Acessibilidade / Reportar erro

Fórum de Humanização: potente espaço para educação permanente de trabalhadores da Atenção Básica

Humanization Forum: powerful space for permanent education of workers of Primary Health Care

RESUMO

O objetivo deste trabalho é discutir os resultados do primeiro Fórum Municipal de Humanização, usado como estratégia de educação permanente para trabalhadores da Atenção Básica. Os trabalhadores foram divididos em grupos para discussão de uma situação-problema e para, assim, buscar estratégias para efetivação da Política Nacional de Humanização. Participaram 71 profissionais de saúde, além de residentes e acadêmicos. Concluiu-se que o Fórum mostrou-se importante instrumento de educação permanente, instigando os profissionais a participar ativamente das discussões, com o intuito de construir e reconstruir processos de trabalho para desenvolver atenção integral aos usuários.

PALAVRAS-CHAVE
Humanização da assistência; Educação continuada; Atenção Primária à Saúde

ABSTRACT

The objective of this work is to discuss the results of the first Municipal Forum of Humanization, used as a permanent education strategy for Primary Health Care workers. The workers were divided into groups to discuss the problem-situation and, therefore, search for strategies for the establishing of the National Humanization Policy. Participants included 71 health professionals, as well as residents and academics. It was concluded that the Forum was an important instrument of permanent education, instigating the professionals to actively participate in discussions, with the purpose of building and rebuilding work processes to develop integral care to users.

KEYWORDS
Humanization of assistance; Education continuing; Primary Health Care

Introdução

Fóruns correspondem a uma modalidade de encontro e discussão assíncrona, em que cada participante pode expressar e produzir saberes, desenvolver capacidades comunicativas e contribuir para o conhecimento coletivo (BARROS; SOUZA, 2011BARROS, J. C.; SOUZA, P. N. Práticas discursivas de uma tutora em fóruns de discussão online. Veredas: Revista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 1, p. 383-397, 2011. Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2011/05/ARTIGO-271.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/...
). É um dispositivo de comunicação transversal, que provoca o aparecimento e a inclusão na roda de comunicação dos pontos e tensionamentos críticos, fazendo com que trabalhadores e gestores possam construir e reconstruir modos de gerir suas práticas profissionais (GUEDES; PITOMBO; BARROS, 2009GUEDES, C. R.; PITOMBO, L. B.; BARROS, M. E. B. Os processos de formação na Política Nacional de Humanização: a experiência de um curso para gestores e trabalhadores da atenção básica em saúde. Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 1087-1109, 2009. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4/v19n4a10.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4...
).

Como processo de formação, os fóruns potencializam movimentos, contagiam e desestabilizam processos instituídos através da construção coletiva do saber, por meio da problematização do modo de cuidar e gerir (GUEDES; PITOMBO; BARROS, 2009GUEDES, C. R.; PITOMBO, L. B.; BARROS, M. E. B. Os processos de formação na Política Nacional de Humanização: a experiência de um curso para gestores e trabalhadores da atenção básica em saúde. Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 1087-1109, 2009. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4/v19n4a10.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4...
). É um lugar de interação, de participação ativa e colaborativa de todos os envolvidos no processo, através da exposição de argumentos e contra-argumentos, para fazer a leitura da realidade de forma crítica (BARROS; SOUZA, 2011BARROS, J. C.; SOUZA, P. N. Práticas discursivas de uma tutora em fóruns de discussão online. Veredas: Revista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 1, p. 383-397, 2011. Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2011/05/ARTIGO-271.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/...
).

O fórum pode ser um instrumento de transformação não só para os trabalhadores envolvidos com a atenção, mas, também, para os gestores de saúde, ou seja, favorece quem realiza o cuidado em saúde e quem o gerencia. Faz com que os trabalhadores de saúde (da atenção e da gestão) sejam protagonistas, intervindo em sua realidade a partir das vivências para, através disso, buscar soluções inovadoras aos problemas cotidianos do seu ambiente de trabalho, desmanchando práticas cristalizadas nos serviços de saúde (GUEDES; PITOMBO; BARROS, 2009GUEDES, C. R.; PITOMBO, L. B.; BARROS, M. E. B. Os processos de formação na Política Nacional de Humanização: a experiência de um curso para gestores e trabalhadores da atenção básica em saúde. Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 1087-1109, 2009. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4/v19n4a10.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4...
).

Sabe-se que as aprendizagens são efetivadas quando fazem sentido ao aprendiz, quando lhe trazem significado (FREIRE, 1988FREIRE, P. Educação e Mudança. São Paulo: Paz e Terra, 1988.). Portanto, convém abordar as práticas de saúde (de atenção e gestão) para o enfrentamento dos problemas, fazendo emergir soluções a partir dos desafios encontrados nos serviços, e, nesse sentido, os fóruns se apresentam como instrumentos que potencializam espaços de discussão, rompendo práticas cristalizadas e, assim, mantendo-se potentes na educação permanente dos trabalhadores, tal como previsto na Política Nacional de Humanização (PNH) (BRASIL, 2004______. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: política nacional de humanização. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizaSus_doc_base.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
) e na Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) (BRASIL, 2004______. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: política nacional de humanização. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizaSus_doc_base.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
). Acredita-se, pois, que os fóruns caracterizam-se como espaços onde é possível dar voz e escuta aos participantes, ou seja, os fóruns oportunizam o poder de dizer e de ouvir sobre o cotidiano de trabalho dos profissionais de saúde, e, nesse atento e constante diálogo, pode-se alcançar a qualidade desejada da atenção e da gestão em saúde.

