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Formação ética para a cidadania: uma investigação de habilidades sociais medidas pelo inventário de habilidades sociais

Ethical instruction for citizenship: an investigation into social abilities measured using the social skills inventory

Resumos

O objetivo desta pesquisa foi investigar se o repertório de habilidades sociais importantes para a formação ética de um grupo de estudantes de ensino médio, curso pré-vestibular e curso de graduação em psicologia evidenciava mudanças relacionadas à diferença de idade e características específicas dos contextos interativos oferecidos pelas instituições de ensino participantes desse processo. Foi aplicado o Inventário de Habilidades Sociais a uma amostra de 45 estudantes e questionários semiestruturados a nove professores. Entre os alunos, os resultados indicaram diferença estatisticamente significativa entre as classes das categorias de ensino investigadas em relação a diferentes conjuntos de habilidades sociais. Dos resultados obtidos com os professores, pode-se depreender que estes possuem noção clara das capacidades que o aluno deve obter para agir com ética e ser cidadão, mas esses professores não propiciam condições, no contexto escolar, para a promoção de tais habilidades. Isso indicou a necessidade de melhorias na capacitação dos docentes, visando à ampliação do repertório de habilidades sociais de seus alunos.

Cidadania; Educação; Habilidades sociais


The aim of the present study was to investigate if the repertory of social skills, important for the ethical education of a group of High School, Pre-college and Psychology college students, differed according to age and the particular characteristics of the interactive environment provided by each educational institution that participated in this process. The Social Skills Inventory was applied to a sample of 45 students and a semi-structured questionnaire was given to nine teachers. Among the students, the results indicated a statistically significant difference between the classes of each education category investigated, in terms of the different groups of social skills. From the results obtained with the teachers, it could be seen that they have a clear notion of the skills a student must obtain in order to be able to act ethically and with citizenship, but those teachers do not create the required conditions inside the school context to develop these capabilities. This indicated the need for improvement in the abilities of the teaching staff, aiming to increase the repertory of social skills in their students.

Citizenship; Education; Social skills


ARTIGOS

Formação ética para a cidadania: uma investigação de habilidades sociais medidas pelo inventário de habilidades sociais1 1 Este artigo é uma adaptação do relatório final de projeto de iniciação científica apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (processo nº 06/50401-8).

Ethical instruction for citizenship: an investigation into social abilities measured using the social skills inventory

Kester CarraraI; Mariana de Freitas BetettoII

IUniversidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências, Departamento de Psicologia. Av. Luiz Edmundo Carrijo Coube, 14-01, 17033-360, Bauru, SP, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: K. CARRARA. E-mail: <kester.carrara@uol.com.br>

IIBolsista de Iniciação Científica, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Curso de Formação de Psicólogos. Bauru, SP, Brasil

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi investigar se o repertório de habilidades sociais importantes para a formação ética de um grupo de estudantes de ensino médio, curso pré-vestibular e curso de graduação em psicologia evidenciava mudanças relacionadas à diferença de idade e características específicas dos contextos interativos oferecidos pelas instituições de ensino participantes desse processo. Foi aplicado o Inventário de Habilidades Sociais a uma amostra de 45 estudantes e questionários semiestruturados a nove professores. Entre os alunos, os resultados indicaram diferença estatisticamente significativa entre as classes das categorias de ensino investigadas em relação a diferentes conjuntos de habilidades sociais. Dos resultados obtidos com os professores, pode-se depreender que estes possuem noção clara das capacidades que o aluno deve obter para agir com ética e ser cidadão, mas esses professores não propiciam condições, no contexto escolar, para a promoção de tais habilidades. Isso indicou a necessidade de melhorias na capacitação dos docentes, visando à ampliação do repertório de habilidades sociais de seus alunos.

Unitermos: Cidadania. Educação. Habilidades sociais.

ABSTRACT

The aim of the present study was to investigate if the repertory of social skills, important for the ethical education of a group of High School, Pre-college and Psychology college students, differed according to age and the particular characteristics of the interactive environment provided by each educational institution that participated in this process. The Social Skills Inventory was applied to a sample of 45 students and a semi-structured questionnaire was given to nine teachers. Among the students, the results indicated a statistically significant difference between the classes of each education category investigated, in terms of the different groups of social skills. From the results obtained with the teachers, it could be seen that they have a clear notion of the skills a student must obtain in order to be able to act ethically and with citizenship, but those teachers do not create the required conditions inside the school context to develop these capabilities. This indicated the need for improvement in the abilities of the teaching staff, aiming to increase the repertory of social skills in their students.

Uniterms: Citizenship. Education. Social skills.

