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COMPARAÇÃO TEMPORAL DA PREVALÊNCIA DE SIBILÂNCIA NO PRIMEIRO ANO DE VIDA EM SÃO PAULO: ESTUDO INTERNACIONAL DE SIBILÂNCIA EM LACTENTES

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a prevalência e a gravidade da sibilância em lactentes no primeiro ano de vida, utilizando o protocolo padronizado do Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes- fase 3, e comparar os valores obtidos com os observados no Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes- fase 1, realizado no mesmo centro.

Métodos:

Entre 2009 e 2010, pais e responsáveis de lactentes responderam ao questionário escrito do Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes- fase 3, e os resultados obtidos foram comparados aos do Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes- fase 1, realizado entre 2005 e 2006. Oslactentes foram separados em sibilantes e “não sibilantes”. Osprimeiros foram divididos de acordo com a frequência dos episódios: sibilância ocasional, quando apresentaram menos de três, e sibilância recorrente, quando manifestaram três ou mais.

Resultados:

A prevalência de sibilantes foi similar nas duas fases (44,6 versus46%). Segundo a frequência, houve aumento na prevalência de sibilância ocasional (19,4 versus 23%; p=0,03) e redução na de sibilância recorrente (26,7 versus 21,6%; p=0,005). Observou-se, ainda, aumento expressivo no diagnóstico de asma (7,5 versus 21,8%) e no uso de corticosteroides inalatórios (11,7 versus 35%), como também na hospitalização por sibilância na fase 3 (19,7 versus 32,6%), período da pandemia Influenza A (H1N1), o que pode ter contribuído para este desfecho.

Conclusões:

A prevalência da sibilância no primeiro ano de vida permanece elevada. Apesar de a avaliação temporal mostrar queda na prevalência da sibilância recorrente, aumento significante de sua morbidade foi identificado pelo maior número de hospitalizações. Além disso, houve indícios de melhora no manejo da sibilância dos lactentes, refletido pelo aumento do diagnóstico de asma e maior indicação de tratamentos preventivos.

Palavras-chave:
Lactente; Sons respiratórios; Prevalência; Asma

ABSTRACT

Objective:

To assess the prevalence and severity of wheezing in the first year of life of infants, using the standardized protocol of the Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes- phase 3, and compare the values obtained with those found in phase 1, conducted at the same center.

Methods:

Between 2009 and 2010, parents and guardians of infants answered the written questionnaire of the Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes - phase 3, and its results were compared to those of phase 1, performed between 2005 and 2006. We divided the infants into wheezing and non-wheezing. The wheezing group was stratified according to the frequency of episodes: occasional wheezing - less than three -, and recurrent wheezing - three or more.

Results:

Wheezing prevalence was similar in both phases (44.6 versus 46%). Regarding frequency, the prevalence of occasional wheezing increased (19.4 versus 23%; p=0.03) and recurrent wheezing decreased (26.7 versus 21.6%; p=0.005). Also, diagnosis of asthma (7.5 versus 21.8%), use of inhaled corticosteroids (11.7 versus35%), and hospitalization for wheezing (19.7 versus 32.6%) grew significantly in phase 3. This period coincides with the Influenza A (H1N1) pandemic, which could have contributed to this outcome.

Conclusions:

Wheezing prevalence in the first year of life remains high. Despite the temporal assessment showing a decrease in the prevalence of recurrent wheezing, a significant increase in its morbidity was identified due to the higher number of hospitalizations. In addition, there were signs of improvement in the wheezing management of infants, reflected by an increase in the diagnosis of asthma and a greater indication of preventive treatments.

Keywords:
Infant; Respiratory sounds/wheezing; Prevalence;Asthma

INTRODUÇÃO

A asma é uma das doenças crônicas mais frequentes em crianças e sua prevalência tem aumentado nos últimos anos.11. Asher MI, Stewart AW, Wong G, Strachan DP, García-Marcos L, Anderson HR, et al. Changes overtime in the relationship between symptoms of asthma, rhinoconjunctivitis and eczema: a global perspective from the International study of asthma and allergies in childhood (ISAAC). Allergol Immunopathol (Madr). 2012;40:267-74.,22. Castro-Rodriguez JA, Garcia-Marcos L. Wheezing and asthma in childhood: an epidemiology approach. Allergol Immunopathol (Madr). 2008;36:280-90. Grande parte das crianças com asma desenvolve sintomas nos primeiros anos de vida, mas há grande dificuldade desse diagnóstico entre os lactentes, principalmente pela complexidade em diferenciar outras causas frequentes de sibilância.33. Martinez FD, Wright AL, Taussig LM, Holberg CJ, Halonen M, Morgan WJ. Asthma and wheezing in the first six yearsoflife. The Group Health Medical Associates. N Engl J Med. 1995;332:133-8.,44. Solé D, Aranda CS, Wandalsen GF. Asthma: epidemiology of disease control in Latin America - short review. Asthma Res Pract. 2017;3:4.

