Introdução

A avaliação do estado nutricional pode ser realizada por meio de diversas técnicas, tais como anamnese, análises bioquímicas e avaliação antropométrica. A técnica antropométrica é a mais conveniente e simples(1), sendo mensuradas a estatura, a massa corpórea, as circunferências, as dobras cutâneas e os diâmetros ósseos(2). Essas variáveis são usadas com diferentes objetivos, podendo se converter em indicadores para identificação de riscos, planejamento de intervenções e avaliação de seu impacto sobre o estado nutricional e a saúde(3). Mas, ao mesmo tempo, sua interpretação requer normas referenciais. Nesse sentido, as curvas de referência, segundo Conde e Monteiro(4), representam um modelo empírico saudável e servem simultaneamente para a classificação e para o diagnóstico do estado nutricional de um indivíduo ou de uma população. Desse modo, vários estudos têm sido desenvolvidos em regiões geográficas de altitudes elevadas utilizando as normas referenciais da Organização Mundial da Saúde (OMS) e/ou do Centro Nacional de Estatísticas sobre Saúde para avaliação do crescimento físico(5-8) e da prevalência de obesidade em crianças e adolescentes(9-11). Tais estudos indicam que as populações em processo de crescimento e desenvolvimento moradoras das regiões de elevadas altitudes sofrem o impacto pelo efeito da hipóxia, verificando-se uma diminuição de 1 a 4 cm na estatura quando comparadas ao percentil 50 das curvas referenciais(2).

Embora de forma geral a OMS(12) e alguns autores(13,14) sugiram a utilização do índice de massa corpórea (IMC) para a identificação e o diagnóstico do sobrepeso e da obesidade, independentemente da região geográfica da população em estudo, muitos autores(5,6,10) demonstram que crianças e adolescentes de populações residentes em elevadas altitudes têm suas estaturas afetadas negativamente por este fator, o que pode influenciar na relação peso e estatura. Por sua vez, as leis alométricas estabelecem que a forma é modificada necessariamente pelo tamanho corpóreo(15). Assim, a aplicação do IMC seria inapropriada para pessoas de baixa estatura(16), como é o caso das crianças e dos adolescentes residentes em elevadas altitudes. A literatura referente ao crescimento físico na altitude é escassa, principalmente quanto ao uso do IMC em crianças e adolescentes. Nesse sentido, o objetivo do presente estudo foi determinar a aplicabilidade do uso das curvas de crescimento da OMS em meninos e meninas moradores de região de moderada altitude (2.320m).

Método

Trata-se de uma pesquisa descritiva de corte transversal, com dados de um projeto longitudinal iniciado em 2000 e com previsão para se estender até 2015. Os participantes pertenciam a escolas da rede pública da província de Arequipa, no Peru. Essa região apresenta uma superfície de 63,528 km2, com uma população de 1.200.000 habitantes(17). O departamento está localizado na parte sul em relação à América do Sul, com longitude Oeste de Greenwich de 71° 31', latitude Sul 16° 23' e a 2.320m acima do nível do mar.

Para este estudo, foram consideradas, como universo, as quatro escolas da rede pública das zonas urbanas de Arequipa, totalizando 6.659 escolares de seis a 12 anos, sendo 3.300 meninos e 3.359 meninas matriculados. Para selecionar o tamanho da amostra, optou-se pela seleção probabilística de tipo estratificada por fixação proporcional, com intervalo de confiança de 95% e erro amostral de 5%, indicando a necessidade de serem incluídos 473 (14,3%) meninos e 482 (14,3%) meninas. Os escolares avaliados tinham condição socioeconômica média (média/média e média/baixa), uma vez que no Peru geralmente os escolares que frequentam as escolas de zonas urbanas/marginais são de baixa condição socioeconômica e aqueles que vivem em regiões rurais de elevadas altitudes são de condição muito baixa. Portanto, foram excluídos do estudo os sujeitos que viviam em zonas marginais e aqueles que nasceram em regiões ao nível do mar. Assim, a amostra foi formada por crianças e adolescentes que nasceram em moderada altitude (Arequipa) e em regiões vizinhas de mesma altitude.