Com o fim do período que caracterizou a Ditadura Militar de 1964 e o início do processo de redemocratização do País, a escola pública passou a enfatizar cada vez mais a transmissão dos conteúdos ligados ao contexto social real do alunado. Seguindo essa tendência, a preocupação da escola começa a ceder espaço para a formação ético-moral dos alunos, visando à formação de cidadãos participantes nas decisões políticas, na aplicação do conhecimento dentro de um contexto cooperativo e no resgate de valores sólidos de caráter, que possibilitem a consolidação das instituições sociais. Por exemplo, a dimensão ético-moral está consolidada no contexto dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (Brasil, 1999) como tema transversal privilegiado pelo Estado democrático voltado para o reconhecimento de direitos e deveres dos cidadãos e interessado em fazer avançar uma sociedade livre, justa e solidária. A proposta ali presente implica uma transferência de prioridades dos conteúdos temáticos em direção aos temas transversais ético-morais. Assegurar oportunidades e condições para uma aprendizagem institucional sobre como viabilizar a cidadania a partir da contribuição da escola constitui consenso, agora fundado na orientação dos PCN. Com isso, a escola e seus professores passam a ter um papel fundamental na construção da cidadania mediante o ensino e a prática de ações diretamente dirigidas à instalação de repertórios comportamentais que impliquem uma série de habilidades sociais e valores, como os de respeito a direitos e deveres, transparência política, honestidade no trato da gestão pública, respeito ao meio ambiente, solidariedade e tantos outros. A dimensão ética da educação escolar, aí assegurada, já dispõe de conteúdos prioritários e estratégias de educação formal descritas a partir das propostas oficiais contidas nos PCN e em processo de aprimoramento. Todavia, a educação ético-moral destinada a priorizar a consolidação da cidadania que garante direitos civis e direitos políticos acontece tanto na escola como fora dela. Naturalmente, o conceito ampliado de cidadania vai muito além desses direitos e implica, preliminarmente, descrição e avaliação das interações sociais complexas presentes em diversas instâncias da vida social, tais como, particularmente, aquelas presentes na instituição escolar.

Nessa perspectiva, nos diversos documentos orientadores das tendências das políticas públicas para o processo educacional - por exemplo -, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), os Parâmetros Curriculares Nacionais e o Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (RCNEI) - passou a ser evidenciada uma preocupação geral com a formação ético-moral, que visa capacitar a população a consolidar valores sociais mais compatíveis com a cidadania. Nesse contexto, o currículo do ensino médio, na medida em que procura atender ao objetivo de construção de uma cidadania democrática, deve atualmente contemplar conteúdos e estratégias de aprendizagem que preparem os alunos para a realização de atividades nos três domínios da ação humana: vida social, atividade produtiva e experiência subjetiva, embora o fato de constar na lei não assegure que será realizado na prática.

Com relação à educação superior, a LDB (1996) registra, em seu Artigo 43, as finalidades desse nível de ensino, especificando-as. Outros elementos devem ser explorados visando à construção da cidadania na sociedade brasileira. De acordo com Carrara (1996), existem alguns componentes básicos que devem ser incluídos em um bom projeto social de cidadania, tais como a noção de formação, em contrapartida à de adestramento; a noção de sujeito social e não de recipiente passivo do saber; a noção de conquista e não de concessão da cidadania; a noção de direitos e deveres do cidadão; a noção de democracia como forma de governo melhor habilitada a tornar possível a participação; a noção de liberdade, de igualdade e de comunidade, que levam à consolidação de ideologias comprometidas com a redução de diferenças sociais. Nessa perspectiva, torna-se cada vez mais relevante o desenvolvimento de estratégias educacionais e processos para avaliação de comportamentos característicos de repertórios sociais compatíveis com a ideia de cidadania. A ênfase na escola como um dos meios importantes para o desenvolvimento de valores e comportamentos socialmente habilidosos é encontrada em Z.A.P. Del Prette e A. Del Prette (2001a, 2003), que destacam a empatia, a solução de problemas interpessoais e o controle da impulsividade e da raiva como comportamentos relevantes na interação escolar. A sugestão dada pela literatura é a de que o ensino de habilidades sociais poderia ser compatibilizado com os conteúdos acadêmicos envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, garantindo, ao mesmo tempo, uma ênfase na perspectiva cooperativa entre os integrantes da comunidade acadêmica.

É predominantemente, conforme o referencial de treinamento de habilidades sociais (THS), que as habilidades sociais (HS) vêm sendo investigadas por vários autores. Apesar de, segundo Caballo (1995), não haver uma definição consensual de habilidades sociais (HS), o termo tem sido usado como sinônimo de um conjunto de habilidades aprendidas. Z.A.P. Del Prette e A. Del Prette (2002) definem as diversas dimensões do interagir socialmente como"... 1) reação habilidosa (que demonstra assertividade, empatia, expressão de sentimentos positivos ou negativos de forma apropriada, civilidade, etc.), 2) reação não habilidosa passiva (que demonstra esquiva ou fuga ao invés de enfrentamento da situação) e 3) reação não habilidosa ativa (que demonstra agressividade, negativismo, ironia, autoritarismo, etc.)" (p.65).

Carrara (2000) dá ênfase ao fundamental compromisso institucional da escola na formação de valores sociais, mas especificamente em relação à promoção de ações educacionais que possibilitem o desenvolvimento da cidadania por meio da participação ativa dos alunos nas relações interpessoais construtivas e cooperativas, dentro e fora do contexto escolar. Os indivíduos, possuindo repertórios de respostas pró-éticas e pró-sociais ("pró" no sentido de que preparam ou constituem pré-requisitos para o comportamento social ético), caminham para a aquisição de práticas culturais cooperativas. A partir disso, estabelecem interações positivas e satisfatórias com outros indivíduos, promovendo dissolução de conflitos e aprendizagem ao lidar com as diferenças, o que viabiliza o aprimoramento humano individual. Como resultado, os indivíduos adquirem condições de conhecer melhor suas realidades e tornam-se capazes de transformá-la.

