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Influência da modalidade de reconto na avaliação do desempenho de escolares em compreensão leitora

Influence of retelling modality on reading comprehension assessment

Resumos

Este estudo buscou estudar a influência da modalidade de reconto sobre a avaliação da compreensão leitora. Avaliaram-se 34 escolares do 2º ao 5º ano do Ensino Fundamental, sem queixas de leitura, agrupados em: 1) Grupo Reconto Oral: 19 crianças que recontaram oralmente texto narrativo e expositivo lidos; 2) Grupo Reconto Escrito: 15 que o fizeram por escrito. A análise dos recontos quantificou proposições de ideia central, detalhe, inferências e número de enlaces. Estabeleceu-se, também, o padrão de compreensão (3-0, do melhor para o pior desempenho). Resultados evidenciaram semelhanças entre as médias de desempenho dos grupos nas variáveis do reconto de texto narrativo. Para o expositivo, houve diferença para enlaces de primeiro nível (t = -2,114, p = 0,042), com maior média do Grupo reconto escrito. Concluiu-se, portanto, que a modalidade do reconto não influenciou a avaliação da compreensão de textos narrativos, mas o reconto escrito de textos expositivos favoreceu o aparecimento de enlaces entre ideias centrais.

Avaliação; Compreensão; Leitura


The aim of the present study was to investigate the influence of the retelling strategy modality on the assessment of reading comprehension. Thirty-four 2nd-5th grade students (elementary school) without reading difficulties were evaluated and grouped as follows: Group 1. Oral retelling: students orally reconstructed narrative and expository texts they read (19 students); Group 2. Writing retelling: students retold these same stories in writing (15 students). The analysis conducted assessed retelling in terms of: proposition of central idea, details, inferences, and number of links. A performance reference standard (3-0) was also established from the best to the worst performance. The results obtained showed similarity between the average performance of the variables of the oral narrative text retelling groups. As for the expository texts, there were differences in the first level of links (t = -2.114, p = 0.042), and the highest average performance was found for the writing retelling group. It can be concluded that the retelling strategy modality did not influence the evaluation of the understanding of narrative texts, but the written retelling of expository texts influenced the connection of central ideas.

Measurement; Comprehension; Reading


A tarefa de reconto após leitura tem sido considerada um importante instrumento de avaliação da compreensão leitora por possibilitar o acesso à expressão direta da representação mental que o leitor construiu a partir das informações do texto lido (Leslie & Cadwell, 2009Leslie, L., & Caldwell, J. (2009). Formal and informal measures of reading comprehension. In S. E. Israel & G. G. Duffy. Handbook or research on reading comprehension (pp.403-27). New York: Taylor & Francis.; Reed & Vaughn, 2012Reed, D. K., & Vaughn, S. (2012). Retell as an indicator of reading comprehensionScientific Studies of Reading, 16(3), 187-217.; Riley & Lee, 1996Riley, G. L., & Lee, J. F. (1996). A comparison of recall and summary protocols as measures of second language reading comprehensionLanguage Testing, 13(2), 173-189.). Por meio dessa ferramenta pode-se identificar as informações que o leitor julgou essenciais e verificar como este as integrou e organizou logicamente. A análise do reconto permite o acesso aos diferentes níveis de representação mental construídos pelo leitor, livres de possíveis interferências ou da indução à resposta como observado à aplicação de outras tarefas de avaliação (e.g., questões de múltipla escolha) (Bernhardt, 1991Bernhardt, E. B. (1991). Reading development in a second-language Norwood, NJ: Ablex.).

Dentre as análises possíveis, a identificação do número de proposições (ou ideias) recontadas tem sido importante medida por mostrar o papel das proposições como unidades básicas de memória do texto (Kintsch & Keenan, 1973Kintsch, W., & Keenan, J. (1973). Reading rate and retention as a function of the number of propositions in the base structure of sentencesCognitive Psychology, 5(3), 257-274.). Essa medida é relevante por apresentar relação direta tanto com a micro quanto com a macroestrutura do texto.