São poucos os estudos populacionais nos quais a prevalência da sibilância em lactentes tenha sido avaliada, e são ainda menos frequentes aqueles com método semelhante, padronizado e validado, capaz de possibilitar a comparação entre várias populações. Com a finalidade de estudar o impacto da sibilância recorrente em lactentes e determinar sua prevalência e os fatores a ela associados, surgiu o Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes (EISL), que utilizou um questionário escrito e padronizado para realização de entrevistas (QE-EISL- fase1).44. Solé D, Aranda CS, Wandalsen GF. Asthma: epidemiology of disease control in Latin America - short review. Asthma Res Pract. 2017;3:4.,55. Mallol J, García-Marcos L, Aguirre V, Martinez-Torres A, Perez-Fernández V, Gallardo A, etal.The international study of wheezing in infants: questionnaire validation. Int Arch Allergy Immunol. 2007;144:44-50.

Nessa primeira fase do EISL foram avaliados 30.093lactentes. Aprevalência de pelo menos 1 episódio de sibilância foi de 45,2%, e a de sibilância recorrente (três ou mais episódios), 20,3%, sendo maior e mais grave em países da América Latina do que nos países europeus.66. Mallol J, García-Marcos L, Solé D, Brand P; EISL Study Group. International prevalence of recurrent wheezing during the first year of life: variability, treatment patterns and use of health resources. Thorax. 2010;65:1004-9. NoBrasil, oito centros participaram do EISL- fase1, sendo um deles da região centro-sul da cidade de São Paulo. Após cinco anos, mudanças nas políticas públicas relacionadas à asma foram implementadas no Brasil, sendo necessárias novas informações sobre esse tema.

O objetivo do presente estudo foi determinar a prevalência e a gravidade da sibilância durante o primeiro ano de vida em lactentes, moradores da região centro-sul da cidade de São Paulo (EISL - fase 3), e comparar esses valores aos dados obtidos pelo EISL - fase 1, passados cinco anos da sua realização.

MÉTODO

Os pais ou responsáveis de lactentes com idade entre 12 e 15meses, que não apresentavam doenças que pudessem repercutir sobre o sistema respiratório, foram convidados a participar de entrevistas respondendo ao QE-EISL - fase 3, composto por 50perguntas sobre sibilância, sintomas respiratórios associados, características demográficas e consumo de medicações, além do uso de antibióticos e paracetamol no primeiro ano de vida, após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. Odesenho do presente estudo (EISL - fase 3) foi idêntico ao anterior, EISL - fase 1, e utilizou o mesmo questionário escrito e padronizado (QE-EISL- fase3).55. Mallol J, García-Marcos L, Aguirre V, Martinez-Torres A, Perez-Fernández V, Gallardo A, etal.The international study of wheezing in infants: questionnaire validation. Int Arch Allergy Immunol. 2007;144:44-50. Osidealizadores do EISL - fase 3 recomendaram a inclusão de pelo menos 1.000 lactentes a cada centro participante, para a amostra ser significativa e com nível de confiança adequado.77. Asher MI, Keil U, Anderson HR, Beasley R, Crane J, Martinez F, etal. International study of asthma and allergies in childhood (ISAAC): rationale andmethods. Eur Respir J. 1995;8:483-91.

Os participantes foram entrevistados por um único médico pediatra, treinado para evitar mudanças do questionário, durante consultas de puericultura ou para vacinação de rotina, no período de junho de 2009 a dezembro de 2010, na região centro-sul da cidade de São Paulo, à semelhança do EISL - fase 1.88. Dela Bianca AC, Wandalsen GF, Mallol J, Sole D. Prevalence and severity of wheezing in the firstyear of life. J Bras Pneumol. 2010;36:402-9.

