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Experiências de acesso à saúde bucal de mulheres em situação de rua

Experiences of access to oral health of homeless women

RESUMO

O objetivo deste estudo foi compreender a experiência de acesso a ações e serviços de saúde bucal de mulheres em situação de rua na cidade de Teresina, Piauí. Pesquisa qualitativa, norteada pelo paradigma interpretativo, desenvolvida com mulheres em situação de rua acompanhadas por instituições de referência. Os dados foram obtidos mediante entrevistas semiestruturadas, gravadas e transcritas. As análises foram baseadas na hermenêutica de Hans-Georg Gadamer (2015) associada às contribuições de Paul Ricoeur (1976). Foram realizadas 13 entrevistas, identificando-se duas unidades de significado: Sermulher em situação de rua; e Acesso a ações e serviços de saúde bucal. Diversas problemáticas cruzam as vidas das mulheres em situação de rua, sendo agravadas pela condição de gênero. Precárias condições de saúde bucal e dificuldade de acesso a ações e serviços de saúde bucal foram indicadas nas narrativas. É imperativo que as políticas existentes sejam postas em prática e contemplem as peculiaridades femininas. Apesar de todos os cirurgiões-dentistas da rede serem responsáveis pela atenção à saúde bucal das pessoas em situação de rua, a presença de um membro da saúde bucal dentro da equipe de consultório da rua foi apontada como necessária.

PALAVRAS-CHAVE
Saúde bucal; Acesso aos serviços de saúde; Pessoas em situação de rua; Saúde da mulher; Hermenêutica

ABSTRACT

This study aimed to understand the experience of access to oral health initiatives and services of homeless women in the city of Teresina, Piauí. A qualitative research, guided by the interpretative paradigm, was conducted with homeless women who were under the care of specialized institutions. The data were obtained using semi-structured interviews, which were recorded and transcribed. The analyses of the interviews were based on the hermeneutics of Hans-Georg Gadamer (2015), combined with the contributions of Paul Ricoeur (1976). Thirteen interviews were conducted, identifying two units of meaning: Being-woman and homeless; and Access to oral health initiatives and services. Poor oral health conditions and difficulty in accessing oral health initiatives and services were reported by the participants. Those problems were aggravated by the status of being a woman. The existing health policies should be put into practice and should, additionally, take into account female peculiarities. Although the public health system is available for the oral health care of homeless people, the Street Clinic service would benefit from the participation of an oral health professional.

KEYWORDS
Oral health; Health services accessibility; Homeless persons; Women’s health; Hermeneutic

Introdução

O acesso aos serviços de saúde diz respeito a perceber a existência de uma necessidade de assistência à saúde e agir em busca dessa assistência. Barreiras ao acesso e ao uso dos serviços de saúde, incluindo os serviços odontológicos, têm sido observadas no Brasil e em países como México, Estados Unidos da América e África do Sul. Essas barreiras podem estar relacionadas com acessibilidade (barreiras geográficas), necessidades de saúde dos indivíduos, características dos serviços de saúde e características socioeconômicas e demográficas11 Carreiro DL, Souza JGS, Coutinho WLM, et al. Acesso aos serviços odontológicos e fatores associados: estudo populacional domiciliar. Ciênc. saúde colet. 2019; 24(3):1021-32., 22 Starfield B. Atenção Primária: Equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília, DF: UNESCO; Ministério da Saúde; 2002.. Ao entender que o acesso e o uso dos serviços odontológicos são influenciados pelas desigualdades sociais e econômicas, é importante considerar a situação de populações em vulnerabilidade social, como a População em Situação de Rua (PSR). Esse grupo está envolto em determinantes sociais que influenciam na saúde, como pobreza extrema, vínculos familiares fragilizados, uso de álcool e outras drogas e problemas de saúde mental33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009..

Diante dessas questões, a Política Nacional para a População em Situação de Rua (PNPSR) surgiu para facilitar o acesso aos serviços e programas de saúde para essa população44 Brasil. Decreto nº 7.053, 23 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 23 Dez 2009.. Em conformidade com a PNPSR, a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) estipulou a Equipe de Consultório na Rua (eCR) para garantir ações de Atenção Básica (AB) voltadas para atender às necessidades de saúde da PSR55 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 122 de 25 de janeiro de 2012. Define as diretrizes de organização e funcionamento das equipes de Consultório na Rua. Diário Oficial da União. 25 Jan 2012., 66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017.. Essa equipe pode ser composta por enfermeiro, psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, médico, agente social, técnico ou auxiliar de enfermagem, técnico em saúde bucal, cirurgião-dentista, profissional/professor de educação física e profissional com formação em arte e educação. De acordo com o número e a categoria profissional presente, as eCR podem ser classificadas nas modalidades I, II ou III. É previsto que o técnico em saúde bucal e/ou o cirurgião-dentista possam compor qualquer uma das modalidades citadas. Quando da presença de um técnico em saúde bucal, este terá todas suas atividades obrigatoriamente supervisionadas por um cirurgião-dentista vinculado a uma Equipe de Saúde da Família (e-SF), a qual também será responsável pelo atendimento da população e pela programação de atividades em conjunto com o técnico em saúde bucal da eCR55 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 122 de 25 de janeiro de 2012. Define as diretrizes de organização e funcionamento das equipes de Consultório na Rua. Diário Oficial da União. 25 Jan 2012., 77 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.029, de 20 de maio de 2014. Amplia o rol das categorias profissionais que podem compor as Equipes de Consultório na Rua em suas diferentes modalidades e dá outras providências. Diário Oficial da União. 20 Maio 2014..

Apesar disso, a PSR ocupa um espaço desfavorecido no sistema de saúde nacional e possui muitas necessidades de saúde bucal33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009., 88 Aguiar MM, Iriart JAB. Significados e práticas de saúde e doença entre a população em situação de rua em Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública. 2012; (28):115-24., 99 Bernardino RMP, Silva AM, Costa JF, et al. Dental caries experience and associated factors among Brazilian homeless persons: a cross-sectional study. Int. J. Odontostomat. 2020; 14(4):564-571., 1010 Hino P, Santos JO, Rosa AS. Pessoas que vivenciam situação de rua sob o olhar da saúde. Rev Bras Enferm. 2018; (71):684-92., 1111 Silva LMA, Monteiro IS, Araújo ABVL. Saúde bucal e consultório na rua: o acesso como questão central da discussão. Cad. Saúde Colet. 2018; (26):285-91., 1212 Lawder JAC, Matos MA, Souza JB, et al. Impacto da condição dentária na qualidade de vida de indivíduos em situação de rua. Rev Saude Publica. 2019; (22):1-10.. A questão se agrava quando se analisa a saúde da mulher em situação de rua, com sua condição de vulnerabilidade e risco maiores, pois as dificuldades sociais dessa situação somam-se às dificuldades de gênero. A violência e o abuso sexual, por exemplo, são pontos importantes, haja vista que ser mulher as torna mais propensas a sofrer violência de gênero no cotidiano da rua. A gravidez não planejada também é outra problemática, que é agravada quando estão presentes o uso de álcool, cigarro e drogas ilícitas, práticas comumente observadas entre as mulheres gestantes em situação de rua. Além disso, Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), que são frequentes na PSR, podem ser pioradas pela questão de gênero1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012., 1414 Costa SL, Vida CPC, Gama IA, et al. Gestantes em situação de rua no município de Santos, SP: Reflexões e desafios para as políticas públicas. Saude soc. 2015; (24):1089-102., 1515 Rosa AS, Brêtas ACP. A violência na vida de mulheres em situação de rua na cidade de São Paulo, Brasil. Interface (Botucatu). 2015; (19):275-85., 1616 Villa EA, Pereira MO, Reinaldo AMS, et al. Perfil sociodemográfico de mulheres em situação de rua e a vulnerabilidade para o uso de uso de substâncias psicoativas. Rev enferm UFPE on line. 2017; (11):2122-31., 1717 Sanchotene IP, Antoni C, Munhós AAR. MARIA, MARIA: concepções sobre ser mulher em situação de rua. Textos Context (Porto Alegre). 2019; (18):146-60., 1818 Souza MRR, Oliveira JF, Chagas MCG, et al. Gênero, violência e viver na rua: vivências de mulheres que fazem uso problemático de drogas. Rev Gaúcha Enferm. 2016; 37(3):e59876..