A análise do reconto pode fornecer indícios sobre as características das informações processadas pelo leitor. Evidências comprovam que as proposições são melhor recontadas à medida que o leitor realiza eficientemente o parsing. Pelo parsing o leitor faz a identificação das estruturas sintáticas das sentenças e estabelece as relações sintáticas e/ou semânticas entre estes constituintes, construindo uma unidade de sentido (proposições) que promove a compreensão local, ou seja, da microestrutura (Kintsch, 1988Kintsch, W. (1988). The role of knowledge in discourse comprehension: A construction integration model. Psychological Review, 95(2),163-82.; 1998Kintsch, W. (1998). Comprehension: A paradigm for cognition. New York: Cambridge University Press.). Além disso, o uso das macro regras, essenciais para constituição da macroestrutura do texto, influenciam o reconto a ponto de favorecer que as ideias principais, veiculadas no texto, sejam recontadas mais frequentemente que as de detalhe ou supra-ordenadas (Kintsch & Keenan, 1973Kintsch, W., & Keenan, J. (1973). Reading rate and retention as a function of the number of propositions in the base structure of sentencesCognitive Psychology, 5(3), 257-274.; Louwerse & Graesser, 2006Louwerse, M. M., & Graesser, A. C. (2006). Macroestrutura. In K. Brown (Ed.), Encyclopedia of language & linguistics (2nd ed., pp.426-29). London: Elsevier.). O reconto também permite analisar o conhecimento do leitor sobre a estrutura dos textos. Pode-se computar os enlaces entre ideias e caracterizar, por um crivo de pontuação, o nível de compreensão alcançado pelo leitor. Esses dados fornecem indícios sobre a organização mental das ideias em função de um esquema estruturado de texto, que possibilita o entendimento global da informação lida (Bernhardt, 1991Bernhardt, E. B. (1991). Reading development in a second-language Norwood, NJ: Ablex.; Carvalho, Ávila, & Chiari, 2009Carvalho, C. A. F., Ávila, C. R. B., & Chiari, B. M. (2009). Níveis de compreensão de leitura em escolares. Pró-Fono: Revista de Atualização Científica, 21(3), 207-12.; Kida, 2009Kida, A. S. B. (2009). Bateria de avaliação de habilidades e competências linguísticas, de escrita e de leitura: estudo piloto (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal de São Paulo.; Owens, Bower, & Black, 1979Owens, J., Bower, G. H., & Black, J. B. (1979). The "soap opera" effect in story recallMemory & Cognition, 7(3), 185-191.).

Diferentes esquemas orientam a leitura e estão diretamente relacionados ao gênero textual narrativo ou expositivo. Os textos narrativos têm, como principal objetivo, apresentar algum fato que cumpra função informativa, de aprendizado ou, mais frequentemente, de entretenimento. Esse tipo de texto baseia-se na ação que envolve personagens, tempo, espaço e conflito apresentados sob o ponto de vista de um narrador. Por sua vez, textos expositivos veiculam um conhecimento mais sistematizado com o propósito de difundir o saber por meio de uma estrutura expositivo-explicativa.

O conhecimento dos esquemas relacionados ao gênero textual é que possibilita a organização das ideias em torno de uma cadeia, no caso de textos narrativos (Stein & Glenn, 1979Stein, N. L., & Glenn, C. G. (1979). An analysis of story comprehension in elementary school children. In R. O. Freedle (Ed.), New directions in discourse processing (pp.53-120). New York: Ablex Publishing.; Trabasso & van den Broek, 1985Trabasso, T., & van den Broek, P. (1985). Causal thinking and the representation of narrative eventsJournal of Memory and Language, 24(5), 617-30.), ou de uma estrutura de ordenação global-periférica, no caso dos expositivos. Para estes últimos, a estruturação das ideias em um esquema de texto ocorre sempre em função de um objetivo central delimitado (Ibarra, 2012Ibarra, A. B. (2012). Competencia retórica y la capacidad de comprensión lectora. En búsqueda de una relación causal (Tesis doctoral no publicada). Universidad de Salamanca, España.; Kida, 2009Kida, A. S. B. (2009). Bateria de avaliação de habilidades e competências linguísticas, de escrita e de leitura: estudo piloto (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal de São Paulo.). Sob o ponto de vista da avaliação da representação mental construída por meio da leitura, o reconto mostra-se capaz de quantificar, através do cômputo de enlaces e da identificação dos níveis de compreensão, a apropriação da estrutura global dos textos lidos.

Assim, há duas modalidades de avaliação da compreensão leitora por meio do reconto: uma pressupõe que o leitor apresente, oralmente, o produto de sua compreensão e outra solicita ao leitor que elabore, por escrito, o conteúdo depreendido (Bryan & Luszcz, 1999Bryan, J., & Luszcz, M. A. (1999). Speed of information processing and working memory as mediators of age differences in prose recall. Australian Psychologist34(2), 132-137.; Green, 1981Green, R. (1981). Remembering ideas from text: The effect of modality of presentation. British Journal of Educational Psychology, 51(1), 83-89.; Reed & Vaughn, 2012Reed, D. K., & Vaughn, S. (2012). Retell as an indicator of reading comprehensionScientific Studies of Reading, 16(3), 187-217.). Estudos indicam que, em crianças, a elaboração escrita pode influenciar mais e negativamente o desempenho que a elaboração oral (Bourdin & Fayol, 2007Bourdin, B., & Fayol, M. (2007). Is written language production more difficult than oral language production? A working memory approach. International Journal of Psychology, 29(5), 591-620.; Grabowski, 2010Grabowski, J. G. (2010). Speaking, writing, and memory span in children: Output modality affects cognitive performance, International Journal of Psychology 45(1), 28-39.). A necessidade de maior atenção aos processos de codificação pode interferir em etapas que demandam maior planejamento, tais como a estruturação do discurso e a organização de ideias em cadeias sintáticas (Flowers & Hayes, 1980Flowers, L. S., & Hayes, J. R. (1980). Identifying the organization of writing processes. In L. W. Gregg & E. R. Steinberg. Cognitive processes in writing (pp.3-30). Hillsdale: Lawrence Erlbaum.; Sánchez, 2002Sánchez, E. M. (2002). Compreensão e redação de textos: dificuldades e ajudas. Porto Alegre: Artmed.). Segundo pesquisas, crianças em processo de aprendizagem da escrita (escolares do 1º ao 3º ano do ensino fundamental) apresentam reduzida automaticidade grafomotora, além de estarem no curso do aprendizado do princípio alfabético e/ou do conhecimento ortográfico. Ambas as condições exigiriam maior capacidade de atenção e memória para as atividades de codificação em detrimento da elaboração, prejudicando o desempenho no discurso, efeito não observado na realização de tarefas orais (Grabowski, 2010Grabowski, J. G. (2010). Speaking, writing, and memory span in children: Output modality affects cognitive performance, International Journal of Psychology 45(1), 28-39.).