As variáveis antropométricas de massa corpórea e estatura foram avaliadas segundo normas padronizadas pela International Working Group of Kinanthropometry, descritas por Ross e Marfell-Jones(18): massa corpórea (kg) mensurada em balança digital com precisão de 200g, da marca Tanitaâð e escala de 0 a 150kg; estatura (m) avaliada com estadiômetro de alumínio graduado em mm de marca Secaâð e escala de 0 a 2,5m. Para avaliação do IMC foram utilizadas as variáveis massa corpórea e estatura a partir da fórmula proposta por Quetelet: [IMC=peso (kg)/estatura (m)2]. A massa corporal (kg) e a estatura (m) foram avaliadas duas vezes por um mesmo avaliador, com erro técnico de medida inferior a 3% e ótima reprodutibilidade (r=0,98 a 0,99).

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto do Esporte Universitário IDUNSA, da Universidade Nacional de San Agustín (Arequipa, Peru). Os pais e/ou responsáveis pelas crianças foram informados sobre a pesquisa e preencheram um termo de consentimento livre e esclarecido.

Utilizaram-se as curvas de referência da OMS(12) para comparação dos resultados da mediana do peso, estatura e o IMC do presente estudo, devido ao fato de serem as curvas mais aplicadas no Peru e sugeridas pelo Ministério de Saúde do Brasil.

Para comparação dos dados do presente estudo e as normas referenciais aplicou-se o escore Z±desvio padrão (DP), sendo interpretado o escore Z positivo como aquele maior que o da população de referência, e negativo o valor menor do que a referência da OMS. Para determinação das diferenças significantes entre os dois grupos, utilizou-se o teste t para amostras pareadas. O pressuposto de distribuição normal dos valores foi verificado por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov.

Resultados

A Tabela 1 mostra as características antropométricas da massa corpórea (kg), da estatura (m) e do IMC de crianças e adolescentes de ambos os sexos. Para as duas primeiras variáveis, observou-se crescimento de forma ascendente; no entanto, o IMC apresentou algumas variações com o decorrer da idade para os meninos e, para as meninas, tendência ascendente.

Nas Tabelas 2, 3 e 4 são apresentadas as variáveis de massa corpórea (kg), estatura (m) e IMC em função da idade decimal. Os valores são descritos pela média , pelo DP, pela diferença das médias, pelo escore Z e pelos valores de p para comparações entre os resultados obtidos no presente estudo e os das curvas de referência. Em relação à massa corpórea (Tabela 2), notou-se que os resultados do presente estudo são similares à referência da OMS, porém as meninas apresentam valores superiores com seis, sete e dez anos.

Na Tabela 3 podem ser observadas as comparações da estatura (m) entre os escolares analisados e a curva de referência utilizada, com diferenças significantes nos meninos em todas as faixas etárias e, no caso das meninas, dos oito até os 12 anos. Nesse sentido, os resultados evidenciam que as crianças e os adolescentes residentes em área de moderada altitude de ambos os sexos apresentam baixa estatura, quando comparados com a referência da OMS a partir do escore Z.

No tocante ao IMC (Tabela 4), os resultados mostram diferenças significantes em todas as faixas etárias e em ambos os sexos, verificando-se maiores valores nas crianças desse estudo quando comparadas com a referência da OMS.

Discussão

Os resultados do presente estudo indicam que escolares residentes em região de moderada altitude apresentaram valores similares de massa corpórea quando comparados com a mediana de referência da OMS(12), com valores bem inferiores de estatura em meninos de todas as idades e nas meninas a partir dos oito até os 12 anos. Em consequência, as crianças e os adolescentes analisados mostraram valores significantemente superiores de IMC com relação às curvas de crescimento da referência.

Esses resultados evidenciam que o IMC não é aplicável a crianças e adolescentes de moderada altitude, uma vez que experimentalmente demonstra-se não ser adequado aplicar o IMC para pessoas de baixa estatura(16), como é o caso dos escolares residentes em áreas de elevadas altitudes e do presente estudo. Nesse sentido, o IMC como indicador de obesidade não é diretamente aplicável a populações humanas em crescimento que apresentem diferenças notáveis de estatura(19), uma vez que as proporções corporais ainda não alcançaram os valores próprios dos adultos, resultando em desvios.

Os resultados do presente estudo indicam valores inferiores de estatura em relação à referência, evidenciando-se retardo no crescimento físico das crianças e nos adolescentes de ambos os sexos, residentes em regiões com condições geográficas com características distintas, como a altitude, o que já havia sido demonstrado anteriormente(7,8,20,21). Stinson(21) e Greksa(22) salientaram a existência de um pequeno retardo no crescimento linear (1 a 4 cm) e na maturação sexual e esquelética, nesta população específica.

