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Importância da criatividade na escola e no trabalho docente segundo coordenadores pedagógicos

The importance of creativity in school and in teaching practice

Resumos

O objetivo principal desta pesquisa foi examinar a percepção de coordenadores pedagógicos sobre a importância do desenvolvimento/expressão da criatividade docente, investigada por meio de entrevista com 12 coordenadores pedagógicos do ensino fundamental de escolas particulares de Brasília, Distrito Federal. As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas, utilizando-se a análise de conteúdo para análise de dados. Os resultados indicaram que para todos os coordenadores entrevistados é muito importante a criatividade estar presente no cotidiano escolar, sobretudo no trabalho docente, devendo o professor ser criativo principalmente por motivos relacionados ao aluno, sendo destacados o aumento do interesse e estímulo deste, a atribuição de significado ao conhecimento, a facilitação da sua aprendizagem, bem como o atendimento às suas necessidades educativas.

Criatividade; Professor; Psicologia Educacional


The main purpose of this study was to explore pedagogical coordinators' perception of the importance of teachers' development/expression of creativity, investigated by means of interviews with 12 *elementary school pedagogical coordinators from private schools in Brasilia, Federal District. The interviews were audio taped and transcribed. Content analysis was used to analyze the data. The results indicated that according to all coordinators, the presence of creativity in school life is very important, especially in teaching practice. According to the participants, the teacher must be creative mainly for reasons related to the students. The increase in the student's interest and incentive, the attribution of significance to knowledge, the facilitation of student's learning, as well as the attention to the student's educational needs were highlighted by the pedagogical coordinators to justify the importance of teachers' creativity.

Creativity; Teacher; Educational Psychology


ARTIGOS

Importância da criatividade na escola e no trabalho docente segundo coordenadores pedagógicos1 1 Artigo elaborado a partir da dissertação de E.B.P. OLIVEIRA, intitulada "Percepção do coordenador pedagógico sobre a criatividade do professor de ensino fundamental". Universidade Católica de Brasília, 2009.

The importance of creativity in school and in teaching practice

Edileusa Borges Porto OliveiraI; Eunice Maria Lima Soriano de AlencarII

IPedagoga. Bagé, RS, Brasil

IIUniversidade de Brasília, Instituto de Psicologia, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Humano e Saúde. Campus Asa Norte, 70910-900, Brasília, DF, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: E.M.L.S. ALENCAR. E-mail: <eunices.alencar@gmail.com>

RESUMO

O objetivo principal desta pesquisa foi examinar a percepção de coordenadores pedagógicos sobre a importância do desenvolvimento/expressão da criatividade docente, investigada por meio de entrevista com 12 coordenadores pedagógicos do ensino fundamental de escolas particulares de Brasília, Distrito Federal. As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas, utilizando-se a análise de conteúdo para análise de dados. Os resultados indicaram que para todos os coordenadores entrevistados é muito importante a criatividade estar presente no cotidiano escolar, sobretudo no trabalho docente, devendo o professor ser criativo principalmente por motivos relacionados ao aluno, sendo destacados o aumento do interesse e estímulo deste, a atribuição de significado ao conhecimento, a facilitação da sua aprendizagem, bem como o atendimento às suas necessidades educativas.

Unitermos: Criatividade. Professor. Psicologia Educacional.

ABSTRACT

The main purpose of this study was to explore pedagogical coordinators' perception of the importance of teachers' development/expression of creativity, investigated by means of interviews with 12 *elementary school pedagogical coordinators from private schools in Brasilia, Federal District. The interviews were audio taped and transcribed. Content analysis was used to analyze the data. The results indicated that according to all coordinators, the presence of creativity in school life is very important, especially in teaching practice. According to the participants, the teacher must be creative mainly for reasons related to the students. The increase in the student's interest and incentive, the attribution of significance to knowledge, the facilitation of student's learning, as well as the attention to the student's educational needs were highlighted by the pedagogical coordinators to justify the importance of teachers' creativity.

Uniterms: Creativity. Teacher. Educational Psychology.

Vive-se um momento sem precedente na história da humanidade, com mudanças que acontecem em ritmo muito acelerado, com grande avanços tecnológicos, incerteza e instabilidade. Na sociedade atual, é cada vez mais urgente o indivíduo desenvolver e utilizar estratégias que lhe possibilitem lidar com as novas exigências, especialmente do mercado de trabalho.

Castells (2003) ressalta que essa nova sociedade, denominada do conhecimento, é marcada especialmente por transformações estruturais que levaram a mudanças significativas das formas sociais no espaço e no tempo, bem como ao surgimento de uma nova cultura. Dentre as principais mudanças requeridas pelo atual sistema de produção das empresas, estão aquelas que se referem à maior produtividade, originada da inovação, e à competitividade, originada da flexibilidade.

Por essa razão, mais do que nunca, cultiva-se o interesse pelas capacidades inovadoras do homem, o que justifica o aumento das pesquisas sobre criatividade. O fenômeno passou a ser objeto de maior número de investigações após o discurso de Guilford (1950) ao assumir a presidência da Associação Americana de Psicologia, ocasião em que declarou ser essa uma habilidade que precisaria ser reconhecida e desenvolvida, sublinhando sua importância para o indivíduo e a sociedade (Alencar & Fleith, 2003a; Amabile, 1996; Feldman, Csikszentmihalyi & Gardner, 1994; Lubart, 2007; Martínez, 1997; Virgolim, 2007; Wechsler, 2002a).