Em consonância com essa perspectiva, esta pesquisa teve como objetivos principais a identificação, caracterização e comparação de repertórios de comportamentos pró-éticos e pró-sociais apresentados por estudantes de ensino médio, curso pré-vestibular e curso superior de psicologia, repertórios estes que constituiriam indicativos de uma atuação cidadã desses participantes. Consequentemente, a investigação buscou avaliar o possível efeito indireto de práticas educacionais que favorecessem o desenvolvimento da cidadania em estudantes desses três níveis de ensino, a partir da identificação e comparação de repertórios de comportamentos socialmente habilidosos dos participantes.

Método

Participantes

Participaram deste projeto 45 estudantes - 15 de uma classe de primeira série do ensino médio de uma escola da rede pública de ensino do Estado de São Paulo, localizada em Rio Claro (SP), 15 de uma classe de um curso pré-vestibular de Bauru (SP) e outros 15 estudantes de uma classe de terceiro ano de psicologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp)-Bauru (SP). A identificação e escolha dos três segmentos amostrais não aleatórios mencionados obedeceu ao critério de identificação de possível sequência de desenvolvimento acadêmico e de habilidades do ensino médio e do curso universitário em população estudantil típica de duas cidades do interior paulista com características socioeconômicas equivalentes. Nessa perspectiva - em contrapartida à dificuldade quanto à pertinência da generalização estatística genuína de resultados para a imensa população - pareceu viável que as amostras mencionadas sugerissem dados indicativos das comparações entre os segmentos diferentes, seja em função da idade, seja em função, adicionalmente, do processo educacional em questão.

O grupo do ensino médio foi composto por cinco estudantes do sexo masculino e dez do sexo feminino, com idade média de 15,4 anos. Já o grupo do curso pré-vestibular foi composto por oito estudantes do sexo masculino e sete do sexo feminino, com idade média de 19,5. O grupo da universidade foi composto por dois estudantes do sexo masculino e 13 do sexo feminino, com idade média de 21,1. Esses estudantes foram aleatoriamente selecionados dentre as classes de alunos sorteadas. Todos os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A pesquisa incluiu também a participação de nove professores, três de cada classe de estudantes: dois professores e uma professora (filosofia, matemática e português, respectivamente) do ensino médio; dois professores e uma professora (matemática, biologia e português, respectivamente) do curso pré-vestibular; duas professoras e um professor (psicologia escolar, prática de ensino de psicologia e psicologia social comunitária, respectivamente) do curso de graduação em psicologia. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências da Unesp-Bauru sob o protocolo nº 2271/46/01/06.

Instrumentos

Com a finalidade de investigar habilidades sociais gerais dos estudantes de curso pré-vestibular e universitários foi utilizado o Inventário de Habilidades Sociais (IHS), de Z.A.P. Del Prette e A. Del Prette (2001b), e uma versão do IHS adaptada para contemplar questões específicas vinculadas ao tema de comportamentos pró-cidadania. Aos professores participantes foi aplicado um questionário aberto, com oito questões, designado "Questionário de Habilidades Sociais", elaborado para possibilitar a identificação de categorias de comportamentos socialmente habilidosos já apresentados por seus alunos, de acordo com o grupo etário de estudantes que representa, além de indicar habilidades sociais raras ou inexistentes no repertório comportamental estudantil. O instrumento conteve questões referentes a repertórios de habilidades sociais de comunicação, de civilidade, assertivas, de trabalho, empáticas e de expressão de sentimentos. Perguntava aos professores, também, quais desses comportamentos faziam falta aos alunos no contexto acadêmico na opinião deles e, ainda, se a instituição propiciava meios para que tais comportamentos socialmente habilidosos compatíveis com a consolidação do repertório pró-cidadania dos alunos se instalassem.

Procedimentos

Os dados fornecidos pelos três instrumentos foram analisados de forma quantitativa e qualitativa. Para a determinação das medidas descritivas e construções gráficas, foram utilizados os softwares Excel e MiniTab (versão 13). Para as comparações envolvendo escores totais e fatoriais, foi aplicado o teste de Análise de Variância, usando-se o software MiniTab.

Resultados e Discussão

Os dados referentes aos estudantes das três categorias de ensino (médio, pré-vestibular e superior) foram obtidos por meio da aplicação do Inventário de Habilidades Sociais (IHS-Del-Prette) e Inventário de Habilidades Sociais modificado (IHS-Del-Prette adaptado). Por estes instrumentos foi possível coletar o repertório de habilidades sociais de todos os estudantes participantes individualmente, agrupando-se as medidas percentuais em escore total, escore fator 1 (enfrentamento e autoafirmação com risco), escore fator 2 (autoafirmação na expressão de sentimento positivo), escore fator 3 (conversação e desenvoltura social), escore fator 4 (autoexposição a desconhecidos e situações novas) e escore fator 5 (autocontrole da agressividade).