Os lactentes foram separados, primeiramente, em duas grandes categorias: sibilantes (pelo menos um episódio de sibilância) e “não sibilantes”. Osprimeiros, por sua vez, foram divididos em grupos de acordo com a frequência dos episódios de sibilância desde o nascimento: sibilância ocasional (SO), quando apresentaram menos de três episódios, e sibilância recorrente(SR), quando manifestaram três ou mais episódios.

Os dados obtidos foram codificados de forma padrão e transferidos ao banco de dados elaborado no Microsoft Excel. Foram analisados estatisticamente com a utilização do Statistical Package for the Social Science (SPSS) for Windows - versão 20.0. Para as variáveis categóricas, foram apresentadas frequências absolutas e relativas; para as variáveis numéricas, medidas-resumo como média e desvio padrão. Para verificar a associação entre fatores de risco de natureza categórica com sibilância foram utilizados testes do qui-quadrado e teste exato de Fisher. Para comparar as médias das variáveis numéricas, foram utilizados testes t de Student para amostras independentes. Para todos os testes estatísticos foram utilizados um nível de significância de 5%. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/UNIFESP).

RESULTADOS

Na fase 1, a amostra foi composta por 1.014 lactentes, sendo que 467 (46,1%) apresentaram pelo menos 1episódio de sibilância no primeiro ano de vida,88. Dela Bianca AC, Wandalsen GF, Mallol J, Sole D. Prevalence and severity of wheezing in the firstyear of life. J Bras Pneumol. 2010;36:402-9.. Nopresente estudo, na fase3, por sua vez, foram considerados válidos 1.335 questionários. Desses, 596 (44,6%) apresentaram pelo menos 1episódio de sibilância (p=0,496). Emrelação à SO, a fase1 identificou 197 (19,4%) lactentes,88. Dela Bianca AC, Wandalsen GF, Mallol J, Sole D. Prevalence and severity of wheezing in the firstyear of life. J Bras Pneumol. 2010;36:402-9. enquanto a fase 3 identificou 307 (23%) (p=0,037). Para a SR, os resultados também foram estatisticamente diferentes: na fase1, foram 270 (26,6%)88. Dela Bianca AC, Wandalsen GF, Mallol J, Sole D. Prevalence and severity of wheezing in the firstyear of life. J Bras Pneumol. 2010;36:402-9. lactentes, e na fase3, 289 (21,6%) (p=0,005).

As características dos lactentes da fase3 que apresentaram pelo menos um episódio de sibilância, estratificados quanto ao gênero, encontram-se na Tabela1. Nota-se maior prevalência de história de pneumonia e uso prévio de antibiótico entre os meninos. ATabela2 apresenta as características pessoais e clínicas de cada grupo de sibilantes das fases1 e 3 e sua comparação.

Tabela 1
Características clínicas de lactentes com sibilância no primeiro ano de vida (n=596¥), discriminados quanto ao gênero, na região centro-sul da cidade de São Paulo - Estudio Internacional de Sibilanciasen Lactantes- fase 3 (n=1.335¥).
Tabela 2
Características pessoais e clínicas dos lactentes segundo manifestarem sibilância ocasional ou recorrente no primeiro ano de vida na região centro-sul da cidade de São Paulo. Comparação entre as fases 1 e 3 do Estudio Internacional de Sibilancias en Lactantes.

O uso de corticosteroides orais, a frequência de despertares noturnos, a procura por serviço de urgência, a percepção de falta de ar pelos pais e o diagnóstico de asma foram maiores para a SR do que para a SO, nas duas fases da pesquisa. Entretanto, houve um aumento no diagnóstico de asma (7,5 versus 21,8%) e no uso de medicamentos para controle dos sintomas entre as crises, como corticosteroides inalatórios (11,7 versus 35,0%), na fase3. Dos130lactentes com diagnóstico de asma, 87 (67,0%) foram tratados com essa mesma classe de medicamento.88. Dela Bianca AC, Wandalsen GF, Mallol J, Sole D. Prevalence and severity of wheezing in the firstyear of life. J Bras Pneumol. 2010;36:402-9.

Ainda em relação à fase 3, no grupo dos lactentes com sibilância, 20% (121/596) foi hospitalizado por pneumonia e 32% (194/596) por sibilância, sendo que 91crianças apresentaram os dois tipos de internação. Ahospitalização por pneumonia foi mais frequente entre os lactentes com SR (24,9%) do que entre os com SO (16,0%) (p=0,007), diferentemente da fase1, na qual não se verificou diferença estatisticamente significante. Ahospitalização por sibilância foi mais frequente na fase3, tanto para os lactentes com SO (24,4%, p=0,013) quanto para os com SR (41,2%, p≤0,001).

