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Um Princípio de Invariância Uniforme: robustez com relação à variação de parâmetros

Abstracts

The purpose of this work is to obtain uniform estimates, with respect to parameters, of the attractor and of the basin of attraction of a dynamical system as well as to apply these results to analyze the robustness of the synchronization of two coupled subsystems. These estimates are obtained through an uniform version of the Invariance Principle of LaSalle which is stated and proved in this work.

Invariance principle; synchronization; robustness; uniformity


O objetivo deste trabalho é a obtenção de estimativas uniformes, com relação aos parâmetros, do atrator e da área de atração de um sistema dinâmico e a aplicação destes resultados à análise da robustez da sincronização de dois subsistemas acoplados. Estas estimativas são obtidas através de uma versão uniforme do Princípio de Invariância de LaSalle o qual é proposto e demonstrado neste trabalho.


UM PRINCÍPIO DE INVARIÂNCIA UNIFORME. ROBUSTEZ COM RELAÇÃO À VARIAÇÃO DE PARÂMETROS

Hildebrando M. Rodrigues*

hmr@icmc.sc.usp.br

Luís F. C. Alberto†

luis@sel.eesc.sc.usp.br

Newton G. Bretas†

ngbretas@sel.eesc.sc.usp.br

*Instituto de Ciências Matemáticas e Computação, USP São Carlos, SP, Brazil e CDSNS, GeorgiaTech, Atlanta, U.S.A.

†Departamento de Engenharia Elétrica Escola de Engenharia de São Carlos, USP São Carlos, SP, Brazil.

ABSTRACT

The purpose of this work is to obtain uniform estimates, with respect to parameters, of the attractor and of the basin of attraction of a dynamical system as well as to apply these results to analyze the robustness of the synchronization of two coupled subsystems. These estimates are obtained through an uniform version of the Invariance Principle of LaSalle which is stated and proved in this work.

KEYWORDS: Invariance principle; synchronization; robustness; uniformity.

RESUMO

O objetivo deste trabalho é a obtenção de estimativas uniformes, com relação aos parâmetros, do atrator e da área de atração de um sistema dinâmico e a aplicação destes resultados à análise da robustez da sincronização de dois subsistemas acoplados. Estas estimativas são obtidas através de uma versão uniforme do Princípio de Invariância de LaSalle o qual é proposto e demonstrado neste trabalho.

1 INTRODUÇÃO

O Princípio de Invariância de LaSalle tem sido uma das ferramentas mais importantes para estudar o comportamento assintótico de soluções de equações diferenciais. Este resultado foi primeiramente estabelecido e provado para equações diferenciais autônomas definidas em espaços de dimensão finita por LaSalle (1960). Depois disto, este resultado foi estendido para equações diferenciais definidas em espaços de dimensão infinita, ver Hale (1969), Slemrod (1970) incluindo equações diferenciais funcionais, veja Hale e Lunel (1993). Este foi estendido para equações diferenciais não autônomas periódicas por LaSalle (1962), quase-periódicas por Miller (1965) e para equações diferenciais ordinárias mais gerais por Sell (1967). Rodrigues (1970) obteve uma extensão para equações não autônomas retardadas e LaSalle (1977) obteve uma extensão para equações de diferença.

A grande virtude do Princípio de Invariância de LaSalle é que ele fornece um meio de estudar a estabilidade de um sistema sem o conhecimento das soluções das equações diferenciais. Para isto, utiliza-se uma função auxiliar denominada Função de Liapunov. Ainda que o Princípio de Invariância de LaSalle venha sendo utilizado com sucesso em inúmeras aplicações, ele apresenta alguns problemas. Um dos principais é que ele não fornece nenhuma maneira sistemática de encontrar a Função de Liapunov. A condição mais restritiva para encontrar tal função é que se exige que a derivada da Função de Liapunov, ao longo das trajetórias do sistema, seja semi-definida negativa. Em sistemas complexos, tais como sistemas caóticos, dificilmente encontram-se Funções de Liapunov satisfazendo estas condições. Neste trabalho, propõe-se uma versão mais geral do Princípio de Invariância de LaSalle na qual não exige-se que a derivada da Função deLiapunov1 1 Neste trabalho, o termo função de Liapunov possui um sentido mais geral do que o usual pois permite-se que a derivada destas funções ao longo das trajetórias possam ser positivas em algumas regiões limitadas. seja sempre semi-definida negativa e além disso, admitem-se incertezas na determinação dos parâmetros do sistema.

A extensão do Princípio de Invariância de LaSalle proposta neste trabalho é apresentada em duas etapas. Na primeira etapa, descrita na seção 3, apresenta-se uma versão do Princípio de Invariância que permite que a derivada da função de Liapunov ao longo das trajetórias seja positiva em algumas regiões limitadas. Na segunda etapa, descrita na seção 4, apresenta-se uma versão do Princípio de Invariância que, além de permitir que a derivada da função de Lyapunov seja positiva em algumas regiões limitadas, contempla incertezas na determinação dos parâmetros. Esta extensão é útil para encontrar estimativas concretas de atratores e das áreas de atração de sistemas não-lineares uniformes com relação aos parâmetros do sistema e mostra-se na seção 5 que ela também é útil para o estudo de sincronismo de sistemas acoplados.

2 PRINCÍPIO DE INVARIÂNCIA DE LASALLE

Antes de apresentarem-se os resultados obtidos neste trabalho, é interessante rever a versão original do Princípio de Invariância de LaSalle.

Seja para isto a equação diferencial autônoma:

Teorema 1: Sejam V: e f : n funções de classe C1. Seja L uma constante real tal que WL = {x Î n : V(x) < L} seja limitado. Admita que (x) £ 0 para todo x Î WL e defina E : = {x Î WL : (x) = 0}. Seja B o maior conjunto invariante2 2 Um conjunto B Ì n é invariante com relação a (1) se, para todo xoÎ B, a solução j( t, xo) Î B para todo t Î contido em E. Então, toda solução de (1) iniciando em WL converge para B quando t ® ¥.

Este teorema foi demonstrado pela primeira vez por LaSalle (1960). Maiores detalhes podem ser encontrados também em Brauer e Nohel (1969).