Levando-se em consideração a média dos escores totais dos estudantes de cada categoria de ensino, a classe universitária (estudantes de graduação em psicologia) obteve o maior valor (73,67), enquanto a classe de curso pré-vestibular obteve o menor valor (59,33) e a classe de ensino médio teve valor intermediário (63,80). O escore total permitiu uma primeira avaliação da existência de recursos e déficits em habilidades sociais no repertório do respondente. Tanto os universitários como as classes de ensino médio e curso pré-vestibular apresentaram bom repertório de habilidades sociais (acima da mediana). Portanto, no geral, em relação ao escore total, os três grupos de estudantes apresentaram valores percentis acima do repertório mediano fornecido pela amostra do teste.

Porém, considerando o caráter situacional das habilidades sociais, é necessário verificar quanto tais déficits são generalizados ou em quais áreas de habilidades específicas eles estão localizados. Nesse sentido é que o inventário avalia o respondente de acordo com escores fatoriais.

Para o fator 1 (enfrentamento e autoafirmação com risco), a classe universitária (classe U) obteve a maior média (73,53), enquanto a classe de curso pré-vestibular (classe C) obteve o menor valor (48,33) e o ensino médio (classe M) obteve média intermediária (56,47). O escore fatorial 1 indica o repertório do respondente em habilidades de enfrentamento com risco, ou seja, a capacidade de lidar com situações interpessoais que demandam a afirmação e defesa de direitos e autoestima, com risco potencial de reação indesejável por parte do interlocutor (possibilidade de rejeição, de réplica ou de oposição). Em outras palavras, é um indicador de assertividade e controle da ansiedade em situações como: apresentar-se a uma pessoa desconhecida, discordar de autoridade, discordar de colegas em grupo, lidar com críticas injustas, falar a público conhecido, manter conversa com desconhecidos e fazer pergunta a conhecidos. Isto significa que em relação a essas ações os universitários e alunos do ensino médio apresentaram bom repertório de habilidades sociais (acima da mediana), enquanto os estudantes de curso pré-vestibular apresentaram bom repertório de habilidades sociais, porém abaixo da mediana. Mesmo com essa diferença, nenhum dos três grupos foi indicado para treinamento de habilidades que envolvem comportamentos expressos neste fator.

Para o fator 2 (autoafirmação na expressão de sentimento positivo), a maior média obtida foi pela classe U (70,67), enquanto a menor média foi a da classe C (51,00), muito próximo do valor obtido pela classe M (53,00). O escore fatorial 2 identifica habilidades para lidar com demandas de expressão de afeto positivo e de afirmação da autoestima, que não envolvem risco interpessoal, ou apenas um risco mínimo de reação indesejável. No IHS, esse escore foi obtido sobre as habilidades de elogiar familiares e outras pessoas, expressar sentimento positivo, agradecer elogios, defender em grupo uma outra pessoa e participar de conversação trivial. Isto significa que, em relação a essas ações, as três classes de estudantes apresentaram bom repertório de habilidades sociais (acima da mediana), embora os universitários tenham se destacado na apresentação destes comportamentos em seus mais diversos contextos de interação.

Em relação ao fator 3 (conversação e desenvoltura social), a classe U obteve maior média (72,27), e a classe M obteve menor valor (64,33), próximo do alcançado pela classe C (67,80). O escore fatorial 3 retrata a capacidade de lidar com situações sociais neutras de aproximação (em termos de afeto positivo ou negativo), com risco mínimo de reação indesejável, demandando principalmente traquejo social na conversação. Verifica-se que os estudantes universitários apresentaram um escore para este fator muito próximo da indicação de repertório bastante elaborado de habilidades sociais. Um alto escore supõe bom conhecimento das normas de relacionamento cotidiano para o desempenho de habilidades, tais como manter e encerrar conversação em contato face a face, encerrar conversa ao telefone, abordar pessoas que ocupam posição de autoridade, reagir a elogios, pedir favor a colegas e recusar pedidos abusivos. Essas ações também se encontram presentes no cotidiano dos alunos de curso pré-vestibular e ensino médio, que apresentaram bom repertório de habilidades sociais, acima da mediana.

Quanto ao fator 4 (autoexposição a desconhecidos e situações novas), a classe U obteve a maior média (71,67), enquanto a menor média foi da classe C (47,33), e a classe M obteve valor intermediário (62,33). O escore fatorial 4 inclui basicamente a abordagem a pessoas desconhecidas. É em parte semelhante ao anterior, porém com maior risco de reação indesejável do outro. Esse fator inclui fazer apresentações ou palestras a um público desconhecido e pedir favores ou fazer perguntas a pessoas desconhecidas. Essas ações estiveram mais presentes no repertório de comportamentos dos universitários, embora tanto eles como os alunos de ensino médio tenham apresentado um bom repertório de habilidades sociais (acima da mediana). Já os estudantes de curso pré-vestibular apresentaram bom repertório de habilidades sociais, porém abaixo da mediana, mas que não aponta indicação para treinamento de habilidades expressas por este fator.