DISCUSSÃO

De acordo com o que fora observado anteriormente na cidade de São Paulo, a prevalência da sibilância no primeiro ano de vida neste estudo (EISL- fase3) foi muito alta, tanto para a SO como para a SR.88. Dela Bianca AC, Wandalsen GF, Mallol J, Sole D. Prevalence and severity of wheezing in the firstyear of life. J Bras Pneumol. 2010;36:402-9. Resultados semelhantes aos deste trabalho- 44,6% relacionado a pelo menos um episódio de sibilância e 21,6%, à SR- já foram observados em outros centros brasileiros participantes da fase1, como Curitiba, PortoAlegre, Recife e Fortaleza, onde 45,4, 61,0, 43,0 e 37,7% da amostra apresentaram pelo menos um episódio de sibilância, e 22,6, 20,3, 24,8 e 16,2% apresentaram SR, respectivamente.99. Chong Neto HJ, Rosario NA, Solé D, Mallol J. Prevalence of recurrent wheezing in infants. J Pediatr (Rio J). 2007;83:357-62.,1010. Lima JA, Fischer GB, Sarria EE, Mattiello R, Solé D. Prevalence of and risk factors for wheezing in the firsty ear of life. J Bras Pneumol. 2010;36:525-31.,1111. Medeiros D, Silva AR, Rizzo JA, Sarinho E, Mallol J, Sole D. Prevalence of wheezing and associated risk factors among infants in Recife, Pernambuco State, Brazil. Cad Saúde Pública. 2011;27:1551-9.,1212. Bessa OA, Leite AJ, Sole D, Mallol J. Prevalence and risk factors associated with wheezing in the first year of life. J Pediatr (Rio J). 2014;90:190-6.

Simplificadamente, a SO pode estar mais relacionada ao fenótipo do sibilante transitório, com menores chances de evolução para a asma. Emcontrapartida, muitos estudos demonstram que a SR apresenta boa concordância com a evolução para asma, em especial quando ocorre nas crianças mais jovens e nos lactentes.33. Martinez FD, Wright AL, Taussig LM, Holberg CJ, Halonen M, Morgan WJ. Asthma and wheezing in the first six yearsoflife. The Group Health Medical Associates. N Engl J Med. 1995;332:133-8.

No presente estudo, a coleta de dados foi realizada após cinco anos da fase1 e, apesar das frequências de sibilância permanecerem elevadas e com poucas diferenças estatísticas, alguns resultados merecem ser discutidos. Houve aumento importante no número de lactentes com diagnóstico de asma (7,5 versus 21,8%), assim como no uso de medicamentos para controle dos sintomas entre as crises, como os corticosteroides inalatórios (11,7 versus 35%) nesta avaliação, possivelmente por interferência de alguns fatores.

O Plano Nacional de Controle da Asma (PNCA), desenvolvido a partir de 1999 pelo Ministério da Saúde e algumas sociedades médicas, possibilitou a disponibilização de medicamentos para a asma pelo Sistema Único de Saúde (SUS), além de treinamento de médicos da rede básica sobre tratamentos de manutenção e das exacerbações de asma.1313. Cerci Neto A, Ferreira Filho OF, Bueno T. Brazilian examples of programs for the control of asthma. J Bras Pneumol. 2008;34:103-6. Osmedicamentos para asma leve e moderada na apresentação de aerossol dosimetrado foram requeridos a partir de 2005 e começaram a ser disponibilizados nas Unidades Básicas de Saúde(UBS) após esse período.1414. Rizzo JA. Disponibilidade dos medicamentos para asma e os direitos dos asmáticos. Rev Bras Alerg Imunopatol. 2006;29:142-3. Dessa maneira, percebe-se que, durante a primeira fase do EISL, o PNCA estava se iniciando, como também o fornecimento de fármacos para a asma que pudessem ser usados em crianças, diferentemente da ocasião na qual foi realizado o EISL- fase3, quando o programa já estava consolidado.