Desde então a criatividade passou a ser investigada por número crescente de pesquisadores, tendo sido estudada primeiramente a partir de uma visão mais unidimensional, e somente no final da década de 1970 recebido uma percepção mais integrada, quando passaram a ser considerados aspectos cognitivos e afetivos do sujeito (Wechsler, 1998). As pesquisas sobre o tema realizadas nas décadas de 1970 e 1980 foram influenciadas principalmente pela psicologia cognitiva e procuraram investigar os processos cognitivos e a influência do contexto social na expressão criativa (Fleith, 2001).

Observa-se que, somente nos últimos 20 anos, o foco nos aspectos ligados ao indivíduo para explicar o fenômeno da criatividade deu lugar a uma nova visão que, além da influência de habilidades e traços de personalidade, dá ênfase a elementos relacionados ao ambiente (Alencar & Fleith, 2003b). Nessa nova abordagem de caráter sistêmico, destacam-se três modelos, a saber: a Teoria de Investimento em Criatividade de Sternberg, o Modelo Componencial de Criatividade de Amabile e a Perspectiva de Sistemas de Csikszentmihalyi.

A Teoria de Investimento em Criatividade de Sternberg (Sternberg & Lubart, 1999; Sternberg, 2000, 2003) propõe a existência da criatividade a partir da confluência de seis recursos distintos, porém, interrelacionados: habilidades intelectuais, conhecimento, estilos de pensamento, personalidade, motivação e ambiente adequado. Segundo Lubart (2007), essa é uma abordagem múltipla da criatividade, sendo necessária e importante uma combinação de fatores ligados ao indivíduo bem como ao contexto ambiental, ou seja, a criatividade depende de fatores cognitivos, conativos, emocionais e ambientais, dado que um componente age sempre em presença de outros. No entanto, também pode haver limite para alguns componentes, como, por exemplo, o conhecimento, abaixo do qual a criatividade não é possível, independentemente dos níveis atingidos em outros componentes. Pode haver uma compensação parcial entre componentes, como, por exemplo, um componente forte como a motivação pode contrabalançar a fraqueza do componente conhecimento. Também é possível a interação entre componentes com alto nível, tais como inteligência e motivação, para reforçar ainda mais a criatividade.

No Modelo Componencial da Criatividade de Amabile (Amabile, 1996, p.35), "um produto ou resposta será julgado criativo na medida em que: a) é novo e apropriado, útil, correto ou de valor para a tarefa em questão, e b) a tarefa é heurística e não algorítmica". Nesse modelo, para que aconteça a emergência de um produto criativo, três componentes precisam estar em interação: habilidades de domínio, processos criativos relevantes e motivação intrínseca. As habilidades de domínio são consideradas a base de qualquer performance, requerendo amplo conhecimento, habilidades técnicas e talento especial em uma determinada área. Já os processos criativos relevantes incluem o estilo cognitivo, a aplicação da heurística para exploração de novos percursos cognitivos e o estilo de trabalho. A motivação intrínseca, por sua vez, refere-se ao envolvimento do indivíduo com uma determinada tarefa.

Segundo a Perspectiva de Sistemas de Csikszentmihalyi (Csikszentmihalyi, 1988; 1997), a criatividade resulta da interação de três fatores: o domínio, o indivíduo e o campo. O domínio transmite informações ao indivíduo, e este produz variações que, por meio do campo, podem ou não ser incorporadas a esse domínio. Nessa visão sistêmica da criatividade, um sistema influencia o outro ao mesmo tempo, de maneira a conduzir a uma produção criativa. No entanto, essa produção criativa só será reconhecida como tal a depender do julgamento de juízes de um dado campo, influenciado por uma cultura, podendo, portanto, deixar de ser considerada criativa em outra época.

Mais recentemente, a escola passou a ser considerada como um dos contextos que interfere no desenvolvimento da criatividade dos indivíduos. Isso fez com que fossem revistas práticas educacionais e propostos programas de treinamento e estimulação da criatividade. Com referência a esse ambiente, o professor constitui elemento chave para facilitar o desenvolvimento do potencial criador dos alunos. Para tanto, a escola precisa ser um espaço que cultive e valorize as ideias originais de seus educadores, oportunizando o desenvolvimento e o desabrochar de habilidades que muitas vezes esse profissional desconhece possuir. Nesse sentido, vários pesquisadores (Alencar, 2000; Oliveira & Wechsler, 2002; T. V. Santeiro, F. R. M. Santeiro & Andrade, 2004) investigaram mais detalhadamente as características do professor propiciador da criatividade.

Ademais, a necessidade de se promover na escola um ambiente propício ao desenvolvimento e à expressão da criatividade tem sido destacada por educadores de vários países, tendo o professor um papel muito especial nesse processo (Alencar, 2002). Para Alencar e Martínez (1998), o desenvolvimento da criatividade na educação passa necessariamente pelo nível da criatividade dos profissionais que nela se encontram. Pois, para favorecer o desenvolvimento da criatividade dos alunos, é importante contar com professores motivados a utilizar práticas pedagógicas criativas; educadores assim motivados servirão de modelo e estímulo ao desenvolvimento do potencial criador de seus alunos.