Já para o fator 5 (autocontrole da agressividade), a classe C obteve a maior média (63,80), enquanto a classe M obteve o menor valor (39,07), inferior ao alcançado pela classe M (45,53). O escore fatorial 5 avalia a capacidade de reagir a estimulações aversivas do interlocutor (agressão, pilhéria, descontrole) com razoável controle da raiva e da agressividade. Não significa deixar de expressar desagrado ou raiva, mas fazê-lo de forma socialmente competente, pelo menos em termos de controle sobre os próprios sentimentos negativos. Esse fator reúne as habilidades de lidar com críticas dos pais e com chacotas ou brincadeiras ofensivas, além da capacidade de cumprimentar desconhecidos sem isso se caracterizar como uma reação de impulsividade, que é incompatível com a calma e o autocontrole avaliados neste fator. Em relação a essas ações, apenas os estudantes de curso pré-vestibular apresentaram um bom repertório de habilidades sociais (acima da mediana), enquanto os universitários e alunos de ensino médio apresentaram bom repertório de habilidades sociais, porém abaixo da mediana. É interessante ressaltar que este fator indicou o menor percentil alcançado em todos os outros escores (39,07), o que possivelmente reflete uma dificuldade maior dos estudantes, em geral, em ter autocontrole da agressividade em situações aversivas. Diferente da avaliação feita pelos valores expressos em outros escores fatoriais, os universitários não apresentaram, pela primeira vez, a maior média percentual. Esta foi apresentada pela classe de alunos do curso pré-vestibular, porém esses estudantes tiveram as piores médias nos escores fatoriais 1 e 4, que expressam habilidades sociais para lidar com situações que envolvem risco potencial de reação indesejável por parte do interlocutor. Esta ocorrência indica que estes participantes possivelmente enfrentam as situações aversivas (que envolvem risco) não de maneira assertiva, isto é, expressando seus direitos e autoestima, mas de maneira passiva e submissa, não sendo identificadas quaisquer possibilidades de ações agressivas, o que representou o maior escore fatorial deste grupo para este fator. Para Alberti e Emmons (1978), uma pessoa com dificuldade de se expressar pode emitir respostas contra sua própria vontade temendo causar prejuízos futuros em sua relação, apresentando comportamentos não assertivos - o que, eventualmente, poderia constituir explicação para tal resultado.

Houve diferença significativa dos valores percentuais apresentados pelos estudantes individualmente em relação aos diferentes escores: total, fator 1, fator 2, fator 3, fator 4 e fator 5. Embora os grupos das três categorias de ensino tenham apresentado, em geral, um bom repertório de habilidades sociais para as diferentes áreas de ações, existiram estudantes, tanto do ensino médio quanto do pré-vestibular e superior, que apresentaram escores abaixo de 25% para as várias categorias de comportamentos socialmente habilidosos, sendo indicados, de acordo com a avaliação do teste, para treinamento em habilidades sociais quando os déficits implicavam problemas. Em contrapartida, a avaliação individual dos estudantes possibilitou identificar que existem alunos das três categorias de ensino que apresentam um repertório bastante elaborado de habilidades sociais para as diferentes áreas, embora, quando avaliados em grupo, esta indicação não tenha aparecido para as classes de ensino médio, pré-vestibular e superior. Isso demonstra que as habilidades sociais são aprendidas e dependem integralmente dos recursos que os mais diversos contextos de interação disponibilizam para o desenvolvimento de ações voltadas para a cidadania. Robinson (2001) afirma que determinados comportamentos são emitidos ou não de acordo com as condições promovidas pelo meio. O desenvolvimento ético-moral e a consciência de direitos e deveres adquirem solidez na medida em que as condições essenciais de formação do caráter estejam presentes nas experiências de interação social.

Quanto ao fator 1, verificou-se que na classe de ensino superior, o valor médio foi de 73,5, na de ensino pré-vestibular foi de 48,3 e, na classe de ensino médio, foi de 56,5. Ocorreu diferença estatisticamente significativa (p<0,05) entre os percentuais do ensino pré-vestibular e superior. Isso significa que, em relação às habilidades de enfrentamento com risco, houve um grande salto no desenvolvimento dessas ações no repertório de alunos com o avanço da escolaridade e idade. Isso pode ter ocorrido devido à mudança de contexto de interação que a universidade e o curso de psicologia representam para os estudantes, ampliando sua exposição às contingências e favorecendo o aparecimento de novos repertórios de comportamento. Considerando o fator 4, também ocorreu diferença estatisticamente significativa (p<0,05) entre os percentuais dos grupos de participantes do ensino pré-vestibular e superior, indicando que ocorreu um aumento no desenvolvimento de habilidades sociais voltadas para ações que incluem basicamente a abordagem a pessoas desconhecidas com o avanço da escolaridade e idade, o que pode ser devido à ampliação dos contextos interativos dos alunos. Possivelmente, esses ambientes oferecem recursos adequados para a maximização de comportamentos socialmente habilidosos.

A Figura 1 possibilita uma visualização dos valores médios percentuais obtidos pelos três grupos de alunos nas diferentes áreas que envolvem ações socialmente habilidosas.


O grupo composto pelos estudantes de psicologia obteve escores maiores em todas as áreas de habilidades sociais, exceto no fator 5. Porém, isso não significa que esses alunos não tenham habilidades de autocontrole da agressividade em situações aversivas mais voltadas para ações assertivas do que as apresentadas pelos alunos de curso pré-vestibular, como já indicado anteriormente.

Os estudantes que compõem a classe de curso pré-vestibular obtiveram os menores escores para a maioria das áreas de habilidades sociais, principalmente para aquelas que envolvem ações de enfrentamento a situações que oferecem risco de rejeição, réplica ou oposição do outro. Estes resultados são compatíveis com o relato dos professores que avaliam a classe como pouco participativa, composta por alunos tímidos e pouco propensos a integração. Verificou-se, mais amplamente, que o curso pré-vestibular não está estruturado como uma instituição de ensino organizada, pois é composto por professores ainda em formação, os quais têm o comprometimento apenas de exercitar suas práticas de ensino, ganhando experiência para a licenciatura ou mesmo para o exercício da profissão futura de educador.