Como vantagem, no entanto, tem-se o fato da elaboração escrita do reconto permitir que maior tempo seja empregado na rememoração e no estabelecimento da relação entre os fatos, além de possibilitar melhor planejamento para expressão do conteúdo lido (Kahmi & Catts, 2012Kahmi, A. G., & Catts, H. (2012). Language and reading: Convergences and divergences. In A. G. Kahmi & H. Catts. Language and reading disabilities (3rd ed., pp.1-22). Boston: Pearson.). Neste sentido, o reconto oral parece exigir maior prontidão para elaboração. Por se construir após imediata solicitação para elaboração oral do conteúdo lido, a preocupação do avaliado em fornecer uma resposta imediata poderia afetar a rememoração de fatos importantes do texto e a qualidade do planejamento do discurso, que deve mostrar a coerência e a coesão entre as ideias relembradas.

No entanto, ainda que a efetividade da tarefa de reconto após leitura, seja oral ou escrita, tenha sido investigada e comprovada em diversos estudos (L. S. Fuchs, Fuchs, & Maxwell, 1988Fuchs, L. S., Fuchs, D., & Maxwell, L. (1998). The validity of informal reading comprehension measuresRemedial and Special Education, 9, 20-28.; Kahmi & Catts, 2012Kahmi, A. G., & Catts, H. (2012). Language and reading: Convergences and divergences. In A. G. Kahmi & H. Catts. Language and reading disabilities (3rd ed., pp.1-22). Boston: Pearson.; Leslie & Cadwell, 2009Leslie, L., & Caldwell, J. (2009). Formal and informal measures of reading comprehension. In S. E. Israel & G. G. Duffy. Handbook or research on reading comprehension (pp.403-27). New York: Taylor & Francis.; Vipond, 1980Vipond, D. (1980). Micro and macroprocesses in text comprehensionJournal of Verbal Learning and Verbal Behavior, 19(3), 276-296.; Wolff, Roelle, & Berthold, 2012Wolff, S., Roelle, J., & Berthold, K. (2012). Training active processing of explanations works but training focused processing works better. Proceedings of the Kongress der Deutschen Gesellschaft für Psychologie: 48th Conference of German Association for Psychology (DGPsP), Bielefeld, Germany. Abstract retrevied on May 20, 2013, from Abstract retrevied on May 20, 2013, from http://www.dgpskongress.de/frontend/ index.phd
http://www.dgpskongress.de/frontend/ ind...
), até o momento não é possível assegurar qual destas formas de avaliação possibilita o melhor acesso à representação construída pelo indivíduo após a leitura. Deste modo, o presente estudo se propôs a investigar a influência da modalidade de reconto (oral e escrita) e do gênero do texto (narrativo e expositivo) na avaliação do desempenho de escolares sem queixas de alterações de aprendizado da leitura (decodificação e compreensão) em tarefas de compreensão leitora. A partir deste estudo pretende-se saber qual das duas modalidades de reconto mostra-se mais adequada para avaliar o desempenho da compreensão leitora, permitindo ao professor ou clínico, acessar, com o mínimo de interferências, a representação mental construída pelo avaliado durante a leitura.

Método

Participantes

Os participantes deste estudo foram indicados pelos professores que receberam, previamente, orientações para que encaminhassem somente alunos que atendessem os critérios de inclusão definidos a priori. Esses critérios foram a ausência de queixas relacionadas ou de indicadores de alterações da audição e/ou da visão (não corrigidos), distúrbios neurológicos, comportamentais ou cognitivos, bem como a ausência de queixas relacionadas a possíveis deficit intelectuais (American Psychiatric Association, 1994American Psychiatric Association. (1994). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (DSM-IV) (4th ed.). Washington, DC: Author.). Solicitou-se, também, que os escolares indicados não apresentassem queixas ou dificuldades de leitura (decodificação ou compreensão leitora).

Esses alunos foram submetidos a uma tarefa de screening de leitura de modo a garantir a observância dos critérios de inclusão, bem como excluir escolares com dificuldades de decodificação e/ou reconhecimento de palavras, fatores capazes de interferir no desempenho em compreensão leitora. Assim, selecionaram-se 34 crianças (45% meninas), regularmente matriculadas em escolas da rede pública de ensino, do 2º ao 5º ano do ensino fundamental. Os escolares foram agrupados em:

Grupo Reconto Oral (GRO): 19 escolares (37% meninas), sendo 7 do 2º ano, 9 do 4º ano e 3 do 5º, que recontaram oralmente, imediatamente após a leitura, os textos que leram.