A escola, assim como outras instituições sociais, pode contribuir para a construção de indivíduos mais equilibrados e atuantes, libertos de uma educação alienante. Solé e Coll (1996, p.18), ao se referirem à importância da aprendizagem escolar na formação dos sujeitos, sublinham: "A educação escolar promove o desenvolvimento na medida em que promove a atividade mental construtiva do aluno, responsável por transformá-lo em uma pessoa única, irrepetível, no contexto de um grupo social determinado". Também para De La Torre (2005), a escola pode influenciar no desenvolvimento da capacidade inovadora e criativa dos jovens. No entanto, é mister observar a necessidade do cultivo de atitudes e habilidades criativas desde a educação infantil até a universidade, conscientizando-se o professor sobre a importância de incluir em seu planejamento objetivos que visem potencializar a criatividade de seus alunos.

Contudo, Wechsler (2002b), analisando os resultados de vários estudos brasileiros sobre a importância do desenvolvimento da criatividade no contexto escolar, realizados com as mais diferentes faixas etárias, enfatiza como sendo o maior desafio para a escola o despertar dos professores para suas próprias dificuldades em desenvolver estratégias de ensino mais adequadas. Tais dificuldades estariam ligadas ao despreparo do professor, em virtude de falhas em sua formação e à existência de barreiras pessoais internas que o impedem de ousar e utilizar estratégias inovadoras em sua prática. O recente estudo de Oliveira e Alencar (2007) com professores do curso de Letras apresentou dados semelhantes a esses resultados. Nele, dentre as barreiras à criatividade mais citadas pelos entrevistados, foram apresentadas algumas relacionadas à formação e atuação do professor, como, por exemplo, o ensino tradicional e conteudista que receberam em sua formação, o desconhecimento do tema criatividade, a ausência de atualização e o ensino excessivamente teórico praticado nos cursos de formação de professores.

Os resultados do estudo realizado por Alencar e Martínez (1998) com professores brasileiros, cubanos e portugueses, evidenciaram que as barreiras de ordem pessoal para o desenvolvimento da criatividade, tais como o medo de errar, de fracassar e da crítica, foram as mais enfatizadas pelos profissionais brasileiros e portugueses, enquanto para os educadores cubanos foi a limitada capacidade de observação, de análise ou de reflexão. Já com relação a barreiras de ordem social, a falta de tempo apareceu como principal impedimento à expressão da criatividade dos educadores. Também em pesquisa de Alencar e Fleith (2003c), junto a professores de distintos níveis de ensino, uma das barreiras à expressão da criatividade docente mais evidenciada foi a falta de tempo.

Oliveira (2003) investigou a percepção de professores do ensino fundamental sobre procedimentos úteis à promoção da criatividade em sala de aula. Os resultados mostraram que, mesmo os professores reconhecendo a importância de desenvolver a criatividade em sala de aula, apontam várias barreiras que dificultam isso na prática. São elas: a falta de tempo para preparar as aulas, o excesso de conteúdo a ser ministrado e a falta de apoio por parte da direção da escola. Já o estudo realizado por Mariani e Alencar (2005), que investigou a percepção de professores de História no ensino fundamental de escolas das redes pública e privada com relação a suas habilidades criativas e aos elementos favoráveis e limitadores da expressão da criatividade em sua atividade docente, indicou elementos relacionados ao próprio professor, que se caracterizaram tanto como aspectos facilitadores quanto limitadores. Como facilitadores da expressão criativa docente foram evidenciadas a liberdade e a paixão pelo trabalho, e, como aspecto limitador, foi ressaltada a falta de habilidade dos professores no relacionamento com os alunos.

Castro e Fleith (2008) investigaram junto a professores de escolas públicas e privadas a relação entre tempo de experiência no ensino fundamental e tipo de escola com relação à criatividade, além de barreiras pessoais para manifestá-la. Nesse estudo, a falta de tempo e a falta de oportunidade foram consideradas as maiores barreiras à expressão da criatividade dos professores. Já o estudo conduzido por Alencar e Fleith (2008), com professores do ensino fundamental sobre as barreiras que lhes dificultam proporcionar condições favoráveis ao desenvolvimento da capacidade criativa de seus alunos, evidenciou obstáculos que se referem ao aluno, tais como o número de alunos em sala e a dificuldade de aprendizagem dos mesmos.

Lubart (2007), ao descrever a influência do ambiente sobre a criatividade, destaca a importância da família, da escola e do trabalho e afirma terem esses ambientes um papel chave na expressão criativa dos indivíduos. Segundo esse autor, tais fatores têm um forte impacto sobre a expressão criativa, podendo oferecer um ambiente favorável ou, pelo contrário, um freio à manifestação de condutas criativas. Para ele, ao entrarem no sistema escolar as crianças têm sua criatividade afetada ao se defrontarem com uma realidade estruturada por um grande número de novas regras, responsáveis por assegurar a aprendizagem. Com isso, à medida que avançam em escolaridade, elas mais evitam situações difíceis, causadoras de possíveis insucessos.

Para facilitar o acompanhamento dos educandos no processo de aprendizagem, orientando-os e capacitando-os a elevar e aprofundar seus conhecimentos e estimulando sua participação ativa em sala de aula, o educador deve dispor de diversas e diferenciadas estratégias de ensino. Ressalta-se que a efetiva participação dos alunos em sala depende de diferentes fatores, tais como: o tipo de conteúdo, a natureza da atividade e seu nível de complexidade, a possibilidade de optar por uma atividade ou fazer escolhas durante sua realização, os materiais de recurso ou apoio, as regras de funcionamento da aula e aspectos ligados à atuação do professor no desenvolvimento das aulas (Onrubia, 1996).