A PNH (BRASIL, 2004______. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: política nacional de humanização. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizaSus_doc_base.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
) busca o (re)encantamento das práticas de gestão e de atenção à saúde; inclui, como protagonistas e corresponsáveis, os diferentes sujeitos (gestores, profissionais e usuários) envolvidos na produção de saúde (BRASIL, 2004______. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: política nacional de humanização. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizaSus_doc_base.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
; PASCHE; PASSOS; HENNINGTON, 2011PASCHE, D. F.; PASSOS, E.; HENNINGTON, E. A. Cinco anos da política nacional de humanização: trajetória de uma política pública. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 11, p. 4541-4548, 2011. Disponível em: <http://www.siga.fiocruz.br/arquivos/ss/documentos/editais/4_Artigo%202%20MP%20Rede%20Cegonha.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.siga.fiocruz.br/arquivos/ss/d...
). É uma política voltada para a reinvenção dos modos de gerir e de cuidar, tendo como diretrizes o acolhimento, a ampliação da clínica - Clínica Ampliada, Projeto Terapêutico Singular (PTS), entre outros -, a gestão democrática, a valorização do trabalhador e a garantia dos direitos dos usuários (PASCHE; PASSOS; HENNINGTON, 2011PASCHE, D. F.; PASSOS, E.; HENNINGTON, E. A. Cinco anos da política nacional de humanização: trajetória de uma política pública. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 11, p. 4541-4548, 2011. Disponível em: <http://www.siga.fiocruz.br/arquivos/ss/documentos/editais/4_Artigo%202%20MP%20Rede%20Cegonha.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.siga.fiocruz.br/arquivos/ss/d...
).

Sabe-se que para se alcançar os intentos da PNH, convém sensibilizar os trabalhadores da saúde e qualificar suas práticas de cuidado e de gestão. A PNEPS tem o objetivo de aprimorar o modelo de atenção à saúde, atuando sobre os serviços, profissionais e gestores por meio da identificação das necessidades dos trabalhadores e construindo estratégias para qualificar a atenção e a gestão em saúde (BRASIL, 2009______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2009. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pacto_saude_volume9.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
; CAROTTA; KAWAMURA; SALAZAR, 2009CAROTTA, F.; KAWAMURA, D.; SALAZAR, J. Educação permanente em saúde: uma estratégia de gestão para pensar, refletir e construir práticas educativas e processos de trabalhos. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 18, n. sup. 1, p. 48-51, jan./mar. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902009000500008>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

Na perspectiva da educação permanente, os profissionais são atores reflexivos de suas práticas e não apenas receptores de conhecimento. Assim sendo, podem construir conhecimento e buscar alternativas para as dificuldades encontradas nos cotidianos do trabalho (BRASIL, 2009______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2009. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pacto_saude_volume9.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

A educação permanente é um recurso que possibilita aos trabalhadores a efetivação de políticas publicas de saúde. Os trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS), enquanto educandos e educadores permanentes, podem ser protagonistas de seus saberes-fazeres, encontrando nos fóruns condições que proporcionam o (re)encantamento de suas práticas, a aproximação entre os trabalhadores da saúde, especialmente os da Atenção Básica (AB), coordenadora do cuidado no interior das Redes de Atenção à Saúde (RAS) e locus privilegiado de promoção da saúde (BRASIL, 2012______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atençao Básica. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: <http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://189.28.128.100/dab/docs/publicaco...
), para fortalecer os serviços e garantir atenção universal, equânime e integral aos usuários do SUS (BRASIL, 1990______. Presidência da República. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990: dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 19 set. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei...
).

O objetivo deste estudo é, pois, apresentar e discutir os resultados do primeiro Fórum Municipal de Humanização, usado como estratégia de educação permanente para os trabalhadores da AB de um município de médio porte do interior gaúcho.

Metodologia

Este estudo foi elaborado a partir de uma pesquisa, aprovada pelo Comitê de Ética de uma Universidade pública do Rio Grande do Sul/RS - sob o número 1.099.207/2015 -, que se ocupou em identificar e intervir sobre o conhecimento de trabalhadores da AB de um município gaúcho de médio porte, sobre a PNH. Refere-se, portanto, à intervenção realizada (Fórum Municipal de Humanização) junto aos referidos trabalhadores de saúde.