Grupo Reconto Escrito (GRE): 15 escolares (53% meninas), sendo 4 do 2º ano, 10 do 4º ano e 1 do 5º, que recontaram por escrito, imediatamente após a leitura, os textos que leram.

Procedimentos

Os participantes foram avaliados, individualmente, em única sessão realizada em uma sala cedida pela direção da escola. A avaliação constou de duas provas: 1) Compreensão da leitura do texto narrativo intitulado "O macaco e o coelho" (Carvalho, 2008Carvalho, C. A. F. (2008). Relação entre a função pragmática da linguagem e compreensão de texto (Dissertação de mestrado não-publicada). Universidade Federal de São Paulo.; Kida, 2009Kida, A. S. B. (2009). Bateria de avaliação de habilidades e competências linguísticas, de escrita e de leitura: estudo piloto (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal de São Paulo.), e 2) Compreensão da leitura do texto expositivo intitulado "Como são formados os vulcões?". Optou-se pela leitura de dois textos em razão das diferentes demandas cognitivas exigidas para os diferentes gêneros. A narração segue uma estrutura causal presente nas histórias infantis e conhecida pelas crianças. O conhecimento prévio da gramática dos textos, adquirido durante a exposição à estrutura de histórias contadas na infância, facilita o processo de seleção e identificação das ideias centrais e no estabelecimento das relações de causa e consequência entre os fatos (Stein & Glenn, 1979Stein, N. L., & Glenn, C. G. (1979). An analysis of story comprehension in elementary school children. In R. O. Freedle (Ed.), New directions in discourse processing (pp.53-120). New York: Ablex Publishing.). Por sua vez, o texto expositivo exige maior demanda cognitiva, por requerer maior participação da memória operacional, uma vez que maior volume de ideias deve ser mantido temporariamente para que estas sejam progressivamente integradas, a partir da ação das macro regras (Kintsch, 1988Kintsch, W. (1988). The role of knowledge in discourse comprehension: A construction integration model. Psychological Review, 95(2),163-82.). A integração das informações essenciais em um esquema global depende, ainda, do conhecimento das diferentes estruturas textuais, que se constrói a partir da exposição progressiva à leitura (Kintsch, 1988Kintsch, W. (1988). The role of knowledge in discourse comprehension: A construction integration model. Psychological Review, 95(2),163-82.; Sánchez, 2002Sánchez, E. M. (2002). Compreensão e redação de textos: dificuldades e ajudas. Porto Alegre: Artmed.; Vieira & Denhière, 1998Vieira, M. A. R., & Denhière, G. (1998). Compreensão de textos e classe socialLeitura: Teoria e Prática, 32, 34-41.).

Os escolares foram instruídos a ler os textos da forma habitual que utilizam para compreender, ou seja, oral ou silenciosamente, no tempo que necessitassem. Também foram informados de que, após a leitura, recontariam tudo o que compreenderam sobre os textos. Seguiram, para tanto, a determinação da avaliadora quanto à forma de realização desse reconto, se oral ou escrita, sendo que, quando oral, os recontos foram gravados em equipamento MP4. Os recontos orais transcritos e os escritos foram analisados na busca de identificar as variáveis de micro e de macroestrutura presentes, segundo parâmetros específicos para cada tipo de texto. Desta forma, os critérios para análise do reconto do texto narrativo foram:

Identificação das variáveis de microestrutura

Utilizou-se o crivo de análise do reconto do texto "O macaco e o coelho" (Kida, 2009Kida, A. S. B. (2009). Bateria de avaliação de habilidades e competências linguísticas, de escrita e de leitura: estudo piloto (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal de São Paulo.), definido por uma banca de três juízes a partir da proposicionalização do texto. As proposicionalizações realizadas pelos membros da banca foram comparadas e as proposições classificadas, por consenso, em função de sua importância para a cadeia causal - ideias centrais, de detalhe e inferências. A seguir, identificaram-se as categorias de eventos narrativos (Stein & Glenn, 1979Stein, N. L., & Glenn, C. G. (1979). An analysis of story comprehension in elementary school children. In R. O. Freedle (Ed.), New directions in discourse processing (pp.53-120). New York: Ablex Publishing.) presentes no texto, o que permitiu estabelecer os enlaces causais de primeiro nível, essenciais por interligarem as ideias centrais da cadeia causal, e os de segundo nível, quando uma ideia de detalhe substitui uma central na cadeia causal (Stein & Glenn, 1979Stein, N. L., & Glenn, C. G. (1979). An analysis of story comprehension in elementary school children. In R. O. Freedle (Ed.), New directions in discourse processing (pp.53-120). New York: Ablex Publishing.; Trabasso & van den Broek, 1985Trabasso, T., & van den Broek, P. (1985). Causal thinking and the representation of narrative eventsJournal of Memory and Language, 24(5), 617-30.). Os recontos foram analisados a partir desse crivo. Computaram-se o número de proposições de ideia central, de ideias de detalhe, de inferência, de enlaces de primeiro e de segundo nível recontados.