A prevalência de traumatismos maxilofaciais causados por violência em mulheres é de até 63,2% no Brasil1919 Chaves AS, Lund RG, Martos J, et al. Prevalência de traumatismos maxilofaciais causados por agressão ou violência física em mulheres adultas e os fatores associados: uma revisão de literatura. RFO UPF. 2018; (23):60-7.. Ademais, algumas IST podem desenvolver alterações bucais. Na sífilis, por exemplo, as manifestações bucais mais frequentes são o cancro duro, as placas mucosas e as gomas, além dos incisivos de Hutchinson e molares em amora no caso de sífilis congênita2020 Kalinin Y, Neto Passarelli A, Passarelli DHC. Sífilis: aspectos clínicos, transmissão, manifestações orais, diagnóstico e tratamento. Odonto. 2015; (23):65-76.. Os pacientes soropositivos podem desenvolver várias lesões orais, sendo que as mais prevalentes são: infecções fúngicas (candidíase e queilite angular); infecções bacterianas (doença periodontal e gengivite ulceronecrosante); infecções virais (herpes simples e leucoplasia pilosa oral); e lesões neoplásicas (sarcoma de Kaposi)2121 Paulique NC, Cruz MCC, Simonato LE, et al. Manifestações bucais de pacientes soropositivos para HIV/AIDS. Arch Heal Invest. 2017; (6):240-4..

Já a gravidez provoca modificações hormonais que podem refletir na modulação de sinais e sintomas da Doença Periodontal (DP). Adicionalmente, a DP pode ser considerada fator de risco para o parto prematuro, baixo peso ao nascer, diabetes gestacional e pré-eclâmpsia2222 Carvalho G, Santos R, Camiá G, et al. Saúde Bucal na gestação e suas implicações para a gestante e feto: perspectivas do enfermeiro durante o pré-natal. Braz J Health Rev. 2019; (2):4345-61.. Destaca-se ainda que o uso de álcool, cigarro e drogas ilícitas, independentemente de haver gestação ou não, pode predispor danos à saúde bucal, indo desde manchamento nos dentes e halitose até cárie, DP e câncer bucal. Além disso, essas substâncias podem aumentar o limiar de dor da pessoa, mascarando a sintomatologia dolorosa de lesões orais e agravando a situação, pois o usuário demorará a buscar um serviço de saúde bucal2323 Marques L, Lotif M, Rodrigues Neto E, et al. Abuso de drogas e suas consequências na saúde bucal: uma revisão de literatura. Rev Faculdade Odontol Lins. 2016; (26):29-35.. Todos esses fatos reforçam a necessidade de ações de saúde bucal para as mulheres em situação de rua. Assim, o objetivo deste estudo foi compreender a experiência de acesso a ações e serviços de saúde bucal de mulheres em situação de rua em Teresina, Piauí.

Material e métodos

Estudo qualitativo, norteado pelo paradigma interpretativo, com referencial teórico da hermenêutica, realizado a partir de entrevistas individuais usando roteiro semiestruturado com mulheres em situação de rua em Teresina, Piauí.

Teresina, capital do Piauí, estado situado na região Nordeste, tem uma população estimada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 871.126 pessoas em 2021. O Índice de Desenvolvimento Humano municipal é de 0,751 em 2010, e um Índice de Gini da distribuição do rendimento real efetivo domiciliar per capita de 0,51 em 20032424 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Conheça cidades e estados do Brasil: Teresina. [acesso em 2022 set 27]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pi/teresina.
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pi/te...
. À época do I Censo e Pesquisa Nacional sobre a PSR, o município contava com uma população de 370 pessoas em situação de rua, com predominância do sexo masculino33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009.. Em pesquisa realizada na cidade, com 176 pessoas em situação de rua, 98,9% apresentaram experiência de cárie dentária, com número médio de dentes permanentes cariados, perdidos e obturados (CPO-D) de 11,0±6,9599 Bernardino RMP, Silva AM, Costa JF, et al. Dental caries experience and associated factors among Brazilian homeless persons: a cross-sectional study. Int. J. Odontostomat. 2020; 14(4):564-571.. O município de Teresina adotou a Estratégia Saúde da Família (ESF) como modelo prioritário de atenção básica, com cobertura de 100% da população. Atualmente possui uma rede de AB composta por 90 Unidades Básicas de Saúde (UBS), que atendem a demandas agendadas e espontâneas. Entre outros serviços, são 264 e-SF, 241 equipes de saúde bucal e um Consultório na Rua2525 APS Redes Inovação na Gestão do SUS. Organização da Atenção Primária em Teresina. [acesso em 2022 set 27]. Disponível em: https://apsredes.org/organizacao-da-atencao-primaria-em-teresina/.
https://apsredes.org/organizacao-da-aten...
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Para garantir a transparência e a completude dessa produção, seguiu-se o Standards for Reporting Qualitative Research2626 O’Brien BC, Harris IB, Beckman TJ, et al. Standards for reporting qualitative research: A synthesis of recommendations. Acad Med. 2014; (89):1245-51.. As participantes foram recrutadas enquanto aguardavam atendimento nos serviços municipais de referência para o cuidado à PSR: Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua de Teresina-PI (Centro POP), Albergue Municipal ‘Casa do Caminho’ e UBS de referência da eCR (UBS Dr. José Ribeiro de Carvalho). Ocorreram entrevistas nos três cenários de pesquisa e foram incluídas treze mulheres maiores de 18 anos, cadastradas em ao menos um dos serviços de referência. Cinco foram excluídas por, após avaliação do pesquisador-entrevistador e/ou serviços de psicologia dos locais, estarem em condições que impossibilitassem a comunicação oral (como estar visivelmente sob efeito de álcool/ drogas). O recrutamento das participantes foi por conveniência, até a saturação teórica2727 Fontanella BJB, Luchesi BM, Saidel MGB, et al. Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cad. Saúde Pública. 2011; (27):389-94., entre agosto/2019 e fevereiro/2020, após imersão prévia do pesquisador de campo nesses espaços, visando a aculturação e ambientação2828 Ribeiro DVA, Azevedo RCS, Turato ER. Por que é relevante a ambientação e a aculturação visando pesquisas qualitativas em serviços para dependência química? Ciênc. saúde coletiva. 2013; 18(6):182734..