É importante destacar que o diagnóstico de asma em lactentes é difícil e deve ser feito com cautela pela exclusão de outras doenças. Neste estudo, apenas 30% dos lactentes com SR tinham o diagnóstico de asma. Nessa faixa etária, nos lactentes que apresentam episódios de sibilância de repetição, pode-se sugerir um quadro futuro de asma com indicação de tratamento à semelhança dos asmáticos, segundo a literatura atual.44. Solé D, Aranda CS, Wandalsen GF. Asthma: epidemiology of disease control in Latin America - short review. Asthma Res Pract. 2017;3:4. Apesar disso, apenas 45% dos SR e 67% dos lactentes com diagnóstico de asma usaram corticosteroides inalatórios, considerados a primeira escolha de tratamento. Assim sendo, apesar do incremento no tratamento da SR em relação à fase1 do EISL em São Paulo, uma grande parte dos lactentes não estava sendo tratada da maneira mais adequada. No que se refere ao uso de corticosteroides sistêmicos nos quadros de sibilância, os estudos apresentam opiniões controversas, mesmo em relação à SR. Entretanto, é consenso que não sejam usados como rotina nos quadros leves, sendo destinados apenas a quadros agudos de maior gravidade.1515. Castro-Rodríguez JA, Rodrigo GJ. Efficacy of inhaled corticosteroids in infants and preschoolers with recurrent wheezing and asthma: a systematic review with meta-analysis. Pediatrics. 2009;123:e519-25.,1616. Global initiative for asthma [homepage on the Internet]. Global strategy for asthma management and prevention 2014 [cited 2015 Feb 08]. Available from: http://www.ginasthma.org/local/uploads/files/GINA_Report_March13.pdf
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Outra consideração relevante que pode ter repercutido nos resultados deve-se ao fato de que, no estado de São Paulo, o termo “asma” é substituído frequentemente pelo termo “bronquite”, tanto pelos médicos como entre os pacientes, favorecendo um subdiagnóstico desta doença.1717. Wandalsen NF, Gonzalez C, Wandalsen GF, Solé D. Evaluation of criteria for the diagnosis of asthma using an epidemiological questionnaire. J Bras Pneumol. 2009;35:199-205.

Outro resultado importante foi a grande prevalência de internações e por pneumonia. Odiagnóstico de pneumonia na faixa etária do estudo também pode ser difícil e gerar confusão com outros diagnósticos, principalmente durante crises de sibilância. Das194crianças que foram hospitalizadas por sibilância, 91lactentes também o foram por pneumonia, o que reforça a imprecisão dos dois diagnósticos. Contudo, existem diversos estudos que analisam a relação entre as infecções e a SR. Osvírus apresentam destaque com diferentes mecanismos envolvidos: nas crianças com resposta imunológica efetiva, os vírus podem causar danos pulmonares, pela produção de radicais livres, e desencadear uma resposta inflamatória, pela ativação do fator nuclear kappaB (NF-ƘB), facilitando o desenvolvimento de SR.1818. Hansbro NG, Horvat JC, Wark PA, Hansbro PM. Understanding the mechanisms of viral induced asthma: new therapeutic directions. Pharmacol Ther. 2008;117:313-53. Poroutro lado, os lactentes que apresentam resposta deficiente contra vírus são mais suscetíveis a infecções virais graves e repetidas, o que aumenta o risco de SR e asma.1919. Lemanske RF Jr, Jackson DJ, Gangnon RE, Evans MD, Li Z, Shult PA, et al. Rhinovirus illnesses during infancy predict subsequent childhoodwheezing. J Allergy Clin Immunol. 2005;116:571-7. Éválido ressaltar que outras alterações imunológicas, inclusive na resposta inata, estão presentes nos asmáticos, como a superprodução de muco, o que facilita as infecções bacterianas.2020. Kwong CG, Bacharier LB. Microbes and the role of antibiotic treatment for wheezy lower respiratory tract illnesses in preschool children. Curr Allergy Asthma Rep. 2017;17:34. Estudos recentes apontam que as bactérias podem ter papel robusto na patogenia da asma e, inclusive, que pneumonias nos lactentes podem interferir na persistência da sibilância.2121. Unger SA, Bogaert D. The respiratory microbiome and respiratory infections. J Infect. 2017;74 Suppl 1:S84-8.

