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A INFLUÊNCIA DA ANQUILOGLOSSIA NO CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO SISTEMA ESTOMATOGNÁTICO

RESUMO

Objetivo:

Avaliar criticamente os artigos existentes na literatura brasileira e estrangeira acerca da influência do frênulo lingual encurtado sobre o crescimento e desenvolvimento do sistema estomatognático, bem como sobre a conquista do equilíbrio forma-função.

Fontes de dados:

A busca eletrônica nas bases MEDLINE/PubMed, Google Scholar, LILACS, SciELO e ScienceDirect com os descritores “freio lingual” e “desenvolvimento” e seus equivalentes em inglês resultou inicialmente em 51 resultados de trabalhos publicados entre janeiro de 1997 e a presente data. Após aplicados os critérios de exclusão, 14 artigos de estudos clínicos foram selecionados para a leitura completa.

Síntese dos dados:

A revisão integrativa da literatura ajudou a confirmar a proposição de que algumas maloclusões estão intimamente relacionadas à anquiloglossia. Ainda que a quantidade de estudos clínicos publicados até a atualidade seja pequena, há um consenso entre os autores acerca do efeito negativo de desequilíbrios funcionais sobre o crescimento e o desenvolvimento corretos do sistema estomatognático, tanto que a metade dos estudos pesquisados relata que intervenções cirúrgicas para a liberação do frênulo lingual são seguras e eficazes no que diz respeito à melhora na amamentação. Ainda, dos 14 estudos incluídos nesta revisão, 4 reportam influências negativas da anquiloglossia sobre a musculatura orofacial.

Conclusões:

Há um consenso entre os autores acerca dos efeitos negativos das alterações anatômico-funcionais do frênulo lingual sobre o crescimento e o desenvolvimento craniofacial, ainda que a opinião sobre a intervenção cirúrgica precoce não seja unânime.

Palavras-chave:
freio lingual; crescimento e desenvolvimento; criança

ABSTRACT

Objective:

To critically examine the existing Brazilian and International scientific literature regarding the influence of short lingual frenulum over growth and development of the stomatognathic system, as well as how it impacts the achievement of the shape-function balance.

Data sources:

An electronic literature search was conducted in databases, including MEDLINE/PubMed, Google Scholar, LILACS, SciELO, and ScienceDirect, using the key words “lingual frenum” and “development”, as well as their equivalents in Brazilian Portuguese. The literature search yielded 51 papers published between January 1997 and the present date; 14 articles of clinical trials were selected for meeting the inclusion criteria and were read in full.

Data synthesis:

The integrated literature review supported the proposition that some malocclusions are closely related to the presence of ankyloglossia and, although very few clinical trials on this topic have been published so far, there is a consensus among authors concerning the negative effects of functional imbalances over the stomatognathic system’s proper growth and development. Half of the studies found state that surgical interventions for releasing the lingual frenum are both safe and effective, concerning improvement in breastfeeding scores. Moreover, 4 out of the 14 studies included in this integrated review, report a negative influence of ankyloglossia over the orofacial muscular system.

Conclusions:

There is a consensus among the authors concerning the negative effects of lingual frenulum’s anatomic and functional alterations over craniofacial growth and development. The opinion about the early surgical intervention, however, is not unanimous.

Keywords:
lingual frenum; growth and development; child

INTRODUÇÃO

O frênulo lingual é uma prega conjuntiva fibrodensa, ocasionalmente constituída por fibras superiores do músculo genioglosso, que se inserem no ventre lingual, entre o ápice e o terço médio, e no assoalho da boca, podendo essa inserção estar entre as carúnculas linguais ou deslocada anteriormente até a crista alveolar inferior.11. Katchburian E, Arana V. Histologia e embriologia oral: texto, atlas, correlações clínicas. 3th ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2012. A anquiloglossia ou o encurtamento da porção lingual livre é uma condição anatômica caracterizada pela restrição de movimento da língua, o que pode ter forte impacto sobre sua função, interferindo também na forma dos arcos dentários e na sua conseguinte oclusão. Tal condição ocorre em 4-16% de neonatos, com predileção por pacientes masculinos na proporção de 2,5:1.22. Laske CA. A influência da deglutição no desenvolvimento da oclusão e da fala [Final paper thesis]. Florianópolis (SC): UFSC; 2002.

