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CINTURA HIPERTRIGLICERIDÊMICA E FATORES ASSOCIADOS EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES PORTADORES DE DIABETES MELITO TIPO 1

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a frequência do fenótipo cintura hipertrigliceridêmica e analisar seus fatores associados em crianças e adolescentes portadores de diabetes melito tipo 1.

Métodos:

Trata-se de um estudo observacional analítico com indivíduos com diabetes melito tipo 1, de cinco a 18 anos de idade, de ambos os sexos, acompanhados em um hospital universitário do Nordeste brasileiro. Foram realizadas medidas de peso, altura e circunferência da cintura, além da análise do perfil lipídico e da hemoglobina glicada. O fenótipo cintura hipertrigliceridêmica foi definido pela presença simultânea da circunferência da cintura aumentada (≥percentil 90 por idade e sexo) e dos níveis séricos de triglicerídeos elevados (≥75 mg/dL para crianças e ≥90 mg/dL para adolescentes). Investigaram-se, ainda, os antecedentes familiares para doenças cardiovasculares e diabetes, e também variáveis sociodemográficas e comportamentais. Nos testes de inferência estatística, as proporções foram comparadas pelo teste do qui-quadrado de Pearson e/ou exato de Fisher, sendo significante p<0,05.

Resultados:

Foram avaliados 102 pacientes, com predomínio do sexo feminino (54,9%) e de adolescentes (66,7%). A frequência de cintura hipertrigliceridêmica foi de 23,5%; a qual apresentou associação com o sexo feminino (p=0,043), excesso de peso (p=0,023), hipercolesterolemia (p=0,002), LDL elevado (p=0,001) e VLDL em valores limítrofes (<0,001).

Conclusões:

A frequência do fenótipo cintura hipertrigliceridêmica foi associada ao sexo feminino, ao perfil lipídico aterogênico e ao excesso ponderal, evidenciando a importância do acompanhamento nutricional dessa população, visando à redução de agravos cardiovasculares futuros.

Palavras-chave:
Cintura hipertrigliceridêmica; Diabetes mellitus tipo 1; Criança

ABSTRACT

Objective:

To assess the frequency of the hypertriglyceridemic waist phenotype and its associated factors in children and adolescents with type 1 diabetes mellitus.

Methods:

This is an observational analytical study with individuals with type 1 diabetes mellitus, aged 5 to 18 years, of both genders, followed in a university hospital in the Brazilian Northeast. Weight, height, and waist circumference were measured, and the lipid profile and glycated hemoglobin were analyzed. The hypertriglyceridemic waist phenotype was defined by the simultaneous presence of increased waist circumference (≥90th percentile for age and gender) and elevated serum triglyceride levels (≥75 mg/dL for children and ≥90 mg/dL for adolescents). We also investigated the family history of cardiovascular diseases and diabetes, as well as sociodemographic and behavioral variables. In the statistical inference tests, the proportions were compared by Pearson’s chi-square test ­and/­or Fisher’s exact test, being significant p<0.05.

Results:

A total of 102 patients were evaluated, most of them females (54.9%) and adolescents (66.7%). The frequency of hypertriglyceridemic waist was 23.5%, which was associated with females (p=0.043), overweight (p=0.023), hypercholesterolemia (p=0.002), high LDL (p=0.001), and borderline VLDL (<0.001).

Conclusions:

The frequency of the hypertriglyceridemic waist phenotype was associated with females, atherogenic lipid profile, and overweight, indicating the importance of the nutritional monitoring of this population, aiming at reducing future cardiovascular diseases.

Keywords:
Hypertriglyceridemic waist; Type 1 diabetes mellitus; Children

INTRODUÇÃO

O diabetes melito tipo 1 (DM1) consiste em um grupo heterogêneo de distúrbios metabólicos, consequentes da destruição parcial ou total das células beta das ilhotas de Langerhans pancreáticas, resultando na incapacidade progressiva de produção de insulina e, consequentemente, hiperglicemia.11. American Diabetes Association. Standards of medical care in diabetes-2017. Diabetes Care. 2017;40 (Suppl 1):S11-S24. Estima-se que 5 a 10% dos brasileiros portadores de DM são do tipo 1, acometendo sobretudo crianças e adolescentes, uma vez que é frequentemente diagnosticado durante a infância.22. Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2017-2018. São Paulo: Clannad; 2017.

