Acessibilidade / Reportar erro

ASPECTOS CLÍNICOS, EPIDEMIOLÓGICOS E SOBREVIDA DE CRIANÇAS COM NEUROBLASTOMA: 21 ANOS DE EXPERIÊNCIA DO INSTITUTO DE ONCOLOGIA PEDIÁTRICA, SÃO PAULO

RESUMO

Objetivo:

Descrever as características clínicas e epidemiológicas e a sobrevida de crianças com neuroblastoma (NB) atendidas em centro de oncologia pediátrica, no período de 1991 a 2012.

Métodos:

Estudo retrospectivo, com análise de dados clínicos e epidemiológicos de 258 pacientes com NB atendidos em centro de oncologia pediátrica, no período de 1991 a 2012, por meio de consulta a prontuários médicos.

Resultados:

A idade média das crianças foi de 40,5±46,4 meses, e a mediana, de 28,9 meses (intervalo interquartil 42,2); relação masculino:feminino 1,3:1, sendo 1% dos pacientes assintomáticos. As manifestações mais frequentes foram: febre (25%), dor abdominal (22%), massa abdominal (19%) e dor óssea (19%). O tempo médio do início dos sintomas até a realização do diagnóstico foi de 3,0±4,8 meses. A localização do tumor mais frequente foi o abdome (63%). As metástases ocorreram na medula óssea (37%) e nos ossos (33%). A sobrevida global (SG) e a sobrevida livre de eventos (SLE) em cinco anos foram de 62 e 52%, respectivamente. A principal causa de óbito foi a progressão da doença (72%).

Conclusões:

As características clínicas das crianças com NB são variáveis e, em sua maioria, inespecíficas, o que torna o reconhecimento clínico difícil e, em geral, tardio. Em crianças com idade inferior a 5 anos, massa abdominal e/ou dor óssea, irritabilidade e febre de origem indeterminada, o diagnóstico de NB deve ser considerado.

Palavras-chave:
Neuroblastoma; Criança; Epidemiologia

ABSTRACT

Objective:

To describe the clinical and epidemiological characteristics and survival outcomes of children with neuroblastoma (NB) treated at a pediatric oncology center from 1991 to 2012.

Methods:

A retrospective study with clinical and epidemiological data from 258 patients with neuroblastoma treated at a pediatric oncology center from 1991 to 2012, using medical records.

Results:

The average age of the children at diagnosis was 40.5±46.4 months with a median age of 28.9 months (interquartile range 42.2). The male:female ratio was 1.3:1, and 1% of the patients were asymptomatic. The most frequent manifestations were: fever (25%), abdominal pain (22%), abdominal mass (19%), and bone pain (19%). The mean time from symptom onset to diagnosis was 3.0±4.8 months. The most common location of the tumor was the abdomen (63%). Metastases occurred in the bone marrow (37%) and in the bone (33%). Overall survival (OS) and event-free survival (EFS) in five years were 62 and 52%, respectively. The main cause of death was the progression of the disease (72%).

Conclusions:

The clinical features of children with neuroblastoma are variable and mostly nonspecific, which makes clinical recognition difficult and, in general, too late. In children less than 5 years old, with an abdominal mass and/or bone pain, irritability, and a fever from an unknown cause, neuroblastoma should be considered as a possible diagnosis.

Keywords:
Neuroblastoma; Child; Epidemiology

INTRODUÇÃO

O neuroblastoma (NB) é o tumor sólido extracraniano maligno mais frequente na infância, sendo o câncer mais comum diagnosticado no primeiro ano de vida.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,22. Parodi F, Passoni L, Massimo L, Luksch R, Gambini C, Rossi E, et al. Identification of novel prognostic markers in relapsing localized resectable neuroblastoma. OMICS. 2011;15:113-21.,33. Park JR, Bagatell R, London WB, Maris JM, Cohn SL, Mattay KK, et al. Children's Oncology Group's 2013 blueprint for research: Neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2013;60:985-93.,44. Shuangshoti S, Nuchprayoon I, Kanjanapongkul S, Marrano P, Irwin MS, Thorner PS. Natural course of low risk neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2012;58:690-4.,55. Cai JY, Pan C, Tang YJ, Chen J, Ye QD, Zhou M, et al. Minimal residual disease is a prognostic marker for neuroblastoma with bone marrow infiltration. Am J Clin Oncol. 2012;35:275-8.,66. Tan C, Sabai SM, Tin AS, Quah TC, Aung L. Neuroblastoma: experience from National University Health System, Singapore (1987-2008). Singapore Med J. 2012;53:19-25. A incidência anual é de 10,5 por milhão de crianças menores de 15 anos, com cerca de 700 casos novos por ano nos Estados Unidos.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,22. Parodi F, Passoni L, Massimo L, Luksch R, Gambini C, Rossi E, et al. Identification of novel prognostic markers in relapsing localized resectable neuroblastoma. OMICS. 2011;15:113-21.,44. Shuangshoti S, Nuchprayoon I, Kanjanapongkul S, Marrano P, Irwin MS, Thorner PS. Natural course of low risk neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2012;58:690-4.,55. Cai JY, Pan C, Tang YJ, Chen J, Ye QD, Zhou M, et al. Minimal residual disease is a prognostic marker for neuroblastoma with bone marrow infiltration. Am J Clin Oncol. 2012;35:275-8.,77. Ward E, DeSantis C, Robbins A, Kohler B, Jemal A. Childhood and adolescent cancer statistics, 2014. CA Cancer J Clin. 2014;64:83-103. No Brasil, em estudo baseado na análise de registro populacional de câncer, que incluiu 12 cidades e o Distrito Federal, a incidência de NB foi de 5,9 por milhão de habitantes com idade inferior a 15 anos, contudo são necessários estudos que incluam registro de todo o território nacional para conclusões definitivas.88. Camargo B, Ferreira JM, Reis RS, Ferman S, Santos MO, Pombo-de-Oliveira MS. Socioeconomic status and the incidence of non-central nervous system childhood embryonic tumours in Brazil. BMC Cancer. 2011;11:160.