A função V utilizada no Teorema 1 é conhecida por Função de Liapunov. Observe que o Teorema admite a existência desta função mas não diz nada a respeito de como encontrá-la. Em verdade, não existem métodos sistemáticos para encontrar uma Função de Liapunov e encontrá-la é, sem sombra de dúvida, uma tarefa não trivial.

É interessante interpretar geometricamente o teorema anterior. Para isto utilizar-se-á a Figura 1 na qual se apresenta um caso simples da aplicação do teorema de LaSalle. Como exigido pelo Teorema 1, WL é um conjunto limitado nesta figura. A linha tracejada representa o conjunto E no qual = 0. Suponha que o maior conjunto invariante contido em E seja composto apenas pelo ponto de equilíbrio estável xs. Considere agora a curva de nível WL: = {x Î WL : V(x) = l < L} e seja p um ponto nesta curva de nível. Como dentro de WL, a derivada de V é menor ou igual a zero, obtém-se pela regra da cadeia a seguinte estimativa:

=< grad(V), >=< grad(V), f>£ 0.


Em particular, esta desigualdade é verdadeira para o ponto p. Desta desigualdade verifica-se que o produto escalar do vetor gradiente de V, o qual é perpendicular às curvas de nível, com o vetor velocidade f, o qual é tangente às órbitas do sistema, deve ser menor ou igual a zero. Isto significa que o ângulo entre estes vetores deve ser maior ou igual a 90º, como mostra a Figura 1. Esta relação entre estes vetores existe para todos os pontos da curva de nível Wl da função V, logo as soluções estão necessariamente entrando na região delimitada pela curva de nível Wl. Isto vale para todas as curvas de nível internas a WL, logo toda solução iniciando em WL deverá convergir para o ponto de equilíbrio xs. Esta observação geométrica do Princípio de Invariância de LaSalle dá origem aos métodos de estimativa da área de atração de pontos de equilíbrio estáveis de sistemas não-lineares.

Uma versão global deste teorema também foi proposta por LaSalle (1960). Esta versão é muito similar ao seguinte teorema:

Teorema 2 : Sejam V : e f : n ® n funções de classe C1. Admita que (x) £ 0 para todo x Î n e defina E: = {x Î n : (x) = 0}. Seja B o maior conjunto invariante contido em E. Então toda solução limitada para t ³ 0 de (1) converge para B quando t ® ¥.

3 EXTENSÃO DO PRINCÍPIO DE INVARIÂNCIA DE LASALLE

Neste trabalho, apresentam-se resultados mais gerais do que aqueles que foram apresentados na seção anterior. Estes requerem condições menos restritivas do que aquelas exigidas na versão original, possibilitando o tratamento de problemas mais gerais. Basicamente, permite-se que a derivada de V seja positiva em algumas regiões. Com estas condições menos restritivas, torna-se mais fácil encontrar a função V e alguns problemas bastante complicados, tais como sistemas caóticos, podem ser tratados.

O teorema a seguir foi proposto e demonstrado pela primeira vez por Rodrigues, Alberto e Bretas em 1998 (Rodrigues et al, 2000).

Teorema 3: (Extensão do Princípio de Invariância de LaSalle). Sejam V : e f : n funções de classe C1. Seja L Î uma constante tal que WL = {x Î n : V(x) < L} seja limitado. Seja C: = {x Î WL : (x) > 0}, e admita que supxÎCV(x) = l < L. Defina l = {x Î WL : V(x) £ l} e E: = { x Î WL : (x) = 0 }l. Seja B o maior conjunto invariante de (1) contido em E. Então, toda solução de (1) iniciando em WL converge para o conjunto invariante B quando t ® ¥.

Além disto, se xo Î l, então j(t,xo) Î l para todo t ³ 0 e j(t,xo) tende para o maior conjunto invariante de (1) contido em l.

Demonstração: Suponha que xo Î WL e xoÏ l. Seja j(t,xo) a solução da equação diferencial com condição inicial xo em t = 0. Seja [0,t+) o máximo intervalo de existência desta solução enquanto esta permanece dentro de WL. Admita inicialmente que a solução j(t,xo) permaneça fora do conjunto l para t Î [0, t+). Como C Ì l, então, (j(t,xo)) £ 0 neste intervalo. Portanto V(j(t,xo)) é decrescente e consequentemente V(j(t,xo)) £ V(xo) < L. Isto implica que t+ = ¥ e o w-limite w(xo) de j(t,xo) está contido no conjunto {x Î WL : V(x) £ V(xo)}, o qual é um subconjunto compacto de WL. Como V(j(t,xo)) é decrescente e inferiormente limitada, V(j(t,xo)) ® v Î , quando t ® ¥. Uma vez que w(xo) é um conjunto invariante de (1), tem-se que V º v em w(xo) e portanto º 0 em w(xo). Portanto, w(xo) Ì WL – C, logo conclui-se que j(t,xo) ® w(xo) Ì B, quando t ® ¥.

Admita agora que xo Î l. Então V(xo) £ l. Afirma-se que a solução j(t, xo) permanece em l para todo t Î [0, t+). Para provar esta afirmação, admita que exista um tempo t* > 0 tal que V(j(t*, xo)) > l. Então existe um s Î [0, t*) tal que V(j(s, xo)) = l e V(j(t, xo)) > l para t Î (s, t*). Portanto, existe Î (s, t*), tal que () > 0, o que contradiz o fato de que £ 0 fora de C. Como antes, t+ = ¥ e a solução permanece dentro de Wl, para t ³ 0. Portanto o conjunto w-limite é não vazio e a solução aproxima-se dele quando t ® ¥. Por outro lado, o conjunto w(xo) é um subconjunto invariante que está contido em l. Portanto a solução aproxima-se do maior conjunto invariante contido em l quando t ® ¥.