Além de temas gerais de identificação pessoal, o modo de viver nas ruas e os motivos que as levaram a tal situação, o roteiro semiestruturado das entrevistas incluiu os seguintes questionamentos: ‘quando há necessidade ou problema de saúde bucal, o que costuma fazer?’; ‘caso ocorra, onde e como conseguiu consulta com dentista e o que achou desta consulta/tratamento?’; e ‘mudaria algo no modo como foi atendida?’.

A entrevista foi realizada em sala reservada, contando somente com a presença da entrevistada e do pesquisador. O pesquisador de campo passou por experimentação do roteiro e desenvolvimento da técnica de entrevista e conduziu a produção de dados após fundamentação teórico-conceitual e metodológica oportunizada por meio de encontros quinzenais em grupo de pesquisa sobre estudos qualitativos, durante o primeiro e o segundo semestre de 2018. As entrevistas foram gravadas em áudio, e as transcrições foram realizadas. Os dados foram arquivados em um drive para acesso de todos os pesquisadores, exclusivamente. As transcrições foram compartilhadas com as participantes para comentários e correções.

A análise de dados ocorreu em blocos de três, adotando o referencial teórico da hermenêutica de Hans-Georg Gadamer2929 Gadamer H. Verdade e método. 15. ed. Bragança Paulista: Petrópolis: Vozes; 2015., associado às contribuições de Paul Ricoeur3030 Ricoeur P. Teoria da Interpretação: o discurso e o excesso de significação. Lisboa: Edições 70; 1976.. A análise e interpretação das narrativas ocorreram em três fases: leitura inicial do texto, leitura crítica e apropriação3131 Terra MG, Gonçalves LHT, Santos EKA, et al. Fenomenologia-hermenêutica de Paul Ricoeur como referencial metodológico numa pesquisa de ensino em enfermagem. Acta Paul Enferm. 2009; (22):93-9.. O pesquisador de campo realizou as transcrições das entrevistas na íntegra. Houve conferência dos dados transcritos com os coletados, sendo as transcrições validadas por outro pesquisador. A codificação dos dados foi auxiliada pelo pesquisador docente coorientador, para identificar as unidades de significado. Essas unidades foram geradas indutivamente, sem utilização de softwares. Os resultados foram discutidos com o pesquisador de campo e com outros dois pesquisadores proponentes do trabalho e com expertise no assunto, garantindo a checagem por membros3232 Patias ND, Hohendorff JV. Quality criteria for qualitative research articles. Psicol estud. 2019; (24):1-14..

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí, sob o número 3.724.147. Destaca-se que a anonimização dos dados pessoais foi mantida, segundo critérios da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018). Os nomes das participantes aqui apresentadas são fictícios.

Resultados e discussão

Treze mulheres participaram desta pesquisa, em entrevistas com média de 30 minutos de duração. Dez participantes estavam em situação de rua há mais de um ano. Três mulheres relataram episódios de violência, e dez manifestaram drogadição. Onze relataram algum problema de saúde bucal quando em situação de rua, e, destas, sete procuraram serviço odontológico. Ao analisar suas narrativas, identificaram-se duas unidades de significado, a saber: Ser-mulher em situação de rua; e Acesso a ações e serviços de saúde bucal.

Ser-mulher em situação de rua

As narrativas indicaram aspectos do processo de ida à rua, de como se percebem e de como sobrevivem nessa situação. Entre os elementos dessa condição, o fator familiar é uma das principais causas para a situação de rua33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009., 1616 Villa EA, Pereira MO, Reinaldo AMS, et al. Perfil sociodemográfico de mulheres em situação de rua e a vulnerabilidade para o uso de uso de substâncias psicoativas. Rev enferm UFPE on line. 2017; (11):2122-31. e esteve presente em várias narrativas do estudo: “tenho uma família que briga, é desunida” (Elis); e, “estou aqui na rua, porque namoro com um rapaz e minha família não aceita” (Liniker). O rompimento ou o enfraquecimento de vínculos familiares leva a situações de isolamento e de solidão. As pessoas não se sentem pertencentes a nenhuma unidade familiar ou comunitária, revelando um quadro de desamparo e abandono, tornando-as menos protegidas e mais vulneráveis3333 Escorel S. Vidas ao léu: Trajetórias de exclusão social. Rio de janeiro: Zahar; 2006., 3434 Cunha JG, Garcia A, Silva TH, et al. Novos arranjos: lançando um olhar sobre os relacionamentos interpessoais de pessoas em situação de rua. Gerais: Rev Interinst Psicol. 2017; 10:95-108.. É fato que há situações em que o viver na rua é uma escolha dos indivíduos, em uma busca por liberdade: “às vezes, a pessoa fica na rua por querer ficar no ar livre, o meu caso é por querer” (Gal). Essa sensação de liberdade ocorre, pois, em uma estrutura familiar, há responsabilidades que não existem na rua; além de que o âmbito domiciliar é, por vezes, um ambiente considerado opressor e perigoso, no qual as mulheres sofrem violências. Nesses casos, a rua torna-se um local de fuga33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009., 1717 Sanchotene IP, Antoni C, Munhós AAR. MARIA, MARIA: concepções sobre ser mulher em situação de rua. Textos Context (Porto Alegre). 2019; (18):146-60., 3434 Cunha JG, Garcia A, Silva TH, et al. Novos arranjos: lançando um olhar sobre os relacionamentos interpessoais de pessoas em situação de rua. Gerais: Rev Interinst Psicol. 2017; 10:95-108., 3535 Andrade LP, Costa SL, Marquetti FC. A rua tem um ímã, acho que é a liberdade: potência, sofrimento e estratégias de vida entre moradores de rua na cidade de Santos, no litoral do Estado de São Paulo. Saude soc. 2014; (23):1248-61..

