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"Aqui somos protegidos pelas nossas quatro paredes. Aqui nós falamos alemão": histórias de letramentos interculturais no Vale do Itajaí, SC

"Here we are protected by our four walls. Here we speak german": stories of intercultural literacies in Itajaí Valley, SC

Resumos

O objetivo deste trabalho é refletir sobre as práticas sociais de leitura e de escrita em um cenário de imigração alemã, no Médio Vale do Itajaí, SC. Parte-se dos registros de uma pesquisa interpretativista¹ que teve como principal objetivo compreender como se deram os acessos ao(s) letramento(s) em língua alemã e em língua portuguesa por parte de indivíduos teuto-brasileiros que vivenciaram o período da segunda campanha de nacionalização do ensino (1937-1945) e o período pós-guerra. O estudo descreve histórias de letramento desses indivíduos e sua relação com a escolarização, com questões de identidade étnica e com as políticas linguísticas nacionais e locais. O principal instrumento de pesquisa utilizado foi a entrevista narrativa, realizada com sujeitos nascidos entre 1916 e 1934. O viés teórico adotado na análise dos registros da investigação orientou-se pelos Estudos do Letramento, em consonância com teorias que envolvem a escolarização em contextos de línguas minoritárias no âmbito da Linguística Aplicada. As narrativas construídas pelos atores sociais desta pesquisa trazem à tona (i) conflitos gerados pela imposição de uma identidade nacional única, (ii) ressentimentos decorrentes do processo de assimilação forçada e (iii) estratégias de resistência desses grupos em manterem sua língua de herança. Além disso, a reconstituição das memórias dos sujeitos participantes do estudo desvelam histórias de letramento em que os significados da escrita transcendem a esfera escolar, uma vez que são produzidos na inserção dos sujeitos em práticas de letramentos vivenciadas na família, na esfera religiosa, entre outras esferas. Assim, o acesso aos letramentos em língua alemã não se deu apenas pela escola, mas outras agências de letramento foram determinantes nesse sentido.

letramentos; imigração alemã; escolarização


This paper provides a reflection on literacy practices in the context of German immigrants in the central Itajaí Valley in Santa Catarina. The research, which was developed through an interpretivist perspective, was designed to facilitate an understanding of how German-Brazilians who spent the period of the second campaign of teaching nationalization (1937-1945) and the post-war years were introduced to German and Portuguese literacy(ies). The study thus presents narratives of literacy of these immigrants to describe the immigrants' literacy stories and their relationship with education, as well as with ethnic identity and national and local language policies. The main instrument used to generate data was the narrative interview, which was conducted with subjects who were born between 1916 and 1934. The analysis of data was guided by Literacy Studies, in line with theories involving schooling in contexts of minority languages within the area of Applied Linguistics. The narratives constructed by the participants bring out (i) the conflicts generated by a single, imposed national identity, (ii) resentment arising from the process of forced assimilation and (iii) strategies of resistance to maintain the heritage language. Moreover, the recovery of the memories of the participants in the study reveals narratives of literacy in which the meaning of writing transcends the school sphere, since these meanings are produced by the insertion of these individuals into various spheres, such as the literacy practices within their families and religious scenarios. Thus, access to literacy in German did not take place only at school, but also through the action of other agencies of literacy, which were crucial to this access.

literacies; German immigration; schooling


ARTIGOS

"Aqui somos protegidos pelas nossas quatro paredes. Aqui nós falamos alemão": histórias de letramentos interculturais no Vale do Itajaí, SC* * Parte dos dados aqui apresentados foi discutida no III Simpósio Nacional e I Simpósio Internacional Discurso, Identidade e Sociedade, realizado na Unicamp, em fevereiro de 2012.