A língua origina-se dos primeiro, segundo e terceiro arcos faríngeos, durante a quarta semana de gestação. Nessa fase, formam-se sulcos laterais à estrutura, para que ela possa se movimentar livremente, exceto pela região aderida pelo frênulo lingual, inicialmente no ápice da língua. À medida que o desenvolvimento ocorre, as células do frênulo sofrem apoptose e tendem a migrar distalmente para a região mediana do dorso lingual. Nesse momento, pode haver interferências no controle celular e a migração pode ser incompleta ou mesmo não ocorrer, estabelecendo a condição de anquiloglossia.11. Katchburian E, Arana V. Histologia e embriologia oral: texto, atlas, correlações clínicas. 3th ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2012.

Diversos autores vêm descrevendo relações entre as maloclusões e os distúrbios funcionais da cavidade oral e sua musculatura adjacente, bem como a importância de se estabelecer um equilíbrio funcional do sistema estomatognático para conquistar a estabilidade de forma. O aleitamento natural tem um importante papel na maturação da musculatura perioral e, por conseguinte, no desenvolvimento de uma correta respiração, deglutição e, posteriormente, oclusão.33. Brookes A, Bowley DM. Tongue tie: the evidence for frenotomy. Early Hum Dev. 2014;90:765-8.

Praetzel et al.44. Praetzel JR, Pistóia SP, Saldanha MJ, Rocha NL. A importância da amamentação no seio materno para a prevenção de distúrbios miofuncionais da face. Pró-fono R Atual Cient. 1997;9:69-73. estudaram retrospectivamente 595 pacientes entre 1 e 14 anos e relacionaram os achados de distúrbios miofuncionais e o tempo de amamentação natural. Os autores reportaram que 54% da amostra apresentava alguma alteração no sistema estomatognático (respiração bucal, mordida aberta, deglutição atípica, anquiloglossia) e, destes, quase 70% foram amamentados naturalmente por menos de 6 meses. Com esses achados, puderam concluir que o crescimento e o desenvolvimento da face dependem do desempenho correto da função de todo o sistema estomatognático e, por analogia, disfunções na respiração, sucção, deglutição, mastigação e fonação estão intimamente relacionadas com alterações na forma dos arcos dentários e sua relação com as respectivas bases ósseas. Acrescentaram ainda que o aleitamento natural prolongado deve ser encorajado, pois é evidentemente importante na prevenção de disfunções da face por ser gerador dos estímulos neurais que irão modular o crescimento e o desenvolvimento craniofacial do bebê.

Um dos problemas centrais de um frênulo lingual fortemente inserido é a necessidade de adaptação à amamentação. Durante o aleitamento natural, alguns músculos mastigatórios iniciam sua maturação e posicionamento, como o temporal (ativado na retrusão da mandíbula), o pterigoideo lateral (solicitado na propulsão), o milo-hióideo (principal responsável pela deglutição) e os masseteres (ativados na mecânica de sucção), enquanto os orbiculares dos lábios superior e inferior orientam o crescimento e o desenvolvimento da região anterior do sistema estomatognático,55. Van Der Laan T. A importância da amamentação no desenvolvimento facial infantil. Pró-fono R Atual Cient. 1995;7:3-5.,66. Pastor IM, Montanha K. Amamentação natural no desenvolvimento do sistema estomatognático. Rev Odontopediatr. 1994;3:185-91. que deverá funcionar em pleno equilíbrio neuromotor para que as mecânicas da mastigação e deglutição sejam eficientes. Segundo o Van der Laan,55. Van Der Laan T. A importância da amamentação no desenvolvimento facial infantil. Pró-fono R Atual Cient. 1995;7:3-5. o esforço muscular que se dá no aleitamento natural é um preparo físico para a futura função mastigatória. As diversas repetições de movimentos protrusivos e retrusivos ao longo do dia são capazes de estimular positivamente as articulações temporomandibulares para o crescimento anteroposterior da mandíbula, de acordo com o descrito por Stutzmann e Petrovic77. Stutzmann JJ, Petrovic AG. Role of the lateral pterygoid muscle and meniscotemporomandibular frenum in spontaneous growth of the mandible and in growth stimulated by the postural hyperpropulsor. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 1990;97:381-92. em 1990, prevenindo assim boa parte das distoclusões.