Nesse quesito, a violência figurou nas narrativas nas formas física, sexual, psicológica/ moral, verbal, estrutural, institucional, simbólica e intervenção legal. Ressalta-se que ser mulher as torna mais propensas a sofrer situações de violência na rua, em uma relação em que o sexo masculino se impõe sobre o feminino, levando à violência de gênero1010 Hino P, Santos JO, Rosa AS. Pessoas que vivenciam situação de rua sob o olhar da saúde. Rev Bras Enferm. 2018; (71):684-92., 1515 Rosa AS, Brêtas ACP. A violência na vida de mulheres em situação de rua na cidade de São Paulo, Brasil. Interface (Botucatu). 2015; (19):275-85., 1717 Sanchotene IP, Antoni C, Munhós AAR. MARIA, MARIA: concepções sobre ser mulher em situação de rua. Textos Context (Porto Alegre). 2019; (18):146-60., 1818 Souza MRR, Oliveira JF, Chagas MCG, et al. Gênero, violência e viver na rua: vivências de mulheres que fazem uso problemático de drogas. Rev Gaúcha Enferm. 2016; 37(3):e59876.. Casos de agressão física e/ou sexual entre a PSR são os mais relatados1010 Hino P, Santos JO, Rosa AS. Pessoas que vivenciam situação de rua sob o olhar da saúde. Rev Bras Enferm. 2018; (71):684-92., concordando com o seguinte trecho: “sou vítima de violência doméstica e, meu agressor, meu pai, me batia na cabeça; depois trabalhei informalmente e fui estuprada, mas não denunciei” (Elza).

Também foi referido o uso de álcool e outras drogas:

Eu bebia muito e quando minha mãe faleceu, eu bebi mais ainda, e fumo muito também. (Sandra).

Quando eu estou sentindo qualquer problema eu tomo um copo de cachaça. (Bethânia).

Para dor de dente eu tomava logo era cachaça, fica tudo anestesiado. (Cássia).

Além do caráter recreativo e socializador, pois a cachaça está constantemente presente nas rodas de conversas da PSR, o consumo de substâncias psicoativas pode amenizar a percepção de incômodos e garantir esquecimento e bem-estar ante as adversidades da vida na rua88 Aguiar MM, Iriart JAB. Significados e práticas de saúde e doença entre a população em situação de rua em Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública. 2012; (28):115-24., 3434 Cunha JG, Garcia A, Silva TH, et al. Novos arranjos: lançando um olhar sobre os relacionamentos interpessoais de pessoas em situação de rua. Gerais: Rev Interinst Psicol. 2017; 10:95-108., 3636 Monteiro FKV, Almeida LP. A exclusão social de mulheres moradoras de rua: questões de gênero e políticas sociais. In: Silva PC, organizador. Territorio(s), género, trabajo y políticas públicas en América Latina. São Paulo: Provocare; 2017. p. 117-129.. Além disso, essas substâncias influenciam o temperamento da PSR. Seus efeitos sobre o sistema nervoso central, como sonolência e diminuição dos reflexos, aumentam o risco de as mulheres em situação de rua sofrerem violência física e sexual1818 Souza MRR, Oliveira JF, Chagas MCG, et al. Gênero, violência e viver na rua: vivências de mulheres que fazem uso problemático de drogas. Rev Gaúcha Enferm. 2016; 37(3):e59876., 3636 Monteiro FKV, Almeida LP. A exclusão social de mulheres moradoras de rua: questões de gênero e políticas sociais. In: Silva PC, organizador. Territorio(s), género, trabajo y políticas públicas en América Latina. São Paulo: Provocare; 2017. p. 117-129.. Outro fato que se destaca é que o álcool e outras drogas aumentam o risco a doenças orais, tais como irritação, úlceras e edemas na mucosa oral, halitose, manchamento nos dentes, xerostomia, bruxismo, candidíase, doenças periodontais, cáries, perdas dentárias e câncer bucal2323 Marques L, Lotif M, Rodrigues Neto E, et al. Abuso de drogas e suas consequências na saúde bucal: uma revisão de literatura. Rev Faculdade Odontol Lins. 2016; (26):29-35..

A vida na rua também está relacionada com questões de saúde mental, observada na narrativa: “minha vida virou de cabeça para baixo, estou vivendo igual folha seca, deixando o vento me levar, tenho depressão e até tomo vários remédios” (Sandra). Tem-se que 9% das mulheres entrevistadas no Censo Nacional sobre a PSR afirmaram ter doenças de ordem psiquiátrica33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009.. Além disso, os abusos (físicos, sexuais, psicológicos) de que são/foram vítimas podem provocar danos à saúde mental1515 Rosa AS, Brêtas ACP. A violência na vida de mulheres em situação de rua na cidade de São Paulo, Brasil. Interface (Botucatu). 2015; (19):275-85., 1616 Villa EA, Pereira MO, Reinaldo AMS, et al. Perfil sociodemográfico de mulheres em situação de rua e a vulnerabilidade para o uso de uso de substâncias psicoativas. Rev enferm UFPE on line. 2017; (11):2122-31., 3737 Carvalho L. As causas dos transtornos mentais. In: Santana CLA, Rosa AS, organizadores. Saúde mental das pessoas em situação de rua: conceitos e práticas para profissionais da assistência social. São Paulo: Epidaurus Medicina e Arte; 2016. p. 64-7..

Sobre como elas se sentem, há uma construção social ancorada em rótulos (ou estereótipos) e preconceito, considerados importantes instrumentos de exclusão social e perda da autoestima, além de gerar constrangimento: “existem pessoas que nos veem como marginais e essa é nossa realidade, a gente sente constrangimento” (Elza). O constrangimento gerado pelos rótulos/estereótipos também é sentido quando as mulheres buscam atenção à saúde: “tem vezes que o médico trata a pessoa como se fosse nada, por ser morador de rua nos atendem só por obrigação e nos tratam com ignorância” (Alcione). O preconceito e os constrangimentos são barreiras ao acesso a serviços de saúde. Há vergonha em buscar atendimento, de modo a evitar a entrada em certos locais para não passar pelo constrangimento de serem expulsas33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009., 1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012., 3838 Silva BM, Silva VN, Andrade EGS. Dificuldades encontradas pelos moradores de rua no acesso a saúde pública. Rev Inic Cient Ext. 2019; (2):280-6.. Além disso, pode ocorrer discriminação por parte de alguns profissionais de saúde, que se mostram indiferentes e/ou até rejeitam os usuários em situação de rua88 Aguiar MM, Iriart JAB. Significados e práticas de saúde e doença entre a população em situação de rua em Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública. 2012; (28):115-24., 3939 Ferreira CPS, Rozendo CA, Melo GB. Consultório na rua em uma capital do nordeste brasileiro: o olhar de pessoas em situação de vulnerabilidade social. Cad. Saúde Pública. 2016; (32):1-10..

Diante das iniquidades sociais que enfrentam, as mulheres em situação de rua realizam diversas atividades visando ao seu sustento: “trabalho por minha conta, vendo meia, peço dinheiro, faço programa, faço artesanato” (Bethânia). Esses dados ajudam a desmistificar a imagem de que a PSR é composta unicamente por ‘mendigos’ e ‘pedintes’. A literatura aponta o desemprego como uma das causas para viver na rua, porém, nacionalmente, 70,9% das pessoas em situação de rua exercem alguma atividade remunerada. As ocupações mais frequentes das mulheres estão relacionadas com pequenas atividades do mercado informal, como coletar e vender materiais recicláveis, vigiar carros e prostituição33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009., 1616 Villa EA, Pereira MO, Reinaldo AMS, et al. Perfil sociodemográfico de mulheres em situação de rua e a vulnerabilidade para o uso de uso de substâncias psicoativas. Rev enferm UFPE on line. 2017; (11):2122-31..

