Introdução
A necessidade de aplicar o conhecimento na prática não é um fato recente, e acompanha a evolução da humanidade. Como exemplo, têm-se os primitivos caçadores que obtiveram êxito na agricultura e que transmitiram o conhecimento prático, que foi passado de geração para geração1. Em anos recentes, pesquisadores e governantes têm-se questionado em relação ao que se pode fazer para integrar e propiciar uma ponte efetiva entre pesquisa e prática2,3. Para Dias4, um desafio da investigação em saúde pública é utilizar o resultado das pesquisas científicas em ações e políticas de saúde mais eficazes que atendam às reais necessidades da população.
Assim, a aplicabilidade do conhecimento na prática é reconhecida mundialmente como um fator relevante para a melhoria da assistência prestada nos serviços de saúde4, compreendendo que a Translação/Tradução do Conhecimento (TC) é interativa e dinâmica, incluindo a síntese, a disseminação, o intercâmbio e a aplicação de conhecimento para a prática de saúde, com limites flexíveis entre criação do conhecimento e desenvolvimento das ações para produzir resultados benéficos para a sociedade5,6, ou seja, representa o processo de colocar o conhecimento em ação5,7.
Nas últimas décadas, percebe-se o aumento das pesquisas sobre como reduzir o fosso entre evidências-prática-política. Nesse sentido, diversos autores apontam estratégia para potencializar a TC reduzindo o hiato entre o conhecimento produzido e sua tradução na resolutividade dos problemas da área de saúde, na interface com outros setores e para progredir na ciência e prática de TC na área da saúde8,9.
Um campo no qual a interface entre pesquisa e ação já é bastante consolidado é o da Promoção da Saúde (PS). Este visa capacitar as pessoas para aumentar o controle e melhorar sua saúde, sendo uma preocupação e um desafio para o campo delinear os contornos e método adequado para a pesquisa da PS10. Ao refletir sobre os dilemas práticos para a PS, Potvin e McQueen11 argumentaram sobre a necessidade de ferramentas para refletir, valorizar e reproduzir as práticas da PS.
Nesse sentido, abordagens capazes de captar a dinâmica das ações dos atores envolvidos, bem como as interações que se estabelecem nesse processo de transformação do conhecimento em ação são necessárias e oportunas12. Com base na Teoria Ator-Rede (TAR), propõe-se que os elementos de uma intervenção compõem uma Rede Sociotécnica13, os quais criam eventos que mudam ou reforçam a trajetória de uma intervenção tornando-se marcadores de sua evolução14,15. Contudo, intervenções em saúde são permeadas por controvérsias, as quais surgem de diferenças entre posições, pontos de vista, projetos sociais e políticos de vários actantes, ou qualquer outra coisa em jogo entre os envolvidos13,16. Controvérsias podem desestabilizar rotinas e relações entre actantes. Chamamos de eventos-críticos aqueles que estão ligados a controvérsias, que geram consequências, e que levam à reconfiguração de uma intervenção17,18.
Dessa forma, este estudo teve como objetivo utilizar ferramenta analítica, o Cartão de Evento-Crítico (CEC), para potencializar a aplicação do conhecimento científico sobre PS na tomada de decisão, com intuito de contribuir para a melhoria na qualidade de vida dos usuários do serviço.
Procedimentos metodológicos
Pesquisa avaliativa, baseada na TAR. A partir dessa teoria, capturaram-se os eventos-críticos, considerados unidade de análise do estudo. O período para realização do estudo foi de 1992, quando da implementação das ações de PS na Unidade de Nova Aliança, situada no município de Camaçari, região metropolitana de Salvador, até 2017.
Nova Aliança possui configuração ímpar por ser uma unidade escola, a partir da parceria estabelecida entre a gestão de Camaçari e a Fundação Estatal em Saúde da Família (Fesf) do Estado da Bahia. É constituída por quatro equipes de saúde da família, composta por: médicos, enfermeiros e dentistas, os quais são residentes do primeiro ano (R1) e residentes do segundo ano (R2). Incluindo a esse grupo, temos: preceptor de enfermagem, medicina e odontologia, que trabalham 40 horas semanais diretamente com os residentes. Os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), técnicos de enfermagem, gerente da unidade, serviços gerais e administrativo compõem o quadro de funcionários do município, que se divide entre contratos, cargos comissionados e concursados.