Em virtude do processo de transição nutricional e modificação do perfil da população mundial nas últimas décadas, o estado nutricional de crianças e adolescentes com DM1 tem se assemelhado ao de indivíduos saudáveis, sendo evidenciadas elevadas prevalências de sobrepeso e obesidade também nesse grupo.33. Liu LL, Lawrence JM, Davis C, Liese AD, Pettitt DJ, Pihoker C, et al. Prevalence of overweight and obesity in youth with diabetes in USA: the SEARCH for Diabetes in Youth study. Pediatr Diabetes. 2010;11:4-11. https://doi.org/10.1111/j.1399-5448.2009.00519.x
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Contribuindo para o excesso ponderal, destacam-se as mudanças no estilo de vida, consequentes da menor restrição alimentar proporcionada pelos esquemas flexíveis de insulinoterapia44. Marques RM, Fornés NS, Stringhini ML. Socioeconomic, demographic, nutritional, and physical activity factors in the glycemic control of adolescents with type 1 diabetes mellitus. Arq Bras Endocrinol Metab. 2011;55:194-202. http://dx.doi.org/10.1590/S0004-27302011000300004
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e redução do gasto energético, favorecido pelo maior tempo dispendido em frente a telas de aparelhos eletrônicos, como televisão, videogames, entre outros.55. American Academy of Pediatrics, Committee on Public Education. American Academy of Pediatrics: Children, adolescents, and television. Pediatrics. 2001;107:423-6. https://doi.org/10.1542/peds.107.2.423
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Tendo em vista que o excesso de peso corporal é um importante fator de risco para alterações metabólicas e doenças cardiovasculares (DCV), pacientes com DM1 merecem maior acompanhamento, visto que em virtude dos danos vasculares causados pela hiperglicemia, tem-se visualizado o início precoce da aterosclerose grave em comparação com a população saudável da mesma faixa etária.66. Ferranti SD, Boer IH, Fonseca V, Fox CS, Golden SH, Lavie CJ, et al. Type 1 diabetes mellitus and cardiovascular disease: a scientific statement from the American Heart Association and American Diabetes Association. Circulation. 2014;130:1110-30. https://doi.org/10.1161/CIR.0000000000000034
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Nesse sentido, métodos clínicos e/ou laboratoriais sensíveis na identificação de fatores de risco devem fazer parte da rotina de atendimento ambulatorial desse grupo.

Um índice recentemente utilizado na predição desses agravos é o fenótipo cintura hipertrigliceridêmica (CHT), definido pela presença simultânea da circunferência da cintura (CC) aumentada e dos níveis séricos de triglicerídeos elevados.77. Esmaillzadeh A, Mirmiran P, Azizi F. Clustering of metabolic abnormalities in adolescents with the hypertriglyceridemic waist phenotype. Am J Clin Nutr. 2006;83:36-46. https://doi.org/10.1093/ajcn/83.1.36
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Ferramenta que tem sido proposta como alternativa ao diagnóstico da síndrome metabólica, destacando-se como marcador de risco cardiovascular e metabólico e associando-se, ainda, com obesidade visceral,88. Conceição-Machado ME, Silva LR, Santana ML, Pinto EJ, Silva RD, Moraes LT, et al. Hypertriglyceridemic waist phenotype: association with metabolic abnormalities in adolescents. J Pediatr (Rio J.). 2013;89:56-63. https://doi.org/10.1016/j.jped.2013.02.009
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por englobar a CC, medida antropométrica associada à obesidade central e hipertrigliceridemia, preditores da síndrome metabólica e/ou da tríade metabólica aterogênica - hiperinsulinemia, níveis elevados de apolipoproteína B e de lipoproteína de baixa densidade (LDL colesterol).99. Gomez-Huelgas R, Bernal-López MR, Villalobos A, Mancera-Romero J, Baca-Osorio AJ, Jansen S, et al. Hypertriglyceridemic waist: an alternative to the metabolic syndrome? Results of the IMAP study (multidisciplinary intervention in primary care). Int J Obes (Lond). 2011;35:292-9. https://doi.org/10.1038/ijo.2010.127
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Um dos primeiros estudos envolvendo a CHT foi desenvolvido por Lemieux et al., em 2000, com amostra composta por adultos canadenses do sexo masculino, verificando-se elevada concordância entre esse índice e a tríade metabólica aterogênica.1010. Lemieux I, Pascot A, Couillard C, Lamarche B, Tchernof A, Alméras N, et al. Hypertriglyceridemic waist: a marker of the atherogenic metabolic triad (hyperinsulinemia; hyperapolipoprotein B; small, dense LDL) in men? Circulation. 2000;102:179-84. https://doi.org/10.1161/01.cir.102.2.179
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Não obstante, em âmbito nacional, apesar de ainda ausente com o público com DM1, a literatura tem apresentado delineamentos com várias populações, inclusive crianças1111. Pereira PF, Faria FR, Faria ER, Hermsdorff HH, Peluzio MD, Franceschini SD, et al. Anthropometric indices to identify metabolic syndrome and hypertriglyceridemic waist phenotype: a comparison between the three stages of adolescence. Rev Paul Pediatr. 2015;33:194-203. http://dx.doi.org/10.1016/j.rpped.2014.10.001
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e adolescentes,88. Conceição-Machado ME, Silva LR, Santana ML, Pinto EJ, Silva RD, Moraes LT, et al. Hypertriglyceridemic waist phenotype: association with metabolic abnormalities in adolescents. J Pediatr (Rio J.). 2013;89:56-63. https://doi.org/10.1016/j.jped.2013.02.009
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,1212. Costa PR, Assis AM, Cunha CM, Pereira EM, Jesus GD, Silva LE, et al. Hypertriglyceridemic waist phenotype and changes in the fasting glycemia and blood pressure in children and adolescents over one-year follow-up period. Arq Bras Cardiol. 2017;109:47-53. https://doi.org/10.5935/abc.20170067
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permitindo a visualização do cenário no qual as DCV representam a principal causa de morbimortalidade, atingido indivíduos cada vez mais jovens e, por conseguinte, determinando redução expressiva da vida produtiva. Assim, objetiva-se avaliar a frequência do fenótipo CHT e seus fatores associados em crianças e adolescentes portadores de DM1.