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, desenvolvida por meio de rodas de conversas, método que possibilita o encontro e o diálogo, criando possibilidades de produção e ressignificação de saberes entre os participantes. As rodas de conversa são baseadas na horizontalidade das relações (poder distribuído), sendo os sujeitos envolvidos atores críticos e reflexivos da realidade vivenciada/experienciada. São espaços de construção de novas possibilidades dadas pelo ato de perceber e refletir, agir e modificar dos participantes, que se reconhecem como condutores de sua ação (SAMPAIO ET AL., 2014SAMPAIO, J. et al. Limites e potencialidades das rodas de conversa no cuidado em saúde: uma experiência com jovens no sertão pernambucano. Interface, Botucatu, v. 118, supl. 2, p. 1299-1312, 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/icse/v18s2/1807-5762-icse-18-s2-1299.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2016.
http://www.scielo.br/pdf/icse/v18s2/1807...
).

O Fórum Municipal de Humanização contou com a participação dos profissionais da AB, provenientes das Estratégias Saúde da Família (ESF), das Unidades Básicas de Saúde (UBS) tradicionais e das com Estratégias de Agentes Comunitários de Saúde (UBS+EACS), com duração de quatro horas. Todos os profissionais da AB foram convidados a participar do Fórum por meio de convite formal enviado pelo órgão da Secretaria Municipal de Saúde, responsável pela educação permanente de seus trabalhadores.

O Fórum contou com as seguintes etapas:

  • 1ª etapa: apresentação dos resultados da referida pesquisa para os trabalhadores da AB (profissionais e gestores municipais), destacando-se como resultado importante o desconhecimento da PNH por parte dos trabalhadores, que deveriam usá-la como referência nos serviços de saúde para promover cuidado integral e humanizado aos usuários do SUS;

  • 2ª etapa: realização de uma conferência de abertura proferida por importante estudiosa e agente política da PNH, por meio da qual se pretendeu sensibilizar os trabalhadores sobre o tema;

  • 3ª etapa: o conjunto de trabalhadores foi dividido em três grupos (pré-organizados no ato da inscrição pelos números 1, 2 e 3), resultando em três grupos para desenvolvimento das rodas de conversa. O primeiro grupo discutiu o subtema 'Cuidado Humanizado'; o segundo, 'Cuidado em AB/ESF e o seu papel dentro das RAS'; e o terceiro, 'Clínica Ampliada e PTS'. Cada grupo contou com um facilitador (pesquisadora) e um relator (trabalhador da AB que registrou a síntese das discussões e a apresentou ao grande grupo). Ressalta-se que, durante a discussão, foram elaboradas estratégias para efetivação da PNH e de seus dispositivos, considerando a rede de serviços disponíveis no município;

  • 4ª etapa: socialização das discussões - apresentação da síntese de cada grupo/das propostas para melhorar o processo de trabalho nas unidades de saúde - para o grande grupo. Ainda nesta etapa, como resultados desse Fórum, foram acordadas três ações: i) divulgação das discussões realizadas, pelos participantes, no interior das ESF e das UBS tradicionais e com EACS; ii) continuidade da educação permanente referente à PNH; e iii) realização do segundo Fórum sobre Humanização.

A discussão, nos três grupos, teve como norte a seguinte situação-problema:

Débora, que trabalha como diarista, tem passado noites em claro, pois Vítor, seu filho de nove anos, apresenta febre e dores de cabeça há alguns dias. Antes de ir ao trabalho do dia, Débora levou Vítor a um Pronto Atendimento (PA), demorando 25 minutos para chegar (de ônibus). Ao chegar lá, foi avisada que não havia pediatra e orientada a procurar o posto de saúde mais próximo de sua casa. Ela achava que o posto não ia atender, pois já eram 10h da manhã e Vítor não tinha consulta marcada. Ao chegar à Unidade de Saúde da Família, informando que o PA a encaminhou com o filho, disseram a ela que o acolhimento era das 7h às 9h. Débora, apesar de muito nervosa, devido ter faltado o trabalho e preocupada com a saúde do filho, não foi atendida por ter extrapolado o limite de atendimentos do turno.

Na saída da ESF, encontrou o seu agente de saúde e relatou o ocorrido. Ele, por sua vez, reforçou a falta de vagas para atendimento médico. Na próxima reunião de equipe, o ACS [Agente Comunitário de Saúde] comentou o ocorrido e contou a história daquela família: 'Débora, 27 anos, mãe de quatro filhos, provedora do lar, casada com Marcos, 33 anos, sem emprego fixo, dependente de álcool, com história de surto psicótico. Dos filhos, dois são adolescentes, uma menina e um menino, com 13 e 11 anos, respectivamente, estes não são filhos de Marcos. As outras duas crianças filhas do casal são dois meninos de 9 e 4 anos. A ACS conta que Vitor apresenta problemas de aprendizagem na escola com frequente envolvimento em brigas, somado a isso, a filha adolescente de 13 anos é vista frequentemente namorando diferentes meninos'.