Para construção dos dados, foram realizadas oficina e entrevistas. A oficina aconteceu com as três ACS mais antigas de Nova Aliança e teve como base a questão: ‘quais acontecimentos marcaram a história desta unidade de saúde?’, objetivando identificar os acontecimentos de PS que marcaram a Unidade.
As entrevistas aconteceram com auxílio de roteiro semiestruturado, em que as perguntas estavam relacionadas com as ações de PS implementadas na unidade, com sete usuários do conhecimento, sendo um líder comunitário (representando os usuários), um profissional da gestão (coordenador da atenção básica), um residente (médico), dois preceptores da residência (medicina e enfermagem), um servidor do município (técnico de enfermagem) e um profissional à época da Unidade Tradicional de Saúde (enfermeira). Estes foram selecionados de acordo com o envolvimento explícito com a unidade. Ao final das entrevistas, foram apresentados os acontecimentos ligados à PS que marcaram a intervenção, identificados na oficina, podendo os entrevistados acrescentar outros acontecimentos quando achassem pertinente. É relevante trazer que a relação desses acontecimentos com a PS partia da concepção dos entrevistados do que viria a ser esse conceito.
Os dados obtidos após as entrevistas semiestruturadas foram lidos, transcritos na íntegra e analisados segundo a análise de conteúdo com abordagem direcionada, já que a TAR ofertou as bases para captura dos dados. A partir da leitura exaustiva das entrevistas e dos acontecimentos identificados, extraíram-se das falas os diversos códigos preestabelecidos a partir da teoria: actantes/atuantes, interesses, interações, mediação técnica, ações, inscrições, lugar, tempo e consequências (quadro 1)19. Esse movimento facilitou na identificação dos acontecimentos que se enquadravam como evento-crítico, possibilitando a aplicação do CEC. Só poderia ser considerado como evento-crítico se preenchesse todas as categorias do cartão, se tivesse causado alguma mudança na intervenção e viesse precedido por controvérsias.
Quadro 1 Categorias analíticas do Cartão de Evento-Crítico (CEC)
Categorias | Operacionalização das categorias analíticas |
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Actante/atuante | Pretende identificar o que está em jogo para atores específicos no evento e/ou sua perspectiva particular sobre o evento. |
Interação | Indica como diferentes grupos e organizações trabalharam juntos e fizeram alterações. |
Mediação | Entendida como um processo, a transformação de uma situação, que leva à redefinição do problema e às relações entre os agentes do sistema. |
Ação | Identifica práticas, atividades, processos de trabalho realizados por atores no surgimento, implementação e estabilização de um evento. |
Inscrição | Todos os tipos de transformação que materializa uma entidade em um sinal, arquivo, documento, pedaço de papel, traço. |
Consequências | Resultados dos eventos críticos, o que foi produzido após a controvérsia, que poderia ser a restabilização ou a ruptura da intervenção. |
Fonte: Oliveira et al.19.
Este estudo foi realizado seguindo os preceitos éticos definidos nas resoluções vigentes e foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa – CEP/Instituto Aggeu Magalhães – IAM, sendo aprovado com o CAAE 73416217.3.0000.5190.
Resultados
Com a aplicabilidade do CEC, foram identificados três eventos-críticos ligados à PS que geraram mudanças na unidade de saúde de Nova Aliança, quais sejam: Chegada do Programa de Agentes Comunitários (Pacs) em Nova Aliança; Implantação do 1º Conselho Local de Saúde; e Implantação do Programa de Residência Multiprofissional e de Medicina de Família e Comunidade.
A utilização da ferramenta permitiu a compreensão de cada evento-crítico em relação ao desenvolvimento das ações de PS. Os ‘actantes/atuantes’ que conformaram a rede na intervenção foram tanto atuantes humanos – profissionais da gestão, profissionais do Pacs, profissionais da Estratégia Saúde da Família, usuários, líderes comunitários, residentes – como não humanos: conhecimento científico, especialidades médicas, acolhimento, diálogo, conceito de PS, conselho de saúde, programa de residência, Fesf, dentre outros.