MÉTODO

Estudo observacional analítico, conduzido em um hospital universitário de Recife, Pernambuco, no Nordeste do Brasil. A população estudada foi constituída por crianças e adolescentes com DM1, de ambos os sexos, com faixa etária entre cinco e 18 anos, acompanhados ambulatorialmente.

A amostra foi obtida por conveniência, sendo avaliadas todas as crianças e adolescentes com DM1 no período de abril a setembro de 2018 e que atendiam aos seguintes critérios de inclusão: apresentar idade entre cinco e 18 anos e possuir exames bioquímicos recentes (últimos três meses). Foram excluídos os indivíduos cujas características pudessem influenciar as medidas antropométricas e demais variáveis, tais como: portadores de paralisia cerebral, síndrome de Down ou de quaisquer outras alterações genéticas; pacientes submetidos à cirurgia abdominal recente; portadores de erros inatos do metabolismo (doença celíaca, galactosemia, alergia à proteína do leite de vaca); doentes renais crônicos ou em uso de corticoterapia.

Foram coletados dados como sexo e idade, além do nível de instrução e renda salarial mensal dos pais e/ou responsáveis. O nível de instrução foi categorizado em anos de estudo, dicotomizado em: inferior a oito anos e maior ou igual a oito anos de estudo. Do mesmo modo, a renda familiar foi dividida em: até um salário mínimo (R$ 954,00) e maior do que um salário mínimo (>R$ 954,00).

Para avaliação antropométrica foram realizadas medidas de peso, altura e CC, aferidos em dualidade, de acordo com os critérios de Lohman.1313. Lohman TG. Advances in body composition assessment. Champaign: Human Kinetics Publishers; 1992. O peso foi mensurado em balança mecânica de marca Filizola (São Paulo, Brasil) e a altura em estadiômetro acoplado à balança. O diagnóstico nutricional foi determinado de acordo com as curvas de índice de massa corpórea (IMC) para idade, preconizadas pela Organização Mundial da Saúde em 2007 para crianças e adolescentes de 5 a 19 anos e classificadas através do escore Z.1414. World Health Organization. Growth reference data for 5-19 years. Geneva: WHO; 2007. Já a CC foi aferida utilizando fita métrica não extensível no ponto médio entre a crista ilíaca e a face externa da última costela. O ponto de corte adotado para CC aumentada foi o percentil ≥90 por idade e sexo.1515. Taylor RW, Jones IE, Williams SM, Goulding A. Evaluation of waist circumference, waist-to-hip ratio, and the conicity index as screening tools for high trunk fat mass, as measured by dual-energy X-ray absorptiometry, in children aged 3-19 y. Am J Clin Nutr. 2000;72:490-5. https://doi.org/10.1093/ajcn/72.2.490
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Todas as medidas antropométricas foram realizadas pela nutricionista residente do referido hospital, responsável pelo estudo.