A análise das propostas foi realizada através da análise de conteúdo (BARDIN, 1977BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edição 70, 1977.). A análise de conteúdo, como um método, configura-se como um conjunto de técnicas de análise de comunicações; adota procedimentos sistemáticos e objetivos para descrever e produzir inferências do conteúdo das comunicações emergidas em um determinado contexto social (CAMPOS, 2004CAMPOS, C. J. Content analysis: a qualitative data analysis tool in health care. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, DF, v. 57, n. 5, p. 611-614, 2004.; CAREGNATO; MUTTI, 2006CAREGNATO, R. C. A.; MUTTI, R. Pesquisa qualitativa: análise de discurso versus análise de conteúdo. Texto & Contexto Enfermagem, Florianópolis, v. 15, n. 4, p. 679-84, out./dez. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/tce/v15n4/v15n4a17.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/pdf/tce/v15n4/v15n4...
; FARAGO; FOFONCA, 2007FARAGO, C. C.; FOFONCA, E. A análise de conteúdo na perspectiva de Bardin: do rigor metodológico à descoberta de um caminho de significações. Linguasagem, São Paulo, v. 18, p. 1-5, 2007. Disponível em: <http://www.letras.ufscar.br/linguasagem/edicao18/artigos/007.pdf >. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.letras.ufscar.br/linguasagem/...
). Portanto, os resultados foram organizados e pré-analisados, explorados (codificados e categorizados) e, finalmente, interpretados.

Resultados

Participaram do Fórum Municipal de Humanização 71 profissionais da AB, sendo 61 das ESF, 10 das UBS + EACS, 29 residentes do Programa de Residência Multiprofissional em Sistema Público de Saúde e 11 acadêmicos das universidades pública e privada do município. Dos trabalhadores do município, 33 eram ACS, 6 Auxiliares de Saúde Bucal (ASB), 6 dentistas, 13 enfermeiros, 4 médicos e 9 técnicos de enfermagem.

O grupo I contou com 19 participantes, já o grupo II, com 25, e o grupo III, com 18 participantes. Note-se que nove trabalhadores não participaram das rodas de discussão, ou seja, participaram apenas das fases expositivas (duas primeiras etapas) do Fórum.

As figuras a seguir representam as propostas de cada roda de discussão.

Figura 1
Roda de conversa I – Subtema: Cuidado Humanizado

Figura 2
Roda de conversa II – Subtema: Cuidado em AB/ESF e o seu papel dentro da RAS

Figura 3
Roda de conversa III – Subtema: Clínica Ampliada e PTS

Discussão

Os momentos vivenciados por cada grupo viabilizaram a observação do processo de trabalho cotidiano, permitindo questionamentos sobre os conhecimentos prático e teórico dos trabalhadores de saúde, incentivando-os a (re)fazer ações de maneira diferenciada (BRASIL, 2009______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2009. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pacto_saude_volume9.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
). Portanto, o Fórum Municipal de Humanização proporcionou a participação ativa dos trabalhadores da AB e favoreceu o (re)conhecimento sobre PNH e PNEPS, evidenciando, tal como sugerem os documentos oficiais do Ministério da Saúde, que se pode modificar as práticas enraizadas nos serviços por meio de ações educativas e da reflexão compartilhada e sistemática entre os que elaboram e produzem ações de saúde.

O fórum constitui-se como uma ferramenta importante de educação permanente aos profissionais da AB do município, pois possibilitou troca de ideias, entrelaçamento de vozes que constroem e descontroem opiniões, fortalecendo a construção coletiva e colaborativa. Pode-se dizer que no Fórum foi exercitada a argumentação, um espaço voltado para a criação de aprendizagem colaborativa, pautada na participação ativa de todos. A argumentação de diferentes atores que defendem seus pontos de vista influencia a formação da opinião dos outros, possibilitando, assim, a reflexão (BARROS; SOUZA, 2011BARROS, J. C.; SOUZA, P. N. Práticas discursivas de uma tutora em fóruns de discussão online. Veredas: Revista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 1, p. 383-397, 2011. Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2011/05/ARTIGO-271.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/...
).

A educação permanente, realizada na modalidade de fórum, reforça seus propósitos de ser uma estratégia de gestão que visa a provocar mudanças nos trabalhadores e em suas práticas, assim como proporcionar a aquisição e/ou a atualização de conhecimentos, favorecendo mudanças na forma de organização e planejamento dos serviços, visto que deve ser realizada de acordo com as necessidades cotidianas das práticas em saúde (BRASIL, 2012______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atençao Básica. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: <http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://189.28.128.100/dab/docs/publicaco...
).

O Fórum realizado com os profissionais de saúde da AB, ao proporcionar espaço de discussão sobre humanização e educação permanente, conforme dito anteriormente, suscitou a necessidade de revisão dos processos de trabalho dentro das ESF e UBS tradicionais e com EACS, ou seja, possibilitou reflexão das práticas diárias de cuidado em saúde. Os profissionais trouxeram como sugestão, para a efetiva realização do cuidado humanizado, a necessidade de discutir os processos de trabalho em equipe. Este, o trabalho em equipe, uma das tão almejadas mudanças no modelo de atenção à saúde (BRASIL, 2009______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2009. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pacto_saude_volume9.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