O NB ocorre mais comumente em crianças menores de 5 anos de idade, com pequena predominância no sexo masculino,11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,66. Tan C, Sabai SM, Tin AS, Quah TC, Aung L. Neuroblastoma: experience from National University Health System, Singapore (1987-2008). Singapore Med J. 2012;53:19-25.,99. Spix C, Pastore G, Sankila R, Stiller CA, Stelliarova-Foucher E. Neuroblastoma incidence and survival in European children (1978-1997): report from the Automated Childhood Cancer Information System project. Eur J Cancer. 2006;42:2081-91. e pode localizar-se em qualquer local ao longo da cadeia de gânglios simpáticos, como região paravertebral e mediastino posterior, mas principalmente na região medular da suprarrenal.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1010. Øra I, Eggert A. Progress in treatment and risk stratification of neuroblastoma: impact on future clinical and basic research. Semin Cancer Biol. 2011;21:217-28.,1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922.,1212. Heck JE, Ritz B, Hung RJ, Hashibe M, Boffetta P. The epidemiology of neuroblastoma: a review. Paediatr Perinat Epidemiol. 2009;23:125-43. Esse tumor embrionário, derivado de células precursoras do sistema nervoso simpático, é considerado um importante desafio aos profissionais de saúde, por estar associado a 15% da mortalidade relacionada à oncologia pediátrica.44. Shuangshoti S, Nuchprayoon I, Kanjanapongkul S, Marrano P, Irwin MS, Thorner PS. Natural course of low risk neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2012;58:690-4.,1313. Parise IZ, Haddad BR, Cavalli LR, Pianovski MA, Maggio EM,Parise GA, et al. Neuroblastoma in southern Brazil: an 11-year study. J Pediatr Hematol Oncol. 2006;28:82-7.

Uma das principais características do NB é a grande variação da apresentação clínica, que depende de inúmeros fatores, como idade do paciente, localização do tumor, estadio, presença de metástases e síndromes paraneoplásicas.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1010. Øra I, Eggert A. Progress in treatment and risk stratification of neuroblastoma: impact on future clinical and basic research. Semin Cancer Biol. 2011;21:217-28. Os principais sinais e sintomas, em geral tardios, são frequentemente inespecíficos e semelhantes a outras doenças da infância, tornando o diagnóstico precoce difícil para os pediatras. A apresentação é variável, desde uma massa indolor, detectada acidentalmente, a um tumor de crescimento rápido e progressivo.1010. Øra I, Eggert A. Progress in treatment and risk stratification of neuroblastoma: impact on future clinical and basic research. Semin Cancer Biol. 2011;21:217-28. Os pacientes com doença localizada podem ser assintomáticos, sendo diagnosticados por meio de exames para outras afecções não relacionados ao tumor.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86. Os sinais e sintomas clássicos, como febre, dor, perda de peso e irritabilidade, são associados ao NB metastático.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1010. Øra I, Eggert A. Progress in treatment and risk stratification of neuroblastoma: impact on future clinical and basic research. Semin Cancer Biol. 2011;21:217-28.,1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922. Proptose e equimose periorbital são frequentes e decorrentes da infiltração tumoral de ossos periorbitais.1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922.

Atualmente, a escolha da terapia depende da estratificação em grupos de risco.1212. Heck JE, Ritz B, Hung RJ, Hashibe M, Boffetta P. The epidemiology of neuroblastoma: a review. Paediatr Perinat Epidemiol. 2009;23:125-43.,1414. Maris JM. The biologic basis for neuroblastoma heterogeneity and risk stratification. Curr Opin Pediatr. 2005;17:7-13.,1515. Bagatell R, London WB, Wagner LM, Voss SD, Stewart CF, Maris JM, et al. Phase II study of irinotecan and temozolomide in children with relapsed or refractory neuroblastoma: a Children's Oncology Group study. J Clin Oncol. 2011;29:208-13. Pacientes de risco baixo ou intermediário, com características tumorais biológicas favoráveis, apresentam altas taxas de sobrevida. Contudo, apesar dos avanços no conhecimento da biologia molecular e nas estratégias de tratamento, pacientes de alto risco ainda têm um prognóstico muito ruim.33. Park JR, Bagatell R, London WB, Maris JM, Cohn SL, Mattay KK, et al. Children's Oncology Group's 2013 blueprint for research: Neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2013;60:985-93.,1515. Bagatell R, London WB, Wagner LM, Voss SD, Stewart CF, Maris JM, et al. Phase II study of irinotecan and temozolomide in children with relapsed or refractory neuroblastoma: a Children's Oncology Group study. J Clin Oncol. 2011;29:208-13.,1616. Berlanga P, Cañete A, Castel V. Advances in emerging drugs for the treatment of neuroblastoma. Expert Opin Emerg Drugs. 2017;22:63-75.,1717. Carpenter EL, Mossé YP. Targeting ALK in neuroblastoma - preclinical and clinical advancements. Nat Rev Clin Oncol. 2012;9:391-9.,1818. Schulte JH, Schulte S, Heukamp LC, Astrahantseff K, Stephan H, Fischer M, et al. Targeted Therapy for Neuroblastoma: ALK Inhibitors. Klin Padiatr. 2013; 225:303-8.