A deglutição normal madura se dá quando a ponta da língua é comprimida contra a papila incisiva, seu dorso empurrando o bolo alimentar por meio do palato duro em direção à orofaringe, com dentes posteriores em máxima intercuspidação e músculos orbiculares do lábio superior e inferior e mentoniano relaxados e promovendo o velamento labial. Uma revisão de literatura indica diferentes tipos de deglutição atípica, todos potencialmente responsáveis pela instalação de maloclusões ou pelo prejuízo da manutenção de estabilidade oclusal após o tratamento, por caracterizarem situações nas quais, invariavelmente, instala-se um desequilíbrio entre os músculos bucinadores, pterigoideos, masseter e temporal.22. Laske CA. A influência da deglutição no desenvolvimento da oclusão e da fala [Final paper thesis]. Florianópolis (SC): UFSC; 2002.

A maioria dos estudos acerca das alterações anatômico-funcionais do frênulo lingual se preocupa em estabelecer uma relação entre as patologias e a qualidade do aleitamento natural ou distúrbios fonéticos, problema com o qual o encurtamento do frênulo já está consagradamente relacionado. O objetivo da presente revisão integrativa foi buscar evidências que liguem essa condição ao estabelecimento de alterações no desenvolvimento craniofacial.

MÉTODO

Trata-se de uma revisão integrativa que selecionou e analisou materiais bibliográficos disponíveis nas bases eletrônicas Literatura Latino-Americana e do Caribe (LILACS), Literatura Internacional em Ciências da Saúde e Biomédica (PubMed/MEDLINE), Google Scholar, Biblioteca Científica Eletrônica Online (SciELO), e ScienceDirect, utilizando-se os unitermos “freio lingual” e “desenvolvimento” e seus equivalentes na língua inglesa, como descritores, a fim de elaborar uma análise crítica objetiva acerca do tema.

A revisão compreendeu o período de 1997 a 2016, durante o qual se constataram 51 publicações relacionadas ao assunto. Primeiramente, analisaram-se todos os títulos e resumos, e, aplicando os critérios de exclusão estipulados pelos autores, 37 artigos foram eliminados da análise por se tratarem de casos clínicos, revisões de literatura ou publicações com resumos incompletos ou sem clareza de objetivos e artigos cujo idioma de publicação não fosse o português ou o inglês. Após aplicados os critérios, 14 artigos foram lidos e analisados integralmente (Quadro 1).

Quadro 1:
Resumo das informações extraídas a partir dos artigos analisados nesta revisão.

REVISÃO DA LITERATURA E DISCUSSÃO

Recentemente, no Brasil, foi sancionada a lei que obriga a aplicação do protocolo de avaliação do frênulo lingual de bebês nascidos em todos os hospitais e maternidades, públicos ou particulares. Tal procedimento visa à prevenção de intercorrências que dificultem o aleitamento natural em decorrência de deficiências das funções de sucção e deglutição, que se associa ao baixo ganho de peso, bem como ao desmame precoce, e pode ser relacionado à condição de anquiloglossia, como refere a literatura.88. Ballard JL, Auer CE, Khoury JC. Ankyloglossia: assessment, incidence, and effect of frenuloplasty on the breastfeeding dyad. Pediatrics. 2002;110:e63.,99. Buryk M, Bloom D, Shope T. Efficacy of neonatal release of ankyloglossia: a randomized trial. Pediatrics. 2011;128:280-8.,1010. Geddes DT, Langton DB, Gollow I, Jacobs LA, Hartmann PE, Simmer K. Frenulotomy for breastfeeding infants with ankyloglossia: effect on milk removal and sucking mechanism as imaged by ultrasound. Pediatrics. 2008;122:e188-94.,1111. Steehler MW, Steehler MK, Harley EH. A retrospective review of frenotomy in neonates and infants with feeding difficulties. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2012;76:1236-40.,1212. Martinelli RL, Marchesan IQ, Berretin-Felix G. Protocolo de avaliação do frênulo lingual para bebês: relação entre aspectos anatômicos e funcionais. Rev CEFAC. 2013;15:599-610.,1313. Wallace H, Clarke S. Tongue tie division in infants with breast feeding difficulties. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2006;70:1257-61.