Cabe destacar que conhecer o perfil de raça/cor da população orienta as ações de saúde bucal. Assim, entre a PSR do Brasil, a proporção de negros (somatório de pardos a pretos) é maior (67%) comparados aos níveis encontrados na população geral (44,6%)33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009.. Tal fato é importante, pois a vulnerabilidade da população negra é maior em relação à da branca no que se refere às iniquidades raciais em saúde bucal no Brasil, em indicadores como cárie, perda dentária, dor e necessidade de prótese4040 Guiotoku SK, Moysés ST, Moysés SJ, et al. Iniquidades raciais em saúde bucal no Brasil. Rev Panam Salud Pública. 2012; (31):135-41..

Acesso a ações e serviços de saúde bucal

A situação de rua favorece o surgimento de doenças e agrava as já existentes33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009.. Além disso, a PSR é um grupo excluído dos serviços de saúde, ficando distante do direito à atenção integral1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012.. A necessidade de acesso a tratamento de saúde bucal é relatada1111 Silva LMA, Monteiro IS, Araújo ABVL. Saúde bucal e consultório na rua: o acesso como questão central da discussão. Cad. Saúde Colet. 2018; (26):285-91. mesmo diante da PNPSR, que assegura o acesso amplo e simplificado aos serviços e aos programas de saúde44 Brasil. Decreto nº 7.053, 23 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 23 Dez 2009..

No presente artigo, observaram-se as seguintes barreiras ao acesso a ações e serviços de saúde bucal: demora em conseguir consulta; logística das marcações no sistema de saúde; exigência de documentações; e profissionais de saúde que atendem somente população residente e adscrita ao território da UBS.

A demora na marcação de consultas e o longo tempo de espera para os atendimentos são uma das barreiras para a assistência à saúde da PSR1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012., como constata-se em: “demora sim, muitas vezes passo de quinze dias a um mês para poder ser atendida, a maioria das vezes, eu não vou, até esqueço a data” (Alcione). As características da PSR devem ser consideradas por serviços e ações de saúde bucal. Uma delas é o imediatismo para com as demandas apresentadas, pois há, no viver nas ruas, uma urgência em obter o que se deseja4141 Wijk LBV, Mângia EF. O cuidado a pessoas em situação de rua pela rede de atenção psicossocial da Sé. Saúde debate. 2017; (41):1130-42.. Por isso o termo ‘imediatistas’ é um dos rótulos utilizados por alguns cirurgiões-dentistas do setor público ao se referirem à PSR1111 Silva LMA, Monteiro IS, Araújo ABVL. Saúde bucal e consultório na rua: o acesso como questão central da discussão. Cad. Saúde Colet. 2018; (26):285-91.. Deve-se entender que uma demora em ser atendida nas consultas gera reflexos na busca pela sobrevivência desse grupo, uma vez que pode significar perda de refeições e de acesso a abrigos. O imediatismo na resolução dos problemas está presente também quando a PSR dá preferência à exodontia, e não a tratamentos conservadores, que geralmente exigem mais sessões clínicas1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012..

Essa tendência para a exodontia também é decorrente da busca por serviços de saúde bucal somente diante da sintomatologia dolorosa, quando, por vezes, o único tratamento é a remoção dentária: “nunca fui ao dentista, porque nunca senti dor, nunca senti problema nenhum” (Iza); e, “de repente, eles [os dentes] doem, e só assim que procuro dentista” (Gal). Buscar ou aceitar ajuda somente diante da necessidade urgente ou piora evidente da situação releva as concepções de saúde e de cuidado desse grupo: uma visão focada em um modelo de atenção curativo, biomédico e medicalizador. Isso leva à falta de adesão da PSR aos serviços de saúde, dificultando a resolução dos problemas1111 Silva LMA, Monteiro IS, Araújo ABVL. Saúde bucal e consultório na rua: o acesso como questão central da discussão. Cad. Saúde Colet. 2018; (26):285-91., 4141 Wijk LBV, Mângia EF. O cuidado a pessoas em situação de rua pela rede de atenção psicossocial da Sé. Saúde debate. 2017; (41):1130-42., 4242 Paiva IKS, Lira CDG, Justino JMR, et al. Direito à saúde da população em situação de rua: Reflexões sobre a problemática. Ciênc. saúde colet. 2016; (21):2595-606..

A dificuldade da PSR em comparecer à consulta no dia e no horário marcado está relacionada também com esquecimento, estilo de vida na rua (marcado pelo uso de álcool e drogas) e dificuldade de deslocamento até a unidade de saúde1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012.. Sobre o esquecimento, deve-se considerar que a pessoa em situação de rua pode não ter acesso a relógio ou até mesmo não saber em que dia da semana está4141 Wijk LBV, Mângia EF. O cuidado a pessoas em situação de rua pela rede de atenção psicossocial da Sé. Saúde debate. 2017; (41):1130-42.. Há ainda a dificuldade financeira em se deslocar até a UBS, visto que a logística das marcações no sistema de saúde desconsidera as particularidades da PSR, como a extrema pobreza: “marquei o dentista, mas me encaminharam para outro bairro e é muito longe, tem que ir a pé, então não fui” (Elba).

O acesso geográfico (distância e tempo necessário para alcançar e obter os serviços) e o acesso sócio-organizacional (exigência de documentação antes de receber o serviço ou os preconceitos com raça e/ou classe social que podem gerar uma barreira para o acesso) são elementos determinantes na saúde da PSR22 Starfield B. Atenção Primária: Equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília, DF: UNESCO; Ministério da Saúde; 2002.. Pode-se pensar o acesso aos serviços de saúde mediante três dimensões: disponibilidade, aceitabilidade e acessibilidade. A primeira dimensão relaciona-se à oferta de serviços. A segunda, à satisfação da população com o serviço utilizado. Já a terceira dimensão diz respeito à proximidade geográfica do serviço ofertado, como também à organização do trabalho no que tange a horários, rotinas, prioridades técnicas, entre outros. É nessa terceira dimensão que recai a narrativa das entrevistadas. Acessibilidade é o elemento estrutural imprescindível para obter a atenção ao primeiro contato. Nesse cenário, a AB, por ser a principal porta de entrada para o Sistema Único de Saúde (SUS), deve garantir fácil acesso ao usuário, pois um serviço disponível e facilmente acessível evita que a atenção seja postergada, afetando o manejo do problema de saúde22 Starfield B. Atenção Primária: Equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília, DF: UNESCO; Ministério da Saúde; 2002., 4343 Carneiro Júnior N, Jesus CH, Crevelim MA. A Estratégia Saúde da Família para a equidade de acesso dirigida à população em situação de rua em grandes centros urbanos. Saude soc. 2010; (19):709-16.. Assim, uma maior facilidade no acesso geográfico ao serviço odontológico dá aos usuários mais chances de alcançar a integralidade na saúde bucal4444 Chaves SCL, Barros SG, Cruz DN, et al. Política Nacional de Saúde Bucal: fatores associados à integralidade do cuidado. Rev Saude Publica. 2010; (44):1005-1013..