Identificação das macroestruturas

Identificaram-se as relações causais presentes no reconto a partir do mapa de análise dos episódios da narrativa (Kida, 2009Kida, A. S. B. (2009). Bateria de avaliação de habilidades e competências linguísticas, de escrita e de leitura: estudo piloto (Tese de doutorado não-publicada). Universidade Federal de São Paulo.). Essa identificação permitiu classificar o padrão de compreensão apresentado pela criança para o qual se atribuiu um escore conforme as orientações a seguir (Coté, Goldman, & Saul, 1998Coté, N., Goldman, S. R., & Saul, E. U. (1998). Students making sense of informational text: Relations between processing and representationDiscourse Processes, 25(1), 1-53.; Gonzales, 2008Gonzales, A. J. C. A. (2008). Lectura conjunta, pensamiento en voz alta y comprensión lectora (Tesis doctoral no publicada). Universidad de Salamanca, España.):

Padrão 3: apresenta todas as relações causais de primeiro nível (enlaces entre ideias centrais) ou contempla todos os momentos do texto marco inicial, fato inicial, resposta interna, execução, consequência e reação -, mesmo que substitua algumas ideias centrais por ideias de detalhe (três pontos);

Padrão 2: apresenta relações de causalidade consideradas mínimas, relacionando ideias do marco inicial, fato inicial, execução e reação (dois pontos);

Padrão 1: apresenta omissão de uma ou mais relações de causalidade consideradas mínimas (um ponto);

Padrão 0: omissão de ideias centrais do texto, não apresenta relações mínimas de causalidade e/ou revela intrusão de elementos não presentes no texto (0 pontos).

Os critérios de análise relativos aos textos expositivos foram:

Identificação das variáveis de microestrutura

Utilizou-se o crivo de análise do reconto do texto "Como são formados os vulcões?". O crivo foi definido a partir da proposicionalização do texto e da identificação das ideias centrais, de detalhe e inferências elaborativas importantes para sua compreensão. Também foram apontados os enlaces, classificados em (Ibarra, 2012Ibarra, A. B. (2012). Competencia retórica y la capacidad de comprensión lectora. En búsqueda de una relación causal (Tesis doctoral no publicada). Universidad de Salamanca, España.; Sánchez, 2002Sánchez, E. M. (2002). Compreensão e redação de textos: dificuldades e ajudas. Porto Alegre: Artmed.):

Enlaces de ordenação central: representam nexos causais entre as ideias centrais identificadas no texto;

Enlaces supra-ordenados: representam nexos entre uma ideia central e uma ideia de detalhe;

Enlaces ordenados periféricos: representam nexos entre ideias de detalhe;

Enlaces de segundo nível: que caracterizam a substituição de uma ideia central por uma ideia de detalhe.

Para este estudo procedeu-se à identificação e cômputo das ideias centrais e de detalhe e inferências, bem como os enlaces causais em suas diferentes classificações.

Identificação das variáveis de macroestrutura

Os recontos foram classificados segundo padrões de compreensão apresentados pelos escolares e a estes atribuiu-se um escore conforme as orientações a seguir (Coté et al., 1998Coté, N., Goldman, S. R., & Saul, E. U. (1998). Students making sense of informational text: Relations between processing and representationDiscourse Processes, 25(1), 1-53.; Gonzales, 2008Gonzales, A. J. C. A. (2008). Lectura conjunta, pensamiento en voz alta y comprensión lectora (Tesis doctoral no publicada). Universidad de Salamanca, España.; Ibarra, 2012Ibarra, A. B. (2012). Competencia retórica y la capacidad de comprensión lectora. En búsqueda de una relación causal (Tesis doctoral no publicada). Universidad de Salamanca, España.):

Padrão 3: presença de todos os enlaces de ordenação central contando ainda com alguma relação supra-ordenada, independentemente da presença de enlaces de ordenado-periférico ou de segunda ordem (3 pontos);

Padrão 2: presença de todas as conexões causais entre ideias centrais, porém, sem relação supra-ordenada. Podem ou não contar com relações de ordenado-periférico ou de segunda ordem (2 pontos);

Padrão 1: presença de, ao menos, algum enlace de ordenação central supra-ordenado, ordenado periférico ou de segunda ordem (1 ponto);

Padrão 0: ausência de conexões causais de qualquer ordem (0 pontos).

Todos os dados obtidos na análise das transcrições e da produção escrita do reconto após leitura foram tabulados por criança e submetidos a análise estatística. Para investigar a existência de possíveis diferenças no desempenho dos escolares em tarefas de reconto oral e escrito após leitura aplicaram-se os Testes - t para amostras independentes, adotando-se o nível de significância de 5% (0,05) e grau de liberdade de 32. Para investigação de possíveis diferenças no desempenho dos escolares em tarefas de reconto em função do gênero textual (narrativo/expositivo) foram calculadas as proporções de enlaces (total de enlaces recontados/total de enlaces possíveis) e de ideias (total de ideias recontadas/total de ideias presentes no texto), analisadas por comparações múltiplas, através do teste de Bonferroni. Foram considerados significativos os valores de p < 0,05. Além disso, este estudo recebeu aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) - CEP/ UNIFESP, sob Protocolo no250.102.