Com relação à maneira de atuar do professor, é ele quem operacionaliza a influência educativa, ou seja, por meio de suas diversas ações educativas, os professores estruturam as intenções educacionais (Zabala, 1996; 1998). Dependendo das necessidades e interesses manifestados pelos alunos em sala, as interações estabelecidas entre professor e aluno serão diferenciadas. Segundo Zabala (1996; 1998), a capacidade de observação e a elasticidade na forma de atuação desse profissional tornam possíveis o acompanhamento e a intervenção diferenciada, de forma a atender às necessidades apresentadas pelos alunos ao longo do processo: em situações de grupo, de interação individual, no decorrer de uma exposição ou no desenvolvimento de uma tarefa.

Ainda segundo Zabala (1998), para que as interações educativas em sala de aula aconteçam de maneira a favorecer a aprendizagem dos alunos, o professor necessita colocar em prática uma série de funções: planejar sua atuação de forma flexível, adaptando-a às necessidades dos alunos; contar com as contribuições e conhecimentos dos alunos no início e ao longo da realização das atividades; ajudar os alunos a encontrarem sentido no que fazem; estabelecer metas ao alcance dos alunos; oferecer aos alunos ajuda adequada durante seu processo de construção, em seus progressos e no enfrentamento de obstáculos; promover condições para que os alunos exercitem sua atividade mental autoestruturante, estabelecendo relações entre conteúdos, atribuindo-lhes significado e regulando o próprio processo de aprendizagem; promover a autoestima e o autoconceito; promover canais de comunicação; potencializar a autonomia e possibilitar que os alunos aprendam a aprender; avaliar os alunos de acordo com sua capacidade e seu esforço, bem como incentivar a autoavaliação.

O desenvolvimento da prática educativa à qual se fez referência, que vise ao papel ativo do aluno ao longo de seu processo de aprendizagem, seguramente contribui para o desenvolvimento da criatividade. Dessa forma, criar um ambiente de aprendizagem estimulador da participação individual e coletiva proporciona momentos privilegiados de interação entre os sujeitos, com trocas de experiências e de soluções de problemas, capazes de favorecer o desenvolvimento do potencial criador.

Na visão de Martínez (2006a), o contexto educacional é um dos ambientes sociais essenciais que influenciam a constituição da subjetividade individual e, como parte dela, do processo criativo. As estratégias educacionais utilizadas em sala devem promover de forma intencional o desenvolvimento da criatividade no processo de aprendizagem. Assim sendo, ainda segundo essa mesma autora, o professor pode contribuir de maneira decisiva nesse processo, se ele próprio puder planejar estratégias individuais que desenvolvam nos alunos configurações subjetivas que participem da regulação do processo criativo e se for capaz de estimular a criatividade em função das necessidades diferenciadas dos alunos.

Uma vez ciente de seu papel de tutor atento à qualidade da aprendizagem de seus alunos, é indispensável ao professor conhecer algumas características especiais que ele necessita apresentar no relacionamento com os mesmos, para ser capaz de identificar e intervir de acordo com as necessidades deles, criando assim um clima de segurança em sala de aula. Tais características o levariam a ser um educador de muitas faces, sendo a mais importante ser um educador reflexivo-criativo (Castillo, 2006). Com isso, cabe ressaltar a necessidade de o professor também conhecer melhor as causas de suas dificuldades para poder superá-las, bem como poder contar com o apoio de outros profissionais envolvidos na prática educativa. Pois, é preciso não esquecer que, mesmo o professor sendo considerado um dos principais agentes do contexto educativo, capaz de influenciar no desenvolvimento e expressão da criatividade dos alunos, ele faz parte de uma equipe de profissionais e, portanto, não está sozinho.

Por essa razão, é fundamental que o coordenador pedagógico esteja ciente de seu papel enquanto profissional responsável pela organização e orientação do trabalho pedagógico e possa contribuir para a construção de uma prática docente mais criativa. No entanto, a ausência de estudos sobre a percepção desse profissional com relação à importância do desenvolvimento e expressão da criatividade no contexto escolar, especialmente no trabalho docente, revela uma lastimável lacuna nos estudos da área no que se refere a seu grande envolvimento profissional para o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem de qualidade. Em vista disso, o propósito deste estudo foi investigar a importância atribuída por coordenadores pedagógicos ao desenvolvimento da criatividade no contexto escolar de maneira geral, bem como sua percepção quanto à relevância de o professor desenvolver/expressar sua criatividade na prática docente.

Método

Natureza do estudo

A presente pesquisa caracterizou-se como uma investigação exploratória, de caráter qualitativo. A escolha dessa modalidade de investigação deveu-se ao fato de ela proporcionar, como sinalizam Denzin e Lincoln (2000), maior flexibilidade e reflexividade para o pesquisador ao longo do estudo, oportunizando uma gama de práticas interpretativas sempre com vistas à melhor compreensão do fenômeno objeto de investigação. Segundo esses e outros autores, como Gaskell e Allum (2002), o uso dessa abordagem metodológica envolve a identificação de significados e interpretações, investigando fenômenos em seu setting natural e analisando-se os resultados por meio da indução analítica. Esta foi, portanto, a estratégia utilizada nesta investigação.