"Here we are protected by our four walls. Here we speak german": stories of intercultural literacies in Itajaí Valley, SC

Maristela Pereira Fritzen; Luana Ewald

FURB, Blumenau (SC), Brasil. mpfritzen@gmail.com; luanaewald@gmail.com

RESUMO

O objetivo deste trabalho é refletir sobre as práticas sociais de leitura e de escrita em um cenário de imigração alemã, no Médio Vale do Itajaí, SC. Parte-se dos registros de uma pesquisa interpretativista1 1 A pesquisa teve apoio do CNPq, Processo 477434/2010-0. que teve como principal objetivo compreender como se deram os acessos ao(s) letramento(s) em língua alemã e em língua portuguesa por parte de indivíduos teuto-brasileiros que vivenciaram o período da segunda campanha de nacionalização do ensino (1937-1945) e o período pós-guerra. O estudo descreve histórias de letramento desses indivíduos e sua relação com a escolarização, com questões de identidade étnica e com as políticas linguísticas nacionais e locais. O principal instrumento de pesquisa utilizado foi a entrevista narrativa, realizada com sujeitos nascidos entre 1916 e 1934. O viés teórico adotado na análise dos registros da investigação orientou-se pelos Estudos do Letramento, em consonância com teorias que envolvem a escolarização em contextos de línguas minoritárias no âmbito da Linguística Aplicada. As narrativas construídas pelos atores sociais desta pesquisa trazem à tona (i) conflitos gerados pela imposição de uma identidade nacional única, (ii) ressentimentos decorrentes do processo de assimilação forçada e (iii) estratégias de resistência desses grupos em manterem sua língua de herança. Além disso, a reconstituição das memórias dos sujeitos participantes do estudo desvelam histórias de letramento em que os significados da escrita transcendem a esfera escolar, uma vez que são produzidos na inserção dos sujeitos em práticas de letramentos vivenciadas na família, na esfera religiosa, entre outras esferas. Assim, o acesso aos letramentos em língua alemã não se deu apenas pela escola, mas outras agências de letramento foram determinantes nesse sentido.

Palavras-chave: letramentos; imigração alemã; escolarização.

ABSTRACT

This paper provides a reflection on literacy practices in the context of German immigrants in the central Itajaí Valley in Santa Catarina. The research, which was developed through an interpretivist perspective, was designed to facilitate an understanding of how German-Brazilians who spent the period of the second campaign of teaching nationalization (1937-1945) and the post-war years were introduced to German and Portuguese literacy(ies). The study thus presents narratives of literacy of these immigrants to describe the immigrants' literacy stories and their relationship with education, as well as with ethnic identity and national and local language policies. The main instrument used to generate data was the narrative interview, which was conducted with subjects who were born between 1916 and 1934. The analysis of data was guided by Literacy Studies, in line with theories involving schooling in contexts of minority languages within the area of Applied Linguistics. The narratives constructed by the participants bring out (i) the conflicts generated by a single, imposed national identity, (ii) resentment arising from the process of forced assimilation and (iii) strategies of resistance to maintain the heritage language. Moreover, the recovery of the memories of the participants in the study reveals narratives of literacy in which the meaning of writing transcends the school sphere, since these meanings are produced by the insertion of these individuals into various spheres, such as the literacy practices within their families and religious scenarios. Thus, access to literacy in German did not take place only at school, but also through the action of other agencies of literacy, which were crucial to this access.

Keywords: literacies; German immigration; schooling.

INTRODUÇÃO

O Sul do Brasil, como resultado das políticas de imigração do século XIX (SEYFERTH, 1999), foi colonizado principalmente por imigrantes alemães, italianos, poloneses, entre outros, formando cenários multiculturais e plurilinguísticos. Apesar do bilinguismo social (ROMAINE, 1995) desses grupos, parece não haver interesse político de que eles sejam visibilizados. Pelo contrário, o esforço, em geral, girou/gira em torno da pressão pela assimilação a fim de se chegar a uma situação "ideal" de monolinguismo.