Considerando a escassez de publicações com casuísticas significantes em nosso meio e a dificuldade do diagnóstico clínico do NB, realizamos este estudo com o objetivo de avaliar as características clínicas e epidemiológicas e a sobrevida de crianças com NB em centro de oncologia pediátrica.

MÉTODO

Estudo retrospectivo, com análise de dados clínicos e epidemiológicos de 263 pacientes com NB admitidos no serviço durante o período de 1991 a 2012. As informações foram obtidas por meio da análise de prontuários médicos. Foram excluídos três pacientes com dados incompletos e dois admitidos apenas para cuidados paliativos, sendo integrantes do estudo 258 casos.

O diagnóstico de NB foi realizado por intermédio de biópsia e exame anatomopatológico, ou pelo estudo da medula óssea infiltrada pelo tumor associado à presença de metabólitos de catecolaminas na urina, segundo critérios internacionais.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922.

Os pacientes foram estadiados, de acordo com os critérios do Sistema de Estadiamento Internacional para Neuroblastoma (INSS), em estadios 1, 2, 3, 4 e 4S (Quadro 1).11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.

Quadro 1:
Sistema de Estadiamento Internacional para Neuroblastoma11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86..

Foi utilizada a classificação histológica da Organização Mundial da Saúde (OMS).11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86. Na avaliação citogenética da célula neoplásica, o oncógene MYCN foi pesquisado pelo método de hibridização in situ por imunofluorescência (FISH), sendo considerado amplificado acima de dez cópias.1919. Mathew P, Valentine MB, Bowman LC, Rowe ST, Nash MB, Valentine VA, et al. Detection of MYCN Gene Amplification in Neuroblastoma by Fluorescence In Situ Hybridization: A Pediatric Oncology Group Study. Neoplasia. 2011;3:105-9.

Considerou-se sobrevida global (SG) o tempo decorrido do diagnóstico até o óbito ou a última avaliação, estando, portanto, incluídas nesse grupo crianças com ou sem doença em atividade. Sobrevida livre de eventos (SLE) foi definida como o tempo decorrido do diagnóstico até a recaída, o óbito ou a última avaliação, fazendo parte, então, desse grupo crianças sem doença em atividade.

Foi realizada uma revisão da literatura por meio de busca nas bases de dados PubMed, Sistema Online de Busca e Análise de Literatura Médica (MEDLINE) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), utilizando os termos neuroblastoma, neuroblastoma Brazil e embryonal tumors, no período de 2000 a 2017.

As variáveis categóricas foram expressas em frequência e porcentagem, e as numéricas, em média, desvio padrão, mínimo, mediana, máximo e total de observações válidas. Para comparar sexo ­versus estadiamento e idade versus estadiamento, foi utilizado o teste da razão de verossimilhança. Para comparar estadiamento versus recaída, aplicou-se o qui-quadrado de Pearson. A comparação do tempo de história versus estadiamento foi feita com a aplicação do modelo de análise de variância (ANOVA). As comparações múltiplas foram realizadas por meio do teste de Bonferroni. Para realizar as análises de sobrevida, empregou-se o teste de Kaplan-Meier. Em todas as análises foi considerado significante o p-valor≤0,05.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), sob o registro nº 1.686/11.

RESULTADOS

A idade ao diagnóstico dos 258 pacientes com NB variou de 4 dias a 30 anos, com média de 40,5±46,4 meses e mediana de 28,9 meses (intervalo interquartil 42,2 meses). Crianças de 1 a 4 anos representaram o grupo mais numeroso (49%), seguidas pelas menores de 1 ano de idade (29%), as de 5 a 9 anos (17%) e, em menor percentual, as com idade maior ou igual a 10 anos (5%). Dos pacientes, 148 (57%) eram do sexo masculino, e 110 (43%), do sexo feminino, com discreta predominância do sexo masculino e razão de 1,3:1,1. Com relação à idade dos pacientes, vale ressaltar que, como o NB é um tumor de incidência predominante infantil, ocorrendo em mais de 90% dos casos em crianças menores de 10 anos de idade, o manejo clínico desses pacientes e o desenvolvimento de protocolos terapêuticos não fazem parte da prática diária de oncologistas adultos. Por isso, mesmo pacientes mais velhos, fora da faixa etária pediátrica, podem ser referenciados a oncologistas pediátricos, com mais experiência nessa patologia.

No que tange à localização do tumor, 164 (63,0%) casos estavam no abdome, sendo 49,0% na região suprarrenal e 15,0% na região retroperitoneal. A suprarrenal esquerda (61,0%) foi mais acometida que a direita (39,0%). As demais localizações foram: região paravertebral (22,0%), mediastino (12,0%), cervical (2,0%), indeterminado (0,4%) e outros locais (0,4%).

Os sinais e sintomas mais frequentes foram febre (25,0%), dor abdominal (22,0%), massa abdominal (20,0%) e dor óssea (20,0%) (Tabela 1). Dos pacientes admitidos no estudo, 3 (1,0%) apresentaram síndrome de Horner, 5 (2,0%) síndrome de Pepper, e 4 (1,0%) opsomioclonus/ataxia. Os locais mais comuns de metástase foram: medula óssea (37,0%), ossos (33,0%), linfonodos (13,0%), fígado (10,0%), pele (0,4%) e outras localizações (5,0%). Dos 258 pacientes, 86 (33,0%) apresentavam metástase em mais de um local.

Tabela 1:
Distribuição absoluta e percentual dos sinais e sintomas em 258 pacientes com neuroblastoma.