Resultados

As análises descritiva e inferencial dos dados de desempenho dos grupos nas tarefas de reconto após leitura encontram-se nas Tabelas 1 e 2. O estudo comparativo das médias de desempenho para as variáveis do reconto do texto narrativo mostrou ausência de diferenças estatisticamente significantes entre o desempenho do GRO e o dos escolares do GRE. A análise comparativa para o texto expositivo, no entanto, mostrou diferença estatisticamente significante entre o desempenho dos grupos quanto aos enlaces de ordenação central (t = -2,114, p = 0,042). Os escolares do GRE apresentaram maior número de enlaces entre as ideias consideradas centrais em comparação com os do GRO.

O estudo comparativo do desempenho dos grupos em função do gênero textual (narrativo e expositivo) encontra-se nas Tabelas 3 e 4. A Tabela 3 apresenta a comparação do desempenho analisado por meio da proporção de ideias recontadas dos textos narrativo e expositivo, enquanto que a Tabela 4 apresenta a comparação do desempenho dos escolares quanto à proporção de enlaces recontados para os diferentes textos.

Tabela 1
Análise comparativa do desempenho do GRO e do GRE na tarefa de reconto de textos narrativos. São Paulo (SP), 2013
Tabela 2
Análise comparativa do desempenho dos GRO e GRE na tarefa de reconto de textos expositivos. São Paulo (SP), 2013
Tabela 3
Análise comparativa do desempenho no reconto de texto narrativo e expositivo realizada pelos grupos avaliados quanto à proporção de ideias recontadas. São Paulo (SP), 2013
Tabela 4
Análise comparativa do desempenho no reconto de texto narrativo e expositivo realizada pelos grupos avaliados quanto à proporção de enlaces recontados. São Paulo (SP), 2013

A comparação entre a proporção de ideias recontadas para os textos narrativo e expositivo mostrou presença de diferença estatisticamente significante somente para o GRE (t = -0,049, p = 0,049). Escolares que recontaram por escrito o texto lido apresentaram, em suas produções, maior proporção de ideias recontadas para o texto expositivo que para o texto narrativo. Por sua vez, a comparação entre a proporção de enlaces mostrou uma diferença estatisticamente significante somente para o GRO (t = 0,148; p = 0,046). Escolares que recontaram oralmente o texto lido apresentaram, em suas produções, maior proporção de enlaces recontados para o texto narrativo que para o texto expositivo.

Discussão

Este estudo propôs investigar se a modalidade do reconto (forma oral ou escrita) influencia o desempenho de escolares sem queixas de alterações no aprendizado da leitura (decodificação e compreensão) em tarefas de compreensão leitora. Para tal, foram selecionados escolares sem queixas de leitura (decodificação e compreensão), segundo a indicação de seus professores, confirmada por uma tarefa de screening de leitura. Estudos apontam que o professor é um bom avaliador real do desempenho acadêmico de seus alunos, especialmente no que se relaciona a leitura (Capellini, Tonelotto, & Ciasca, 2004Capellini, S. A., Tonelotto, J. M. F., & Ciasca, S. M. (2004). Medidas de desempenho escolar: avaliação formal e opinião de professores. Estudos de Psicologia (Campinas), 21(2), 79-90. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-166X2004000200006
https://doi.org/10.1590/S0103-166X200400...
; Cogo-Moreira, Ploubidis, Ávila, Mari, & Pinheiro, 2012Cogo-Moreira, H., Ploubidis, G. B., Ávila, C. R. B., Mari, J. J., & Pinheiro, A. M. V. (2012). EACOL (Scale of Evaluation of Reading Competency by the Teacher): Evidence of concurrent and discriminant validity. Neuropsychiatric Diseases and Treatment, 8, 443-454.; Lúcio & Pinheiro, 2013Lúcio, P. S., & Pinheiro, A. M. V. (2013). Escala da Avaliação da Competência da Leitura pelo professor (EACOL): evidências de validade de critério. Temas em Psicologia, 21(2), 499-511.). A ausência de queixas de leitura, aqui entendida como ausência de dificuldades tanto na competência de decodificação e reconhecimento de palavras quanto da compreensão leitora, era uma condição essencial. Os grupos investigados (GRO e GRE) deveriam apresentar boa capacidade leitora, permitindo que possíveis diferenças em seus desempenhos pudessem ser atribuídas, essencialmente, à modalidade de realização do reconto.

A comparação do desempenho dos escolares em função da modalidade do reconto mostrou, para o texto narrativo, que a mesma não foi capaz de influenciar a compreensão leitora. De forma semelhante, o estudo de Tannen (1982Tannen, D. (1982). Oral and literate strategies in spoken and written narratives. Language 58(1), 1-21.) mostrou em desenho metodológico que envolveu a comparação entre elaborações orais e escritas do gênero narrativo produzidas pela mesma pessoa -, as mesmas características discursivas nas duas modalidades de comunicação. O gênero narrativo tem uma estrutura conhecida, fruto da exposição aos contos infantis, sendo esta, um conhecimento partilhado entre escritor e leitor. Nesse contexto, a forma de expressão oral e escrita para a narrativa torna-se próxima, por considerar que ambas usam estratégias discursivas e estruturas sintáticas mais simples e concisas, que valorizam a expressão explícita dos eventos da cadeia narrativa. Não há necessidade de contextualizações. Por esse motivo, o desempenho das elaborações narrativas torna-se semelhante.