Os estudantes que compõem a classe de ensino médio obtiveram, na maioria das áreas de habilidades sociais, escores intermediários entre os apresentados pelo grupo de ensino pré-vestibular e de ensino superior. Apenas para os fatores 3 (conversação e desenvoltura social) e 5 (autocontrole da agressividade) esses participantes tiveram escores abaixo dos apresentados pelas outras duas categorias de ensino.

Avaliando todos os escores apresentados pelos diferentes grupos de estudantes, verificou-se que apenas com o fator 3 ocorreu o que era esperado de acordo com a hipótese inicial lançada pelo projeto. Isso significa que só em relação ao repertório de habilidades que envolvem conversação e desenvoltura social foi possível verificar um aumento gradual no surgimento dessas ações no cotidiano dos participantes, levando-se em consideração o avanço da idade e escolaridade, além da ampliação dos ambientes de interação mais significativos.

Os dados sobre a frequência com que as diferentes categorias de comportamentos socialmente habilidosos foram apresentadas pelos estudantes do ensino médio, pré-vestibular e superior foram obtidos mediante a aplicação do Questionário de Habilidades Sociais para Professores. Estes responderam a questões baseadas nas classes que eram compostas pelos três grupos de alunos participantes da pesquisa.

As Habilidades Sociais de Comunicação parecem estar fortemente associadas às habilidades de conversação e desenvoltura social expressas no escore fatorial 3 do teste aplicado aos estudantes. Os resultados demonstraram que há correspondência entre o que os professores apontam em relação aos seus alunos e as reais habilidades destes apenas entre os universitários, para ações que envolvem capacidade de lidar com situações sociais neutras de aproximação (traquejo social). No segmento de ensino superior, os alunos foram avaliados positivamente, enquanto no ensino médio e no curso pré-vestibular os alunos foram avaliados negativamente pelos professores, apesar de terem apresentado bom repertório destas habilidades.

As Habilidades Sociais de Civilidade podem representar repertório do respondente em habilidades de autoafirmação na expressão de afeto positivo, devidamente expressas no escore fatorial 2 do teste aplicado aos alunos. Os resultados demonstraram que há correspondência entre o que os professores apontaram em relação aos seus alunos e as reais habilidades destes para o ensino pré-vestibular e superior, que obtiveram avaliações positivas. Já os alunos do ensino médio, apesar de apresentarem bons níveis de habilidades de civilidade, foram avaliados negativamente por seus professores.

As Habilidades Sociais Assertivas de Enfrentamento estão fortemente associadas à habilidades de enfrentamento com risco, indicadas no escore fatorial 1 do teste aplicado aos alunos. Os resultados demonstraram que há correspondência entre o que os professores apontaram em relação aos seus alunos e as reais habilidades destes apenas para os estudantes do ensino pré-vestibular, que foram avaliados negativamente. Já os professores do ensino superior e médio acreditam que seus alunos não apresentem habilidades para lidar com situações interpessoais com assertividade, embora estes grupos de estudantes tenham apresentado tais repertórios.

As Habilidades Sociais Empáticas podem estar associadas a habilidades de autoafirmação na expressão de afeto positivo (escore fatorial 2). Os resultados não foram suficientes para indicar correspondência entre o que os professores apontaram em relação aos seus alunos e as reais habilidades destes, pois muitos professores não responderam a essa questão. Isso pode ter ocorrido devido à falta de entendimento da mesma, ou mesmo ao conhecimento para avaliar os alunos em função destes aspectos.

As Habilidades Sociais deTrabalho podem englobar tanto habilidades de autoexposição a desconhecidos ou a situações novas (escore fatorial 4) quanto habilidades de autocontrole da agressividade (escore fatorial 5). Os resultados apontaram que é possível apenas afirmar que os professores das três categorias de ensino avaliaram seus alunos, em geral, como pouco habilidosos em atividades de trabalho dentro de sala de aula. Porém, para ações que envolvem autoexposição a desconhecidos ou a situações novas, somente os alunos de curso pré-vestibular apresentaram um escore abaixo da mediana, corroborando o que os professores indicaram sobre a timidez e falta de iniciativa demonstrada na classe em geral. Estes também podem ser aspectos vinculados ao fato de a classe de curso pré-vestibular ter sido apontada como a mais habilidosa no autocontrole da agressividade, sugerindo que os professores percebem muito mais a passividade nas ações de seus alunos do que a assertividade.

As Habilidades Sociais de Expressão de Sentimento Positivo estão fortemente associadas às habilidades de autoafirmação na expressão de afeto positivo (escore fatorial 2). Os resultados mostraram que esse fator foi o que apresentou melhor nível de correspondência entre o que os professores apontaram em relação aos seus alunos e as reais habilidades destes. O grupo que pareceu apresentar mais dificuldades de expressar sentimentos positivos nos relacionamentos interpessoais foi o grupo do ensino pré-vestibular.