Para interpretar geometricamente este teorema, observe a Figura 2. O conjunto WL é limitado em acordo com as hipóteses do Teorema 3. Dentro de WL, a derivada de V, ao longo das soluções, é não positiva exceto dentro do conjunto C o qual aparece em tom de cinza. Por hipótese, este conjunto nunca atinge a fronteira de WL, uma vez que l < L. O Teorema 3 garante que todas as solucões de (1) iniciando dentro de WL tendem para o maior conjunto invariante contido em E. Se, em particular, o maior conjunto invariante contido em E estiver contido em l, então todas as soluções com condição inicial em WL tendem para o maior conjunto invariante contido em l. Uma vez dentro de l, as soluções não saem deste conjunto o qual é uma estimativa do atrator. Dentro de l, duas coisas podem ocorrer, ou as soluções tendem para o conjunto {x Î l : (x) = 0}, ou as soluções permanecem entrando e saindo do conjunto C indefinidamente. Estas duas situa cões serão ilustradas na seção de exemplos.


Observação 1: Se (x) < 0 para xÏ , então toda solução j(t,xo) de (1) tende para o maior conjunto invariante contido em l. Na maioria das vezes, a condição exigida anteriormente não é satisfeita, no entanto se para todo xo Î E – l a solução j(t,xo) abandonar o conjunto E para qualquer t > 0, suficientemente pequeno, então j(t,xo) tende para o maior conjunto invariante contido em Wl

Observação 2: No teorema anterior, admite-se que o conjunto WL = {x Î n : V(x) < L} seja limitado. Em verdade, se apenas uma componente conexa de WL é limitada, então o teorema permanece válido para esta componente. Isto segue do fato de que soluções com condições iniciais dentro de uma componente conexa não podem sair desta componente.

Uma versão global do teorema anterior também foi proposta e demonstrada pela primeira vez por Rodrigues, Alberto e Bretas em 1998 (Rodrigues et al., 2000).

Teorema 4: (Versão Global da Extensão do Princípio de Invariância) Sejam V : n ® e f : n ® n funções de classe C1 Seja C: = {x Î Rn : (x) > 0}. Admita que l: = supxÎCV(x) Î e que , l : = {x Î n : V(x) £ l} seja limitado. Seja E: = {x Î Rn: (x) = 0 } l e seja B o maior conjunto invariante contido em E. Então toda solução, j(t,xo), de (1), que é limitada para t ³ 0, converge para o conjunto invariante B quando t ® ¥.

Além disto, se xo Î l então j(t,xo) é definido para todo t ³ 0, j(t,xo) Î l para todo t ³ 0, e l tende para o maior conjunto invariante de (1) contido em l.

Demonstração: Admita que xo Ï l e suponha que a solução j(t,xo) de (1) seja limitada para t ³ 0. Admitindo-se que a solução j(t,xo) permaneça fora do conjunto l para t ³ 0, então (j(t,xo)) £ 0 para t ³ 0. Como V(j(t,xo)) é uma função decrescente e limitada inferiormente para t ³ 0, existe v Î tal que v : = limt®¥V(x(t)). O conjunto w-limite, w(xo), é compacto, não-vazio e invariante. Isto implica que V º v e portanto º 0, em w(xo). Então w(xo) Ì B. Desde que x(t) ® w(xo), quando t ® ¥, conclui-se que j(t,xo) ® B quando t ® ¥.

Admita agora que xo Î l. Então V(xo) £ l. Afirma-se que a solução j(t,xo) permanece em l para todo t ³ 0. Para provar isto, suponha que exista um tempo t* > 0 tal que V(j(t*,xo)) > l. Então existe s Î (0,t*) tal que V(j(s,xo)) = l e V(j(t,xo)) > l para t Î (s,t*). Isto contradiz o fato de que £ 0 fora de Wl É C. Como antes, a solução permanece dentro de Wl, para t ³ 0 e portanto, o conjunto w-limite, w(xo), é não-vazio e a solução tende para ele quando t ® ¥. Por outro lado, w(xo) é um conjunto invariante de (1) e w(xo) Ì l . Portanto, a solução aproxima-se do maior conjunto invariante contido em l.

A Observação 1 feita para o Teorema 3 pode ser adaptada ao Teorema 4. Do ponto de vista de aplicações, a seguinte observação é bastante importante.

Observação 3: Admitindo-se, no teorema acima, que V : n ® é ilimitada radialmete, i.e., V(x) ® ¥ ,quando ||x|| ® ¥, então toda solução é limitada para t ³ 0 e as conclusões do teorema acima são válidas para todas as soluções.

O Teorema 4 apresentado anteriormente associado à Observação 3 é muito útil para a obtenção de estimativas de atratores globais conforme mostra o exemplo a seguir.

Exemplo 1: Sistema de Lorenz. Considere o sistema de Lorenz:

onde, s = 10, r = 28 and b = 8/3. Estes valores foram escolhidos de forma a obter-se comportamentos caóticos. A seguir, mostra-se como a extensão do Princípio de Invariância pode ser facilmente utilizada para estimar-se o atrator de Lorenz.

Seja

uma Função de Liapunov associada ao sistema de Lorenz. Até onde se sabe, a Função de Liapunov apresentada anteriormente é a melhor apresentada até hoje para estimar-se o atrator de Lorenz por um elipsóide positivamente invariante. Maiores detalhes a respeito deste sistema e de funções de Liapunov podem ser encontrados em Sparrow (1982).

Pode-se verificar que esta função satisfaz as condições da Observação 3, logo utilizar-se-á o Teorema 4 para obter-se uma estimativa do atrator global de Lorenz. A derivada de V é dada por:

(x, y, z) = –2s(rx2 + 4y2 + 4bz2 + 5rbz).

O conjunto C é dado por C: = {x Î R3 : rx2 + 4y2 + 4bz2 – 5rbz < 0} e é fácil verificar que a fronteira de C é um elipsóide centrado em (x = 0,y = 0,z = 5/8r). Como C é um conjunto convexo e a Função de Liapunov V é uma função convexa, o supxÎCV(x) ocorre na fronteira do conjunto C. Para calcular o sup de V no conjunto C, a técnica dos multiplicadores de Lagrange será utilizada. A equação do elipsóide será tratada como uma equação de restrição.

Usando a função Lagrangiana:

obtêm-se as seguintes condições de extremo:

Resolvendo o sistema anterior obtêm-se = –s, x = 0,z = e y2 = . Substituindo estes valores na expressão de V, obtém-se:

l = supxÎCV(x) = < 52267.