Visibilizar cenários de línguas minoritárias se torna relevante hoje, entre outros aspectos, pelo fato de as políticas educacionais no Brasil, em geral, se apoiarem no mito do monolinguismo brasileiro, já bastante contestado pelos estudos da linguagem (BAGNO, 1999; BORTONI-RICARDO, 2005; CAVALCANTI, 1999, 2011; OLIVEIRA, 2002). Essa crença, também difundida em cursos de formação de professores, constrói uma visão simplificadora e homogeneizante dos diferentes grupos culturais e étnicos que integram o país, talvez como ressonância da própria ideia de constituição de Estado-Nação, traduzida pelo lema "uma língua, uma nação", em que "a língua materna deveria coincidir com a língua nacional" (ACHARD, 1987/1989, p. 31). Não raro, desconsideram-se nos processos de escolarização os cenários multiculturais como os de imigração, de fronteira, de povos indígenas, onde a própria escola se insere. Essa postura pode ser percebida na tentativa de apagar ou estigmatizar as línguas minoritárias2 2 O conceito de língua minoritária não é definido pelo número de falantes, mas associa-se à falta de prestígio que a língua desfruta no meio social, sendo, pois, entendido em seu sentido político (MAHER, 2007; ACHARD, 1989). No caso do alemão, considerando o contexto brasileiro, apesar de ter sido, em termos numéricos, a língua mais falada no Vale do Itajaí até 1940, pode-se dizer que sempre foi língua minoritária, por não desfrutar do status de língua oficial do Brasil (FRITZEN, 2007). ou, ainda, de tratar o bilinguismo dos alunos como um problema para a educação formal e para a aprendizagem do português.

Questões relacionadas ao sistema de ensino teuto-brasileiro, à escolarização em contexto de imigração alemã, à realidade sociolinguística e educacional da região do Vale do Itajaí, SC, ainda carecem de compreensão mais aprofundada. Para que esses temas entrem, definitivamente, na agenda de discussão em diferentes instâncias, é necessário que sejam amplamente pesquisados no âmbito acadêmico, a fim de atingirem outras esferas. Nesse sentido, realizamos a pesquisa aqui relatada, a fim de buscarmos o desvelamento de experiências na educação formal de descendentes de imigrantes alemães que, em sua maioria, foram obrigados a abandonar sua língua de herança, o alemão, em função das políticas de nacionalização adotadas pelo governo Vargas (1937-1945).

A suspensão do sistema de ensino comunitário e religioso, existente não apenas no Vale do Itajaí, mas no Sul do Brasil (KREUTZ, 1994), foi deflagrada por leis federais, promulgadas a partir de 1937, que proibiram o ensino em "língua estrangeira" e restringiram a liberdade didática nos estabelecimentos particulares (SEYFERTH, 1999, p. 308). Tais leis culminaram, em Santa Catarina, com o Decreto nº. 88, de 31 de março de 1938, o qual estabeleceu as normas relativas ao ensino primário em escolas comunitárias no Estado, bem como com o Decreto-Lei Federal 1.545, de 25 de agosto de 1939, o qual determinava a proibição do uso de línguas estrangeiras, isto é, as línguas de imigração que, por razões políticas, foram tratadas como línguas estrangeiras.

Diante dos conflitos gerados pelas medidas repressivas da campanha de nacionalização, perguntamos: que consequências o fechamento das escolas e a tentativa de silenciamento dos indivíduos teuto-brasileiros trouxeram para esses grupos? Com a proibição do uso da língua alemã não somente no âmbito público, mas também na esfera familiar, sujeitando as pessoas que insistissem em utilizar sua língua de herança à perseguição e punições, a língua alemã é empregada hoje, em grande parte, exclusivamente na oralidade, em localidades rurais de municípios do Vale do Itajaí, antiga Colônia Blumenau. Permanece, porém, em várias dessas localidades, ainda como principal língua de interação social entre os descendentes de imigrantes (FRITZEN, 2008).