Cabe destaque a dois atuantes não humanos identificados: o programa de residência e o conceito de PS. O programa de residência por meio do processo ensino-serviço torna-se um facilitador para realização das ações de PS, discutindo o conceito de PS a partir da problematização dos determinantes sociais. Além dos determinantes sociais, a residência discute com seu corpo pedagógico formas para se ampliar o acesso, melhorando o contexto de vida na comunidade.
A residência puxa muito mais isso, porque é um local de formação, é um local que tem gente pensando sobre isso, pensando em avançar, pensando em desenvolver um sistema de saúde melhor, então quando você fica ali naquela reflexão, isso acaba apontando para um norte, mas os servidores na caminhada acabam sendo puxados pra isso e também vão participando nisso. E3.
Esse conceito de PS trabalhado pela residência, portanto, vai bem mais além do que a ausência de doença, atuando realmente sobre os determinantes sociais, que seriam as condições de moradia, educação, saneamento básico, renda, trabalho, alimentação e lazer. Preocupa-se com os problemas socioambientais, valorizando e incentivando políticas públicas que visem à transformação social.
Percebe-se que os atuantes compartilharam suas ações para mudanças na política, prática e prestação de serviços de saúde, e agiram como usuários do conhecimento garantindo a utilização deste para a tomada de decisões.
Discutia o melhor para a comunidade, e iam em busca das melhorias. Trouxe muita melhoria pra comunidade, aconteceu até reforma, não foi? Uma pequena reforma aqui dentro, o conselho estava sim na linha de frente, buscando e vendo essa necessidade. (Rosa).
Compreender o modo de ação das intervenções permitiu identificar os ‘interesses’ dos atuantes, podendo estes serem convergentes ou divergentes em relação a algumas ações, inclusive ações de PS, a depender do período estudado.
Foi visto que, no evento-crítico 1, havia interesses opostos entre comunidade e ACS: enquanto a primeira valorizava as unidades de saúde tradicionais e não apoiavam a intervenção, os ACS possuíam interesse pelo programa, realizando várias ações sem apoio da gestão municipal ou participação de outros integrantes da equipe, agindo como um agente agregador, um nó na rede.
Observa-se que os interesses conflitantes podem ser modificados a depender das articulações estabelecidas na Rede Sociotécnica. Percebe-se que, no evento crítico 2, uma aliança entre atuantes foi conformada por comunidade, profissionais da unidade básica e do Pacs, em decorrência da ação do atuante não humano Conselho Local de Saúde. Essa articulação foi fruto do empoderamento dos usuários e de um interesse comum: as mudanças sociais a partir da ‘interação’ entre a saúde, comunidade e outros setores. Tal afirmação fortalece a intersetorialidade e as ações de PS.
É importante frisar que nesse conselho local, a gente inseriu de forma direta, a gente inseriu a comunidade, de forma direta. (Rosa).
Esse empoderamento da comunidade ganhou solidez com o evento-crítico 3, sendo o programa de residência multiprofissional e de medicina de família e comunidade estabelecido naquele território a partir do ‘interesse’ entre a gestão municipal e a Fesf. Entretanto, a rede estabelecida foi desfeita a partir do desinteresse dos servidores da unidade, dificultando inicialmente a realização do processo de trabalho e, consequentemente, as ações de PS.
Percebe-se que a divergência de interesses está intimamente relacionada com o contexto e com o tempo. Esse processo de evolução das intervenções é caracterizado por controvérsias e por ‘mediadores’ que estabilizam a rede formada a partir destas interações. Pode-se destacar como mediadores cruciais alguns profissionais da gestão, sendo acompanhados também por suas ferramentas didáticas e tecnológicas, mediadores não humanos que facilitaram o processo de trabalho e as relações, levando à sustentabilidade da intervenção e nos avanços das ações de PS.
Ela fez o programa crescer e avançar, porque apesar do município não oferecer condições, mas ela criava situações onde a gente pudesse ser mais capacitadas, onde a gente pudesse... ela buscava junto ao Ministério da Saúde e trazia, e com isso a gente já aprendeu muito, com isso. (Orquídea).
O diálogo também foi um ‘mediador’ das relações, sendo utilizado a partir de ferramentas como: acolhimento e reunião de equipe. Alguns atores específicos, como a médica preceptora e os novos residentes, também podem ser considerados mediadores para continuidade do processo. Com o CEC, teve-se a possibilidade de identificar os principais pontos de fragilidades para uma posterior tomada de decisão, sendo o diálogo um fator crucial na implantação de uma intervenção.