Consultas ocorrendo em horas incompatíveis com horários de sobrevivência e trabalho na rua também dificultam o acesso33 Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Rua: aprendendo a contar: Pesquisa Nacional sobre a População em Situação de Rua. Brasília, DF: MDS; 2009., 1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012.. É plausível que as necessidades de saúde sejam colocadas em segundo plano quando não se sabe o que irá comer ou onde irá dormir4242 Paiva IKS, Lira CDG, Justino JMR, et al. Direito à saúde da população em situação de rua: Reflexões sobre a problemática. Ciênc. saúde colet. 2016; (21):2595-606.. Uma flexibilidade no horário de atendimento facilitaria a questão, já que as UBS podem funcionar em horários alternativos e com diferentes formas de agendamento, desde que atendam às necessidades da população66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017.. Nisso, a instituição do Programa ‘Saúde na Hora’ pode ser uma opção ao estender o horário de funcionamento das UBS4545 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 930, de 15 de maio de 2019. Institui o Programa “Saúde na Hora”, que dispõe sobre o horário estendido de funcionamento das Unidades de Saúde da Família. Diário Oficial da União. 15 Maio 2019..

As disparidades sociais dessa população também se relacionam com a desigualdade nos acessos aos serviços de saúde. Estruturalmente, disparidades socioeconômicas estão associadas com condições desiguais nos acessos aos serviços e na condição de saúde das populações. Quando se reflete sobre a extrema pobreza econômica da PSR, entende-se que toda barreira ao acesso impacta muito mais os grupos que são socioeconomicamente desfavorecidos22 Starfield B. Atenção Primária: Equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília, DF: UNESCO; Ministério da Saúde; 2002., 44 Brasil. Decreto nº 7.053, 23 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 23 Dez 2009..

A exclusão das pessoas em situação de rua dos serviços também é reforçada mediante violência institucional, por meio da burocracia nos serviços de saúde, como a exigência de documento de identidade, de comprovante de endereço e/ou do Cartão Nacional de Saúde4646 Hallais JAS, Barros NF. Consultório na Rua: visibilidades, invisibilidades e hipervisibilidade. Cad. Saúde Pública. 2015; (31):1497-504.. Este estudo concorda com essa informação diante da narrativa: “às vezes não era atendida, porque sem documento a pessoa não é ninguém, não atendem” (Alcione). A falta de documentos de identificação pessoal é um fenômeno comum entre as PSR e cria um obstáculo ao acesso a programas, ações e serviços do governo e ao exercício da cidadania. Porém, legalmente (Lei nº 13.714, de 24 de agosto de 2018), é assegurada atenção integral à saúde aos indivíduos em situações de vulnerabilidade ou risco social e pessoal mesmo sem apresentar documentos que comprovem domicílio ou inscrição no cadastro no SUS88 Aguiar MM, Iriart JAB. Significados e práticas de saúde e doença entre a população em situação de rua em Salvador, Bahia, Brasil. Cad. Saúde Pública. 2012; (28):115-24., 1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012., 4444 Chaves SCL, Barros SG, Cruz DN, et al. Política Nacional de Saúde Bucal: fatores associados à integralidade do cuidado. Rev Saude Publica. 2010; (44):1005-1013., 4646 Hallais JAS, Barros NF. Consultório na Rua: visibilidades, invisibilidades e hipervisibilidade. Cad. Saúde Pública. 2015; (31):1497-504., 4747 Brasil. Lei nº 13.714, de 24 de agosto de 2018. Altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, para assegurar o acesso das famílias e indivíduos em situações de vulnerabilidade ou risco social e pessoal à atenção integral à saúde. Diário Oficial União. 24 Ago 2018..

Nesse cenário, encontra-se outra barreira: a territorialidade. A característica migratória da PSR torna inapropriado um trabalho baseado somente na responsabilização por uma área geográfica fixa e sua população adscrita. Assim, as UBS com uma territorialização rígida, que não adscrevem a PSR, são fortes obstáculos para a assistência em saúde dessa população1111 Silva LMA, Monteiro IS, Araújo ABVL. Saúde bucal e consultório na rua: o acesso como questão central da discussão. Cad. Saúde Colet. 2018; (26):285-91., 1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012.. Essa situação pode ser observada na fala a seguir:

Quem não tem casa, não pode se consultar. Eu tinha agente de saúde e não tenho mais. Quando é morador de rua, eles [dentistas] não gostam de atender, não atendem quem não é de lá da área. (Elba).

Diante disso, as mulheres buscam estratégias como: “para ser atendida, eu dou o endereço da casa da minha irmã” (Elba). No entanto, isso não deveria ocorrer, pois a AB deve responder às necessidades de saúde não somente da população com residência fixa, mas também dos itinerantes, como a PSR. A necessidade da população (a residente e a itinerante) é o elemento definidor das ações e dos serviços de saúde66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017..

Toda essa conjuntura faz com que, em alguns casos, as mulheres em situação de rua recorram a ameaças para garantir o atendimento: “às vezes, tenho que ameaçar denunciar, todos nossos direitos são descumpridos, desrespeitados; chega um momento que é automático reclamar” (Elza). Diante das condições adversas vividas na rua, é necessário estar em constante estado de vigilância e preparação para ‘reagir’ ou ‘fugir’1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012.. Além disso, a situação de rua exige uma constante reafirmação de si mesmo enquanto ser humano e cidadão, para ter acesso a direitos e diminuir preconceitos e estigma social4848 Sicari AA, Zanella AV. Pessoas em Situação de Rua no Brasil: Revisão Sistemática. Psicol Ciênc Prof. 2018; (38):662-79.. Ressalta-se que, além do álcool e das drogas influenciarem no temperamento da PSR3636 Monteiro FKV, Almeida LP. A exclusão social de mulheres moradoras de rua: questões de gênero e políticas sociais. In: Silva PC, organizador. Territorio(s), género, trabajo y políticas públicas en América Latina. São Paulo: Provocare; 2017. p. 117-129., a condição de saúde bucal pode causar dificuldade em manter um estado emocional equilibrado, deixando a pessoa em situação de rua nervosa ou irritada1212 Lawder JAC, Matos MA, Souza JB, et al. Impacto da condição dentária na qualidade de vida de indivíduos em situação de rua. Rev Saude Publica. 2019; (22):1-10..