Participantes

Os participantes foram escolhidos a partir da consulta a várias páginas, na Internet, de escolas particulares de ensino fundamental de Brasília, Distrito Federal. Nessas páginas buscou-se identificar, na proposta pedagógica ou nos objetivos educacionais das instituições, se elas faziam alguma referência à importância do desenvolvimento da criatividade.

Participaram da pesquisa 12 coordenadores pedagógicos de ensino fundamental de escolas particulares de Brasília, sendo 2 do sexo masculino (16,6%) e 10 do feminino (83,3%). A idade dos coordenadores entrevistados variou de 32 a 63 anos, com a média etária de 47,5 anos. Dez dos 12 coordenadores eram pedagogos, um era licenciado em História e um em Geografia. Quanto ao nível de escolaridade mais elevado, um possuía mestrado completo, um com mestrado incompleto, sete possuíam especialização completa e três apenas a graduação. Metade dos coordenadores entrevistados trabalhava menos de 40h semanais, variando de 25h a 36h sua permanência na escola; a outra metade cumpria uma carga horária igual ou superior a 40h, variando de 40h a 50h. A carga horária média foi de 37,6/hora. A média de experiência na coordenação foi de 15,6 anos, com amplitude entre menos de um ano e 30 anos. De todos os entrevistados, apenas um nunca tinha exercido a função docente. O restante dos participantes revelou ter sido professor antes de desempenhar a função de coordenador ou concomitantemente a ela. Destes, o menor tempo na atividade docente foi de cinco anos, e o maior, de 35 anos. Quanto ao grau de satisfação dos coordenadores com relação ao trabalho que desempenhavam na coordenação pedagógica, numa escala de um a dez, um atribuiu o grau seis, um o grau sete; oito atribuíram o grau oito, um o grau nove e um o grau dez de satisfação. A fim de preservar a identidade dos participantes, eles foram codificados utilizando-se a letra "C", que indica coordenador, seguida do número que indica a ordem da realização da entrevista.

Instrumento

Foi utilizada a entrevista individual semiestruturada, cujo protocolo constituía-se de duas partes. A primeira constou de questões de identificação (nome, gênero, idade, formação na graduação, nível mais elevado de escolaridade, tempo de atuação na coordenação e de experiência em sala de aula, carga horária semanal e grau de satisfação na coordenação). A segunda compreendeu elementos relacionados ao fenômeno investigado, como importância da criatividade no contexto escolar e importância do desenvolvimento/expressão da criatividade no trabalho docente.

Procedimento

Inicialmente foi realizado um estudo piloto que contou com a participação de dois coordenadores pedagógicos do ensino fundamental. O objetivo desse estudo foi verificar a estrutura e a clareza do protocolo de entrevista, bem como identificar possíveis falhas no referido protocolo, a fim de torná-lo o mais adequado possível para o alcance dos objetivos propostos. No que diz respeito aos aspectos focalizados, não foi detectada a necessidade de possíveis alterações nas perguntas.

Foram identificadas oito escolas que atenderam ao critério apresentado no item "participantes". Todas foram contatadas por telefone, sendo agendada uma visita, quando foram novamente informadas acerca do estudo e receberam uma carta solicitando autorização da direção para que fosse realizada a pesquisa junto aos coordenadores pedagógicos. Das oito escolas contatadas, seis autorizaram a realização do estudo. Posteriormente, os coordenadores foram contatados por telefone, e aqueles que concordaram em participar da pesquisa receberam maiores esclarecimentos sobre seus objetivos. As entrevistas foram conduzidas pela primeira autora da pesquisa nas próprias escolas, tendo os coordenadores lido e assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes de seu início. As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas verbatim. As gravações tiveram um tempo médio de 41 minutos, variando entre 21 e 59 minutos.

Análise dos dados

O método adotado para análise de dados foi a análise de conteúdo clássica, muito utilizada em pesquisa social, por ser uma estratégia de análise de textos que considera o conteúdo das informações por meio da produção de inferências, buscando compreender e descrever o conteúdo das mensagens (Bardin, 2009; Bauer, 2002; Franco, 2008).

Na primeira fase realizou-se a organização preliminar do material das entrevistas, permitindo, assim, torná-lo disponível a uma exploração mais sistemática. Nessa etapa, elaboraram-se os indicadores, a partir da presença frequente de menções explícitas de distintos temas que posteriormente possibilitaram a construção de categorias. A segunda etapa caracterizou-se pela organização de quadros a partir das respostas dos entrevistados com a utilização da codificação, enumeração e categorização. Na codificação, foram identificadas as unidades de registro presentes no conteúdo das respostas dos entrevistados, das quais se privilegiou o "tema", ou seja, um recorte do sentido de algo que, na visão de Bardin (2009), é uma unidade de significação muito utilizada na análise de entrevistas, permitindo descobrir os núcleos de sentido que compõem a comunicação, podendo sua frequência de aparição ser significativa para o objetivo analítico escolhido. Por essa razão, utilizou-se a enumeração de frequência, que tem por base o seguinte princípio: quanto maior for a frequência de aparição de uma unidade de registro, maior será sua importância. Quanto à categorização, optou-se pelo agrupamento por categoria semântica, reunindo-se em uma mesma categoria todos os temas que apresentassem o mesmo significado. A etapa seguinte compreendeu o tratamento das informações, a produção de inferências e a interpretação do conteúdo das respostas dos participantes às questões que compunham o protocolo da entrevista.