Os pacientes assintomáticos somaram 13% dos casos, com tumores detectados por meio da palpação de massa abdominal em consulta de rotina ou pela realização de exames por outras queixas, não relacionadas ao tumor. De acordo com o estadiamento INSS, a maior parte desses pacientes apresentava doença localizada: 46% estava no estadio 1; 6%, estadio 2; 27%, estadio 3; 12%, estadio 4; e 9%, estadio 4S. Nos pacientes assintomáticos, a localização do tumor mais frequente foi a região abdominal (43%), sendo 34% na suprarrenal e 9% em retroperitônio, seguida de mediastino (36%) e paravertebral (21%).

O tempo médio do início dos sintomas até a realização do diagnóstico foi de 3,0±4,8 meses, com variação de 0 a 32 meses. Não houve diferença estatística entre o estadiamento dos pacientes e o tempo de surgimento dos sintomas. O tempo mediano entre o início dos sintomas e o diagnóstico, em todos os estadiamentos, apresentou valores muito próximos (p=0,118) (Tabela 2).

Tabela 2:
Comparação entre estadiamento e tempo de sinal e sintomas (meses) utilizando teste não paramétrico de Kruskal-Wallis.

O diagnóstico de NB foi realizado por biópsia do tumor e exame anatomopatológico em 202 (78%) pacientes, e pelo estudo da medula óssea infiltrada pelo tumor associado à presença de metabólitos de catecolaminas na urina em 56 (22%). De acordo com o estadiamento INSS, viu-se que: 38 (15%) pacientes estavam em estadio 1; 12 (5%), em estadio 2; 74 (29%), em estadio 3; 120 (46%), em estadio 4; e 14 (5%), em estadio 4S.

A pesquisa da amplificação do MYCN foi realizada em 44 (17%) pacientes, sendo inconclusiva em quatro deles. Dez pacientes (25%) apresentaram amplificação do MYCN, enquanto 30 não tiveram tal alteração. A maior parte dos pacientes (90%) com amplificação do MYCN mostrava doença avançada ao diagnóstico (estadios 3 e 4). Apenas um paciente com doença localizada apresentava amplificação do MYCN.

Dos 258 pacientes analisados, 171 (66%) entraram em remissão. Deles, 57 (33%) apresentaram recidiva do tumor, sendo 17 (30%) recidivas locais, 35 (61%) a distância, e cinco (9%) locais e a distância. Os pacientes com doença metastática ao diagnóstico apresentaram mais recidivas (69% do total) (p=0,002). Nos estadios 1, 2 e 4S, ocorreram dois casos de recidiva em cada grupo. Os dois pacientes do estadio 1 que recidivaram tinham idade superior a 1 ano ao diagnóstico, e a recidiva do tumor deu-se no local primário (abdome). O tempo de recidiva variou de 3 a 84 meses, com média de 18,2 meses e mediana de 11,5 meses; e os locais mais frequentes foram: medula óssea (47%), ossos (45%), linfonodos (7%), pulmão (2%) e sistema nervoso central (2%).

A SG dos pacientes estudados foi de 62% em cinco anos e de 53% em dez anos. A SLE foi de 52% em 5 anos e de 47% em 10 anos, ambas calculadas pelo método de Kaplan-Meier. A principal causa de óbito foi progressão da doença (72%). O óbito por toxicidade decorrente de quimioterapia ocorreu em 22 (23%) pacientes; já a morte por complicações cirúrgicas foi constatada em 4 (4%) casos. O tempo médio de seguimento dos pacientes foi de 58 meses.

Ao analisar as curvas de sobrevida em relação aos vários grupos etários, observou-se que os pacientes com idade inferior a 1 ano apresentaram maior tempo de SG e SLE de eventos em comparação aos de outros grupos, que não exibiram diferença entre si (p=0,001) (Gráfico 1). Os pacientes menores de 1 ano possuíam, em sua maioria, doença avançada ao diagnóstico (38% eram estadio 3, e 22%, estadio 4), e a localização do tumor mais frequente foi suprarrenal (40%), seguida das regiões paravertebral (24%), retroperitonial (18%), do mediastino (15%) e cervical (3%).

Gráfico 1:
Curvas de sobrevida global por faixa etária (Kaplan-Meier; p-valor=0,001).

A comparação entre a SG e a SLE quanto ao estadiamento evidenciou diferença estatística (p<0,05) no que se refere ao estádio 4, com taxas de sobrevida menores que os demais estadios, que não tiveram diferença com significância entre si (Gráfico 2).

Gráfico 2:
Curvas de sobrevida global por estadiamento (Kaplan-Meier; p-valor<0.001).