Em um estudo clínico conduzido por Ballard et al.88. Ballard JL, Auer CE, Khoury JC. Ankyloglossia: assessment, incidence, and effect of frenuloplasty on the breastfeeding dyad. Pediatrics. 2002;110:e63. em 2002, constatou-se que 4% de neonatos com dificuldades na amamentação eram portadores de algum grau de encurtamento do frênulo lingual, e a frenectomia se mostrou eficaz na melhora da “pega” do seio e no alívio das dores relatadas pelas mães em 100% dos casos, o que é coincidente com o que Buryk et al.99. Buryk M, Bloom D, Shope T. Efficacy of neonatal release of ankyloglossia: a randomized trial. Pediatrics. 2011;128:280-8. reportaram em seu estudo clínico randomizado sobre a frenectomia precoce e seus resultados positivos imediatos nos escores de amamentação. Geddes et al.1010. Geddes DT, Langton DB, Gollow I, Jacobs LA, Hartmann PE, Simmer K. Frenulotomy for breastfeeding infants with ankyloglossia: effect on milk removal and sucking mechanism as imaged by ultrasound. Pediatrics. 2008;122:e188-94. conseguiram provar clinicamente, por meio de registro de imagens por ultrassom na região submental, o aumento do fluxo de leite transferido do seio materno para a cavidade oral em 100% dos bebês após realizadas as frenectomias.

Steehler et al.,1111. Steehler MW, Steehler MK, Harley EH. A retrospective review of frenotomy in neonates and infants with feeding difficulties. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2012;76:1236-40. em estudo retrospectivo de 2012, relataram que 86% das mães de pacientes que foram submetidos à frenulotomia antes de completarem uma semana de vida notaram grandes melhoras na amamentação. Já dentre as mães de crianças submetidas ao procedimento após a primeira semana de vida a melhora na amamentação foi referida por 74%, sugerindo maior eficiência na intervenção precoce.

No ano seguinte, Sethi et al.1414. Sethi N, Smith D, Kortequee S, Ward VM, Clarke S. Benefits of frenulotomy in infants with ankyloglossia. Int J Pediatr Otorhi. 2013;77:762-5. avaliaram prospectivamente 85 crianças entre 3 e 120 dias que apresentavam dificuldades relacionadas ao aleitamento natural. Os pacientes foram submetidos à frenulotomia e 52 deles, avaliados ao longo de 5 meses, por meio de entrevista telefônica com perguntas sobre a dor referida pela mãe ao amamentar, a quantidade de mamadas ao dia, os ruídos na sucção, a correta “pega” e o volume do fluxo de leite. Os resultados mostraram melhora no aleitamento em até duas semanas depois do procedimento para 77% das mães, indicando haver relação entre anquiloglossia e dificuldades na amamentação, a qual, entretanto, não é a única causa de dificuldades. No mesmo ano, Emond et al.1515. Emond A, Ingram J, Johnson D, Blair P, Whitelaw A, Copeland M, Sutcliffe A. Randomised controlled trial of early frenotomy in breastfed infants with mild-moderate tongue-tie. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2014;99:F189-95. conduziram um estudo semelhante, porém com a inclusão de um grupo controle. Nesse último estudo, embora a percepção materna sobre a eficácia do aleitamento tivesse sido positiva, não foram registradas melhoras objetivas na amamentação após a frenectomia precoce.