É dentro desse cenário cultural e sociolinguisticamente complexo (CAVALCANTI, 1999, 2011) que se desenvolveu a pesquisa ora relatada, a fim de possibilitar a reconstrução e a compreensão das trajetórias de vida de descendentes de imigrantes alemães e sua relação com o acesso que tiveram a práticas sociais de leitura e escrita nas línguas alemã e portuguesa, ou o acesso a essas práticas que lhes foi negado. Por meio da descrição das histórias de letramentos de indivíduos teuto-brasileiros e sua relação com a escolarização ou com outros processos sociais, podemos desvelar aspectos relevantes relacionados aos significados culturais que a leitura e a escrita tiverem e têm para esses grupos bi/multilíngues, permitindo, assim, revelar a situação das comunidades de Blumenau e região tanto no plano socioeducacional como linguístico. Compreendemos "teuto-brasileiro/a" como um qualificativo para nos referirmos a descendentes de imigrantes alemães, da terceira, quarta ou quinta geração, que ainda aprenderam em casa a língua de herança familiar3 3 No caso da pesquisa aqui relatada, os sujeitos são descendentes de alemães da terceira e quarta geração. .

A carência de pesquisas que focalizem a ação pedagógica das escolas brasileiras nessas zonas de imigração do Vale do Itajaí após a brusca interrupção de experiências de ensino das escolas religiosas e comunitárias e o fato de as pessoas que vivenciaram esse período na escola já terem hoje idade avançada demonstra a urgência do desenvolvimento de pesquisas desse tipo. Dar voz a esses indivíduos teuto-brasileiros certamente contribui com a escrita e o registro da história local, a partir dos atores sociais que dela fizeram e fazem parte. Esse é, pois, um dos compromissos da Linguística Aplicada, como argumenta Moita Lopes (2006, p. 27):

[...] a possibilidade política de que a pesquisa contemple outras histórias sobre quem somos ou outras formas de sociabilidade que tragam para o centro de atenção vidas marginalizadas do ponto de vista dos atravessamentos identitários de classe social, raça, etnia, gênero, sexualidade, nacionalidade, etc.

Considerando a problemática do contexto investigado e tendo como pressuposto a dimensão política da pesquisa, organizamos a discussão em quatro partes. Inicialmente abordamos de forma sucinta os procedimentos metodológicos da pesquisa. Em seguida, analisamos os depoimentos dos sujeitos a respeito das medidas coercivas aplicadas ao ensino da língua alemã e sua relação com as práticas de letramento. Por fim, apresentamos as considerações finais com o intuito de contribuir para a reconstrução da história, no âmbito linguístico e educacional, do Vale do Itajaí.

1. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Por meio da pesquisa, de abordagem interpretativista (ERICKSON, 1986; MOITA LOPES, 1994), compreendemos que os significados do mundo social são construídos nas interações entre os sujeitos, não são dados a priori para que o pesquisador apenas faça a coleta deles. Também se buscou o olhar da etnografia, no sentido de procurarmos compreender, com o apoio dos instrumentos dessa técnica interpretativa e com base em princípios éticos, as práticas sociais de determinado grupo e os sentidos que têm para esses atores sociais (FRITZEN, 2012).

Com esses pressupostos em mente, objetivamos compreender como se deu o acesso ao(s) letramento(s) em língua alemã e em língua portuguesa por parte de indivíduos teuto-brasileiros que viveram durante a segunda campanha de nacionalização do ensino (a partir de 1937) e logo após esse período.

Para atingir esse objetivo, é importante ressaltar que o pesquisador, ao estudar grupos culturais, especialmente grupos minoritários, deveria se questionar sobre a bagagem cultural que inevitavelmente leva "ao adentrar o território do outro" (CAVALCANTI, 2006, p. 237). Além disso, é necessário que o pesquisador seja capaz de registrar e traduzir, por meio da escrita, as falas dos sujeitos da pesquisa, as quais constituem o corpus da investigação, com o qual é possível gerar compreensão e interpretação dos múltiplos sentidos que se constroem no/do cenário em estudo.