DISCUSSÃO

O reconhecimento dos sinais e sintomas de NB nem sempre é fácil, por causa da baixa incidência da doença e da frequente mimetização do quadro clínico com outras doenças comuns na infância.2020. Rodrigues KE, Camargo B. Diagnóstico precoce do câncer infantil: responsabilidade de todos. Rev Assoc Med Bras. 2003;49:29-34. O conhecimento das características epidemiológicas, como a ocorrência predominante na infância, a anamnese e o exame físico, pode sugerir a suspeita do tumor.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922.,1212. Heck JE, Ritz B, Hung RJ, Hashibe M, Boffetta P. The epidemiology of neuroblastoma: a review. Paediatr Perinat Epidemiol. 2009;23:125-43.,1313. Parise IZ, Haddad BR, Cavalli LR, Pianovski MA, Maggio EM,Parise GA, et al. Neuroblastoma in southern Brazil: an 11-year study. J Pediatr Hematol Oncol. 2006;28:82-7.,2121. Cartum J, Cristófani LM, Bendit I, Odone Filho V. Aspectos clínicos, terapêuticos e variáveis de prognóstico em crianças maiores de um ano portadoras de neuroblastoma não disseminado. Pediatria (São Paulo). 2004;26:159-71.,2222. Aydn GB, Kutluk MT, Yalçn B, Büyükpamukçu M, Kale G, Varan A, et al. Neuroblastoma in Turkish children: experience of a single center. J Pediatr Hematol Oncol. 2009;31:471-80.,2323. Schroeder H, Wacher J, Larsson H, Rosthoej S, Rechnitzer C, Petersen BL, et al. Unchanged incidence and increased survival in children with neuroblastoma in Denmark 1981-2000: a population-based study. Br J Cancer. 2009;100:853-7.,2424. Haupt R, Garaventa A, Gambini C, Parodi S, Cangemi G, Casale F, et al. Improved survival of children with neuroblastoma between 1979 and 2005: a report of the Italian Neuroblastoma Registry. J Clin Oncol. 2010;28:2331-8.,2525. Palma-Padilla V, Juárez-Ocaña S, González-Miranda G, Siordia-Reyes AG, Mejía-Aranguré JM, Carréon-Cruz R, et al. Incidencia y tendencia Del neuroblastoma em niños derechohabientes del IMSS. Rev Med Inst Mex Seguro Soc. 2010;48:151-8.

A idade média das crianças com NB ao diagnóstico, na literatura, é de 23 meses. Uma revisão realizada nos Estados Unidos com 3.666 crianças com NB, em grupos cooperativos entre 1986 e 2001, evidenciou idade média de 19 meses.1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922. Na nossa casuística, a média de idade foi de 40,5 meses, podendo ter sido reflexo do diagnóstico tardio realizado na maioria dos pacientes estudados. Interessante notar que 28% dos pacientes tinham idade inferior a 1 ano, confirmando a alta incidência do tumor nessa faixa etária.

As crianças com NB apresentaram ao diagnóstico quadro clínico bastante variável, semelhante aos descritos na literatura.2626. Collaço LM, Simamura MA, Giroldo PAKS. Avaliação clínicoepidemiológica de neoplasias de adrenal na infância em hospital oncológico de referência. Rev Med Paraná. 2008; 66:7-12. Em nosso estudo, manifestações sistêmicas inespecíficas, como febre (25%) e perda de peso (15%), foram referidas com frequência. Esses sinais e sintomas também foram prevalentes no estudo de Collaço et al., que analisaram 50 casos de NB em hospital de referência de Curitiba, Paraná.2626. Collaço LM, Simamura MA, Giroldo PAKS. Avaliação clínicoepidemiológica de neoplasias de adrenal na infância em hospital oncológico de referência. Rev Med Paraná. 2008; 66:7-12.

Além das manifestações sistêmicas, os pacientes apresentaram sinais e sintomas decorrentes da localização do tumor. O NB, em 63% dos casos, ocorreu no abdome, comprometendo, na maioria das vezes, a glândula suprarrenal. Nesses casos, as manifestações foram distensão, dor e massa abdominal palpável. Ao exame físico, o tumor, endurecido, fixo e de difícil delimitação, ocupa a loja renal e projeta-se ao hipocôndrio e ao flanco, podendo ultrapassar a linha média do abdome.1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922.

A região paravertebral foi frequente (22%). Nessa localização, o NB tende a se estender pelo forame neural, comprimir a medula espinhal e desencadear sinais e sintomas neurológicos: dor radicular, paraplegia, incontinência fecal/urinária. A compressão medular é uma emergência, pois, se prolongada, pode causar déficit neurológico permanente. Neste estudo, 37% dos pacientes com tumores em região paravertebral apresentavam sintomas associados à compressão medular.

Ao diagnóstico, 46% dos pacientes apresentavam metástases a distância (estádio 4), especialmente na medula óssea e no sistema esquelético. Não raramente, o médico é procurado por queixas decorrentes das metástases: dor óssea difusa, anemia, pancitopenia, irritabilidade, proptose ocular, equimose periorbitária, nódulos em calota craniana etc. A dor óssea pode ser intensa e impedir a criança de deambular.

A taxa de pacientes assintomáticos foi de 13%, sendo o diagnóstico realizado por meio da palpação de massa abdominal em consulta de rotina ou por exames de imagem para investigação de outras queixas não relacionadas ao tumor. Esses achados “acidentais” são comuns em tumores localizados no mediastino e em tumores pequenos no abdome. A presença de massa abdominal assintomática alerta para a necessidade e a importância de exame físico cuidadoso, para detecção de tumores em estadios iniciais.

No NB, a incidência dos sintomas característicos é baixa. Apenas 12 (5%) pacientes apresentaram sinais e sintomas de síndromes paraneoplásicas ou síndromes clínicas associadas ao NB. O opsomioclonus/ataxia, presente em quatro (1%) crianças neste estudo, está ligado, em 50% dos casos, aos tumores neuroblásticos.2121. Cartum J, Cristófani LM, Bendit I, Odone Filho V. Aspectos clínicos, terapêuticos e variáveis de prognóstico em crianças maiores de um ano portadoras de neuroblastoma não disseminado. Pediatria (São Paulo). 2004;26:159-71. Trata-se de síndrome paraneoplásica caracterizada por ataxia (incoordenação dos movimentos musculares), mioclonias (contrações súbitas dos músculos), opsoclônus (movimentos oculares involuntários, multidirecionais, incoordenados e hipercinéticos) e irritabilidade, com incidência descrita na literatura de 4,0%. Outras síndromes clínicas, como a diarreia intratável, que pode ocorrer pela produção de peptídio intestinal vasoativo (VIP) pelas células neoplásicas, e a síndrome de Horner, caracterizada por ptose unilateral, miose e anidrose, em geral associada a tumores em região torácica alta ou cervical, também apresentam baixa incidência, sendo descritas incidências de 3,1 e 2,0%, respectivamente.2121. Cartum J, Cristófani LM, Bendit I, Odone Filho V. Aspectos clínicos, terapêuticos e variáveis de prognóstico em crianças maiores de um ano portadoras de neuroblastoma não disseminado. Pediatria (São Paulo). 2004;26:159-71. Em lactentes estadio 4S, é comum o envolvimento massivo do fígado, podendo levar a um quadro de insuficiência respiratória caracterizado como síndrome de Pepper, observado em 29% dos pacientes estadio 4S neste estudo.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922.