O conjunto l é o elipsóide: {(x,y,z) Î 3 : rx2 + 4sy2 + 4s(z–r)2£ }.

O conjunto no qual = 0 está contido em l e portanto toda solução com condição inicial em 3 converge para o maior conjunto invariante contido em l. O conjunto l é uma estimativa do atrator. A Figura 3a mostra esta estimativa. Neste caso, é importante salientar que a derivada de V permanece intercambiando de sinal depois que a solução entra em l. Um gráfico de (x(t),y(t),z(t)) é mostrado na Figura 3b.


4 PRINCÍPIO DE INVARIÂNCIA UNIFORME. ROBUSTEZ COM RELAÇÃO À VARIAÇÃO DE PARÂMETROS

Os resultados apresentados nesta seção são mais gerais do que aqueles apresentados na seção anterior. Nesta seção apresenta-se uma extensão do Princípio de Invariância na qual, além de permitir que a derivada da Função de Lyapunov seja positiva em algumas regiões limitadas, consideram-se incertezas na determinação dos parâmetros do sistema. Esta extensão será denominada Princípio de Invariância Uniforme, isto porque esta é útil para a obtenção de estimativas uniformes, com relação aos parâmetros, do atrator e da área de atração de sistemas dinâmicos. O Princípio de Invariância Uniforme foi proposto e demonstrado pela primeira vez em Rodrigues et al. (2001).

Considere o seguinte sistema autônomo:

onde Î L Ì m é um vetor de parâmetros do sistema e x Î n.

Teorema 5: (Princípio de Invariância Uniforme). Suponha que f : n×L ® n, V : n×L ® sejam funções de classe C1 e a,b,c : n ® sejam funções contínuas. Admita que para qualquer (x,) Î n×L, tem-se:

Para L > 0 seja L: = {x Î n : a(x) < L}. Admita que L seja não-vazio e limitado.

Considere os conjuntos

Suponha agora que supxÎCb(x) £ l < L e defina os conjuntos

Se é um parâmetro fixo em L e todas as condições anteriores são satisfeitas, então para xo Î L a solução j(t,xo,) é definida em [0,¥) e as seguintes conclusões são obtidas:

I) se xo Î Blentão j(t,x0,) Î Al, para t ³ 0 e j(t,x0,) tende para o maior conjunto invariante de (3) contido em Al, quando t ® ¥.

II) se xo Î L – Bl, então j(t,xo,) tende para o maior conjunto invariante de (3) contido em AlÈ EL.

Demonstração: A demonstração é realizada em duas etapas:

I) Para xo Î Bl, seja [0,t+) o máximo intervalo de existência da solução j(t,xo,) de (3). Suponha que exista Î [0,t+) tal que j(,xo,Al. Então V(j(0,xo,),) £ b(j(0,xo,)) £ l e V(j(,xo,),) ³ a(j(,xo,)) > l. Isto implica na existência de < tal que V(j(,xo,),) = l e b(j(t,xo,)) ³ V(j(t,xo,),) > l para t Î (,). Então j(t,xo,Blpara t Î (,]. Isto é uma contradição porque –(j(t,xo,),) ³ c(j(t,xo,)) ³ 0, o que significa que V((j(t,xo,),) é uma função decrescente de t neste intervalo. Portanto j(t,xo,) Î Alpara t Î [0,t+) o que implica em t+ = ¥. O conjunto w-limite de j(t,xo,) está contido em Ale portanto j(t,x0,) tende para o maior conjunto invariante de (3) contido em Al, quando t ® ¥.

II) Para xo Î L – Bl, seja [0,t+) o máximo intervalo de existência da solução, j(t,xo,), de (3). Se existir s Î (0,t+) tal que j(s,xo,) Î Bl, então o problema é reduzido à Parte I.

Suponha que j(t,xo,) Ï Bl,para t Î [0,t+). Se existir Î (0,t+) tal que j(,xo,) Ï L então L £ a(j(,xo,)) £ V(j(,xo,),) e V(j(0 ,xo,),) £ b(j(0,xo,)) < L, o que leva a uma contradição, uma vez que fora de Bl, (j(t,xo,),) £ 0.

Para t Î [0,t+), tem-se que a(j(t,xo,)) £ V(j(t,xo,),) £ V(j(0,xo,),) £ b(j(0,xo,)) = b(xo) £ L e portanto, j(t,xo,) Î {x Î n : a(x) £ b(xo)}. Portanto, t+ = ¥. Tomando como sendo o conjunto w-limite de j(t,xo,), tem-se que Ì {x Î n : a(x) £ b(xo)}. Como V(j(t ,xo,),) é uma função decrescente de t e limitada inferiormente, tem-se que existe limt®¥V(j(t,xo,)): = v Î . Então V(·,) º v e portanto (·,) º 0 em . Como CÇ = e Ì L, então 0 = –(x,) ³ c(x) = 0 para x Î . Assim Î EL. Isto significa que j(t,x0,) tende para o maior conjunto invariante de (3) contido em EL, quando t ® ¥.

A uniformidade é garantida pela existência das fun cões a,b e c as quais são independentes dos parâmetros do sistema. Para interpretar geometricamente este resultado, observe a Figura 4 onde ilustram-se as relações entre estas funções e as estimativas obtidas com o teorema.


O conjunto C contém o conjunto onde é positiva independentemente do parâmetro Î L. Portanto, ao calcular o supxÎCb(x), obtém-se um número l que é sempre maior que V(x,). De posse deste número, utiliza-se a curva de nível l da função a para obter-se uma estimativa do atrator.

A Figura 5 ilustra a aplicação do Princípio de Invariância Uniforme. Observe que BlÌ Ale L. A noção de invariância, neste caso, é um pouco diferente conforme explicado a seguir. Nesta ilustração, x1 e x3 pertencem à L. O conjunto L, por sua vez, não é positivamente invariante, entretanto, pode-se afirmar que as soluções iniciando dentro de L não saem de L. Este é o caso das soluções iniciando em x1 e x3 na Figura 5. Nada pode-se afirmar a respeito das soluções iniciando em L – L. A solução iniciando em x2, por exemplo, abandona L e não retorna mais.