Por outro lado, diferentemente desses resultados, a avaliação do desempenho em compreensão leitora para textos expositivos foi influenciada pela modalidade do reconto. Os recontos realizados por escrito apresentaram maior número de enlaces entre ideias consideradas centrais, quando comparados com os orais. Recontar apropriadamente proposições de alto-nível, tomadas como um primeiro e mais importante nível, mostra a eficiência de utilização das regras de seleção de informação, que permitem manter ativadas somente as ideias julgadas essenciais, ou centrais, para a cadeia textual ( García-Madruga, Martín, Luque, & Santamaría, 1996García Madruga, J. A., Martín, J. I., Luque, J. L., & Santamaría, C. (1996)Intervención sobre la comprensión y recuerdo de textos: un programa de instrucción experimentalInfancia y Aprendizaje, 74, 67-82.). Neste sentido, textos expositivos que veiculam, em geral, um grande volume de informações, seriam favorecidos pelo uso de estratégias apropriadas de seleção e integração das ideias principais, revelando, por sua vez, maior deleção de ideias de detalhe. Essa integração no reconto manifesto pelo enlace parece justificar os achados encontrados. Em geral, os textos expositivos apresentam uma relação de causalidade e um princípio explicativo que necessita de marcadores sintáticos específicos, como "que", "como", "porque", "quando", "onde", "por consequência" (Escudero & León, 2007Escudero, I., & Leon, J. A. (2007). Procesos inferenciales en la comprensión del discurso escrito: Infuencia de la estructura del texto en los procesos de comprensión. Revista Signos, 40(64), 311-36.). Essas conjunções têm uma função sintática de integração que tende a ser mais utilizada na escrita e que mantém, como característica marcante, a presença de maior densidade lexical se comparada à oralidade (Kahmi & Catts, 2012Kahmi, A. G., & Catts, H. (2012). Language and reading: Convergences and divergences. In A. G. Kahmi & H. Catts. Language and reading disabilities (3rd ed., pp.1-22). Boston: Pearson.).

A comparação do desempenho em função do gênero textual foi realizada a partir da comparação da proporcionalidade de ideias e enlaces recontados (calculado a partir do número de enlaces recontados/todos os enlaces possíveis, sendo que este último parâmetro decorre da soma do total de enlaces de primeiro e de segundo nível, no caso do texto narrativo, e da soma do total de enlaces de ordenação central, supra-ordenados, ordenado-periférico e de segundo nível, no caso do expositivo). Os achados deste estudo demonstraram que o gênero textual influenciou o desempenho dos escolares na tarefa de reconto após leitura. Escolares que recontaram por escrito o texto lido apresentaram, em suas produções, maior proporção de ideias recontadas para o texto expositivo, se comparado ao desempenho no reconto do narrativo. Por sua vez, aqueles que recontaram oralmente apresentaram maior proporção de enlaces recontados para o texto narrativo que para o expositivo. Assim, o tipo ou gênero textual podem ter determinado padrões de ativação diferentes para o processamento mental do texto pelo leitor (Irrazábal & Saux, 2005Irrazábal, N., & Saux, G. L. (2005). Comprensión de textos expositivos: memoria y estrategias lectoras. Educación, Lenguaje y Sociedad3(3), 33-55.; Tannen, 1982Tannen, D. (1982). Oral and literate strategies in spoken and written narratives. Language 58(1), 1-21.).

Os textos expositivos se diferenciam dos narrativos pela quantidade de informações que veiculam. Os primeiros podem exercer a função de instruir sobre um dado tema, já que neles pode-se encontrar muitas informações novas (Irrazábal & Saux, 2005Irrazábal, N., & Saux, G. L. (2005). Comprensión de textos expositivos: memoria y estrategias lectoras. Educación, Lenguaje y Sociedad3(3), 33-55.; Otero, León, & Graesser, 2002Otero, J., León, J. A., & Graesser, A. C. (2002). The psychology of science text comprehension (pp.2-25). Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates.). A ausência de familiaridade com o tema, que resulta em menor disponibilidade de conhecimentos prévios para facilitação do processamento das informações, tende a fazer com que o leitor busque manter na memória o máximo possível de ideias (van den Broek, Virtue, Gaddy, Tzeng, & Sung, 2002van den Broek, P., Virtue, S., Gaddy, E. M., Tzeng, Y., & Sung, Y. (2002). Comprehension and memory of science texts: Inferential processes and the construction of a mental representation. In J. Otero, J. A. León, & A. C. Graesser (Eds.), The Psychology of science text comprehension (pp.131-134).. Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates ). A manutenção dessas ideias estaria relacionada à dificuldade de prever quais seriam as informações mais relevantes e resultaria, portanto, em maior sobrecarga da memória operacional. Isso faz com que o processamento de textos expositivos exija mais que o de textos narrativos (McNamara, 2004McNamara, D. S. (2004). Aprender del texto: efectos de la estructura textual y las estrategias del lector, Revista Signos 37(55), 19-30.; Otero et al., 2002Otero, J., León, J. A., & Graesser, A. C. (2002). The psychology of science text comprehension (pp.2-25). Mahwah, NJ: Lawrence Erlbaum Associates.).

