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Professor-aluno

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RESENHA

Professor-aluno1 1 Simka, S., & Meneghetti, I. (Orgs.). (2010). A Relação professor e aluno: um olhar interdisciplinar sobre o conteúdo e a dimensão humana. Rio de Janeiro: Walk.

Teacher-student

Geraldina Porto Witter

Universidade Camilo Castelo Branco, Pró-Reitoria de Pós-Graduação. R. Carolina Fonseca, 584, 08230-230, Itaquera, SP, Brasil. E-mail: <gwitter@uol.com.br>

A interação professor-aluno tem mudado ao longo da história: primeiramente chamou muito a atenção dos pesquisadores (exemplo anos 60-70 do século XX); depois arrefeceu, mas continuou entre os temas de pesquisa, dada sua influência em vários aspectos da aprendizagem (motivação, retenção, criatividade, independência) e da formação do cidadão. Mais recentemente a questão voltou a merecer a atenção dos pesquisadores, notadamente de psicólogos escolares, sociólogos educacionais e pedagogos.

O livro aqui resenhado trata dessa relação. Foi organizado por Simka, mestre em Língua Portuguesa, e Meneghetti, doutor em Literatura, que contaram com o apoio de outros autores. Na breve apresentação, os organizadores informam que, com a obra, pretenderam discutir "a importância da dimensão humana e afetiva na educação do século XXI" (p.7) e apresentar as limitações do tecnicismo nas práticas pedagógicas, bem como suscitar reflexões acerca da matéria.

A obra é constituída por 10 textos cujos autores enfocam vários aspectos, tanto gerais quanto específicos, de leitura fácil e sem exigência de conhecimentos prévios ou informações de alto nível, disponíveis na farta bibliografia científica, tecnológica e filosófica sobre a matéria. Está praticamente ausente a estrutura do saber-poder-fazer que caracteriza o discurso científico como tal. As opiniões são apresentadas de maneira elegante e fluente pelos autores, mas sem a preocupação de apresentar dados aceitáveis como evidências que sirvam de sustentação. Entretanto, o leitor interessado pode enriquecer-se buscando evidências em bases bibliográficas internacionais (ERIC - www.eric.ed.gov, PsycINFO - www.apa.org/pubs/databases/psycinfo/index.aspx) ou nacionais (SciELO - www.scielo.br), ou nas muitas revistas científicas, das quais muitas estão disponíveis online e são de consulta aberta. Assim, poderão formar sua opinião pessoal e contrastá-la com o conhecimento disponível no livro.

O primeiro texto, de Palamares, discorre sobre o elemento humano na referida interação, apresentando os princípios propostos por Weill, os quais embora possibilitem ao professor ser um líder humano, não são novidade e já foram enunciados de várias formas e com maior ou menor detalhamento. A autora relata alguns êxitos pessoais seguindo tais propostas.

Meneghetti descreve rapidamente nove percursos interativos para a humanização do ambiente acadêmico, começando com as razões para ingressar na universidade e passando pelos entremeios dos ambientes universitários. Em seguida, apresenta as cantinas e bandejões, lembrando as propostas "barthesianas do sabor e do saber na construção comum do conhecimento por parte de todos" (p.21). Apresenta o que considera um espaço minado - a sala dos professores. Ah! O horror das secretarias foi também lembrado, destacando a resistência de seus responsáveis à critica e à oposição, bem como o fato de que esse é um órgão que ocupa um papel centralizador na universidade. O item seguinte trata das bibliotecas, com críticas sutis. O sétimo percurso é o mais pertinente ao tema do livro, pois é na sala de aula que ocorre a maioria das relações entre professores e alunos quando se trata de ensino presencial, pois no ensino à distância é outra a história. O autor pede que a sala de aula seja um diálogo com o mundo e, embora ele não cite, hoje estão disponíveis muitas estratégias para que isso se concretize de forma efetiva, eficiente e prazerosa.

O ensino-aprendizagem é visto como arte e técnica do diálogo, tendo por substrato inquietações éticas, o que também tem sido enfocado por vários pesquisadores, especialmente a partir dos anos 1980-1990 do século passado, e que continua sendo objeto de investigações e discussões em vários eventos de áreas diversas do conhecimento. Mas isso não é referido por Ramos, que assina o texto, iniciado com o que fazer com tanta informação. Trata da necessidade de diálogo entre o sujeito e o objeto, da necessária humildade científica nem sempre presente e do fato de o mundo ser uma escola, embora raramente seja visto assim.

Em seguida, Pereira trata da formação do professor de Matemática, começando pela carga horária dos cursos de licenciatura e sua distribuição pelos vários conteúdos, com base em estudos descritivos da realidade brasileira. Enfoca as relações professor-aluno diante do currículo ideal, do oficial e do real, em busca da humanização do ensino, com rápidas pinceladas no que concerne à Matemática, que é uma das áreas mais pesquisadas.