Todas as soluções iniciando em L garantidamente tendem para o maior conjunto invariante contido em Al È EL. Se por ventura alguma destas soluções entrar em Bl, então pode-se afirmar que esta nunca mais sairá de AlÉ Bl, embora Blnão seja positivamente invariante. Este é o caso da solução com condição inicial em x3.

É importante salientar que a ilustração da Figura 5 não apresenta o caso mais geral. Neste exemplo o conjunto AlÌ L, entretanto, esta não é uma condição necessária.

Observações similares àquelas feitas para a extensão do Princípio de Invariância apresentada na secão 3 podem ser feitas para o Princípio de Invariância Uniforme.

Teorema 6: (Versão Global do Princípio de Invariância Uniforme). Suponha que f : n × L ® n e V : n × L ® sejam funções de classe C1, a,b,c : n ® sejam funções contínuas. Admita que para qualquer (x,) Î n × L, tem-se:

Considere os conjuntos:

Suponha que supxÎCb(x) £ l < ¥ e considere os conjuntos

Suponha que Alé não-vazio e limitado.

Então, se é um parâmetro fixo em L e todas as condições anteriores são satisfeitas, então as seguintes conclusões são obtidas:

I) se xo Î Blentão j(t,xo,) está definida e pertence à Alpara todo t ³ 0 e j(t,x0,) tende para o maior conjunto invariante de (3) contido em Alquando t ® ¥.

II) Se xo é tal que a solução j(t,xo,) é limitada para t ³ 0, então j(t,xo,) tende para o maior conjunto invariante de (3) contido em AlÈE quando t ® ¥.

Demonstração: A demonstração de I) é similar à demonstração da primeira parte do teorema anterior.

Para demonstrar II), procede-se como a seguir: Observe que C Ì BlÌ Al, então (x,) £ 0, para todo (,x) Î L × (n – Bl). Se existir t ³ 0 tal que j(t,xo,) Î Bl, o resultado segue da parte I).

Admitindo-se que j(t,xo,) seja limitada para t ³ 0 e que j(t,xo,) Ï Bl, para todo t Î [0,¥), tem-se que (j(t,xo,),) £ 0, para todo t Î [0,¥). Portanto, V(j(t,xo,),) é uma função decrescente de t. Como V(j(t,xo,),) é limitada, seja v : = limt®¥V(j(t,xo,),). Então V(·,) º v no conjunto w-limite, , de j(t,xo,) e portanto c(x) £ –(x,) = 0, para x Î , o que implica em c(x) = 0, para x Î , uma vez que C Ç = . Como é invariante com relação à (3), conclui-se que j(t,xo,) tende para o maior conjunto invariante contido em E.

Observação 4: Se a(x) ® ¥, quando ||x|| ® ¥, então para todo r > 0 o conjunto Ar: = {x Î n : a(x) £ r} é limitado. Se tal condição é satisfeita, então toda solução é limitada para t ³ 0 e a conclusão do teorema anterior é válida para todas as soluções.

Ao utilizar os Teoremas 5 ou 6 em algumas aplicações, podem surgir algumas dificuldades técnicas. A função c(x) pode não ser suave, o conjunto C pode não ser convexo e portanto supxÎCb(x) pode não ocorrer na fronteira do conjunto C. Isto impossibilita a aplicação da técnica de multiplicadores de Lagrange para o cálculo do sup x Î Cb(x) mesmo que b seja uma função convexa. Entretanto, quando existirem algumas simetrias presentes no problema, o próximo Lema fornece um caminho alternativo para explorá-las, evitando estas dificuldades.

Lema 7: Seja h, b,f1,f2,...,fk : , funções contínuas e admita que

Seja

Então as seguintes afirmações são verdadeiras:

  • H Ì Fi e supxÎHb(x) £ b(x).

  • Suponha que Fiseja limitado e que exista uma seqüência de homeomorfismos Si : n (i = 1,...,k), tal que, Fj= Sj–1(Fj–1), " j = 2,...,k e F1= SkFk. Se b(Si(x)) = b(x)," x Î n," i = 1,...,k então b(x) = supxÎFjb(x) ³ supxÎHb(x), "j Î {1,2,..., k}.

Demonstração: Se x Î H então inf{f1(x),f2(x),...,fk(x)} £ h(x) < 0. Portanto existe j tal que fj(x) < 0 e portanto x Î FjÌ Fi, o que prova a primeira afirmação.

Agora é necessário provar que b(y) = b(x), " i = 1,...,k. Se y Î Fi–1 então existe z Î Fital que z = Si–1(y) e portanto b(y) = b(Si–1(y)) = b(z) £ b(x). Logo b(y) £ b(x). Consequentemente,

Portanto, b(x) = b(x) para qualquer i, j Î {1,..., k} e portanto b(x) = b(x), para qualquer i Î {1,..., k} e a demonstração está completa.

O próximo Lema tem uma demonstração trivial, entretanto, este é muito útil para reduzir a dimensão em problemas de maximização.

Lema 8: Sejam A Ì num conjunto compacto e b: A ® uma função contínua. Seja D Ì num conjunto fechado tal que A Ç D ¹ e admita que para todo x Î A existe Î A Ç D tal que b³ b(x). Então supxÎA b(x) = supxÎAÇD b(x).

Demonstração: Como o conjunto (A Ç D) Ì A, então supxÎAÇDb(x) £ supxÎAb(x). Falta provar que supxÎAb(x) £ supxÎAÇDb(x) para concluir-se a igualdade. Suponha que a desigualdade não seja verdadeira. Como A é compacto, então existe algum y Î A tal que b(y) > b(x), "x Î (A Ç D). Portanto chegamos a uma contradição pois por hipótese para cada y Î A existe Î (A Ç D) tal que b() ³ b(y). Logo a desigualdade é verdadeira e o lema está demosntrado.

Exemplo 2 : Estimativa do Atrator do Sistema de Lorenz com incertezas nos parâmetros.