O contexto investigado, conforme mencionado anteriormente, é o Vale do Itajaí, SC, cenário de imigração predominantemente alemã, mas onde há também grupos de imigração italiana, polonesa, além de povos indígenas. Nesse campo, definiram-se grupos sociais que conservaram/conservam o alemão como língua de herança. Uma vez que a pesquisa teve como objetivo abranger o período histórico que inicia com a segunda campanha de nacionalização (1937-1945), os sujeitos da pesquisa foram escolhidos entre teuto-brasileiros, de preferência, acima de 78 anos, que vivenciaram esse período na escola. Assim, chegou-se a dezesseis sujeitos4 4 Tendo em vista o espaço limitado deste artigo, serão discutidos dados parciais do corpus da pesquisa. , oito homens e oito mulheres, nascidos em diferentes cidades do Médio Vale do Itajaí, entre 1916 e 1934. Todos frequentavam a escola durante a campanha de nacionalização.

Em consonância com a metodologia de pesquisa adotada, o principal instrumento de investigação utilizado foi a entrevista narrativa, pois "através da narrativa, as pessoas lembram o que aconteceu, colocam a experiência em uma sequência, encontram possíveis explicações para isso, e jogam com a cadeia de acontecimentos que constroem a vida individual e social" (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2002, p. 91). As narrativas dos sujeitos, como "real unidade da comunicação discursiva – o enunciado" (BAKHTIN, 1992/2011, p. 274, grifo no original), compõem "elo[s] na corrente complexamente organizada de outros enunciados" (BAKHTIN, 1992/2011, p. 272) no trabalho de registro das memórias dos grupos teuto-brasileiros.

As entrevistas foram realizadas entre novembro de 2010 e julho de 2012, no próprio domicílio dos sujeitos. A residência se mostrou um lugar propício para evocar as lembranças dos entrevistados, uma vez que eles tinham ao seu redor "artefatos culturais" (BARTLETT, 2007) como fotografias, livros e documentos relacionados às suas vivências do período foco da pesquisa.

2. "ENTÃO ERA ALEMÃO NÉ, EM CASA E NA ESCOLA": REFLEXÕES A PARTIR DAS MEMÓRIAS DE LETRAMENTOS DE INDIVÍDUOS TEUTO-BRASILEIROS

A constituição do cenário da região do Vale do Itajaí, por razões históricas e políticas, entre outras, reuniu num mesmo espaço geográfico grupos étnicos diversos, com sua língua, suas crenças, seus comportamentos e modos de construir sentidos às suas ações e ao contexto em que se inserem. O fator principal desencadeador da formação desse contexto intercultural foram as políticas de imigração do país no século XIX, como mencionado anteriormente, que estimularam o ingresso de estrangeiros com o objetivo de povoar terras ditas devolutas, consideradas adequadas à instalação de agricultores livres e europeus (SEYFERTH, 1999).

Com a promulgação da lei que aboliu o tráfico de africanos, colonos europeus poderiam substituir a mão de obra escrava, além de ocupar terras ainda não cultivadas, contribuindo para o desenvolvimento da produção agrícola. Aliado a isso, havia o interesse, de cunho etnocêntrico, de políticos e intelectuais ligados ao governo e do próprio governo imperial, na diminuição do número de negros no Brasil, com projetos de imigração de populações brancas, "para se chegar à "raça pura" (branca) através da "miscigenação" seletiva", como argumenta Seyferth (1986). A historiadora salienta que essa política caracterizou a "ideologia do branqueamento" da população brasileira, com a assimilação dos imigrantes pela população mestiça e negra.

Como decorrência das políticas de imigração, foi fundada em 1850, a Colônia Blumenau no Vale do Itajaí, SC. Em termos numéricos, os alemães ficaram aquém de imigrantes vindos da Itália, Espanha e Portugal5 5 Segundo Cavalcanti (1999, p. 390), os primeiros portugueses e os africanos não são vistos como imigrantes. Aqueles "parecem ter um status superior como 'donos/donatários' das terras", enquanto estes, cerca de 6 milhões de pessoas que serviram como mão de obra escrava, foram a razão da adoção de uma política de "branqueamento" do País, em favor da imigração europeia. . Sua importância, porém, dentro do contexto imigratório brasileiro, está relacionada com o povoamento dos três estados do Sul, "em zonas pioneiras, constituindo uma sociedade culturalmente diversa" (SEYFERTH, 1999).