A comunicação deficitária com a RAS também foi levantada como um problema enfrentado nos serviços, que dificulta a resolutividade e leva à manutenção fragmentada do cuidado, dado esse também encontrado por outros autores (MEDEIROS; GERHARDT, 2015MEDEIROS, C. R. G.; GERHARDT, T. E. Avaliação da Rede de Atenção à Saúde de pequenos municípios na ótica das equipes gestoras. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 39, n. esp., p. 160-170, dez. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39nspe/0103-1104-sdeb-39-spe-00160.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39nspe/01...
; OLIVEIRA ET AL., 2016OLIVEIRA, L. A. et al. Processos microrregulatórios em uma Unidade Básica de Saúde e a produção do cuidado. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 40, n. 109, p. 8-21, 2016. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-11042016000200008&script=sci_abstract&tlng=pt>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010...
). O centro de comunicação das RAS se localiza na AB. É ela a ordenadora do cuidado, o que significa que, além de encaminhar o seu usuário aos serviços de média e alta complexidades, é na AB que o usuário deve receber suporte para cuidar de sua saúde (MENDES, 2011MENDES, E. V. As redes de atenção à saúde. 2. ed. Brasília, DF: Organização Pan-Americana da Saúde, 2011. Disponível em: <http://www.conass.org.br/bibliotecav3/pdfs/redesAtencao.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.conass.org.br/bibliotecav3/pd...
). Nesse sentido, ficou evidente a percepção dos profissionais que atuam nas ESF e na UBS tradicionais e com EACS de que é muito importante (re)conhecer a RAS para que se possa encaminhar e acompanhar o caminho que o usuário percorre, para que ele não se perca na rede.

Outro importante aspecto evidenciado foi a necessidade de realizar acolhimento (apontamento dos grupos 2 e 3). Além de ser, preferencialmente, a porta de entrada na RAS, a AB deve ser 'porta aberta' para atender à demanda espontânea e dar respostas satisfatórias aos usuários. Preconizado pela PNH, o acolhimento vem com a perspectiva de mudança na forma de acolher e resolver as queixas e dúvidas que chegam às unidades de AB. Os profissionais devem ter a sensibilidade de ampliar a escuta das queixas e perceber o sofrimento que não é relatado pelo usuário, favorecendo a criação de vínculo (BRASIL, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2013. Disponível em: <http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/Caderno28volI.pdf.>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File...
).

O acolhimento está presente em todas as relações de cuidado, entre trabalhadores de saúde e usuários, nos atos de receber e escutar as pessoas, podendo acontecer de formas variadas e em lugares variados (na recepção, na sala de espera, nos consultórios, fora da ESF), sendo uma atribuição comum a todos os membros da equipe multiprofissional, favorecendo a ampliação do acesso (FAUSTO ET AL., 2014FAUSTO, M. C. R. et al. A posição da Estratégia Saúde da Família na rede de atenção à saúde na perspectiva das equipes e usuários participantes do PMAQ-AB. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 38, n. esp., p. 13-33, 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-11042014000600013&script=sci_abstract&tlng=pt>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010...
; ROCHA; SPAGNUOLO, 2015ROCHA, S. A.; SPAGNUOLO, R. S. Acolhimento na visão complexa: ação coletiva emergente na Equipe de Saúde da Família. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 39, n. 104, p. 124-135, jan./mar. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n104/0103-1104-sdeb-39-104-00124.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n104/01...
). Geralmente, a recepção é o primeiro contato que o usuário tem quando entra na unidade. Uma das propostas do grupo 2 foi a qualificação da recepção, uma situação observada como frágil em várias unidades/serviços de saúde. Quando não há recepção ou quando o recepcionista é pouco solícito, o usuário, que vai à unidade porque está à procura de ajuda/está fragilizado, acaba não sendo acolhido de forma adequada (BRASIL, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2013. Disponível em: <http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/Caderno28volI.pdf.>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File...
).

Outra sugestão apontada, pelos trabalhadores do grupo 3, foi a construção de genograma e ecomapa das famílias, elaborações importantes para se compreender o contexto familiar dos usuários. Os dois instrumentos permitem conhecer as famílias em seus aspectos sociais, emocionais e de saúde, podendo identificar, assim, suas potencialidades e dificuldades.

O genograma (árvore da família) é um recurso elaborado a partir de uma entrevista realizada por um profissional da unidade, com participação ativa da família; traz informações demográficas, de posição funcional, recursos e acontecimentos críticos na dinâmica familiar. Através dele, a equipe de saúde pode visualizar o processo de adoecimento, facilitando o plano terapêutico (MELLO ET AL., 2005MELLO, D. F. et al. Genograma e ecomapa: possibilidades de utilização na estratégia de saúde da família. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, São Paulo, v. 15, n. 1, p. 79-89, 2005. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbcdh/v15n1/09.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbcdh/v15n...
; PEREIRA ET AL., 2009PEREIRA, A. P. D. S. et al. O genograma e o ecomapa no cuidado de enfermagem em saúde da família. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, DF, v. 62, n. 3, p. 407-416, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reben/v62n3/12.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/pdf/reben/v62n3/12....
).