As variáveis bioquímicas utilizadas foram: colesterol total, lipoproteína de alta densidade (colesterol HDL), colesterol LDL, lipoproteína de muito baixa densidade (colesterol VLDL) e triglicerídeos, analisados pelo método de automação, e hemoglobina glicada (HbA1c), analisada por imunoturbidimetria. Para tanto, foram consultados os resultados dos exames realizados no laboratório de análises clínicas do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) no período de até três meses. Utilizou-se HbA1c <7,5% como valor de referência para a avaliação do controle glicêmico;11. American Diabetes Association. Standards of medical care in diabetes-2017. Diabetes Care. 2017;40 (Suppl 1):S11-S24. e para o perfil lipídico foram adotados os seguintes valores de referência: colesterol total <170 mg/dL; colesterol HDL >45 ­mg/­dL; colesterol LDL <110 mg/dL; VLDL: desejável <30 mg/dL e limítrofe entre 30 e 67 ­mg/­dL; triglicerídeos <75 mg/dL (0 a 9 anos de idade) e <90 mg/dL (10 a 19 anos de idade), conforme a Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção de Aterosclerose.1616. Faludi AA, Izar MC, Saraiva JF, Chacra AP, Bianco HT, Afiune A Neto, et al. Atualização da diretriz brasileira de dislipidemias e prevenção da aterosclerose. Arq Bras Cardiol. 2017;109 (Supl 1):1-76. https://doi.org/10.5935/abc.20170121
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O fenótipo CHT foi determinado nas crianças e adolescentes que apresentaram aumento da CC (≥percentil 90 por idade e sexo) em associação com hipertrigliceridemia (≥75 mg/dL para crianças e ≥90 mg/dL para adolescentes).77. Esmaillzadeh A, Mirmiran P, Azizi F. Clustering of metabolic abnormalities in adolescents with the hypertriglyceridemic waist phenotype. Am J Clin Nutr. 2006;83:36-46. https://doi.org/10.1093/ajcn/83.1.36
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Na descrição das variáveis comportamentais foi investigada a prática de atividade física e o tempo de tela. Para a primeira foi questionada a realização ou não de atividade física e, em caso afirmativo, quais as modalidades praticadas, bem como a duração e a frequência semanal. Já no que se refere ao tempo de tela, esse se define como representante do comportamento sedentário e corresponde ao período despendido utilizando aparelhos eletrônicos. Foi interrogada a duração da utilização desses equipamentos diariamente, sendo dicotomizada em menor do que duas horas e igual ou maior do que duas horas diárias, conforme a Academia Americana de Pediatria, que recomenda duas horas como limite máximo de tempo de tela para crianças maiores de dois anos e para adolescentes.55. American Academy of Pediatrics, Committee on Public Education. American Academy of Pediatrics: Children, adolescents, and television. Pediatrics. 2001;107:423-6. https://doi.org/10.1542/peds.107.2.423
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Foi avaliado ainda o tempo de diagnóstico de DM1 e o início do tratamento, além do histórico familiar para DCV e DM. Foi estabelecida história familiar positiva de DCV quando o paciente possuía no mínimo um parente direto (pais, irmãos ou avós) com episódio de hipertensão arterial, doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca, acidente vascular encefálico e/ou doença arterial periférica; e para diabetes, quando tal familiar direto apresentava DM tipo 1 ou 2.

Para a análise estatística, os dados foram lançados no programa Microsoft Office Excel e analisados no Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 13.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA) e Epi-Info versão 3.5.4 (CDC, Atlanta, GA. EUA). As variáveis contínuas foram testadas quanto à normalidade da distribuição pelo teste de Kolmogorov-Smirnov; as que apresentaram distribuição normal foram descritas na forma de média e desvio padrão; e as com distribuição não normal, em mediana e intervalo interquartílico (IQ). Na descrição das proporções, a distribuição binomial foi aproximada à distribuição normal pelo intervalo de confiança de 95% (IC95%). Nos testes de inferência estatística, as proporções foram comparadas pelo teste do qui-quadrado de Pearson e/ou exato de Fisher. Foi utilizado o nível de significância de 5,0% para rejeição de hipótese de nulidade.

Esse delineamento faz parte de um estudo denominado “Cintura hipertrigliceridêmica e risco cardiovascular em crianças e adolescentes”, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo seres humanos da UFPE, de acordo com a Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, sob o CAAE n° 83335318.2.0000.5208. A coleta de dados foi iniciada após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) pelo responsável legal para a autorização do menor na pesquisa, seguido do termo de assentimento livre e esclarecido (TALE) assinado pelo menor, informando seu desejo de participar de forma livre e voluntária.

RESULTADOS

A amostra final foi composta por 102 pacientes, porém quanto aos parâmetros bioquímicos, uma vez que se trataram de dados coletados a partir de registros em prontuários, a HbA1c pôde ser avaliada em 99 pacientes, o colesterol total em 100, as frações de LDL e HDL em 98, enquanto que apenas 74 participantes apresentaram resultados referentes ao VLDL.

Houve predomínio do sexo feminino (54,9%) e de adolescentes (66,7%). A maior parte residia no interior do estado de Pernambuco (49%), possuía renda inferior a um salário mínimo (68,6%) e em 62,7% dos voluntários a escolaridade dos responsáveis foi igual ou superior a oito anos de estudo (Tabela 1).

Tabela 1
Características socioeconômicas, demográficas e clínicas de crianças e adolescentes portadores de diabetes melito tipo 1, Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Pernambuco, 2018.

Quanto às variáveis clínicas, evidenciou-se histórico familiar positivo para DCV e DM em 75,5 e 73,5%, respectivamente (Tabela 1). Já a mediana do tempo de diagnóstico e do início de tratamento foi de 48 meses (IQ: 24-84), em ambos.