Os imigrantes teuto-brasileiros criaram na região do Vale do Itajaí um amplo sistema de ensino, com escolas comunitárias e religiosas. Apesar da precariedade das primeiras escolas, no início do século XX já havia uma sólida rede de educação formal, que superava em muito o número de escolas estaduais (LUNA, 2000). Para se ter uma ideia, em Santa Catarina, no ano de 1916, 40% das escolas eram privadas (comunitárias ou religiosas). Em Blumenau, na mesma época, havia 10 escolas estaduais, que contavam com 520 alunos, e 113 estabelecimentos de ensino privado, com 5.011 alunos matriculados (LUNA, 2000).

Os relatos a seguir, de indivíduos teuto-brasileiros6 6 São usados pseudônimos para identificar os sujeitos a fim de preservar sua identidade. , trazem à tona lembranças e cenas das escolas que faziam parte do sistema de ensino comunitário e religioso da região.

Na escola, o papai ensinava um dia alemão, um dia português. Isso ele levava a capricho. Nós praticávamos muito o canto... Nós cantávamos muito, porque o papai era músico, ele cantava bem e tocava quatro instrumentos. (Entrevista com Sr. Bernardo, nascido em 1916)

Entrevistadora: e durante as brincadeiras no recreio a senhora lembra?

Edith: TUDO7 7 Convenções de transcrição adaptadas de Marcuschi (1986): MAIÚSCULA: ênfase; (abcd): comentários do pesquisador; [...]: omissão de trecho; /: interrupção abrupta. Não foi feita a tradução do alemão no trecho da fala da entrevistada, visto que ela mesma traduz para a entrevistadora. em alemão [...] Ringeln ringeln Rose, Butter in die Dose (cantando em alemão) (risos)

Entrevistadora: o que significa isso? (rindo)

Edith: (risos) Ringeln ringeln quer dizer roda roda né, rose rosa, meinetwegen na na mantegueira. Eier in den kasten (cantando) ovos na mantegueira. Morgen woll ma fasten (cantando). Amanhã nós vamos jejuar e depois de amanhã übermorgen lämlein schlachten, é matar um carneirinho, coisa. E ele faz MÉÉÉ (risos). (Entrevista com Sra. Edith, nascida em 1922)

Na escola era língua alemã né, porque o pai e a mãe não sabiam falar (no caso, o português), o vizinho também não sabia falar e o avô também não né. Então era alemão né, em casa e na escola.

Daí a escola era particular. Isso também depois passou a estadual.

(Entrevista com Sr. Ulmer, nascido em 1928).

Ao reconstruírem suas memórias e recuperarem parte das memórias coletivas do grupo teuto-brasileiro, esses sujeitos falam de suas experiências na escola em um tempo em que a língua alemã estava presente no contexto familiar, social e educacional. Do currículo faziam parte a língua de imigração e o português. Também o canto e a música foram lembrados em suas experiências escolares. De acordo com Mailer (2003, p. 37), "o professor era, na maioria das vezes, um mestre-escola, que ensinava desde música, religião e artes, até história e matemática".

O Sr. Bernardo, que frequentou um estabelecimento de ensino da comunidade evangélica luterana onde seu pai foi professor, destaca o fato de as aulas serem ministradas em alemão e em português, isto é, ambas as línguas eram usadas como línguas de instrução nos processos de ensinar e aprender na escola. Assim, os alunos tinham acesso a "práticas de letramento" (STREET, 2000, 2003; KLEIMAN, 1995) em ambas as línguas, na sua língua de herança e na língua oficial do país.