Há ainda, no contexto da saúde bucal, algumas questões pessoais que influenciam na busca por ações e serviços. Como exemplo, tem-se a negligência com a própria saúde bucal: “várias vezes marcaram dentista para mim e eu nunca fui, esqueço de ir” (Alcione); e, “tanto faz eu escovar os dentes ou não, quando lembro vou escovar os dentes, não tenho vaidade” (Sandra). Por ser um grupo heterogêneo44 Brasil. Decreto nº 7.053, 23 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 23 Dez 2009., existem percepções diversas em relação ao autocuidado, e há até quem não procure pelos serviços de saúde. Contudo, a negligência para consigo ou a falta de autocuidado podem adquirir, no contexto da rua, outros significados. A falta de vaidade de mulheres em situação de rua pode significar uma forma de proteção para evitar ser violentada4949 Lopes PR, Winkelmann MCC, Heidemann ITSB, et al. Percepção das pessoas em situação de rua acerca da promoção da saúde. Rev Enferm Atual. 2017; 83(21):54-60.. Além disso, deve-se relembrar que as mulheres em situação de rua frequentemente fazem uso de substâncias psicoativas, cujos efeitos podem levar à negligência com a saúde bucal2323 Marques L, Lotif M, Rodrigues Neto E, et al. Abuso de drogas e suas consequências na saúde bucal: uma revisão de literatura. Rev Faculdade Odontol Lins. 2016; (26):29-35.: “a pessoa quando está assim, no uso [sob efeito de drogas], não procura o dentista” (Elis).

Nas narrativas das mulheres em situação de rua, evidenciaram-se outros serviços e instituições como sendo importantes auxiliares no acesso aos serviços de saúde bucal, como é o caso da eCR:

Procurei o consultório na rua e pedi um encaminhamento ao dentista e deu certo, fui atendida no mesmo dia, me levaram lá para o hospital. No consultório na rua o atendimento é mais rápido. (Rita).

Pensando em garantir a AB para populações específicas, a PNAB estipulou a eCR55 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 122 de 25 de janeiro de 2012. Define as diretrizes de organização e funcionamento das equipes de Consultório na Rua. Diário Oficial da União. 25 Jan 2012., 66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017.. A atuação dessa equipe mostra-se positiva, pois desenvolve ações para além da intervenção terapêutica, com atendimento integral e de qualidade, valorização da escuta e do acolhimento e realização de busca ativa das situações que necessitam de atendimento. Assim, a eCR tem se revelado como um real dispositivo de acesso e cuidado a esse grupo social4646 Hallais JAS, Barros NF. Consultório na Rua: visibilidades, invisibilidades e hipervisibilidade. Cad. Saúde Pública. 2015; (31):1497-504., 4949 Lopes PR, Winkelmann MCC, Heidemann ITSB, et al. Percepção das pessoas em situação de rua acerca da promoção da saúde. Rev Enferm Atual. 2017; 83(21):54-60..

Embora a população necessite e a Portaria nº 1.029/2014 permita, a eCR de Teresina não possui cirurgião-dentista ou técnico de saúde bucal em sua composição. No entanto, a equipe tem facilitado o acesso das mulheres em situação de rua às ações de saúde bucal em outros serviços da rede. Porém, existem dificuldades da eCR na busca por pactuar o acesso da PSR à atenção em saúde bucal1111 Silva LMA, Monteiro IS, Araújo ABVL. Saúde bucal e consultório na rua: o acesso como questão central da discussão. Cad. Saúde Colet. 2018; (26):285-91.. A PNAB orienta que, mesmo existindo eCR, todos os profissionais do SUS, em especial os da AB, são responsáveis pela saúde de populações com vulnerabilidades sociais. As equipes que atuam na AB devem aprender as tecnologias do cuidado, a sensibilidade do trabalhador e os modos de escuta e construção de vínculos da eCR, para que, no futuro, não sejam mais necessárias as eCR66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017..

O Centro POP também figurou como um elemento facilitador do acesso ao fornecer documentação ou declaração para ser apresentada nos estabelecimentos de saúde: “como estava sem documento, fui com uma declaração do Centro POP: eu mostrava a declaração e era atendida no dentista” (Gal). O Centro POP tornou-se um espaço potente para atender a algumas necessidades da população, como fichas para refeições, fornecimento de espaço e material para higiene, organização na confecção de documentos e liberação de benefícios sociais. Ainda assim, esse serviço precisa desenvolver ações de modo a atender a PSR em suas singularidades, garantindo-lhes, além dos direitos básicos, o acesso à rede intersetorial4848 Sicari AA, Zanella AV. Pessoas em Situação de Rua no Brasil: Revisão Sistemática. Psicol Ciênc Prof. 2018; (38):662-79., 4949 Lopes PR, Winkelmann MCC, Heidemann ITSB, et al. Percepção das pessoas em situação de rua acerca da promoção da saúde. Rev Enferm Atual. 2017; 83(21):54-60..

As narrativas das mulheres indicaram a busca por acesso à atenção em saúde bucal em hospitais públicos da cidade. Essa questão releva que, como já descrito, normalmente os serviços de saúde são procurados por esse grupo populacional somente em situações de urgência, condições que são resolvidas no nível terciário da saúde. Vale destacar que o uso de substâncias psicoativas pode aumentam o limiar de dor, mascarando a sintomatologia dolorosa de lesões bucais, fazendo com que o usuário postergue a busca por serviços de saúdes2323 Marques L, Lotif M, Rodrigues Neto E, et al. Abuso de drogas e suas consequências na saúde bucal: uma revisão de literatura. Rev Faculdade Odontol Lins. 2016; (26):29-35.. Assim, o cuidado centrado nas situações de urgência e emergência dificulta as ações de promoção da saúde e continuidade do cuidado1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012., 5050 Vale AR, Vecchia MD. “UPA é nós aqui mesmo”: as redes de apoio social no cuidado à saúde da população em situação de rua em um município de pequeno porte. Saude Soc. 2019; (28):222-34..

Diante da conjuntura da saúde em situação de rua, as mulheres nessa condição apontam uma possível solução para melhorar o acesso à saúde bucal:

Se tivesse um dentista específico para gente, ficaríamos mais tranquilas; se tivesse um espaço próprio para nós, com dentista, igual tem um [médico] clínico geral no consultório na rua. (Elza).

Eu acho que devia ter dentista aqui, através do albergue. (Nara).

Assim, entende-se que se faz necessária a existência de um dentista específico para PSR, que pode ser incluído na eCR, pois, por intermédio da Portaria nº 1.029/2014, o cirurgião-dentista consta no rol das categorias profissionais que podem compor as eCR77 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.029, de 20 de maio de 2014. Amplia o rol das categorias profissionais que podem compor as Equipes de Consultório na Rua em suas diferentes modalidades e dá outras providências. Diário Oficial da União. 20 Maio 2014..

A problemática das mulheres em situação de rua não é exclusivamente uma questão de políticas públicas (embora necessite), mas sim de fazer valer as leis e as portaria já existentes, como as indicadas aqui. É pertinente citar, por exemplo, que a Política Nacional de Saúde Bucal, de 2004, já indicava os ‘grupos de rua’ como espaços sociais possíveis para ações de proteção à saúde bucal em nível coletivo5151 Brasil. Ministério da Saúde. Diretrizes da política nacional de saúde bucal. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2004.. Entretanto, devido à pouca compreensão da responsabilidade sanitária de todas as equipes de saúde bucal do SUS para com a PSR e dada à dificuldade de acesso às ações de saúde bucal, é imprescindível a presença do cirurgião-dentista dentro da eCR. O cuidado seria então compartilhado entre o dentista da eCR e os demais dentistas da AB, que também são responsáveis pela atenção à saúde das pessoas em situação de rua66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017..