Em seu texto, Fontoura apresenta considerações pessoais sobre as tarefas atuais da Educação, tendo por meta repensar a relação do professor com o aluno no processo de humanização. As tarefas sobre as quais tece considerações são: ética e cidadania, cultura para a paz, transformação social, construção de limites, uso da firmeza e da ternura, resgate dos valores humanos e encantamento do aluno.

A Geografia é a área trabalhada por Honório, que apresenta concepções sobre as razões para ensinar e aprender tal disciplina e incluí-la na formação docente. Apoia-se, em suas impressões pessoais, em sua experiência como docente da disciplina Conteúdo e metodologia no ensino de História e Geografia, ministrada no 4º semestre de Habilitação do Ensino Fundamental do Curso de Pedagogia, no ano de 2008. Relata algumas dificuldades encontradas na realidade e alguns desenvolvimentos propostos.

Simka trata do que o professor deixa na memória do aluno, como as evidências científicas mostram, embora elas não sejam referidas pelo autor. Um dos personagens que mais influi e permanece nas lembranças e no comportamento dos alunos é o docente, o que justifica a preocupação com o assunto. Lembra que essas lembranças podem ser tanto positivas como negativas. Descreve uma proposta de modelo em que o professor-humano singular estabelece interação com o aluno, mediada pelas atuações humanas e pedagógicas que geram confiança, respeito e liberdade. Recorre à apresentação de uma figura com o esquema, mas não mostra a reciprocidade, variável imprescindível para que haja real interação. Contrasta com o modelo negativo e propõe aos docentes um exercício muito simples, mas útil e compatível com a realidade do professor brasileiro, muito embora precário em face do que está disponível na literatura.

A busca da dimensão humana como forma de superar o tecnicismo educacional é o assunto trabalhado por Mafra. O autor começa por reconhecer os avanços alcançados em decorrência da tecnologia, ressaltando que eles contribuíram para a manutenção da educação tradicional de natureza autoritária e conteudista. Propõe uma humanização que rompa com a prática unilateral do conhecimento, o que implica uma interação afetiva, ou seja, uma postura educativa específica e única, na visão da autora. Embora ela não apresente dados, há que se discutirem as modernas tecnologias para desenvolver cognição, memória, criticidade, criatividade, motivação, autonomia e independência - habilidades que levam ao gosto por ler, estudar, planejar e trocar vivências. Ler sobre essas possibilidades efetivas e outros temas e depois comparar com o que diz a autora, é uma forma mais eficiente de se tornar livre do que se ater apenas ao pensamento de um dado autor. O leitor pode ir além, muito além.

O nono texto, assinado por Reis, traz o título A dor que cura. Trata-se de uma reflexão do autor sobre os novos rumos da educação brasileira em busca da qualidade, com um professor que assuma o papel de agente de mudança, reflita sobre sua prática e vá além do conteúdo, fazendo sempre a ponte com a formação humana. Como sempre, em todas as propostas está subjacente a esperança de que a escola possa fazer a diferença. É a fala do autor, sem qualquer menção a fontes inspiradoras e que já trataram do assunto tanto da mesma perspectiva quanto de outros ângulos. A humildade de que fala no final do primeiro parágrafo, ficou esquecida. Certamente, cientistas, educadores e tecnólogos que valorizam seu trabalho concordam que é indispensável a humildade. Ela implica em humanamente respeitar os que já pesquisaram ou discursaram sobre a matéria. É um tema para muito estudo, muita leitura, muita escuta, muita troca de ideias, opiniões, fatos e dados que sejam evidências replicáveis.

Correia discute a necessidade de ir além do embrutecimento na relação entre professor e aluno. O embrutecimento implica degradação da inteligência. O autor recorre à história para exemplificar sua perspectiva, caminhando rapidamente da Grécia antiga para a modernidade, quando o homem passou a ser o centro do universo, sob o apanágio da razão e "da atuação antropocêntrica, individualista, egóica solitária, obtusa e embrutecedora" (p.136), como são consideradas a sociedade e a educação. Exemplifica com um olhar algumas poucas propostas vigentes e propõe a busca pelo coletivo.

São bons textos para seminários, cuja eficiência, riqueza e variabilidade dependem da abrangência dos conhecimentos e da variedade de formas disponíveis para assegurar a desejada humanização na relação aluno-aluno. O leitor deve, porém, estar atento ao dogmatismo presente em alguns textos.

Recebido em: 2/12/2010

Versão final reapresentada em: 22/6/2011

Aprovado em: 27/6/2011

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    Simka, S., & Meneghetti, I. (Orgs.). (2010).
    A Relação professor e aluno:
    um olhar interdisciplinar sobre o conteúdo e a dimensão humana. Rio de Janeiro: Walk.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Out 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012
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