Embora 70,6% tenham relatado tempo de tela igual ou superior a duas horas por dia (Tabela 2), a prática de atividade física foi referida por 52%, com uma frequência semanal em média de 3,6 vezes/semana (±1,6) e com mediana de 60 minutos (IQ: 60-90) de duração diária.

Tabela 2
Características antropométricas e comportamentais de crianças e adolescentes portadores de diabetes melito tipo 1, Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Pernambuco, 2018.

No que se refere à avaliação antropométrica, 29,4% dos participantes apresentavam excesso ponderal (IMC/idade com escore Z≥1). Já a CC acima do percentil 90 foi verificada em 45,1%, dos quais 23,5% eram portadores de hipertrigliceridemia, caracterizando assim o fenótipo CHT (Tabela 2).

O perfil lipídico evidenciou hipercolesterolemia em 44%, enquanto o LDL elevado, o HDL reduzido e o VLDL em valores limítrofes foram evidentes em 24,5; 25,5 e 10,8%, respectivamente (Tabela 3). Já a média da HbA1c foi de 9,4% (±1,8) e esteve elevada em 91,9% dos avaliados.

Tabela 3
Perfil metabólico de crianças e adolescentes portadores de diabetes melito tipo 1, Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Pernambuco, 2018.

Quanto aos fatores associados à CHT, evidenciou-se associação com o sexo feminino (p=0,043), excesso ponderal (p=0,023), hipercolesterolemia (p=0,002), LDL elevado (p=0,001) e VLDL em valores limítrofes (<0,001). Além disso, verificou-se ainda uma tendência para o HDL reduzido entre os pacientes que apresentavam CHT (p=0,076). Quanto às demais variáveis do estudo, incluindo a idade, não foi observada associação estatística (Tabela 4).

Tabela 4
Associação da cintura hipertrigliceridêmica com variáveis demográficas, clínicas, comportamentais, antropométricas e bioquímicas em crianças e adolescentes portadores de diabetes melito tipo 1, Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Pernambuco, 2018.

DISCUSSÃO

O estudo do fenótipo CHT, sobretudo em crianças, tem mostrado relevância epidemiológica, visto que o processo aterosclerótico se inicia na infância e tem repercussão negativa na qualidade de vida na idade adulta, em função do aumento da morbimortalidade.1717. Alavian SM, Motlagh ME, Ardalan G, Motaghian M, Davarpanah AH, Kelishadi R. Hypertriglyceridemic waist phenotype and associated lifestyle factors in a national population of youths: CASPIAN Study. J Trop Pediatr. 2007;54:169-77. https://doi.org/10.1093/tropej/fmm105
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,1818. Barreiro-Ribeiro F, Vasques AC, Silva CD, Zambon MP, Rodrigues AM, Camilo DF, et al. Hypertriglyceridemic waist phenotype indicates insulin resistance in adolescents according to the clamp technique in the BRAMS study. Child Obes. 2016;12:446-54. https://doi.org/10.1089/chi.2016.0180
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A frequência do fenótipo nesse delineamento foi de 23,5%, evidenciando que a população de crianças e adolescentes com DM1 tem acompanhado o perfil dos não portadores, com aumento do excesso de peso, inclusive na região abdominal, provável reflexo também do processo de transição nutricional que tem acometido as diversas faixas etárias, tanto nos países desenvolvidos quanto nos em desenvolvimento.1919. Kelishadi R. Childhood overweight, obesity, and the metabolic syndrome in developing countries. Epidemiol Rev. 2007;29:62-76. https://doi.org/10.1093/epirev/mxm003
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Ainda não há pesquisas que avaliem a CHT no público pediátrico de portadores de DM1, e os estudos se resumem a amostras com crianças e adolescentes saudáveis. Em desenho conduzido no Irã com 5.625 alunos de um programa nacional de vigilância escolar (Caspian Study), uma prevalência de 8,52% foi demonstrada por Alavian et al.1717. Alavian SM, Motlagh ME, Ardalan G, Motaghian M, Davarpanah AH, Kelishadi R. Hypertriglyceridemic waist phenotype and associated lifestyle factors in a national population of youths: CASPIAN Study. J Trop Pediatr. 2007;54:169-77. https://doi.org/10.1093/tropej/fmm105
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Já na Inglaterra, Bailey et al.2020. Bailey DP, Savory LA, Denton SJ, Davies BR, Kerr CJ. The hypertriglyceridemic waist, waist-to-height ratio, and cardiometabolic risk. J Pediatr. 2013;162:746-52. https://doi.org/10.1016/j.jpeds.2012.09.051
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constataram 7,3% dos estudantes com fenótipo e, logo, maior risco cardiometabólico.