A exigência do ensino em português já foi instituída pela Lei Estadual 447, de 1858, em seu parágrafo quarto, que determinava que os "professores de primeiras letras", isto é, dos primeiros anos do ensino fundamental, das colônias Dona Francisca (Joinville, SC) e Blumenau fossem cidadãos brasileiros, maiores de 21 anos e que dominassem, além das matérias próprias do ensino, a língua alemã. No entanto, Blumenau, fundador e administrador da Colônia8 8 O Dr. Hermann Blumenau permaneceu na direção da Colônia até 1880, quando foi elevada à categoria de município (SILVA, 1972). , em relatório ao então Governo Imperial, queixava-se diante das dificuldades de encontrar professores que reunissem, em suas palavras, "as indispensáveis garantias morais e o conhecimento da língua vernácula e da alemã, visto que as crianças entendem somente esta" (SILVA, 1972, p. 301). Essa dificuldade persistiu especialmente em zonas rurais, onde, com frequência, o professor era um dos moradores da comunidade com maior instrução e que nem sempre dominava o português. Em geral, nessas comunidades, a escola era comunitária. Os pais pagavam a instrução de seus filhos, como menciona o Sr. Ulmer, ao se referir à escola particular.

Embora os teuto-brasileiros considerassem importante o ensino do português, como demonstra o texto do relatório citado, também entendiam a necessidade de promover práticas sociais de leitura e de escrita na língua do seu grupo étnico. A Lei acima mencionada já aponta os conflitos surgidos com o processo de escolarização dos imigrantes e seus descendentes. É preciso lembrar que, ao longo da história da Europa Ocidental, as escolas foram utilizadas como um dos meios "para difundir uma imagem de "nação" que possibilitasse o surgimento de sentimentos de adesão e lealdade a ela" (BERENBLUM, 2003, p. 39, grifo no original). No caso das escolas teuto-brasileiras, elas tiveram um importante papel como veículos de expressão e de afirmação da etnicidade teuto-brasileira.

Além das escolas, outras manifestações culturais como a imprensa em língua alemã, a divulgação de calendários, produções literárias, bem como traduções da literatura portuguesa para o alemão mantinham viva a língua de imigração no Vale do Itajaí e seu prestígio por meio da escrita. Em Blumenau, dois jornais se destacaram: o Blumenauer Zeitung (Gazeta de Blumenau) e Der Urwaldsbote (O Mensageiro da Floresta). Ambos tiveram repercussão nacional e circularam até a segunda campanha de nacionalização (KORMANN, 1995), quando medidas do Governo Vargas (1937-1945) determinaram o fechamento de todos os órgãos de imprensa em "língua estrangeira", ou seja, língua de imigração, como citado anteriormente.

Entrevistadora: em casa o senhor lembra se vocês tinham algum jornal, almanaque, alguma coisa assim em alemão?

Ulmer: aham, TINHA. O meu, é, almanaque vinha sempre em alemão, em alemão. Aquele, tinha aquele almanaque grosso né, e o meu pai era assinante. O meu pai e o meu tio, os dois juntos né. O Urwaldsbote e o Blumenauer Zeitung né, que continuou, que é a nação, que passou pelo jornal de Santa Catarina, é continuação né. E o Blumenauer Zeitung depois ele chamava-se cidade de Blumenau. [...] Eu me lembro sempre. Nós íamos lá buscar o jornal de noite sempre e eu lia todas as palavras sempre. Aí o meu/ nós fizemos a janta, aí a minha mãe e minha irmã lavaram a louça o meu pai lia o jornal. Meu pai era mais adiantado né, minha mãe não era tão boa na leitura. Então ele lia e explicava pra ela né, enquanto isso nós fazíamos a nossa lição, nossa tarefa. A tarefa era escrita em alemão e em português, igualzinho né, tinha que ser igual. (Entrevista com Sr. Ulmer, nascido em 1928).

Nas memórias do Sr. Ulmer, constatamos o lugar que os almanaques e jornais em língua alemã ocupavam na vida familiar, como suportes de gêneros discursivos (BAKHTIN, 1992/2011) que eram lidos nessa esfera. No depoimento do entrevistado, é possível reconstruir "eventos de letramento" (STREET, 2000) na esfera familiar, em que pais e filhos se reúnem em torno de práticas de leitura e de escrita. No caso das crianças que frequentavam a escola, essas práticas incluíam ambas as línguas que circulavam na sociedade. O fato de ter de produzir as tarefas escolares em alemão e em português pode sinalizar não somente para o cumprimento da Lei mencionada, mas para o reconhecimento da necessidade do aprendizado de ambas as línguas, uma vez que elas tinham uma função social, como línguas presentes na oralidade e na escrita da comunidade.