O ecomapa, por sua vez, fornece uma visão ampliada, além do contexto familiar, delineando a estrutura de sustentação e o elo entre a família e a sociedade. Mostra os vínculos da família com a comunidade, possibilitando avaliar apoios e suportes disponíveis nesse espaço. Permite visualizar as relações da família com o meio em que se encontra (MELLO ET AL., 2005MELLO, D. F. et al. Genograma e ecomapa: possibilidades de utilização na estratégia de saúde da família. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, São Paulo, v. 15, n. 1, p. 79-89, 2005. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbcdh/v15n1/09.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbcdh/v15n...
; PEREIRA ET AL., 2009PEREIRA, A. P. D. S. et al. O genograma e o ecomapa no cuidado de enfermagem em saúde da família. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, DF, v. 62, n. 3, p. 407-416, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reben/v62n3/12.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/pdf/reben/v62n3/12....
).

Para proporcionar atenção integral aos usuários, os profissionais dos grupos 2 e 3 indicaram que o cuidado multiprofissional é indispensável nas equipes de saúde. O trabalho multiprofissional promove o desenvolvimento do trabalho em equipe e a troca de saberes dos diferentes núcleos profissionais para a construção de novos conhecimentos. É a partir da discussão de cada núcleo profissional que se alcança um olhar ampliado da saúde do usuário, e, assim, possa ser realizado um PTS adequado. Com a equipe multiprofissional, desenvolve-se melhor a continuidade do cuidado e o acompanhamento dos usuários, promovendo corresponsabilização entre profissional e usuário, melhora do vínculo e, consequentemente, maior adesão ao tratamento (FERREIRA; VARGA; SILVA, 2009FERREIRA, R. C.; VARGA, C. R. R.; SILVA, R. F. Trabalho em equipe multiprofissional: a perspectiva dos residentes médicos em saúde da família. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 14, p. 1421-1428, 2009. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/240767221_Trabalho_em_equipe_multiprofissional_a_perspectiva_dos_residentes_medicos_em_saude_da_familia>. Acesso em: 20 mar. 2016.
https://www.researchgate.net/publication...
; OLIVEIRA, 2006OLIVEIRA, E. M.; SPIRI, W. C. Programa Saúde da Família: a experiência de equipe multiprofissional. Revista Saúde Pública, São Paulo, v. 40, n. 4, p. 727-733, 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rsp/v40n4/25.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://www.scielo.br/pdf/rsp/v40n4/25.pd...
).

Uma das estratégias reconhecidas pelos trabalhadores da AB que pode ser implementada para proporcionar cuidado ampliado, com a participação ativa do usuário, foi a elaboração do PTS. O PTS pode ser elaborado para um indivíduo ou grupo e usado como condutas terapêuticas articuladas em uma equipe multiprofissional. Geralmente, é utilizado em situações complexas, em que um profissional, sozinho, não conseguiria gerenciar o cuidado adequado ao usuário. Além dos profissionais, quem deve participar ativamente é o indivíduo, juntamente com a sua família, para que a conduta terapêutica tenha maior adesão e seja realizada de acordo com as necessidades do usuário. No PTS, há que se ter um profissional de referência, preferencialmente, aquele que tem maior vínculo com o usuário/grupo em questão (BRASIL, 2008______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo da Política Nacional de Humanização. Clínica ampliada, equipe de referência e projeto terapêutico singular. 2. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2008. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/clinica_ampliada_equipe_referencia_2ed_2008.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

O grupo 1 indicou, ainda, a necessidade de valorização do trabalhador de saúde. Para valorizar o trabalhador, é necessário promover mudança no modelo de gestão fundamentado na hierarquia e no autoritarismo, por um modelo moderno baseado na cogestão, proporcionando corresponsabilização de todos pela atenção aos usuários (SCHUBERT, 2010SCHUBERT, L. P. Gestão de pessoas: a valorização do trabalho e do trabalhador da saúde. 2010. 70 f. Trabalho de conclusão de curso (Especialização) - Escola de Saúde Pública Professor Mestre Osvaldo de Oliveira Maciel, Florianópois, 2010.). Diante disso, a educação permanente pode ser um mecanismo de valorização do trabalhador da saúde, visto que possibilita estreitar laços de trabalho, fazendo com que não haja barreiras entre gestão e profissional de saúde e com que a opinião de todos seja relevante no processo de trabalho. Assim, os trabalhadores se sentirão valorizados, favorecendo as mudanças nos serviços de saúde.

Com a valorização do profissional de saúde, este poderá ser promotor de mudanças no seu ambiente de trabalho, introduzindo instrumentos de educação em saúde para os usuários. Um desses instrumentos que pode ser elaborado é a criação de panfletos informativos, contendo todas as informações sobre a rotina dos serviços de saúde, favorecendo a comunicação com os usuários. Essa foi uma proposta citada pelos profissionais do grupo 1.