Nesta pesquisa, o texto selecionado buscou cumprir a função instrucional, uma vez que o tema abordado foi a tectônica de placas, introduzido em geral no segundo ciclo do ensino fundamental. Desse modo, por se tratar de um tema novo e, por isso, contar com menor possibilidade de utilização de conhecimentos prévios, a necessidade de manutenção de um grande número de ideias ficou evidenciada. Isso pode ser observado, especialmente, quando comparado ao desempenho do texto narrativo, onde o conhecimento prévio da estrutura do texto facilita a aplicação das regras de deleção, o que favorece a seleção das ideias principais da cadeia causal (Coté et al., 1998Coté, N., Goldman, S. R., & Saul, E. U. (1998). Students making sense of informational text: Relations between processing and representationDiscourse Processes, 25(1), 1-53.). Esse mesmo conhecimento, por sua vez, parece justificar os achados desta pesquisa no que diz respeito aos próprios textos narrativos. O reconto de maior proporção de enlaces parece ser justificado pelo maior conhecimento da gramática dos textos (Stein & Glenn, 1979Stein, N. L., & Glenn, C. G. (1979). An analysis of story comprehension in elementary school children. In R. O. Freedle (Ed.), New directions in discourse processing (pp.53-120). New York: Ablex Publishing.) pelos leitores deste estudo. A conhecida estrutura dos eventos da cadeia narrativa (marco inicial, fato inicial, resposta interna, execução, consequência e reação) permitiria reconhecer mais facilmente as ideias centrais e suas relações de estrutura causal-temporal. Seriam, sob o ponto de vista cognitivo, mais fáceis de processar que textos de estrutura lógica, como em textos expositivos (Coté et al., 1998; Irrazábal & Saux, 2005Irrazábal, N., & Saux, G. L. (2005). Comprensión de textos expositivos: memoria y estrategias lectoras. Educación, Lenguaje y Sociedad3(3), 33-55.; Sánchez, 2002Sánchez, E. M. (2002). Compreensão e redação de textos: dificuldades e ajudas. Porto Alegre: Artmed.; Tannen, 1982Tannen, D. (1982). Oral and literate strategies in spoken and written narratives. Language 58(1), 1-21.).

Em síntese, a análise da influência da modalidade de reconto e do gênero textual no desempenho de escolares sem queixas de alterações de aprendizado da leitura em tarefas de compreensão leitora mostrou que o reconto oral do texto narrativo lido mostrou-se similar ao reconto do mesmo texto, feito por escrito. Essa similaridade deu-se na comparação do desempenho dos grupos em todas as variáveis investigadas (número de ideias centrais e de ideias de detalhe recontadas, inferências mencionadas em reconto, número de enlaces de primeiro e segundo nível recontados, número total de enlaces e padrão do reconto).

O reconto escrito do texto expositivo mostrou-se superior ao reconto oral do mesmo texto, quando analisado o número de enlaces de ordenação central recontados. As demais variáveis investigadas (número de ideias centrais e de ideias de detalhe recontadas, número total de enlaces recontados, número de enlaces de ordenação supra-ordenada recontados, número de enlaces de ordenação periférica recontados, número de enlaces de segundo nível recontados e padrão do reconto) revelaram-se similares.

O presente estudo buscou demonstrar a possibilidade do uso do reconto como forma de avaliação da compreensão leitora e a importância de se conhecer a influência da modalidade sobre a avaliação do desempenho de escolares. A partir dos resultados obtidos pode-se concluir que o desempenho em compreensão de textos narrativos lidos pode ser igualmente avaliado tanto na modalidade oral quanto na escrita, ao passo que, esta última pareceu favorecer a observação do desempenho para textos expositivos.

Além do objetivo cumprido, este artigo foi elaborado com o intuito de mostrar a importância e a viabilidade do uso de um protocolo de avaliação do reconto como forma de analisar, de forma estruturada, a elaboração mental construída pelo sujeito, expressa por meio da linguagem. Seus resultados, ainda que preliminares, mostram que a avaliação por meio do reconto corrobora os pressupostos teóricos e outros experimentos relacionados à investigação das diferentes esferas da compreensão (micro e macroestrutura e compreensão global). Fornecem ainda apontamentos que ressaltam a importância do conhecimento sobre os instrumentos de avaliação em suas diferentes formas de uso clínico, e cujos resultados devem favorecer o desempenho do leitor, permitindo a expressão mais ampla de suas capacidades.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    12 Nov 2013
  • Revisado
    26 Mar 2014
  • Aceito
    25 Abr 2014
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