Considere o sistema de Lorenz:

onde, s, r e b são parâmetros do sistema. Os valores nominais destes parâmetros são sN= 10, rN= 28 e bN= . Admite-se existir uma incerteza de ±5% na determinação destes parâmetos. Seja sm: = 9.5, sM: = 10.5, rm: = 28 – , rM: = 28 + , bm: = – , bM: = + . Portanto, os parâmetros pertencem ao seguinte subconjunto de 3:

L : = {: = (s,r,b) Î 3 : sm£ s £ sM,

rm £ r £ rM, bm £ b £ bM}.

Com a seguinte mudança de variáveis:

obtém-se o seguinte sistema:

Seja

uma Função de Liapunov para o sistema (4). É fácil verificar que esta função satisfaz as condições estabelecidas na Observação 4, portanto o Teorema 6 será utilizado para estimar o atrator de Lorenz.

Neste caso escolhem-se as funções a e b como sendo a(x,y,z): = rmx2 + 4smy2 + 4smz2 e b(x,y,z): = rMx2 + 4sM y2 + 4sMz2. É importante destacar que a mudança de variáveis e a escolha da função V foram fundamentais para que as funções a e b pudessem ser facilmente escolhidas como funções regulares, ou seja, são contínuas e possuem derivadas de qualquer ordem contínuas.

A escolha da função c não é tão simples. Calculando a derivada de V ao longo das soluções de (4), obtém-se a seguinte estimativa:

A expressão anterior define claramente os parâmetros a, b, g. Observe que a função c não é uma função regular e o conjunto C não é convexo.

Agora utilizar-se-á o Lema 7 com h = c, f1(x,y,z): = ax2 + by2 + g(z – r)2 –m e f2(x,y,z): = ax2 + by2 + g(z + r)2 –m.

Se tomarmos C: = {(x,y,z) Î 3 : c(x,y,z) < 0}, F1: = {(x,y,z) Î 3 : f1(x,y,z) < 0} segue do Lema 7 que supC b £ supF1b.

Como F1 é um conjunto convexo e b é uma função convexa, a técnica de multiplicadores de Lagrange pode ser utilizada para obter-se que o supremo é atingido em

Portanto o atrator de Lorenz está contido dentro do elipsóide:

{(x,y,z) 3 : rmx2 + 4smy2 + 4smz2 < l = 88576}.

A estimativa anterior assim como uma representação numérica do atrator de Lorenz estão mostradas na Figura 6 para dois vetores de parâmetros diferentes. O elipsóide externo representado em tons de cinza corresponde ao conjunto Ale o elipsóide interno representado parcialmente por linhas circulares corresponde ao conjunto Bl.


5 PRINCÍPIO DE INVARIÂNCIA DE LASALLE APLICADO À ANÁLISE DE SINCRONISMO

Embora o Princípio de Invariância de LaSalle seja frequentemente utilizado para estudar a estabilidade de diversos sistemas, esta teoria pode ser utilizada para extrair informações a respeito do sincronismo de sistemas de equações diferenciais acopladas. Sincronismo é um conceito importante que vem sendo extensivamente utilizado por pesquisadores em diversas áreas da ciência, tais como, Engenharia Elétrica, Mecânica, Biologia, Físca, etc. e tem sido empregado com muito sucesso em Sistemas de Comunicação para codificação de informação, veja Cuomo e Oppenheim (1993), Yang e Chua (1997), Pecora et al. (1997), Tresser e Worfolk (1995) e Gameiro (1999).

Métodos matemáticos para estudar sincronismo entre sistemas caóticos foram apresentados em Affraimovich et al. (1986). Resultados abstratos, robustez com relação aos parâmetros e dissipatividade uniforme foram obtidos por Rodrigues (1996) e Affraimovich e Rodrigues (1998). Para sistemas de dimensão infinita pode-se encontrar alguns resultados em Rodrigues (1996), Carvalho et al. (1998), Hale (1997;n.d.) e Affraimovich et al. (1997).

Neste artigo estuda-se o sincronismo de dois sistemas acoplados com a seguinte forma:

onde (x,y) Î n × n.

Uma das vantagens da técnica de análise de sincronismo utilizada neste trabalho é que esta, além de comprovar o sincronismo entre os sistemas, fornece uma estimativa do menor valor do parâmetro de acoplamento necessário para garantir o sincronismo entre eles.

Definição 9 O sistema (6) sincroniza globalmente, com relação à diagonal, se dado e > 0 existir d > 0 tal que, se ||1 – 2|| < d, então

||y(t, xo, yo, 1, 2)|| £ e

para todas as condições iniciais (xo,yo) Î n.

Veja Hale (1997), para outras definições similares.

De maneira geral, o método de análise desta seção é realizado, basicamente, através dos seguintes passos. Primeiramente, uma estimativa uniforme do atrator, com relação ao parâmetro de acoplamento, é obtida, utilizando para isto uma Função de Liapunov adequada. De posse desta informação, extrai-se informações a respeito do sincronismo entre os sistemas.

Exemplo 3: Sistemas Unidimensionais Acoplados. Como primeiro exemplo, considere dois sistemas unidimensionais idênticos acoplados por um termo linear:

Utilizar-se-á o Princípio de Invariância para estudar o sincronismo entre os sistemas. Com este objetivo, escolhe-se V(x,y) = como sendo uma Função de Liapunov associada ao sistema (7). Esta função será utilizada para estimar o atrator de (7) e para garantir que todas as soluções de (7) são limitadas para t > 0. Calculando a derivada de V obtém-se:

Observe que a função c independe do parâmetro de acoplamento k. Como neste caso não se estão considerando incertezas nos parâmetros do sistema, pode-se escolher a(x,y) = V(x,y) = b(x,y) e utilizar-se o Princípio de Invariância Uniforme para obter-se uma estimativa do atrator que independa do parâmetro de acoplamento k. O máximo de V(x,y) no conjunto, onde c(x,y) < 0, é 1. Portanto, toda solução de (7) entra em uma bola de raio r > em tempo finito qualquer que seja o parâmetro de acoplamento k ³ 0.

Na análise anterior, o Teorema 6 junto com a Observação 4 foram utilizados para estimar uma limitação do atrator. Agora, utilizar-se-á uma outra Função de Liapunov para estudar o sincronismo entre os sistemas acoplados. A idéia é utilizar o Teorema 2 em conjunto com a limitação das soluções demonstrada anteriormente. Com isto em mente, seja:

uma outra Função de Liapunov do sistema (7). A derivada de W é dada por:

–(x, y) = (x, y)2(2k – 1 + (x2 + xy + y2)).