Resultados e Discussão

Importância da criatividade no contexto escolar

A criatividade é um elemento constantemente citado no discurso de instituições dos mais diferentes segmentos, principalmente na área educacional. Tanto isso é veiculado no dia a dia da mídia, dos ambientes sociais e de trabalho, que tal aspecto foi considerado como critério na escolha das escolas onde os coordenadores pedagógicos foram procurados e convidados a participar deste estudo. Por essa razão, considerou-se relevante investigar o grau de importância atribuído por esses profissionais ao desenvolvimento/expressão da criatividade no contexto escolar de maneira geral e também no trabalho docente.

Na entrevista, quanto ao aspecto inicialmente focalizado - importância da criatividade no contexto escolar -, pelas respostas pôde-se observar que esse elemento foi considerado muito importante por todos os entrevistados, sendo sua importância mais frequentemente relacionada ao trabalho pedagógico (42,8%). Em segundo lugar, a criatividade foi relacionada ao desenvolvimento pessoal (35,7%) e, por último, foi considerada importante para que a escola consiga acompanhar o mundo em constante evolução (21,4%) (Tabela 1).

As falas transcritas a seguir ilustram as distintas categorias:

"Ela tem que ter um propósito, ela tem que ter um objetivo claro, geral e específico. Ela tem que ser elaborada. Seria um elemento que estaria no planejamento, ele é concomitante" (C11).

"Não adianta se não tiver um objetivo traçado, se não tiver uma organização prévia, simplesmente querer construir. Tem que traçar, saber o que precisa. Então, tudo isso eu acho que são elementos muito importantes para que essa criatividade também possa fluir ..."(C7).

"É importante a criatividade estar no contexto escolar porque a criatividade leva as pessoas a amarem as ideias e é com essas ideias que a gente aprende a estabelecer relações. É observando essas ideias que a gente percebe como elas se relacionam, como elas se apoiam, como elas convergem umas sobre as outras"(C3).

"Sim, eu acho muito importante. Porque a criança de hoje convive com um mundo que tem muito estímulo, então a escola não pode ficar atrás, ela tem que proporcionar momentos de criatividade, estimular mesmo essa criatividade da criança para que o aluno tenha interesse em participar" (C2).

Na percepção dos entrevistados, a criatividade deve estar presente no ambiente escolar, principalmente, por favorecer o trabalho pedagógico. No entanto, entendeu-se, a partir dos relatos dos coordenadores, que ela estaria condicionada a aspectos tais como acontecer de forma intencional, ou seja, estar no planejamento dos professores e com propósitos bem definidos, bem como haver recursos materiais e espaço para que ela possa ocorrer.

Pesquisas recentes na área da criatividade realizadas com profissionais da educação (Godinho, 2008; Oliveira, 2007; Oliveira & Alencar, 2007; Silva, 2007) têm destacado que, quando a criatividade é trabalhada na escola, geralmente isso não ocorre de forma intencional, devido principalmente ao desconhecimento sobre esse fenômeno por parte de diretores, coordenadores, orientadores e professores. Assim sendo, é relevante destacar que, mesmo que esses profissionais tentem desenvolver no contexto escolar práticas que estimulem o pensamento criativo, enquanto não houver um investimento em sua formação (inicial e continuada) com relação à importância dos aspectos cognitivos, conativos e ambientais no desenvolvimento da criatividade (Lubart, 2007), a escola continuará não trabalhando as habilidades criativas ou o fará de forma intuitiva e despreparada, sem conseguir atender à crescente demanda da sociedade por indivíduos mais criativos e que saibam enfrentar os constantes desafios dos dias atuais.

Corroborando essas ideias, Martínez (2006b) acrescenta que os professores em geral tendem a reproduzir no trabalho o que vivenciaram em sua vida escolar e, mais ainda, recebem em sua formação receitas, normalmente implícitas, sobre o que é ser professor e como ensinar, o que nada ou pouco tem a ver com a criatividade. Chama atenção também para o fato de conteúdos e atividades estimuladores da criatividade no trabalho pedagógico praticamente inexistirem nos currículos dos cursos de formação de professores.

Uano (2002), ao discutir as barreiras à criatividade, ressalta a importância dos recursos na diversificação de estratégias de ensino para atender aos diferentes estilos de aprendizagem dos alunos. A falta de recursos materiais também foi um dos obstáculos à criatividade indicados no estudo realizado por Ribeiro e Fleith (2007) com professores e estudantes de licenciatura.

Por outro lado, é válido levantar o seguinte questionamento: será que a disponibilidade de diversificados recursos tecnológicos e materiais pode garantir que eles serão utilizados de forma criativa? Na visão de Martínez (2006b), existe na escola uma tendência em introduzir coisas novas em sala de aula sem haver, no entanto, uma preocupação com os reais efeitos que elas podem produzir na aprendizagem e no desenvolvimento dos alunos. Essa autora assinala que de nada adianta uma diversidade de dinâmicas e jogos utilizados em sala de aula se eles possuem objetivos em si mesmos, não são integrados a outros elementos do trabalho pedagógico e não se apresentam acompanhados de interesses reais voltados ao incremento dos níveis de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos.

O segundo aspecto mais destacado pelos coordenadores para justificar a importância de trabalhar a criatividade no ambiente escolar foi o de favorecer o desenvolvimento pessoal, pois, segundo esses profissionais, ela tornaria as pessoas mais amantes das ideias, mais questionadoras e reflexivas, mais aptas para atender às diferenças, enquanto também os alunos aprenderiam com maior prazer.