Contrariando o que sugeria a literatura prévia,1616. Meenakshi S, Jagannathan N. Assessment of lingual frenulum lengths in skeletal malocclusion. J Clin Diagn Res. 2014;8:202-4.,1717. Navarro NP, López M. Anquiloglossia en niños de 5 a 11 años de edad. Diagnóstico y tratamiento. Rev Cubana Estomatol. 2002;39:3-7.,1818. Martinelli RL, Marchesan IQ, Berretin-Felix G. Estudo longitudinal das características anatômicas do frênulo lingual comparado com afirmações da literatura. Rev CEFAC. 2014;16:1202-7.,1919. Corrêa MS. Odontopediatria na primeira infância. 3th ed. São Paulo: Selo Editorial Santos; 2009. Martinelli et al.1818. Martinelli RL, Marchesan IQ, Berretin-Felix G. Estudo longitudinal das características anatômicas do frênulo lingual comparado com afirmações da literatura. Rev CEFAC. 2014;16:1202-7. avaliaram 71 bebês do 1º ao 12º mês de vida quanto a características e local de inserção do freio, tanto no dorso lingual quanto no assoalho da boca, e comprovaram clinicamente que não ocorre alteração ou migração da inserção das fibras superiores do genioglosso ao longo do primeiro ano de vida do bebê, uma vez que em 100% dos pacientes não houve alteração na posição, na espessura ou no comprimento da estrutura. Silva et al.2020. Silva MC, Costa ML, Nemr K, Marchesan IQ. Frênulo de língua alterado e interferência na mastigação. Rev CEFAC. 2009;11:363-9. observaram, também clinicamente, que indivíduos portadores de anquiloglossia apresentaram cerca de 5,5 vezes mais restrições de mobilidade lingual e atipias musculares durante a mastigação do que aqueles com seu frênulo lingual inserido normalmente. Ambos os estudos justificam a indicação precoce da intervenção cirúrgica tão logo seja feito o diagnóstico da anquiloglossia, ainda que os achados na literatura acerca de como proceder clinicamente nesses casos sejam bastante divergentes.2121. Knox I. Tongue tie and frenotomy in the breastfeeding newborn. NeoReviews. 2010;11:e513-9.,2222. Hogan M, Westcott C, Griffiths M. Randomized controlled trial of division of tongue-tie in infants with feeding problems. J Paediatr Child Health. 2005;41:246-50.,2323. Suter VG, Bornstein MM. Ankyloglossia: facts and myths in diagnosis and treatment. J Periodontol. 2009;80:1204-19.,2424. Miranda BH, Milroy CJ. A quick snip - A study of the impact of outpatient tongue tie release on neonatal growth and breastfeeding. J Plast Reconstr Aesthet Surg. 2010;63(9):e683-5.,2525. Lalakea ML, Messner AH. Frenotomy and frenuloplasty: If, when, and how. Operative Techniques in Otolaryngology-Head and Neck Surgery. 2002;13:93-7.,2626. Hong P, Lago D, Seargeant J, Pellman L, Magit AE, Pransky SM. Defining ankyloglossia: a case series of anterior and posterior tongue ties. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2010;74:1003-6. Não há um consenso sobre a real necessidade do tratamento cirúrgico, qual o momento ou a técnica a ser adotada em caso de se optar por cirurgia, ou sequer sobre qual o profissional habilitado a realizá-lo.

Jang et al.2727. Jang SJ, Cha BK, Ngan P, Choi DS, Lee SK, Jang I. Relationship between the lingual frenulum and craniofacial morphology in adults. Am J Dentofacial Orthop. 2011;139 Suppl 4:e361-7. e Meenakshi e Jagannathan,1616. Meenakshi S, Jagannathan N. Assessment of lingual frenulum lengths in skeletal malocclusion. J Clin Diagn Res. 2014;8:202-4. em estudos clínicos, correlacionaram positivamente alterações no frênulo lingual e presença de maloclusões. Os últimos autores classificaram 30 pacientes de 12 a 16 anos em três grupos de acordo com o tipo de maloclusão. Foram tomadas medidas horizontais e verticais do comprimento do freio lingual e da amplitude de abertura de boca em dois momentos: abertura máxima e abertura máxima com a ponta da língua tocando a papila incisiva. O comprimento médio do frênulo lingual para pacientes da classe I foi 25% menor do que os da classe III. Embora tais autores relatem que ocorre a migração da estrutura até a puberdade (fato contestado por Martinelli et al.1818. Martinelli RL, Marchesan IQ, Berretin-Felix G. Estudo longitudinal das características anatômicas do frênulo lingual comparado com afirmações da literatura. Rev CEFAC. 2014;16:1202-7.), os autores sugerem que o diagnóstico e o tratamento precoces da anquiloglossia possibilitam um melhor prognóstico no tratamento de maloclusões de classe III. Da mesma forma, Jang et al,2727. Jang SJ, Cha BK, Ngan P, Choi DS, Lee SK, Jang I. Relationship between the lingual frenulum and craniofacial morphology in adults. Am J Dentofacial Orthop. 2011;139 Suppl 4:e361-7. em 2011, observaram clinicamente 150 pacientes divididos igualmente entre os três tipos de maloclusões e estabeleceram um método direto (por régua específica) e indireto (máxima amplitude de abertura de boca com e sem toque da papila incisiva) de mensuração do frênulo lingual. Tais autores concluíram que pacientes classe III mostravam significantes alterações no comprimento do frênulo e na redução de amplitude de abertura em relação aos demais grupos, estabelecendo, assim, uma possível relação entre a inserção da estrutura e a distoclusão.