Para k > 1/2, vê-se que –(x,y) ³ 0 e –(x,y) = 0 se e somente se x = y. Portanto, se k > 1/2, todas as soluções tendem para o maior conjunto invariante contido na diagonal x=y, logo, os dois sistemas sincronizam.

Se o parâmetro k é pequeno, existirá uma região, nas vizinhanças da origem, onde a derivada de W será positiva. Neste caso, não é possível concluir a respeito do sincronismo utilizando o Princípio de Invariância de LaSalle original. Entretanto, se o parâmetro de acoplamento é suficientemente grande, a região onde a derivada de W é positiva desaparece. Neste caso, o Princípio de Invariância de LaSalle original pode ser utilizado para concluir-se a respeito do sincronismo destes sistemas. As curvas de nível da Figura (7) mostram a região onde a derivada de W é positiva para dois valores distintos de k.


Exemplo 4 Sistemas de Lorenz(Hadley) acoplados.

As seguintes equações são provenientes de estudos de circulação de Hadley em problemas atmosféricos:

As constantes utilizadas neste exemplo são G = 1, a = 0.25, b = 4 e F = 8. O coeficiente k é o parâmetro de acoplamento entre o sistema 1 e o 2. Seja

uma função de Liapunov associada ao sistema (8). Esta função será utilizada para obter-se uma estimativa do atrator deste sistema. Calculando-se a derivada de V obtém-se:

Observe que depende do parâmetro de acoplamento k. Para obter estimativas do atrator que sejam independentes do parâmetro k, escolhe-se a função c como sendo:

Com esta escolha tem-se que –³ c. Em particular, escolhe-se a(x) = V(x) = b(x) e utiliza-se o Princípio de Invariância Uniforme para obter uma estimativa do atrator independente do parâmetro de acoplamento k.

Neste caso, o conjunto C é o conjunto de pontos em 6 que satisfazem a seguinte desigualdade:

A fronteira de C é um elipsóide centrado em (x1 = x2 = , y1 = y2 = 1, z1 = z2 = 0).

Para calcular o supxÎCV(x) utilizar-se-á o Lema 8 para mostrar que o supxÎCV(x) ocorre na diagonal, reduzindo o problema em 6 a um problema em 3.

Neste exemplo o conjunto D: = {(x1,y1,z1,x2,y2,z2) Î 6: x1 = x2, y1 = y2, z1 = z2} é a diagonal e o conjunto C assume o papel do conjunto A do Lema 8.

Para (x1,y1,z1,x2,y2,z2) Î C, define-se

e seja () Î D.

É evidente que V() ³ V(x1,y1,z1,x2,y2,z2). Portanto basta provar que () Î CÇD, ou seja, que () Î C.

Como

então () Î C conforme desejado. Logo o problema de cálculo do supremo pode ser reduzido a um problema equivalente com a metade da dimensão do problema original, isto é:

Como C Ç D é um conjunto convexo e a função de Liapunov V é convexa, o supxÎCÇDV(x) ocorre na fronteira do conjunto C Ç D. Usando a função Lagrangeana:

obtém-se as seguintes condições de extremo:

A solução do sistema anterior é = –3.8855, x1 = x2 = 8.22772, y1 = y2 = 1.34656 e z1 = z2 = 0. Logo

l = supx Î CV(x) = 61.531

O conjunto l é o elipsóide

O conjunto no qual = 0 está contido em l, portanto toda solução iniciando em 6 converge para o maior conjunto invariante contido em l. O conjunto l é uma estimativa superior do atrator, i.e., o atrator está contido no conjunto l, para todo k > 0.

Agora analisar-se-á o sincronismo entre os sistemas de Hadley acoplados. Utilizando a estimativa do atrator e outra função de Liapunov, pode-se estimar o valor mínimo do parâmetro de acoplamento k que é necessário para garantir a sincronização entre os sistemas. Com isto em mente seja

W = [2.5(x1 – x2)2 + (y1 – y2)2 + (z1 – z2)2]

uma função de Liapunov associada ao sistema (8).

Da estimativa do atrator pode-se provar que em l as seguintes desigualdades são satisfeitas:

A derivada de W pode ser escrita em uma forma quadrática:

onde P =

Para garantir o sincronismo, é necessário mostrar que – é definida positiva. Usando o critério de Sylvester, pode-se mostrar que k deve satisfazer a seguinte desigualdade para garantir o sincronismo:

Esta desigualdade deverá ser satisfeita para todo y1,y2, z1,z2 e x1, enquanto a solução permanecer em l. Usando (9) para estimar o lado direito da desigualdade, com relação a y1,y2,z1,z2 e x1, obtém-se que o sistema sincroniza globalmente se k > 4927.

A Figura 8 confirma o resultado obtido. A Figura 8a mostra a projeção da estimativa do atrator no conjunto {(x1,y1,z1,x2,y2,z2) Î 6 : x1 = x2, z1 = z2} e a Figura 8b mostra a norma da diferença entre os dois sistemas para k = 5000.


Exemplo 5 : Estimativa Uniforme do atrator e sincronização de sistemas de Lorenz acoplados com incertezas nos parâmetros.

Considere dois sistemas de Lorenz acoplados através de um termo linear:

Os valores nominais destes parametros são sN = 10, rN= 28 e bN= . Admitindo existir uma incerteza de ±5% na determinação destes parâmetros, define-se sm : = 9.5, sM : = 10.5, rm : = 28– , rM : = 28+, bm : = – , bM : = +. Defina o seguinte conjunto:

onde : = (s1,r1,b1,s2,r2,b2).

Aplicando a seguinte mudança de variáveis xi : = ui, yi : = vi, zi : = wi – riao sistema (10), obtém-se o seguinte sistema equivalente:

Seja

uma Função de Liapunov associada ao sistema (11).

O próximo objetivo é mostrar que as condições da Observação 4, e do Teorema 6 são satisfeitas.

As funções a e b podem ser escolhidas como a seguir:

A derivada de V é dada por:

para todo Î L e k > 0. A identidade anterior define os parâmetros a, b, g, r, m.