A formação na área da saúde deve enfatizar uma educação que englobe também os aspectos de produção de subjetividade e o adequado conhecimento dos preceitos que regem o SUS. Isso pode ser alcançado ao se contemplar o quadrilátero ensino, gestão, atenção e controle social dentro da formação em saúde. É fundamental que a gestão da educação na saúde seja integrante da gestão do sistema de saúde, de modo a redimensionar a forma de atuação dos serviços, além de dar atenção ao controle social5252 Ceccim RB, Feuerwerker LCM. O quadrilátero da formação para a área da saúde: ensino, gestão, atenção e controle social. Physis Rev Saúde Colet. 2004; (14):41-65.. Nesse sentido, valorizar a educação permanente no cotidiano do trabalho auxiliaria no enfrentamento de situações reais e complexas, baseadas em padrões previamente definidos, tais como as diretrizes do SUS e os protocolos de saúde bucal5353 Warmling CM, Baldisserotto J, Rocha ET. Acolhimento & acesso de necessidades de saúde bucal e o agir profissional na Atenção Primária à Saúde. Interface (Botucatu). 2019; (23):1-15..

Isso fortaleceria o entendimento de que a rua, por ser um espaço de vida, também é um território5454 Sampaio C. Território e redes. In: Lopes LE, organizador. Atenção integral à saúde de pessoas em situação de rua com ênfase nas equipes de consultórios na rua: caderno de atividades. 2. ed. Rio de Janeiro: EAD; ENSP; Fiocruz; 2018. p. 25-77., e deve ser enfatizado no processo de territorialização para os serviços de saúde bucal. A territorialização e o mapeamento da área de atuação são atribuições comuns a todos os membros das equipes da AB e visam identificar famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidades para programar as ações baseadas nas necessidades existentes66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017.. Nesse assunto, cabe reforçar a noção de território vivo, de Milton Santos5555 Santos M. O retorno do território. In: Santos M, Souza MAA, Silveira ML, organizadores. Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec; 1998. p. 15-20.: se o território é vivo, logo é mutável, então é importante refazer ou complementar a territorialização sempre que necessário66 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. 21 Set 2017..

Pode-se ainda trazer à tona o acesso avançado como um conceito importante a ser utilizado. Esse é um método de organização das vagas das consultas, no qual a agenda permanece sempre aberta e, conforme a demanda, os horários vão sendo preenchidos diariamente. Assim, evita-se um agendamento fragmentado, dividido em períodos reservados a grupos específicos; ou divisão da agenda entre demanda de rotina e de urgência5656 Pires Filho LAS, Azevedo-Marques JM, Duarte NSM, et al. Acesso avançado em uma unidade de saúde da família do interior do estado de São Paulo: um relato de experiência. Saude soc. 2019; (43):605-13.. O uso do método de acesso avançado, em associação com o processo de territorialização, poderia superar o problema relativo ao absenteísmo e ao tempo de espera5353 Warmling CM, Baldisserotto J, Rocha ET. Acolhimento & acesso de necessidades de saúde bucal e o agir profissional na Atenção Primária à Saúde. Interface (Botucatu). 2019; (23):1-15. que as mulheres em situação de rua enfrentam. Destaca-se que há pessoas em situação de rua que têm pouca itinerância relacionada com o seu local de permanência, convivência e cuidados de vida. Nesses casos, a equipe de saúde pode vincular essa pessoa à UBS, acompanhando-a de modo longitudinal5757 Pacheco J, Lima J, Amirati K, et al. População em situação de rua e a saúde como direito. In: Lopes LE, organizadores. Atenção integral à saúde de pessoas em situação de rua com ênfase nas equipes de consultórios na rua: caderno de atividades. Rio de Janeiro: EAD; ENSP; Fiocruz; 2018. p. 87-96..

É importante também que os profissionais de saúde bucal entendam que a própria dinâmica tradicional de funcionamento do atendimento odontológico pode gerar entraves para o acolhimento e o acesso5353 Warmling CM, Baldisserotto J, Rocha ET. Acolhimento & acesso de necessidades de saúde bucal e o agir profissional na Atenção Primária à Saúde. Interface (Botucatu). 2019; (23):1-15.. A presença de profissionais de saúde bucal sem sensibilização, sem treinamento e sem capacitação sobre a PSR pode acarretar, por conseguinte, a presença de profissionais alheios ao caráter humano e social do ato do cuidar. Isso é uma barreia à medida que pode levar ao preconceito e ao estigma, fragilizando o acolhimento. Essas ações, por parte do cirurgião-dentista, tendem a afastar a PSR do serviço de saúde bucal1111 Silva LMA, Monteiro IS, Araújo ABVL. Saúde bucal e consultório na rua: o acesso como questão central da discussão. Cad. Saúde Colet. 2018; (26):285-91..

Viver na rua é uma situação extrema, mas é mais grave para as mulheres, que se tornam mais vulneráveis pelos problemas referentes à condição de gênero1313 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Manual sobre o cuidado à saúde junto à população em situação de rua. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 2012.. Quando isso tudo é somado aos problemas de saúde bucal, entende-se as mulheres em situação de rua quando dizem que a conjuntura “deveria mudar, deveria ter um local para as mulheres, para que a gente pudesse conseguir uma vida melhor” (Marília).

Considerações finais

A condição da PSR é amparada por políticas públicas que trouxeram conquistas significativas em saúde. Porém, verificaram-se fragilidades no acesso a ações e serviços de saúde bucal em virtude da dificuldade de acolhimento nas UBS; da dificuldade dos serviços e dos profissionais da rede em considerar as peculiaridades que cercam a vida das mulheres em situação de rua; e da ausência do cirurgião-dentista na eCR.

É necessária a inclusão de profissionais de saúde bucal na eCR, bem como o cumprimento das políticas existentes, com ênfase nas peculiaridades do universo feminino em situação de rua, e o reconhecimento das suas necessidades e demandas. Além disso, o desenvolvimento de práticas intersetoriais, a organização e o funcionamento dos serviços em rede e o investimento na educação permanente no cotidiano do trabalho dos cirurgiões-dentistas da AB favoreceriam o entendimento de que todos os profissionais de saúde bucal do SUS são responsáveis pelo atendimento das mulheres em situação de rua, assim como da PSR.

Como limitações do estudo, há o fato de as entrevistas terem sido realizadas somente com mulheres acompanhadas pelos serviços de referência, muito embora a existência de pessoas em situação de rua para além do amparo das instituições seja uma verdade, e careça de investigações, uma vez que as vivências delas podem destoar das observadas no presente estudo. Importa salvaguardar que os resultados condizem com o contexto da cidade na qual a pesquisa foi realizada; diferentes conjunturas podem apresentar outras realidades para a PSR, não sendo possível a generalização dos resultados.

  • Suporte financeiro: não houve
  • *
    Orcid (Open Researcher and Contributor ID).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2023

Histórico

  • Recebido
    29 Jul 2022
  • Aceito
    07 Nov 2022
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