No que se refere aos déficits de Habilidades Sociais, os professores da classe de primeira série do ensino médio citaram que há falta de ações voltadas para habilidades de civilidade, assertivas de enfrentamento e de comunicação em seus alunos. Isto significa que, na opinião dos professores, os escores fatoriais 1, 2 e 3 dos alunos de ensino médio deveriam ser ampliados. Os professores deste nível de ensino provavelmente buscam em seus alunos preferencialmente comportamentos como cumprimentar desconhecidos, manifestar opiniões, lidar com críticas, lidar com autoridades e fazer perguntas, ações muito valorizadas em contextos escolares.

Ainda quanto à falta de habilidades sociais em seus alunos, os professores da classe do ensino pré-vestibular avaliaram que existem déficits de ações voltadas para habilidades de comunicação e assertivas de enfrentamento. Isso significa que os escores fatoriais 1 e 3 deveriam ser expandidos no repertório comportamental dos estudantes de curso pré-vestibular. Verificou-se uma preocupação muito mais intensa dos professores em desenvolver a comunicação dos alunos entre eles e com o professor, de modo que as aulas pudessem ser mais participativas, favorecendo a integração e o posicionamento dos alunos frente ao conteúdo ensinado.

Quando foram considerados os déficits de Habilidades Sociais da classe de alunos do terceiro ano do ensino superior, os professores avaliaram que há falta de ações voltadas para habilidades de trabalho, assertivas de enfrentamento e de expressão de sentimento positivo. Partindo de uma visão dos professores dos universitários, os escores fatoriais 1, 2, 4 e 5 deveriam ser mais bem desenvolvidos nos alunos. Verifica-se que os professores da universidade avaliam como importante o desenvolvimento de ações como exposição a pessoas desconhecidas, capacidade de demonstrar empatia e assertividade para lidar com situações que envolvam conflitos. Esses parecem ser elementos fundamentais que devem compor o repertório de comportamentos de qualquer profissional, principalmente psicólogos, que estão engajados continuamente em interações sociais. Segundo Z.A.P. Del Prette e A. Del Prette (1999), é importante avaliar e promover a competência social de universitários, que constituem uma classe emergente e que, em alguns casos, terão a interação social como base de sua atuação profissional.

Os professores da classe de alunos de terceiro ano do ensino superior apontaram um grande comprometimento em oferecer disciplinas que estimulem a participação ativa dos alunos. Um dos professores relatou que em algumas disciplinas essas habilidades são tangencialmente abordadas. Em outras disciplinas, propõe-se uma discussão sobre valores humanos e uma reflexão crítica a respeito do ser humano na sociedade. Citando suas próprias palavras: "Creio ser importante articular valores com comportamento, mesmo porque a habilidade pode ser instalada, mas nem sempre sua intenção e valor". Para eleger os valores a serem agregados aos comportamentos pró-sociais ou pró-éticos, o cientista deve se comprometer a participar da discussão junto à parcela populacional envolvida na questão. Segundo Skinner (1990, 1953/1993), existem valores que devem orientar a escolha de práticas que visem à sobrevivência das culturas, tais como conhecimento, habilidades, tolerância, cooperação, apoio, compaixão, justiça, paz, ordem, segurança, preservação do ambiente, abundância.

Nesse sentido, pode-se afirmar que a amostra selecionada de professores universitários está muito mais comprometida com o desenvolvimento nos alunos de habilidades sociais para sua formação profissional do que as outras instituições de ensino, as quais disponibilizam meios apenas para desenvolver nos alunos comportamentos que favorecem a aprendizagem de conteúdos.

Esses aspectos podem ser facilmente notados no discurso dos professores sobre as contribuições das instituições de ensino para o desenvolvimento de comportamentos socialmente habilidosos nos alunos. Os professores da classe de primeira série do ensino médio apontaram dificuldades na implantação de meios eficazes para o desenvolvimento de habilidades sociais em seus alunos. Um professor de filosofia avaliou que a escola não propicia meios para o desenvolvimento de habilidades sociais porque está subordinada à política educacional do Estado, cuja diretriz "leva o aluno a ter somente direitos e não deveres e responsabilidades". Verificou-se que algumas coisas pontuais têm sido feitas. Dois professores relataram que a escola promove atividades diferenciadas, visando ao bom relacionamento entre os alunos e oferecendo espaço para que estes, durante as aulas, manifestem suas opiniões, sejam ouvidos e façam ou respondam perguntas. Quantos aos resultados, um professor de matemática apontou que poucos são obtidos em longo prazo, pois os alunos "não levam a sério" o que é proposto. Nessa perspectiva, verifica-se que a maioria dos professores não reconhece seu papel ativo no processo de ensino-aprendizagem de habilidades interpessoais nos alunos. Parte dos professores (44,45%, sendo dois do ensino médio e dois do curso pré-vestibular) manifestou que não é papel da escola desenvolver essas habilidades nos alunos, pois elas devem ser ensinadas na família e em grupos religiosos. Essa opinião não foi manifestada pelos professores da universidade. Em contrapartida, tal como indicado nos PCN, o currículo do ensino médio, procurando atender ao objetivo de construção de uma cidadania democrática, deve apresentar conteúdos e estratégias de aprendizagem que preparem os alunos para a realização de atividades nos três domínios da ação humana: vida social, atividade produtiva e experiência subjetiva. Porém, esses documentos tornam-se falhos na medida em que descrevem apenas capacidades e habilidades que os professores devem desenvolver em seus alunos, sem se preocupar em fornecer alternativas de ensino para a aprendizagem de tais habilidades. Nessa direção, Carrara (2000) dá ênfase ao fundamental compromisso institucional da escola na formação de valores sociais, mas especificamente em relação à promoção de ações educacionais que possibilitem o desenvolvimento da cidadania, sugerindo o estímulo à participação ativa dos alunos nas relações interpessoais construtivas e cooperativas, dentro e fora do contexto escolar.