Na verdade, não foi a gente só, foi todos os profissionais da unidade. Nenhum foi colocado ‘vai chegar tal dia, vem pra botar tal coisa’, isso não aconteceu. (Girassol).
Por intermédio das interações e das mediações, portanto, foi-se melhorando as relações e estabilizando a rede de aliados, sendo, a partir destas, realizado o estabelecimento das ‘ações’ para a PS. Pode-se identificar a partir do evento-crítico 1: mapeamento de áreas e construção de mapa estatístico; sala de espera com palestras; visitas domiciliares; cadastramento de áreas; grupo de Idosos e palestras no território. Essas ações estão presentes no CEC, o que facilita no processo avaliativo dos tomadores de decisões. Entre as ações desenvolvidas relacionadas com o evento crítico 2, estavam: reuniões mensais na comunidade, levantamento de problemas na comunidade e propostas para melhoria em diversas áreas.
As ações estabelecidas em Nova Aliança com a residência foram: territorialização, cadastramento de usuários, acolhimento à demanda espontânea, visita domiciliar, organização de grupos e ações voltadas para prevenção e promoção da saúde, como: grupo de gestante, Programa Saúde na Escola (PSE), consulta coletiva etc. Independentemente de toda dificuldade encontrada, os resultados positivos do trabalho desenvolvido na comunidade pelas turmas de residência geraram impactos também no processo de formação, ampliando o olhar integral ao usuário pelos residentes e servidores. Os grupos de PS desenvolvidos traziam a participação dos usuários, sendo conduzidos, muitas vezes, por estes.
O último grupo que teve, o último encontro foi uma usuária que estava facilitando. Ela faz karatê e ela trouxe pra o grupo, ela é faixa amarela do Karatê sei lá, alguma coisa assim. Ela trouxe para o grupo essa atividade, então ela facilitou o processo. Então, é uma coisa que a gente busca, é paulatino, mas é uma coisa que a gente busca. A ideia é exatamente essa, é que depois os usuários possam eles mesmos, elas mesmo tocarem o grupo e tendo uma independência maior das unidades de saúde. E1.
Além das ações avaliadas, é pertinente trazer que toda mudança leva a ‘consequências’, o que nos diz o quão importante foi determinado programa. Como ‘consequência’ para intervenção a partir do evento-crítico 2, tivemos: um maior fortalecimento do controle social, melhorias (reforma) para unidade de Nova Aliança a partir das articulações do conselho e um fortalecimento da comunidade para mudanças sociais. A categoria consequência também foi avaliada no estudo, sendo identificada com a chegada do Pacs: aumento de cobertura vacinal em crianças, melhora nas condições de saúde da população e maior organização do processo de trabalho do Pacs.
Reduziu muito os casos de sarampo, de paralisia infantil, muito, muito mesmo. A gente foi muito parabenizado por isso. (Girassol).
Por fim, as ‘consequências’ descritas no CEC geradas pelo evento-crítico 3 foram inúmeras. Uma das mais importantes foi a mudança de modelo assistencial após a chegada da residência, rompendo com um modelo vigente há mais de 30 anos, aperfeiçoamento no processo de trabalho, melhorando o acolhimento aos usuários, melhora nos níveis de saúde daquela população e uma maior integração com a comunidade.
Discussões
O estudo objetivou mostrar a utilização de uma ferramenta analítica para identificação e análise de eventos críticos, e o potencial desta para a aplicação do conhecimento científico na tomada de decisão. Constatou-se que as categorias analíticas baseadas na TAR formam um conjunto de elementos potentes para entender a complexidade das intervenções e explicar o processo de TC, sendo uma abordagem interativa e flexível, conforme tem sido preconizado pelos estudos de TC20,21. Concebe-se que a TC é um sistema de ações que operam com Rede Sociotécnica que produzem inovações, criam e reconfiguram as ligações entre atuantes22.
Observando os achados referentes aos actantes/atuantes, percebe-se que a criação de redes e a construção de ‘cooperações efetivas’ fortaleceram as relações entre os envolvidos, criando nós que permitiram a aplicação de conhecimentos relacionados à PS14,23. O uso da TAR possibilitou o reconhecimento de actantes que se relacionam em Rede Sociotécnica. Estes actantes não são apenas os envolvidos tradicionalmente no processo de construção do conhecimento, como os usuários já elencados pela literatura, mas um conjunto de entidades que, no geral, não são consideradas.