Em âmbito nacional, resultados análogos aos aqui encontrados foram obtidos por Guilherme et al.2121. Guilherme FR, Molena-Fernandes CA, Hintze LJ, Fávero MT, Cuman RK, Rinaldi W. Hypertriglyceridemic waist and metabolic abnormalities in Brazilian schoolchildren. PloS One. 2014;9:e111724. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0111724
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em investigação com escolares de dez a 14 anos do ensino público e privado do Paraná, dos quais 20,7% apresentavam simultaneamente CC e triglicerídeos (TG) séricos elevados. Por outro lado, percentuais inferiores também têm sido documentados na literatura científica. Em coorte com estudantes de um município da Bahia, envolvendo crianças e adolescentes, Costa et al.1212. Costa PR, Assis AM, Cunha CM, Pereira EM, Jesus GD, Silva LE, et al. Hypertriglyceridemic waist phenotype and changes in the fasting glycemia and blood pressure in children and adolescents over one-year follow-up period. Arq Bras Cardiol. 2017;109:47-53. https://doi.org/10.5935/abc.20170067
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constataram prevalência de 10,6%. Já em pesquisas desenvolvidas por Pereira et al.1111. Pereira PF, Faria FR, Faria ER, Hermsdorff HH, Peluzio MD, Franceschini SD, et al. Anthropometric indices to identify metabolic syndrome and hypertriglyceridemic waist phenotype: a comparison between the three stages of adolescence. Rev Paul Pediatr. 2015;33:194-203. http://dx.doi.org/10.1016/j.rpped.2014.10.001
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e Conceição-Machado et al.,88. Conceição-Machado ME, Silva LR, Santana ML, Pinto EJ, Silva RD, Moraes LT, et al. Hypertriglyceridemic waist phenotype: association with metabolic abnormalities in adolescents. J Pediatr (Rio J.). 2013;89:56-63. https://doi.org/10.1016/j.jped.2013.02.009
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apenas com adolescentes, o fenótipo foi prevalente em 6,4 e 7,2%, respectivamente. As diferenças nas prevalências encontradas podem ser explicadas pelos distintos pontos de corte adotados para classificação da CC e dos TG, e posterior definição do fenótipo CHT.

O IMC/idade demonstrou excesso de peso em 29,4%, dos quais 25,5% apresentavam sobrepeso e 3,9%, obesidade. Em estudo multicêntrico de base populacional, Liu et al.,33. Liu LL, Lawrence JM, Davis C, Liese AD, Pettitt DJ, Pihoker C, et al. Prevalence of overweight and obesity in youth with diabetes in USA: the SEARCH for Diabetes in Youth study. Pediatr Diabetes. 2010;11:4-11. https://doi.org/10.1111/j.1399-5448.2009.00519.x
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nos Estados Unidos, evidenciaram uma prevalência de 22,1% de sobrepeso e 12,6% de obesidade entre participantes de três a 18 anos de idade com DM1. No Brasil, Marques et al.44. Marques RM, Fornés NS, Stringhini ML. Socioeconomic, demographic, nutritional, and physical activity factors in the glycemic control of adolescents with type 1 diabetes mellitus. Arq Bras Endocrinol Metab. 2011;55:194-202. http://dx.doi.org/10.1590/S0004-27302011000300004
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constataram menores proporções, com excesso ponderal em 14,1%, de acordo com as curvas de IMC/idade.

Entretanto, em nível global, já se tem visualizado uma ascensão desse excesso ponderal entre indivíduos com DM1 em função do tempo, uma vez que estudos atuais retratam prevalências em torno de 40%.2222. Castro-Correia C, Santos-Silva R, Pinheiro M, Costa C, Fontoura M. Metabolic risk factors in adolescent girls with type 1 diabetes. J Pediatr Endocrinol Metabol. 2018;31:631-5. https://doi.org/10.1515/jpem-2018-0053
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,2323. De Keukelaere M, Fieuws S, Reynaert N, Vandoorne E, Kerckhove KV, Asscherickx W, et al. Evolution of body mass index in children with type 1 diabetes mellitus. Eur J Pediatr. 2018;177:1661-6. https://doi.org/10.1007/s00431-018-3224-9
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Dentre os fatores que têm contribuído para tal, destaca-se o estilo de vida contemporâneo, baseado no elevado consumo energético, inclusive o excesso de produtos dietéticos e a manutenção de comportamentos sedentários,2424. Driscoll KA, Corbin KD, Maahs DM, Pratley R, Bishop FK, Kahkoska A, et al. Biopsychosocial aspects of weight management in type 1 diabetes: a review and next steps. Curr Diab Rep. 2017;17:58. https://doi.org/10.1007/s11892-017-0892-1
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refletido neste desenho através do tempo excessivo de uso de equipamentos eletrônicos pela maior parte da amostra (70,6%), além da ausência de atividade física, também evidenciada em grande proporção (48%).