Com isso, pode-se perceber que a criatividade também aparece ligada ao crescimento pessoal e à capacidade do indivíduo de interpretar melhor a realidade à sua volta e se envolver com o próprio aprendizado de forma mais intensa. Seria isso, talvez, indício da construção do que Martínez (1997; 2002) chama de uma "concepção personológica da criatividade" do sujeito, ressaltando-se aí a importância pessoal da criatividade. Ainda dentro desse segundo aspecto ressaltado, um dos participantes, mesmo considerando o trabalho com a criatividade extremamente positivo, foi enfático ao mencionar que pouco ou nada se poderia fazer para desenvolvê-la, pois ela já viria com a pessoa, seria um dom.

Importância da criatividade no trabalho docente

Constatou-se que todos os coordenadores consideraram importante a criatividade no trabalho docente. Para justificar a resposta, eles apresentaram motivos associados ao aluno (64,3%), argumentando que a atuação criativa do professor faz com que os alunos fiquem mais interessados e os ajuda a dar mais significado ao conhecimento, facilitando a aprendizagem; que os professores precisam ser criativos, pois os alunos de hoje não aceitam um ensino repetitivo; e que o professor precisa saber lidar com as mudanças e atender às necessidades dos alunos. A criatividade no trabalho docente também foi relacionada ao desenvolvimento do próprio professor (35,7%), sendo destacados aspectos como flexibilidade, disponibilidade para aprender e fazer, atenção às mudanças e percepção de formas diferenciadas de ensinar e aprender. Na Tabela 2 encontra-se uma síntese das respostas que espelham a percepção dos coordenadores sobre a importância do elemento criatividade no trabalho do professor.

Seguem transcrições de respostas relativas à importância de o professor ser criativo:

"Os alunos acabam se interessando mais pelo conteúdo quando o professor ensina de uma maneira diferente..." (C2).

"O professor pode ajudar o aluno a dar mais sentido, mais significado ao conhecimento, às ideias, ao mundo, à realidade que nós vivemos"(C3).

"Ele pode facilitar realmente o entender o conteúdo, então, se ele tem isso, se ele tem essa habilidade, com certeza o resultado é mais positivo, tanto pra ele no trabalho dele, quanto para o aluno na aquisição do saber" (C6).

"O professor tem que estar nesse contato, nessa mudança constantemente, ser criativo o tempo todo, atento e observando aquilo que está mudando" (C4).

"É muito importante o professor ter criatividade porque ela o leva a ser mais flexível, ela o leva a não ficar sempre enquadrado na mesma visão"(C8).

Com relação à importância da criatividade no trabalho do professor, a categoria mais enfatizada foi a relacionada ao aluno. Nesse aspecto, foram salientados o maior interesse e estímulo dos alunos em sala de aula, o atendimento a suas individualidades e necessidades, a facilitação de seu aprendizado e sua recusa em aceitar um ensino repetitivo.

O fato de os coordenadores terem se referido principalmente a elementos relacionados ao aluno possivelmente reflete sua consciência da necessidade de se construir um ensino mais centrado no aluno, que respeite seus interesses, necessidades e habilidades, ao longo do processo ensino-aprendizagem. Fleith (2007), em seu estudo de revisão acerca dos modelos propostos para desenvolver a criatividade, apresenta os seis que mais se destacam. Segundo a autora, em todos eles o oferecimento de oportunidades de escolha ao aluno, levando em consideração seus interesses, estilos e habilidades, é uma das características de um ambiente de sala de aula favorável ao desenvolvimento da criatividade.

Os participantes do estudo também consideraram importante a criatividade no trabalho docente por razões ligadas ao próprio educador. Nesse sentido, foram evidenciadas a flexibilidade, a disponibilidade para aprender e fazer, o acompanhamento das mudanças e a percepção das diferentes formas de ensinar e aprender. No entanto, esses foram aspectos menos indicados. Mesmo assim, cabe ressaltar que a figura do professor criativo, aquele capaz de encorajar, acolher e provocar no momento certo é fundamental para o desenvolvimento de qualquer proposta de ensino que tenha por objetivo o desenvolvimento do potencial criador (Alencar & Galvão, 2007; Fleith, 2007; Martínez, 1997; Renzulli, Gentry & Reis, 2007), sendo da maior relevância que ele tome consciência de seu papel para poder atuar nesse processo com intencionalidade.

No entanto, vale lembrar a perspectiva de Martínez (2006b) quando ressalta que uma das possibilidades de expressão da criatividade no trabalho pedagógico está na capacidade do professor em enxergar a sala de aula de forma diferente, onde estão sujeitos que pensam e aprendem de forma diferente. Por isso mesmo, uma de suas maiores dificuldades estaria justamente em contribuir para o desenvolvimento da criatividade na aprendizagem de seus alunos, sem utilizar receitas e estratégias universais, pois assim estaria negando a própria criatividade.