Em um recente estudo clínico, Tecco et al.2828. Tecco S, Baldini A, Mummolo S, Marchetti E, Giuca MR, Marzo G, et al. Frenulectomy of the tongue and the influence of rehabilitation exercises on the sEMG activity of masticatory muscles. J Electromyogr Kinesiol. 2015;25:619-28. avaliaram, por meio de eletromiografia de superfície, 24 indivíduos portadores de maloclusão de classe I na dentição mista. A amostra foi dividida em um grupo controle, formado por 11 indivíduos com freio lingual normal, e um grupo de estudo, com 13 indivíduos portadores de anquiloglossia. O estudo consistiu em avaliar a atividade muscular dos músculos masseteres, temporais, orbiculares e submental em três momentos: ao início do tratamento (T0), um mês (T1) e seis meses (T2) após a liberação do freio lingual no grupo de estudo. Os resultados dos potenciais eletromiográficos foram comparados e os pesquisadores puderam constatar diferença entre a atividade muscular do grupo de estudo e do controle em T0, mas similaridades entre eles em T2, concluindo que a frenectomia lingual foi capaz de influenciar a função dos músculos orofaciais estudados.

Pode-se, então, associar a anquiloglossia a problemas oclusais e do desenvolvimento craniofacial, uma vez que a postura baixa da língua foi relacionada à instalação da maloclusão de classe III.1616. Meenakshi S, Jagannathan N. Assessment of lingual frenulum lengths in skeletal malocclusion. J Clin Diagn Res. 2014;8:202-4.,2727. Jang SJ, Cha BK, Ngan P, Choi DS, Lee SK, Jang I. Relationship between the lingual frenulum and craniofacial morphology in adults. Am J Dentofacial Orthop. 2011;139 Suppl 4:e361-7. Ainda, sob um ponto de vista mais complexo, a correção da posição de repouso da língua melhora o posicionamento do osso hioide, diminuindo as forças musculares sobre a mandíbula, no sentido de rodá-la para trás e para baixo e, em contrapartida, o posicionamento da língua no assoalho bucal abaixa o osso hioide, distendendo a musculatura inserida à mandíbula, o que favorece sua rotação no sentido horário, resultando, por exemplo, em mordida aberta anterior.

Destaca-se o número reduzido de publicações relacionando anquiloglossia e desenvolvimento ao longo dos 19 anos estudados, embora grande parte dos achados date da última década, destacando um aumento de interesse pelo tópico. Ou seja, trata-se ainda de um campo com muito espaço para pesquisas, tanto clínicas quanto acadêmicas, com o intuito de fornecer melhor embasamento teórico aos profissionais da área.

Pode-se concluir que, apesar de existirem divergências sobre a indicação da intervenção clínico-cirúrgica para a correção de anquiloglossia, há consenso na literatura acerca do efeito negativo de desequilíbrios funcionais causados pela anquiloglossia sobre o correto crescimento e desenvolvimento do sistema estomatognático, e a totalidade dos autores pesquisados reporta ser necessário o estabelecimento do equilíbrio neuromuscular para que se alcancem objetivos estético-funcionais estáveis.

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  • Financiamento: O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2017

Histórico

  • Recebido
    13 Jul 2016
  • Aceito
    07 Out 2016
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