O período de coleta de dados do EISL- fase 3 coincidiu com a pandemia mundial do vírus Influenza A(H1N1) de 2009. Pelaconsulta do Cadastro de Notificação da Influenza Pandêmica A(H1N1), do Sistema Nacional de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), pode-se verificar que 3.278casos em crianças menores de 2anos foram notificados no estado de São Paulo nessa ocasião. Aoconsultar informações do Ministério da Saúde pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), mais de 4.000internações por pneumonia foram registradas em menores de 1ano na cidade de São Paulo, de março a agosto de 2009, sendo que, no mesmo período dos anos anteriores, as internações não alcançaram 3.000.2222. Brazil - Ministério da Saúde - DATASUS [homepage on the Internet]. Sistema de informações sobre hospitalizações 2010. [cited 2015 Jul 10]. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br
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Devido à agressividade do vírus H1N1, uma mudança da rotina dos profissionais de saúde durante a pandemia por todo mundo foi significante.1616. Global initiative for asthma [homepage on the Internet]. Global strategy for asthma management and prevention 2014 [cited 2015 Feb 08]. Available from: http://www.ginasthma.org/local/uploads/files/GINA_Report_March13.pdf
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Como a evolução da doença é rápida e pode ser mortal, houve aumento na prescrição de antibióticos e corticosteroides, apesar de controverso, na tentativa de tratar quadros instáveis antes mesmo da confirmação do vírus, além da grande procura aos serviços de urgência pela população em geral.2323. Jain S, Kamimoto L, Bramley AM, Schmitz AM, Benoit SR, Louie J, et al. Hospitalized patients with 2009 H1N1 influenza in the United States, April-June 2009. N Engl J Med. 2009;361:1935-44.,2424. Kudo K, Takasaki J, Manabe T, Uryu H, Yamada R, Kuroda E, et al.Systemic corticosteroids and early administration of antiviral agents for pneumonia with acute wheezing due to influenza A (H1N1) pdm 09 in Japan. PLoS One. 2012;7:e32280.,2525. Oommen A, Lambert PC, Grigg J. Efficacy of a short course of parent-initiated oral prednisolone for viral wheeze in children aged 1-5 years: randomized controlled trial. Lancet. 2003;362:1433-8.,2626. Weinberger M. Consensus statement from conference on treatment of viral respiratory infection-induced asthma in young children. J Pediatr. 2003;142 Suppl 2:S45-6. Dessa maneira, a pandemia de H1N1 pode ser considerada um viés nos resultados desta pesquisa e justificar a grande frequência no uso de antibióticos e o aumento no uso de corticosteroides orais em relação à fase 1.

A utilização de um questionário com perguntas que dependem da memória dos pais e/ou responsáveis também pode gerar viés de informação e ser uma limitação deste estudo. Entretanto, alguns estudos revelam que pais são capazes de se recordar de doenças de seus filhos com precisão, particularmente em relação a fatos recentes como os ocorridos no último ano.2727. Pless CE, Pless IB. How well they remember. The accuracy of parent reports. Arch Pediatr Adolesc Med. 1995;149:553-8. Estudosepidemiológicos com utilização de questionário são extremamente úteis e de baixo custo para a geração de informações e melhorias nas políticas públicas. É um instrumento de grande valia, principalmente para países em desenvolvimento.

Outro ponto foi o tema sibilância. Pode haver confusão na identificação dos sibilos e dos outros sons respiratórios pelos responsáveis dos lactentes, gerando dúvidas e, consequentemente, uma estimativa equivocada da sua real prevalência. Entretanto, para a validação de construção do questionário EISL, uma versão resumida identificou boa concordância entre a percepção dos pais e o diagnóstico médico após ausculta.2828. Bianca AC, Wandalsen GF, Miyagi K, Camargo L, Cezarin D, Mallol J, et al. International study of wheezing in Infants (EISL): validation of written questionnaire for children aged below 3 years. J Investig Allergol Clin Immunol. 2009;19:35-42.

Em conclusão, a prevalência da sibilância no primeiro ano de vida na região centro-sul da cidade de São Paulo permanece elevada e com alta morbidade. Ainda assim, apesar de a avaliação temporal mostrar queda na prevalência da SR, um aumento significante de sua morbidade foi identificado pelo maior número de hospitalizações e maior consumo de medicamentos específicos para seu tratamento.

Mudanças nas políticas públicas atuais, como melhoria no acesso dos lactentes com SR aos serviços especializados e capacitação específica sobre asma na infância, poderiam melhorar o panorama dessa condição em São Paulo.

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Financiamento

  • O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    13 Ago 2017
  • Aceito
    08 Nov 2017
  • Publicado
    27 Nov 2018
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