Cabe destaque para o atuante não humano: conceito de PS. Analisando-o, observa-se a relação que as intervenções possuem com o tempo e o espaço em que ela se desenvolve. De acordo com Latour24, o fato de esse conceito ser rastreado, gerando traços e marcas na intervenção, o tornam um não humano na rede, estando este estudo de acordo com o que a teoria aborda. O foco inicial da PS ligado à prevenção de doença e à evolução do conceito para o foco dos determinantes sociais nos traz consequências nas implementações das ações de promoção e nas redes construídas a partir de cada abordagem. Valorizar esse achado, o próprio conhecimento, os recursos tecnológicos e todo o conjunto de atores não humanos interagindo e agindo dentro da intervenção facilita a TC.
O conhecimento ocorre em um fluxo ativo e multidirecional de informações25, em que as interações e as trocas se estabelecem entre uma ampla gama de interessados; compreendendo tal aplicabilidade na intervenção, a partir da interação complexa entre todos os atuantes do processo, com múltiplos fatores determinando e interferindo como o conhecimento baseado em pesquisa encontrado no caminho para a prática26.
Compreender as intervenções a partir da TAR possibilitou conectar universos inicialmente distantes, negociando interesses na (re)configuração das suas identidades e relações, percebendo a TC como um ente distinto. As interações evidenciadas nos eventos-críticos foram produto de alianças que interferem e sofrem interferência de relações que são alinhadas em virtude de objetivos comuns27.
Os mediadores aqui identificados foram capazes de transformar, traduzir, distorcer e modificar os significados28, potencializando as ações dentro de um universo, de uma rede constituída de uma heterogeneidade de mediadores. Na ocorrência das ações decorrentes dos eventos-críticos, foi indispensável a medição do ‘diálogo’, por exemplo, que permitiu a criação de vínculos que não existiam29.
Assim, compreendem-se que a ferramenta analítica CEC pode colaborar para o ciclo de ação ou aplicação proposto por Graham, pois permite compreender as intervenções, suas interações com o contexto local, bem como as possíveis barreiras e facilitadores no processo de tradução desse conhecimento para a prática clínica18,30. A necessidade do uso de ferramentas que traduzam os resultados das investigações em linguagem e formatos direcionados para a tomada de decisão deve ser um preceito adotado pelos usuários do conhecimento. Sabe-se que o uso de estratégias garante uma pesquisa mais relevante e melhor utilização dos resultados da investigação, bem como propiciam a ampliação da rede de aliados.
É oportuno explicitar ainda que a pesquisa translacional é útil para tomadores de decisão se beneficiarem dos conhecimentos científicos produzidos31, avaliando para além da eficácia das intervenções. Compreende-se também como fatores podem potencializar os usos dessas intervenções em contextos reais32. Esse campo envolve ainda colaboração entre todos os usuários do conhecimento, incluindo pesquisadores (dentro e entre as disciplinas), decisores políticos e gestores, prestadores de cuidados de saúde e consumidores (ou seja, pacientes, familiares e cuidadores informais)8,33.
Outro ponto que pode ser destacado é que se pode melhorar o potencial de aprendizagem das organizações, permitindo-lhes assimilar e aplicar o conhecimento34. Como aponta Proctor et al.34, é necessário, para efetivar a pesquisa translacional, tanto um corpo de pesquisa e teoria que informe processos de implementação eficazes quanto a força de trabalho de pesquisa capaz de conduzir estudos rigorosos e relevantes.
Considerações finais
Compreende-se que, ao analisar ferramentas analíticas como o CEC, pode-se encontrar caminhos para aplicação de conhecimento e, consequentemente, melhorar a utilização de resultados de pesquisa na prática. Desse modo, salienta-se que a ciência de implementação tem uma relevância prática. Nesse sentido, o alcance desta discussão está em superar as poucas pesquisas realizadas na América Latina e em convocar os diversos atores no cenário nacional, no que diz respeito à pesquisa translacional, a estabelecer um olhar distinto para a aplicação do conhecimento que possa melhorar os resultados de saúde.