Portanto, é possível usar as curvas de peso corpóreo e estatura da OMS em crianças e adolescentes residentes em áreas de moderada altitude para o diagnóstico do estado nutricional e para o seguimento do crescimento físico, assim como para verificar o impacto de fatores ambientais. Mas o IMC não deveria ser aplicado para este tipo de população, já que é influenciado diretamente pela estatura, proporcionando erros no diagnóstico nutricional. A aplicação do IMC sem correções alométricas levaria à superestimativa do excesso de gordura em indivíduos de baixa estatura e subestimaria o mesmo em indivíduos de maior estatura. Esses desvios permitem supor que, em estudos de tendência secular de crescimento, o incremento e/ou a diminuição da estatura em diversas populações poderiam ser responsáveis por classificações errôneas, originando-se maior tendência e incidência de magreza, normalidade, sobrepeso ou obesidade.

Por outro lado, fica evidente que as populações de regiões com características geográficas específicas, como a altitude, carecem de estudos referenciais que possibilitem avaliar com maior clareza seu estado nutricional e crescimento físico. A maioria dos estudos realizados em regiões de elevadas altitudes precisa usar as referências da OMS e/ou do Centro Nacional de Estatísticas para a Saúde para confrontar seus resultados, pois, principalmente no Peru, não há um padrão referencial que permita contrastar os dados obtidos.

De fato, acredita-se que a principal contribuição do presente estudo é o impacto da altitude na estatura das crianças e dos adolescentes de ambos os sexos, o que consequentemente, afetará o resultado do IMC. Nesse sentido, as crianças e os adolescentes do presente estudo mostraram-se com sobrepeso e obesidade quando comparados ao padrão de referência, assim como quando comparados com crianças provenientes das mesmas regiões geográficas(23,24) e de baixos níveis de altitude(25,26), prevalecendo, respectivamente, o sobrepeso e a obesidade.

Ainda, alguns estudos têm demonstrado que, em regiões de elevadas altitudes e sob condições de hipóxia(27-29), há supressão do apetite com perda de peso, o que deveria levar à menor prevalência de sobrepeso e obesidade nas crianças e nos adolescentes. Tal fato deve ser associado a outros fatores que influenciam o estado nutricional de crianças e adolescentes, como os hormonais, metabólicos, psicológicos, genéticos e hábitos alimentares, assim como os reduzidos níveis de atividade física, independentemente da região geográfica, os quais podem desencadear o desenvolvimento gradativo de inúmeras disfunções crônico-degenerativas, tais como obesidade, dislipidemias, diabetes melito, doenças cardiovasculares e hipertensão em idades cada vez mais precoces.

Por fim, ressalta-se ainda que o estudo apresentou algumas limitações. O nível de atividade física, o tipo de alimentação e a maturação biológica não foram controlados durante a pesquisa e poderiam influenciar o crescimento linear das crianças e dos adolescentes do presente estudo. Por sua vez, a avaliação da condição socioeconômica de forma direta por meio de um questionário padronizado poderia ter permitido uma melhor caracterização da amostra estudada. Portanto, tais limitações poderiam influenciar os resultados do presente estudo, que devem ser interpretados com cautela. Apesar das limitações especificadas, considerou-se que os resultados apresentados no estudo são relevantes pelo grande número de crianças e adolescentes avaliados e pela ausência de estudos com moradores de áreas de moderadas altitudes, nas diversas regiões geográficas do Peru.

Conclui-se que a amostra avaliada apresenta estatura inferior à referência da OMS, provavelmente em razão do impacto que a altitude parece exercer na estatura dos escolares. Em consequência, o IMC não deve ser valorizado para este tipo de população, uma vez que pode superestimar o excesso de gordura em indivíduos de baixa estatura.

Recebido em: 2/9/2011

Aprovado em: 23/1/2012

Fonte financiadora: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

Conflito de interesse: nada a declarar

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  • Endereço para correspondência:
    Marco Antonio Cossio
    Avenida Erico Verissimo, 701 - Cidade Universitária
    CEP 13083-851 - Campinas/SP
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Out 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      02 Set 2011
    • Aceito
      23 Jan 2012
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