Embora o NB seja produtor de catecolaminas em 90% dos casos, taquicardia, sudorese e hipertensão arterial são raros. Ressalta-se que a medida da pressão arterial deve ser sempre aferida ao diagnóstico e durante o acompanhamento desses pacientes.

O tempo médio de diagnóstico para pacientes com NB varia em diferentes centros de oncologia pediátrica. O Royal Hospital for Sick Children, em Edimburgo, apresentou tempo médio de 5,3 semanas; o grupo cooperativo Pediatric Oncology Group, nos Estados Unidos, de 5,4 semanas; e o Hospital do Câncer de São Paulo, de 18,6 semanas.2020. Rodrigues KE, Camargo B. Diagnóstico precoce do câncer infantil: responsabilidade de todos. Rev Assoc Med Bras. 2003;49:29-34. No nosso estudo, o tempo médio do início dos sintomas até a realização do diagnóstico foi de 12 semanas, porém não houve diferença entre o tempo de sintomas e o estadiamento dos pacientes (p=0,118), o que parece não ter influenciado na sobrevida. Estudo realizado por Parise et al., que, em 11 anos, avaliaram 125 pacientes com NB de três hospitais de oncologia pediátrica do Estado do Paraná, concluiu que o diagnóstico foi tardio e, consequentemente, a sobrevida relativamente baixa.1313. Parise IZ, Haddad BR, Cavalli LR, Pianovski MA, Maggio EM,Parise GA, et al. Neuroblastoma in southern Brazil: an 11-year study. J Pediatr Hematol Oncol. 2006;28:82-7. Esses achados podem ser reflexo da heterogeneidade biológica do NB, o que pode explicar a presença de doença localizada em pacientes com tempo prolongado de sintomas e diagnóstico tardio.

Quando há suspeita de NB abdominal ou pélvico, o ultrassom é, usualmente, o primeiro exame de imagem a ser solicitado. Entretanto, para melhor delimitação do tumor, são necessários outros exames, como tomografia ou ressonância. A ressonância é fundamental, principalmente nos tumores paravertebrais, para avaliar a compressão de medula espinhal. Entre outros exames para o diagnóstico ou o estadiamento, destacam-se: pesquisa de catecolaminas urinárias, mapeamento com metaiodobenzilguanidina (MIBG), biópsia de medula óssea, mielograma e avaliação citogenética da célula neoplásica.2727. Brisse HJ, McCarville MB, Granata C, Krug KB, Wootton-Gorges SL, Kanegawa K, et al. Guidelines for imaging and staging of neuroblastic tumors: consensus report from the International Neuroblastoma Risk Group Project. Radiology. 2011;261:243-57.

Em relação ao estadiamento INSS, que é baseado na idade do paciente, na extensão da doença e na ressecção tumoral, este estudo evidenciou predomínio (75% dos casos) de pacientes com doença estadio avançado (estadios 3 e 4). Nesses estadios houve maior percentual de pacientes de 1 a 4 anos (p<0,05). Vários estudos epidemiológicos mostram resultados semelhantes, com incidência de pacientes com doença avançada (local ou disseminada) superior a 60%.66. Tan C, Sabai SM, Tin AS, Quah TC, Aung L. Neuroblastoma: experience from National University Health System, Singapore (1987-2008). Singapore Med J. 2012;53:19-25.,1313. Parise IZ, Haddad BR, Cavalli LR, Pianovski MA, Maggio EM,Parise GA, et al. Neuroblastoma in southern Brazil: an 11-year study. J Pediatr Hematol Oncol. 2006;28:82-7.,2222. Aydn GB, Kutluk MT, Yalçn B, Büyükpamukçu M, Kale G, Varan A, et al. Neuroblastoma in Turkish children: experience of a single center. J Pediatr Hematol Oncol. 2009;31:471-80.,2323. Schroeder H, Wacher J, Larsson H, Rosthoej S, Rechnitzer C, Petersen BL, et al. Unchanged incidence and increased survival in children with neuroblastoma in Denmark 1981-2000: a population-based study. Br J Cancer. 2009;100:853-7.,2424. Haupt R, Garaventa A, Gambini C, Parodi S, Cangemi G, Casale F, et al. Improved survival of children with neuroblastoma between 1979 and 2005: a report of the Italian Neuroblastoma Registry. J Clin Oncol. 2010;28:2331-8.,2525. Palma-Padilla V, Juárez-Ocaña S, González-Miranda G, Siordia-Reyes AG, Mejía-Aranguré JM, Carréon-Cruz R, et al. Incidencia y tendencia Del neuroblastoma em niños derechohabientes del IMSS. Rev Med Inst Mex Seguro Soc. 2010;48:151-8. Esses achados refletem o comportamento agressivo do NB com metástases precoces. Por outro lado, o estadio da criança com NB apresenta influência relevante no prognóstico, como demonstrado na Gráfico 1. A sobrevida de pacientes com NB de estadios iniciais (estadios 1 e 2) e estádio 4S apresentou diferença, com significância estatística (p<0,05), em relação ao estádio 4, que tem taxas de sobrevida menores (SG de 41% e SLE de 26%, em 5 anos).