A ambiência, como dispositivo da PNH, também interfere no trabalho dos profissionais de saúde, gerando insatisfação e desmotivação para pensar e realizar novos processos de trabalho. A ambiência, por si só, não muda o processo de trabalho, mas ela pode facilitar os processos de mudanças (SCHUBERT, 2010SCHUBERT, L. P. Gestão de pessoas: a valorização do trabalho e do trabalhador da saúde. 2010. 70 f. Trabalho de conclusão de curso (Especialização) - Escola de Saúde Pública Professor Mestre Osvaldo de Oliveira Maciel, Florianópois, 2010.). É entendida como um espaço social, profissional e de relações interpessoais, que seja facilitador no processo de trabalho, propiciando atendimento humanizado, acolhedor e resolutivo; que garanta conforto aos trabalhadores e usuários (BRASIL, 2010______. Ministério da saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo da Política Nacional de Humanização. Ambiência. 2. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2010. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ambiencia_2ed.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

Como pontos positivos do Fórum, podem-se citar: o reconhecimento da importância do trabalho em equipe na elaboração das propostas; a conscientização da carência de conhecimento sobre as políticas de saúde, bem como sobre as redes de atenção disponíveis no município; a necessidade de mais espaços de discussão para os trabalhadores, juntamente com os gestores, ou seja, a necessidade de aproximação da gestão dos processos de trabalho das equipes de saúde.

Conclusões

O Fórum de Humanização mostrou-se importante instrumento de educação permanente, e é a partir de contínuas discussões sobre as práticas diárias que se constrói e reconstrói processos de trabalho para desenvolver atenção integral aos usuários. Como estratégia de educação permanente, buscou-se, com o Fórum, debater as necessidades dos trabalhadores de saúde e instigar práticas inovadoras nos serviços do referido município.

As dificuldades apontadas foram semelhantes entre os grupos, mostrando que o cenário de trabalho desses profissionais necessita de mudanças. As mudanças serão possíveis com o trabalho multiprofissional, preferencialmente, com abordagem inter ou transdisciplinar, com a participação de toda a equipe e o engajamento da gestão. Além disso, os profissionais levantaram a necessidade de (re)conhecer a RAS do seu município, tendo em vista que a AB é a ordenadora do cuidado do usuário, sendo indispensável o conhecimento da mesma.

Faz-se necessário dar prosseguimento às discussões por meio de outros fóruns, dando voz aos trabalhadores de saúde, bem como aproximar a gestão municipal dos processos de trabalho vivenciados em cada serviço/unidade de saúde, reforçando, assim, essa modalidade de Educação Permanente, praticando-se a participação ativa e corresponsável pelos processos de planejamento e execução de ações resolutivas em AB.

  • Suporte financeiro: esta pesquisa teve auxílio financeiro indireto para sua realização, uma vez que foi desenvolvida no Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Sistema Público de Saúde - UFSM e as quatro primeiras autoras receberam bolsa durante o período da Residência