Observe que as funções a e b previamente obtidas são fun cões regulares. Entretanto, a função c não é regular e o conjunto onde c < 0 não é convexo, o que traz algumas dificuldades na aplicação da técnica de multiplicadores de Lagrange. Para superar esta dificuldade, o Lema 7 pode ser utilizado em conjunto com a técnica de multiplicadores de Lagrange para obter-se que o supremo ocorre em x = y = 0, e z = . Substituindo estes valores na expressão de b, o número l é obtido:

O conjunto Ble Alsão elipsóides. O conjunto no qual c(x1,y1,z1,x2,y2,z2) = 0 está contido em Ale portanto toda solução converge para o maior conjunto invariante contido em Al. O conjunto Alé uma estimativa do atrator que é independente dos parâmetros Î L e k > 0. Portanto toda solução de (10) entra em Alem um tempo finito e permanece lá dentro para sempre.

Para estudar o sincronismo, o Teorema 2.3 de (Rodrigues, 1996) ou Teorema 3.1 de (Affraimovich e Rodrigues, 1998) podem ser utilizados. Com este objetivo é conveniente reescrever o sistema (10) na seguinte forma:

onde Aké uma matriz constante que representa o acoplamento entre os sistemas de Lorenz, 1 = (s1,r1,b1) é o vetor de parâmetros do primeiro sistema, 2 = (s2,r2,b2) é o vetor de parâmetros do segundo sistema, u = (x1,y1,z1)T é o vetor de estados do primeiro sistema e v = (x2,y2,z2)T é o vetor de estados do segundo sistema. Neste caso:

Teorema 10 (Affraimovich e Rodrigues, 1998) Seja f :n ×L ® n uma função de classe C1, L Ì p. Sejam Ì q e Akuma matriz n × n real constante para cada k Î . Seja Aluma estimativa global do atrator e suponha que

  • "(u,v,) Î Al × L tem-se:

    f(v,) – f(u,) = F(u,v,)[v – u] e ||f(u,2) – f(u,1)|| £ O(||2 – 1||)

  • $ak, Mk, Mo> 0, tal que para cada solução de (12), (u(t), v(t)) Î Alpara t ³ to, o operador de evolução, Tk(t, s, ), associado a –2Ak+ F(u(t), v(t), ) satisfaz ||Tk(t, s, )|| £ Mk, t ³ s ³ to, ||Tk(t, s, )||ds £ Mo, t ³ to.

Então para cada solução de (12), (u(t), v(t)) Î Alpara t ³ to, tem-se:

||u(t) – v(t)|| Mk||u(to) – v(to)|| + O(||2 – 1||) para todo t ³ to.

No caso particular do exemplo é fácil ver que f(v,2) – f(v,1) = O(|2 – 1|), relembrando que v permanece em um conjunto limitado.

Observe que f(v, ) – f(u, ) pode ser reescrito na seguinte forma:

f(v, ) – f(u, ) = F(u, v, 2)[v – u],

onde

Logo a função f satisfaz os requisitos do Teorema 10. Seguindo as idéias deste Teorema, um decaimento exponencial para o operador de evolução de

deve ser encontrado para que o sincronismo seja garantido. Com isto em mente, considere a seguinte Função de Liapunov:

W(x1, x2, x3) : = [(x1)2 + b(x2)2 + b(x3)2].

Calculando a derivada de W, com relação a (13), obtém-se:

Na forma matricial tem-se – =

Logo, – – rW =

Utilizando o Critério de Sylvester, e relembrando que as soluções permanecem dentro do conjunto Al, é possível concluir que – – rW é definida positiva se e somente se:

É possível mostrar que se a terceira desigualdade for satisfeita, todas as demais estarão automaticamente satisfeitas. Portanto basta estudar a última desigualdade.

Dividindo esta desigualdade por b(b – ), obtém-se:

e portanto,

Assim,

Da estimativa do atrator tem-se que:

Tomando b = 0.1 e r = 0.1, obtém-se:

De £ – rW, conclui-se o decaimento do operador de evolução de (13). Portanto o sistema (10) sincroniza para k > 377.

As Figuras 9a e 9b mostram respectivamente a projeção das órbitas de ambos os sistemas no plano x-z e a norma da diferença entre as soluções do sistema quando o segundo sistema de Lorenz tem um erro de +1% nos parâmetros. As Figuras 9c e 9d são similares às anteriores, entretanto o erro dos parâmetros do segundo sistema é igual à +5%. Em ambas as situações os sistemas sincronizam conforme previsto pelos cálculos anteriores.



6 CONCLUSÕES

Neste artigo, uma versão uniforme do Princípio de Invariância, foi apresentada. Nesta versão, condições menos restritivas do que aquelas do Princípio de Invariância Clássico foram utilizadas de forma a permitir sua aplicação em uma classe maior de problemas. Basicamente permite-se que a derivada da Função de Liapunov seja positiva em algumas regiões limitadas e admite-se incerteza na determinação dos parâmetros do sistema. Este teorema é muito útil na obtenção de estimativas de atratores e das respectivas áreas de atração, ambas uniformes com relação à variação de parâmetros. Além disto, o Princípio de Invariância de LaSalle foi aplicado com sucesso ao estudo do sincronismo de sistemas acoplados.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho foi financiado parcialmente pela FAPESP.

Artigo submetido em 12/12/00

1a. Revisão em 17/04/01; 2a. Revisão em 10/08/01

Aceito sob recomendação do Ed. Cons. Prof. Dr. José Roberto Castilho Piqueira

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  • 1
    Neste trabalho, o termo função de Liapunov possui um sentido mais geral do que o usual pois permite-se que a derivada destas funções ao longo das trajetórias possam ser positivas em algumas regiões limitadas.
  • 2
    Um conjunto
    B Ì
    n é invariante com relação a (1) se, para todo
    xoÎ
    B, a solução j(
    t,
    xo) Î
    B para todo
    t Î
  • Publication Dates

    • Publication in this collection
      15 Jan 2003
    • Date of issue
      Apr 2002

    History

    • Reviewed
      10 Aug 2001
    • Received
      12 Dec 2000
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