Outra causa apontada é o tratamento intensivo, caracterizado pelo uso de múltiplas doses de insulina, pois apesar de favorecer o controle glicêmico, tende a elevar o peso corporal e a adiposidade, sobretudo na região central, em virtude da sua função anabólica.2525. Purnell JQ, Zinman B, Brunzell JD; DCCT/EDIC Research Group. The effect of excess weight gain with intensive diabetes mellitus treatment on cardiovascular disease risk factors and atherosclerosis in type 1 diabetes mellitus: results from the Diabetes Control and Complications Trial/Epidemiology of Diabetes Interventions and Complications Study (DCCT/EDIC) study. Circulation. 2013;127:180-7. https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.111.077487
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No que tange às alterações em perfil lipídico, Homma et al.2626. Homma TK, Endo CM, Saruhashi T, Mori AP, Noronha RM, Monte O, et al. Dyslipidemia in young patients with type 1 diabetes mellitus. Arch Endocrinol Metab. 2015;59:215-9. https://doi.org/10.1590/2359-3997000000040
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reportaram dados superiores aos da presente investigação, com hipercolesterolemia e LDL elevado em 56,7 e 44%, respectivamente. Já a proporção de voluntários com HDL reduzido mostrou-se semelhante à da nossa amostra, enquanto a presença de hipertrigliceridemia foi inferior, com acometimento de somente 11,8%.

Quando comparados a crianças e adolescentes saudáveis, a prevalência de dislipidemia tem sido superior entre os portadores da doença, o que é preocupante, já que se trata de indivíduos jovens, nos quais o DM isoladamente já é considerado um fator de risco para aterosclerose precoce e, dessa maneira, essa condição torna-se um risco adicional.2727. Bulut T, Demirel F, Metin A. The prevalence of dyslipidemia and associated factors in children and adolescents with type 1 diabetes. J Pediatr Endocrinol Metabol. 2017;30:181-7. https://doi.org/10.1515/jpem-2016-0111
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A dislipidemia secundária ao inadequado controle glicêmico é uma realidade entre indivíduos com DM1 e altos níveis de colesterol total (CT), LDL e TG, e reduzidos de HDL têm sido associados substancialmente à HbA1c elevada.2626. Homma TK, Endo CM, Saruhashi T, Mori AP, Noronha RM, Monte O, et al. Dyslipidemia in young patients with type 1 diabetes mellitus. Arch Endocrinol Metab. 2015;59:215-9. https://doi.org/10.1590/2359-3997000000040
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Nesse contexto, visualiza-se que, apesar da adoção dos esquemas intensivos de insulina, o adequado controle glicêmico ainda tem sido um desafio entre os portadores de DM1.2828. Baskaran C, Volkening LK, Diaz M, Laffel LM. A decade of temporal trends in overweight/ obesity in youth with type 1 diabetes after the Diabetes Control and Complications Trial. Pediatr Diabetes. 2015;16:263-70. https://doi.org/10.1111/pedi.12166
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Nessa casuística, a inadequação glicêmica avaliada através da HbA1c esteve presente em cerca de 90% dos pacientes, elevando o risco aterogênico nesse público e corroborando resultados de outros delineamentos.44. Marques RM, Fornés NS, Stringhini ML. Socioeconomic, demographic, nutritional, and physical activity factors in the glycemic control of adolescents with type 1 diabetes mellitus. Arq Bras Endocrinol Metab. 2011;55:194-202. http://dx.doi.org/10.1590/S0004-27302011000300004
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,2727. Bulut T, Demirel F, Metin A. The prevalence of dyslipidemia and associated factors in children and adolescents with type 1 diabetes. J Pediatr Endocrinol Metabol. 2017;30:181-7. https://doi.org/10.1515/jpem-2016-0111
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Diante disso, verifica-se a necessidade do cuidado multiprofissional efetivo para com esse público, com consultas mais frequentes e trabalhos educativos para o paciente e a família. O acompanhamento nutricional mostra-se de extrema relevância para a obtenção do controle metabólico, evidenciando-se a importância do conhecimento da contagem de carboidratos, no qual o nutricionista adéque a programação alimentar de forma individualizada e dentro de um contexto de rotina diária.

No que se refere aos fatores associados ao fenótipo CHT, verificou-se associação com o sexo feminino, sugerindo um maior risco de complicações crônicas nessas jovens e apoiando os dados de Homma et al.2626. Homma TK, Endo CM, Saruhashi T, Mori AP, Noronha RM, Monte O, et al. Dyslipidemia in young patients with type 1 diabetes mellitus. Arch Endocrinol Metab. 2015;59:215-9. https://doi.org/10.1590/2359-3997000000040
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e Pérez et al.,2929. Pérez A, Wägner AM, Carreras G, Giménez G, Sánchez-Quesada JL, Rigla M, et al. Prevalence and phenotypic distribution of dyslipidemia in type 1 diabetes mellitus: effect of glycemic control. Arch Intern Med. 2000;160:2756-62. https://doi.org/10.1001/archinte.160.18.2756
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que demonstraram que o DM1 tem grande impacto no aumento do risco cardiovascular em adolescentes, mesmo naquelas com peso e controle glicêmico adequados, sugerindo o sexo feminino como um fator de risco independente.