Diante dos meios que a escola oferece para a promoção dessas habilidades e dos resultados esporádicos e insuficientes obtidos, os professores têm a tendência de culpar os alunos individualmente por esse fracasso, sem fazer uma análise mais ampla do modo como a escola está organizada. A análise do comportamento aponta que a explicação para o comportamento não está no indivíduo, mas sim na interação com o ambiente no qual ele está inserido.

Analisando-se as respostas dos professores da classe do ensino pré-vestibular quanto a essa questão, verificou-se que estes se preocupam com o desenvolvimento de habilidades sociais nos alunos. Com isso em vista, dois professores relataram que o curso pré-vestibular organiza plantões de dúvidas para promover o contato aluno-professor, além de se mostrarem acessíveis ao auxiliar os alunos na realização de suas atividades, instigando-os a discutir sobre assuntos levantados e favorecendo a interação entre eles. Em contrapartida, verificou-se que um dos professores queixou-se do desinteresse e falta de engajamento dos estudantes na expressão destas ações, acreditando que a instituição de ensino não propicia meios de desenvolver estas habilidades nos alunos porque não há retorno positivo de aprendizagem destes, isto é, o fracasso é todo voltado para o indivíduo que não aprende.

Considerações Finais

Existem várias iniciativas no sentido de desenvolver comportamentos voltados para a cidadania, amparadas por documentos como os PCN e diversas leis que defendem os direitos humanos. É bastante consensual no contexto educacional a noção das habilidades que o acadêmico deve obter para agir com ética e ser cidadão, mas a prática das ações correspondentes à implantação e manutenção desse perfil não se encontra bem estabelecida. Esse desafio foi colocado às instituições de ensino, que passaram a ter que adequar os conteúdos ensinados à realidade dos alunos, desenvolvendo neles o espírito crítico e criativo de interação com seu meio. Porém, o que se observa é uma dificuldade muito grande dos professores em propiciar condições no contexto escolar para a promoção de tais habilidades e comportamentos. Isso indica, cada vez mais, a necessidade de uma preparação dos professores no sentido de maximizar o repertório de habilidades sociais de seus alunos, na medida em que estes se colocam como indivíduos ativos no processo de ensino-aprendizagem e disponibilizam meios adequados para a promoção de ambientes que favoreçam a interação interpessoal.

Os dados analisados nesta pesquisa mostraram que os alunos também são parte integrante de todo esse processo e desenvolvem suas habilidades e capacidades não só em ambientes escolares, mas em outros grupos sociais, entre eles, a família. O estudo revelou que a hipótese de que o repertório de habilidades sociais deveria aumentar de acordo com o avanço da idade, escolarização e mudança dos contextos de interação apenas é válido sob certas condições. O desenvolvimento dessas ações também depende de como a instituição de ensino está organizada, quais objetivos pretende atingir e quais procedimentos educacionais ela adota. A título de exemplo, verificou-se que um curso de psicologia, com professores teoricamente instrumentados para promover comportamentos socialmente habilidosos em seus alunos, nem sempre consegue oferecer os meios mais adequados e eficazes para o desenvolvimento dessa capacidade, embora os resultados obtidos sejam muito mais consistentes e significativos do que os obtidos nas outras instituições de ensino.

Nessa perspectiva, os resultados desta pesquisa, para a amostra utilizada, são consistentes em sugerir a necessidade de programas sistematizados para assegurar capacitação de professores para a promoção de um processo de ensino-aprendizagem mais eficaz de habilidades sociais imprescindíveis para tornar a escola uma instituição comprometida com o desenvolvimento e aplicação dos preceitos éticos da cidadania a seus integrantes. Nesse sentido, estudos subsequentes poderiam se concentrar na pesquisa de alternativas de treinamento de habilidades sociais que não só instalassem comportamentos nos indivíduos, mas que propiciassem uma formação ético-moral mais sólida e comprometida com a noção de cidadania, assegurando um acompanhamento longitudinal dos efeitos desse processo de capacitação.

Agradecimentos

Pela leitura do original à Ana Maria B.F. Betetto; pelo apoio técnico a Matheus de F. Betetto e Manoel H. Salgado; pela disponibilidade na fase de coleta a Marisa E.M. Meira, Alessandra T. Bolsoni-Silva, Teresa Busato, Celso Zonta e docentes do Curso Preparatório da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Bauru.

Recebido em: 13/2/2008

Versão final reapresentada em: 3/7/2008

Aprovado em: 13/8/2008

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  • 1
    Este artigo é uma adaptação do relatório final de projeto de iniciação científica apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (processo nº 06/50401-8).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      Set 2009

    Histórico

    • Aceito
      13 Ago 2008
    • Recebido
      13 Fev 2008
    • Revisado
      03 Jul 2008
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