Referências

  • BARDIN, L. Análise de conteúdo Lisboa: Edição 70, 1977.
  • BARROS, J. C.; SOUZA, P. N. Práticas discursivas de uma tutora em fóruns de discussão online. Veredas: Revista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 1, p. 383-397, 2011. Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2011/05/ARTIGO-271.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
    » http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2011/05/ARTIGO-271.pdf
  • BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2013. Disponível em: <http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/Caderno28volI.pdf.>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/Caderno28volI.pdf.
  • ______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Atençao Básica Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: <http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://189.28.128.100/dab/docs/publicacoes/geral/pnab.pdf
  • ______. Ministério da saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo da Política Nacional de Humanização. Ambiência 2. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2010. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ambiencia_2ed.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ambiencia_2ed.pdf
  • ______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Núcleo da Política Nacional de Humanização. Clínica ampliada, equipe de referência e projeto terapêutico singular 2. ed. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2008. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/clinica_ampliada_equipe_referencia_2ed_2008.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/clinica_ampliada_equipe_referencia_2ed_2008.pdf
  • ______. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Política Nacional de Educação Permanente em Saúde Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2009. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pacto_saude_volume9.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pacto_saude_volume9.pdf
  • ______. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. HumanizaSUS: política nacional de humanização. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizaSus_doc_base.pdf>. Acesso em: 15 mar. 2016.
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/humanizaSus_doc_base.pdf
  • ______. Presidência da República. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990: dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil Brasília, DF, 19 set. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm>. Acesso em: 15 mar. 2016.
    » http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm
  • CAMPOS, C. J. Content analysis: a qualitative data analysis tool in health care. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, DF, v. 57, n. 5, p. 611-614, 2004.
  • CAREGNATO, R. C. A.; MUTTI, R. Pesquisa qualitativa: análise de discurso versus análise de conteúdo. Texto & Contexto Enfermagem, Florianópolis, v. 15, n. 4, p. 679-84, out./dez. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/tce/v15n4/v15n4a17.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/pdf/tce/v15n4/v15n4a17.pdf
  • CAROTTA, F.; KAWAMURA, D.; SALAZAR, J. Educação permanente em saúde: uma estratégia de gestão para pensar, refletir e construir práticas educativas e processos de trabalhos. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 18, n. sup. 1, p. 48-51, jan./mar. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902009000500008>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902009000500008
  • FARAGO, C. C.; FOFONCA, E. A análise de conteúdo na perspectiva de Bardin: do rigor metodológico à descoberta de um caminho de significações. Linguasagem, São Paulo, v. 18, p. 1-5, 2007. Disponível em: <http://www.letras.ufscar.br/linguasagem/edicao18/artigos/007.pdf >. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.letras.ufscar.br/linguasagem/edicao18/artigos/007.pdf
  • FAUSTO, M. C. R. et al. A posição da Estratégia Saúde da Família na rede de atenção à saúde na perspectiva das equipes e usuários participantes do PMAQ-AB. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 38, n. esp., p. 13-33, 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-11042014000600013&script=sci_abstract&tlng=pt>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-11042014000600013&script=sci_abstract&tlng=pt
  • FERREIRA, R. C.; VARGA, C. R. R.; SILVA, R. F. Trabalho em equipe multiprofissional: a perspectiva dos residentes médicos em saúde da família. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 14, p. 1421-1428, 2009. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/240767221_Trabalho_em_equipe_multiprofissional_a_perspectiva_dos_residentes_medicos_em_saude_da_familia>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » https://www.researchgate.net/publication/240767221_Trabalho_em_equipe_multiprofissional_a_perspectiva_dos_residentes_medicos_em_saude_da_familia
  • FREIRE, P. Educação e Mudança São Paulo: Paz e Terra, 1988.
  • GUEDES, C. R.; PITOMBO, L. B.; BARROS, M. E. B. Os processos de formação na Política Nacional de Humanização: a experiência de um curso para gestores e trabalhadores da atenção básica em saúde. Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19, n. 4, p. 1087-1109, 2009. Disponível em: <http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4/v19n4a10.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielosp.org/pdf/physis/v19n4/v19n4a10.pdf
  • MEDEIROS, C. R. G.; GERHARDT, T. E. Avaliação da Rede de Atenção à Saúde de pequenos municípios na ótica das equipes gestoras. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 39, n. esp., p. 160-170, dez. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39nspe/0103-1104-sdeb-39-spe-00160.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39nspe/0103-1104-sdeb-39-spe-00160.pdf
  • MELLO, D. F. et al. Genograma e ecomapa: possibilidades de utilização na estratégia de saúde da família. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, São Paulo, v. 15, n. 1, p. 79-89, 2005. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbcdh/v15n1/09.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbcdh/v15n1/09.pdf
  • MENDES, E. V. As redes de atenção à saúde 2. ed. Brasília, DF: Organização Pan-Americana da Saúde, 2011. Disponível em: <http://www.conass.org.br/bibliotecav3/pdfs/redesAtencao.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.conass.org.br/bibliotecav3/pdfs/redesAtencao.pdf
  • OLIVEIRA, E. M.; SPIRI, W. C. Programa Saúde da Família: a experiência de equipe multiprofissional. Revista Saúde Pública, São Paulo, v. 40, n. 4, p. 727-733, 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rsp/v40n4/25.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/pdf/rsp/v40n4/25.pdf
  • OLIVEIRA, L. A. et al. Processos microrregulatórios em uma Unidade Básica de Saúde e a produção do cuidado. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 40, n. 109, p. 8-21, 2016. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-11042016000200008&script=sci_abstract&tlng=pt>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-11042016000200008&script=sci_abstract&tlng=pt
  • PASCHE, D. F.; PASSOS, E.; HENNINGTON, E. A. Cinco anos da política nacional de humanização: trajetória de uma política pública. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 16, n. 11, p. 4541-4548, 2011. Disponível em: <http://www.siga.fiocruz.br/arquivos/ss/documentos/editais/4_Artigo%202%20MP%20Rede%20Cegonha.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.siga.fiocruz.br/arquivos/ss/documentos/editais/4_Artigo%202%20MP%20Rede%20Cegonha.pdf
  • PEREIRA, A. P. D. S. et al O genograma e o ecomapa no cuidado de enfermagem em saúde da família. Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, DF, v. 62, n. 3, p. 407-416, 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/reben/v62n3/12.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/pdf/reben/v62n3/12.pdf
  • ROCHA, S. A.; SPAGNUOLO, R. S. Acolhimento na visão complexa: ação coletiva emergente na Equipe de Saúde da Família. Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 39, n. 104, p. 124-135, jan./mar. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n104/0103-1104-sdeb-39-104-00124.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/pdf/sdeb/v39n104/0103-1104-sdeb-39-104-00124.pdf
  • SAMPAIO, J. et al. Limites e potencialidades das rodas de conversa no cuidado em saúde: uma experiência com jovens no sertão pernambucano. Interface, Botucatu, v. 118, supl. 2, p. 1299-1312, 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/icse/v18s2/1807-5762-icse-18-s2-1299.pdf>. Acesso em: 18 mar. 2016.
    » http://www.scielo.br/pdf/icse/v18s2/1807-5762-icse-18-s2-1299.pdf
  • SCHUBERT, L. P. Gestão de pessoas: a valorização do trabalho e do trabalhador da saúde. 2010. 70 f. Trabalho de conclusão de curso (Especialização) - Escola de Saúde Pública Professor Mestre Osvaldo de Oliveira Maciel, Florianópois, 2010.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2017

Histórico

  • Recebido
    Mar 2017
  • Aceito
    Ago 2017
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde Av. Brasil, 4036, sala 802, 21040-361 Rio de Janeiro - RJ Brasil, Tel. 55 21-3882-9140, Fax.55 21-2260-3782 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revista@saudeemdebate.org.br