As crianças com NB são estratificadas como portadoras de NB de baixo, intermediário e alto risco de recorrência da doença.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86. Essa classificação depende de inúmeros fatores prognósticos clínicos (idade, estadio, localização do tumor, níveis séricos da desidrogenase láctica e ferritina) e biológicos (classificação histopatológica e classificação citogenética). Fatores associados a pior prognóstico incluem idade maior que 1 ano, doença metastática ao diagnóstico e classificação histopatológica desfavorável, conforme classificação de Shimada.22. Parodi F, Passoni L, Massimo L, Luksch R, Gambini C, Rossi E, et al. Identification of novel prognostic markers in relapsing localized resectable neuroblastoma. OMICS. 2011;15:113-21. A idade do paciente é fator prognóstico independente. Pacientes menores de 1 ano de idade ao diagnóstico apresentam melhor sobrevida que crianças mais velhas.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1111. Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922. Em nosso estudo, esses pacientes apresentaram maior tempo de SG e SLE que os demais (p=0,01), resultado semelhante ao da literatura internacional.

O oncógene MYCN é fator prognóstico importante no NB, sendo associado a comportamento agressivo e desfecho desfavorável.22. Parodi F, Passoni L, Massimo L, Luksch R, Gambini C, Rossi E, et al. Identification of novel prognostic markers in relapsing localized resectable neuroblastoma. OMICS. 2011;15:113-21.,44. Shuangshoti S, Nuchprayoon I, Kanjanapongkul S, Marrano P, Irwin MS, Thorner PS. Natural course of low risk neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2012;58:690-4. Está amplificado em 25 a 35% dos NBs, e em cerca de 30 a 40% dos casos estadios 3 e 4.11. Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.,1414. Maris JM. The biologic basis for neuroblastoma heterogeneity and risk stratification. Curr Opin Pediatr. 2005;17:7-13.,2828. Brodeur GM. Neuroblastoma: biological insights into a clinical enigma. Nat Rev Cancer. 2003;3:203-16. Em nosso estudo, a pesquisa de amplificação do oncógene MYCN foi realizada em 44 (17%) pacientes, e 10 (25%) apresentaram amplificação do MYCN, dos quais 90% apresentavam doença avançada ao diagnóstico (estadios 3 e 4).

A intensidade do tratamento e o planejamento terapêutico (incluindo a necessidade de transplante de medula óssea) dependem da classificação de risco. Enquanto pacientes de risco baixo e risco intermediário apresentam sobrevida superior a 90%, os de alto risco têm prognóstico ruim.33. Park JR, Bagatell R, London WB, Maris JM, Cohn SL, Mattay KK, et al. Children's Oncology Group's 2013 blueprint for research: Neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2013;60:985-93. A SG dos pacientes estudados foi de 62% em cinco anos, reflexo do alto percentual de pacientes diagnosticados com doença avançada.

Atualmente, muitos estudos com terapia-alvo molecular (anti-MYCN, quinase de linfoma anaplástico - ALK, inibidores da via fosfatidilinositol-3-quinase/serina-treonina quinase - PI3K/proteína-alvo da rapamicina - mTor e da aurora quinase) e com imunoterapia são desenvolvidos para o tratamento do NB de alto risco, mostrando resultados promissores, porém incipientes.2929. Pinto NR, Applebaum MA, Volchenboum SL, Matthay KK, London WB, Ambros PF, et al. Advances in risk classification and treatment strategies for neuroblastoma. J Clin Oncol. 2015;33:3008-17.