Embora os coordenadores tenham concordado quanto à importância da criatividade no contexto escolar e em especial no trabalho docente, foi possível observar que são vários os desafios enfrentados por eles no processo de fazer com que a criatividade esteja de fato presente no ambiente da escola. Um desses desafios é a própria formação tanto do coordenador quanto dos professores: ambos, de modo geral, pouco conhecem a respeito de ambientes de aprendizagem, ensino e avalição que contribuam para que os alunos tomem consciência de seu potencial para criar, ou onde desenvolvam e expressem sua criatividade. Um segundo desafio diz respeito ao papel do professor. Este tem como uma de suas principais responsabilidades assegurar a aprendizagem, pelo aluno, de uma vasta gama de conteúdos relativos às distintas disciplinas da grade curricular. Sendo essa a prioridade, tornam-se escassas as oportunidades oferecidas aos alunos para questionar, expressar ideias divergentes e participar de atividades que possibilitem uma atuação criativa

Ademais, embora o fomento da criatividade usualmente esteja presente no projeto pedagógico da escola, é raro uma cultura institucional que a valorize de fato e possibilite sua expressão. De modo geral, não tem sido uma prática do coordenador pedagógico encorajar os professores a experimentarem novas práticas pedagógicas, oferecer-lhes amplas oportunidades de compartilhar experiências de ensino criativo bem sucedidas, facilitar-lhes o acesso a informações sobre como promover a criatividade na vida pessoal e profissional. O que na maioria das vezes se observa é que o coordenador pedagógico consegue apenas acompanhar o trabalho do professor, mais como expectador de todo o processo educativo do que como agente construtor dessa dinâmica. Quem dera o coordenador pudesse destinar grande parte de seu tempo na escola para desenvolver práticas que realmente formassem os professores e os levassem a investir na produção de novas ideias em sala de aula e a refletir sobre o efeito das mesmas no desenvolvimento do potencial criativo de seus alunos.

Considerações Finais

O contexto escolar constitui, sem sombra de dúvidas, um dos locais mais férteis ao desenvolvimento da criatividade. Nesse sentido, o presente estudo proporcionou vislumbrar alguns aspectos da percepção do coordenador pedagógico no que se refere ao desenvolvimento/expressão da criatividade de uma das personagens mais importantes do cenário escolar, o professor.

Entretanto, o estudo apresenta limitações. Uma delas diz respeito ao tamanho reduzido da amostra utilizada. Outra é ter sido a amostra selecionada apenas em escolas particulares de uma única região de Brasília, Distrito Federal. Esse é um fator que limita a possibilidade de generalização dos resultados obtidos no estudo, uma vez que não se pode assegurar que resultados similares seriam obtidos caso fosse utilizada uma amostra maior, ou caso participassem coordenadores de escolas públicas, quer localizadas no mesmo setor da cidade onde os dados foram coletados, quer em outros locais.

Sabe-se que o ambiente escolar tanto pode promover o desenvolvimento da criatividade quanto pode inibi-la. Os resultados desta pesquisa indicaram que, para o coordenador, a criatividade é um elemento importante no contexto educacional e que o professor criativo pode ser um elemento chave para estimular seu desenvolvimento e expressão no ambiente escolar. No entanto, observa-se que os coordenadores entrevistados não fizeram nenhuma referência a estratégias que pudessem ser desenvolvidas junto ao professor a fim de proporcionar-lhe condições para desenvolver seu potencial criador. Com isso, concluiu-se que o coordenador parece estar-se esquecendo de que a prática docente em todas as suas dimensões é, em grande parte, reflexo de sua atuação ao orientar o trabalho pedagógico. Como componente do grupo, o coordenador partilha dos sucessos e insucessos produzidos por ele. Nesse sentido, cabe o seguinte questionamento: até que ponto o coordenador está realmente conseguindo enxergar a dimensão da atuação do professor, principalmente, no que se refere ao lugar da criatividade no planejamento e dinâmica da aula, para poder intervir de forma a potencializá-la?

É sem dúvida muito importante que a criatividade esteja presente no contexto escolar, sobretudo no trabalho do professor, e que este utilize estratégias didáticas diferenciadas e inovadoras que despertem o interesse dos alunos pelos conteúdos e projetos. No entanto, essa pode ser considerada uma visão limitada dos participantes deste estudo, pois deixa de lado outras importantes variáveis relativas à construção de um ambiente estimulador da criatividade, ligadas tanto ao indivíduo quanto ao ambiente onde ele está inserido. Essa visão deixa transparecer a falta de informação por parte dos profissionais entrevistados sobre como a criatividade pode ser desenvolvida e expressa, trazendo à tona um pensamento ainda unilateral sobre esse fenômeno.

Diante do exposto, vale ressaltar a importância de a escola investir na formação continuada do professor e do coordenador, bem como na do orientador e do gestor, com vistas a proporcionar conhecimentos acerca da criatividade, dos fatores que contribuem para sua expressão e das estratégias para implementá-la no contexto escolar. Isso contribuiria para que o coordenador atuasse como um profissional estimulador do desenvolvimento/expressão da criatividade docente, em consonância com a crescente demanda por uma prática educativa mais consciente e intencional, que atenda às exigências da sociedade atual.

Finalmente, espera-se que os resultados deste estudo possam servir de referencial para futuras pesquisas, suprindo assim uma lacuna acerca de estudos empíricos sobre a percepção do coordenador pedagógico acerca do desenvolvimento e expressão da criatividade do professor.

Recebido em: 25/8/2010

Versão final em: 28/10/2011

Aprovado em: 10/2/2012

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  • 1
    Artigo elaborado a partir da dissertação de E.B.P. OLIVEIRA, intitulada "Percepção do coordenador pedagógico sobre a criatividade do professor de ensino fundamental". Universidade Católica de Brasília, 2009.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      25 Ago 2010
    • Aceito
      10 Fev 2012
    • Revisado
      28 Out 2011
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