Outra associação foi evidenciada com o excesso ponderal, o que pode ser justificado pelo fato de que, quanto maior o IMC, mais elevada poderá ser a CC e, por conseguinte, os níveis de triglicerídeos séricos. Resultados similares foram relatados em estudo com não portadores de DM1, nos quais além da obesidade, o fenótipo foi relacionado a outros eventos cardiometabólicos, tais como pressão arterial aumentada, hipercolesterolemia e HDL reduzido.3030. Kelishadi R, Jamshidi F, Qorbani M, Motlagh ME, Heshmat R, Ardalan G, et al. Association of hypertriglyceridemic-waist phenotype with liver enzymes and cardiometabolic risk factors in adolescents: the CASPIAN-III study. J Pediatr (Rio J.). 2016;92:512-20. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2015.12.009
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Quanto ao perfil lipídico, a CHT foi associada com a hipercolesterolemia, LDL elevado e VLDL em valores limítrofes, o que pode ser explicado pela excessiva atividade lipolítica do tecido adiposo disposto na região central, resultando em aumento dos ácidos graxos livres circulantes que funcionam como substrato para síntese de colesterol e lipoproteínas.1616. Faludi AA, Izar MC, Saraiva JF, Chacra AP, Bianco HT, Afiune A Neto, et al. Atualização da diretriz brasileira de dislipidemias e prevenção da aterosclerose. Arq Bras Cardiol. 2017;109 (Supl 1):1-76. https://doi.org/10.5935/abc.20170121
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Logo, essa associação era esperada. Já com o colesterol HDL, embora não tenha havido associação, visualizou-se uma tendência para níveis reduzidos entre aqueles com a presença da CHT, o que merece destaque em virtude da função protetora dessa lipoproteína, sobretudo contra o dano vascular.1616. Faludi AA, Izar MC, Saraiva JF, Chacra AP, Bianco HT, Afiune A Neto, et al. Atualização da diretriz brasileira de dislipidemias e prevenção da aterosclerose. Arq Bras Cardiol. 2017;109 (Supl 1):1-76. https://doi.org/10.5935/abc.20170121
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Além disso, uma vez que a hipertrigliceridemia ocorre em função do consumo excessivo de carboidratos e sendo o VLDL uma lipoproteína rica em triglicerídeos e responsável pelo seu transporte para os tecidos periféricos, a associação entre VLDL alterado e CHT pode ser ilustrada pela inadequação glicêmica predominante na amostra, uma vez que essa lipoproteína é carboidrato dependente. Correspondentemente a esses achados, Conceição-Machado et al.2121. Guilherme FR, Molena-Fernandes CA, Hintze LJ, Fávero MT, Cuman RK, Rinaldi W. Hypertriglyceridemic waist and metabolic abnormalities in Brazilian schoolchildren. PloS One. 2014;9:e111724. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0111724
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também evidenciaram correlação entre o fenótipo e o perfil lipídico aterogênico em população saudável da mesma faixa etária, recomendando a utilização dessa ferramenta como um meio prático para o rastreio de crianças e adolescentes com alterações cardiometabólicas.

Algumas limitações podem ser apontadas neste levantamento, tais como o desenho do estudo, visto que, ao ser realizado em um único momento, não permite o estabelecimento de causalidade. Destaca-se também a ausência de exames bioquímicos de alguns participantes, impedindo a avaliação do perfil metabólico da amostra em sua totalidade, além da ausência de informações referentes à dose total diária de insulina e ao esquema insulínico, limitando uma melhor avaliação do controle glicêmico. Por fim, a escassez de estudos envolvendo o fenótipo em portadores de DM1 é outro agente limitante para o contraste com os resultados aqui apresentados, reforçando a necessidade do desenvolvimento de mais pesquisas com a temática nesse público.

Em conclusão, constata-se que a frequência do fenótipo CHT foi semelhante e até superior aos resultados de delineamentos realizados com crianças e adolescentes saudáveis, estando associada ao sexo feminino, à hipercolesterolemia, aos elevados níveis de LDL e de VLDL e também ao excesso ponderal. Nesse sentido, a adoção de medidas de caráter preventivo se faz necessária para a redução de agravos, promoção de saúde e, por conseguinte, garantia da qualidade de vida.

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Financiamento

  • O estudo não recebeu financiamento.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Mar 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    01 Mar 2019
  • Aceito
    21 Jun 2019
  • Publicado
    12 Mar 2020
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