As características clínicas e epidemiológicas das crianças com NB atendidas no nosso serviço durante o período de 1991 a 2012 foram semelhantes às descritas na literatura. O diagnóstico clínico de NB é difícil, visto que suas manifestações são variáveis e inespecíficas. Contudo, em crianças com idade inferior a 5 anos, com massa abdominal e/ou dor óssea, irritabilidade, febre de origem indeterminada, o diagnóstico de NB deve ser considerado.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Park JR, Eggert A, Caron H. Neuroblastoma: biology, prognosis, and treatment. Hematol Oncol Clin North Am. 2010;24:65-86.
  • 2
    Parodi F, Passoni L, Massimo L, Luksch R, Gambini C, Rossi E, et al. Identification of novel prognostic markers in relapsing localized resectable neuroblastoma. OMICS. 2011;15:113-21.
  • 3
    Park JR, Bagatell R, London WB, Maris JM, Cohn SL, Mattay KK, et al. Children's Oncology Group's 2013 blueprint for research: Neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2013;60:985-93.
  • 4
    Shuangshoti S, Nuchprayoon I, Kanjanapongkul S, Marrano P, Irwin MS, Thorner PS. Natural course of low risk neuroblastoma. Pediatr Blood Cancer. 2012;58:690-4.
  • 5
    Cai JY, Pan C, Tang YJ, Chen J, Ye QD, Zhou M, et al. Minimal residual disease is a prognostic marker for neuroblastoma with bone marrow infiltration. Am J Clin Oncol. 2012;35:275-8.
  • 6
    Tan C, Sabai SM, Tin AS, Quah TC, Aung L. Neuroblastoma: experience from National University Health System, Singapore (1987-2008). Singapore Med J. 2012;53:19-25.
  • 7
    Ward E, DeSantis C, Robbins A, Kohler B, Jemal A. Childhood and adolescent cancer statistics, 2014. CA Cancer J Clin. 2014;64:83-103.
  • 8
    Camargo B, Ferreira JM, Reis RS, Ferman S, Santos MO, Pombo-de-Oliveira MS. Socioeconomic status and the incidence of non-central nervous system childhood embryonic tumours in Brazil. BMC Cancer. 2011;11:160.
  • 9
    Spix C, Pastore G, Sankila R, Stiller CA, Stelliarova-Foucher E. Neuroblastoma incidence and survival in European children (1978-1997): report from the Automated Childhood Cancer Information System project. Eur J Cancer. 2006;42:2081-91.
  • 10
    Øra I, Eggert A. Progress in treatment and risk stratification of neuroblastoma: impact on future clinical and basic research. Semin Cancer Biol. 2011;21:217-28.
  • 11
    Brodeur GM, Hogarty MD, Mosse YP, Maris JM. Neuroblastoma. In: Pizzo PA, Poplack DG, editors. Principles and Practice of Pediatric Oncology. 6thed. Philadelphia PA: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. p. 886-922.
  • 12
    Heck JE, Ritz B, Hung RJ, Hashibe M, Boffetta P. The epidemiology of neuroblastoma: a review. Paediatr Perinat Epidemiol. 2009;23:125-43.
  • 13
    Parise IZ, Haddad BR, Cavalli LR, Pianovski MA, Maggio EM,Parise GA, et al. Neuroblastoma in southern Brazil: an 11-year study. J Pediatr Hematol Oncol. 2006;28:82-7.
  • 14
    Maris JM. The biologic basis for neuroblastoma heterogeneity and risk stratification. Curr Opin Pediatr. 2005;17:7-13.
  • 15
    Bagatell R, London WB, Wagner LM, Voss SD, Stewart CF, Maris JM, et al. Phase II study of irinotecan and temozolomide in children with relapsed or refractory neuroblastoma: a Children's Oncology Group study. J Clin Oncol. 2011;29:208-13.
  • 16
    Berlanga P, Cañete A, Castel V. Advances in emerging drugs for the treatment of neuroblastoma. Expert Opin Emerg Drugs. 2017;22:63-75.
  • 17
    Carpenter EL, Mossé YP. Targeting ALK in neuroblastoma - preclinical and clinical advancements. Nat Rev Clin Oncol. 2012;9:391-9.
  • 18
    Schulte JH, Schulte S, Heukamp LC, Astrahantseff K, Stephan H, Fischer M, et al. Targeted Therapy for Neuroblastoma: ALK Inhibitors. Klin Padiatr. 2013; 225:303-8.
  • 19
    Mathew P, Valentine MB, Bowman LC, Rowe ST, Nash MB, Valentine VA, et al. Detection of MYCN Gene Amplification in Neuroblastoma by Fluorescence In Situ Hybridization: A Pediatric Oncology Group Study. Neoplasia. 2011;3:105-9.
  • 20
    Rodrigues KE, Camargo B. Diagnóstico precoce do câncer infantil: responsabilidade de todos. Rev Assoc Med Bras. 2003;49:29-34.
  • 21
    Cartum J, Cristófani LM, Bendit I, Odone Filho V. Aspectos clínicos, terapêuticos e variáveis de prognóstico em crianças maiores de um ano portadoras de neuroblastoma não disseminado. Pediatria (São Paulo). 2004;26:159-71.
  • 22
    Aydn GB, Kutluk MT, Yalçn B, Büyükpamukçu M, Kale G, Varan A, et al. Neuroblastoma in Turkish children: experience of a single center. J Pediatr Hematol Oncol. 2009;31:471-80.
  • 23
    Schroeder H, Wacher J, Larsson H, Rosthoej S, Rechnitzer C, Petersen BL, et al. Unchanged incidence and increased survival in children with neuroblastoma in Denmark 1981-2000: a population-based study. Br J Cancer. 2009;100:853-7.
  • 24
    Haupt R, Garaventa A, Gambini C, Parodi S, Cangemi G, Casale F, et al. Improved survival of children with neuroblastoma between 1979 and 2005: a report of the Italian Neuroblastoma Registry. J Clin Oncol. 2010;28:2331-8.
  • 25
    Palma-Padilla V, Juárez-Ocaña S, González-Miranda G, Siordia-Reyes AG, Mejía-Aranguré JM, Carréon-Cruz R, et al. Incidencia y tendencia Del neuroblastoma em niños derechohabientes del IMSS. Rev Med Inst Mex Seguro Soc. 2010;48:151-8.
  • 26
    Collaço LM, Simamura MA, Giroldo PAKS. Avaliação clínicoepidemiológica de neoplasias de adrenal na infância em hospital oncológico de referência. Rev Med Paraná. 2008; 66:7-12.
  • 27
    Brisse HJ, McCarville MB, Granata C, Krug KB, Wootton-Gorges SL, Kanegawa K, et al. Guidelines for imaging and staging of neuroblastic tumors: consensus report from the International Neuroblastoma Risk Group Project. Radiology. 2011;261:243-57.
  • 28
    Brodeur GM. Neuroblastoma: biological insights into a clinical enigma. Nat Rev Cancer. 2003;3:203-16.
  • 29
    Pinto NR, Applebaum MA, Volchenboum SL, Matthay KK, London WB, Ambros PF, et al. Advances in risk classification and treatment strategies for neuroblastoma. J Clin Oncol. 2015;33:3008-17.
  • Financiamento: O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2018
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    30 Mar 2017
  • Aceito
    15 Ago 2017
Sociedade de Pediatria de São Paulo R. Maria Figueiredo, 595 - 10o andar, 04002-003 São Paulo - SP - Brasil, Tel./Fax: (11 55) 3284-0308; 3289-9809; 3284-0051 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rpp@spsp.org.br