Dados do censo demográfico do IBGE9 9 Segundo Oliveira (2002, p. 88), "de todos os censos brasileiros, somente os de 1940 e 1950 se interessaram por perguntar qual língua os brasileiros usavam no lar, e se sabiam falar português". O censo de 2010 incluiu, para a população indígena, pergunta com relação à etnia ou povo a que pertence e à língua falada. No caso das antigas zonas de imigração, não há dados oficiais sobre as línguas ainda faladas hoje, salvo por iniciativas de pesquisadores. de 1940 permitem vislumbrar a situação linguística no município de Blumenau naquela época: 97% da população usava o alemão cotidianamente, no mínimo, no âmbito familiar. Evidentemente, o contato com a língua nacional também gerava (e continua gerando) conflitos linguísticos e identitários, uma vez que língua e identidade são constitutivas do próprio processo permanente e inacabado de construção e projeção das identidades culturais e das diferenças.

Com relação ao número expressivo de pessoas que utilizavam a língua alemã em contextos como do Vale do Itajaí, a "contrapalavra" 10 10 Para Bakhtin, toda compreensão é ativa e responsiva: "Compreender é opor à palavra do locutor uma contrapalavra" (BAKHTIN, 1977/2006, p. 135). (BAKHTIN, 1977/2006) do governo, isto é, a resposta aos imigrantes alemães e seus descendentes foi dada por meio de duas campanhas de nacionalização. Em Santa Catarina, a primeira campanha, desencadeada a partir de 1911, no Governo de Vidal Ramos, atingiu o sistema de ensino do Estado.

As tensões entre a sociedade majoritária e os grupos em zonas de imigração aumentaram com a primeira Guerra Mundial e a adesão do Brasil aos aliados, em 1917. Começaram a surgir atitudes nacionalistas e denúncias do "perigo alemão" (FÁVERI, 2005). Essas vozes acusavam o Estado de Santa Catarina de estar "infestado pelo vírus da desnacionalização, no qual brasileiros são criados como se fossem estrangeiros" (SEYFERTH, 1981, p. 183). Em consequência, foram tomadas as primeiras providências contra as escolas do sistema teuto-brasileiro de ensino.

A Lei Estadual 1.187 e o Decreto 1.063 de 1917 determinaram uma série de medidas, entre elas o ensino exclusivamente em português com obras de autores nacionais, que resultaram no fechamento das escolas comunitárias. O Decreto proibiu, ainda, que as Superintendências Municipais subvencionassem escolas particulares (comunitárias e religiosas) nas quais a língua de instrução não fosse exclusivamente o português. Para a reabertura dessas escolas era necessário que se ajustassem às medidas legais. O controle era feito pelo Inspetor Geral do Ensino, que autorizava a reabertura da escola, depois de fazer uma verificação no estabelecimento e constatar que o professor "falasse corretamente o português" (SILVA, 1972, p. 319). Como nem todas as escolas conseguiram adaptar-se às exigências do governo, muitas delas não puderam reabrir suas portas. Com isso, foi negado a muitas crianças teuto-brasileiras o direito à educação formal (LUNA, 2000).

A segunda campanha de nacionalização, implantada durante o regime ditatorial do Estado Novo (1937-1945), conforme já mencionado neste artigo, tendo como alvo escolas em zonas de imigração, em particular, as teuto-brasileiras, assumiu um caráter repressivo ainda maior: a assimilação dos imigrantes e seus descendentes dar-se-ia por meio da ação militar (FÁVERI, 2005). O Decreto-Lei 1545, de 25 de agosto de 1939, incumbiu o Estado Maior do Exército para dirigir as atividades do Ministério da Guerra com o intuito de promover a "perfeita adaptação, ao meio nacional, dos brasileiros descendentes de estrangeiros"11 11 Art. 1º. do Decreto-Lei 1545, de 25 de agosto de 1939. Disponível em < http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=11345>. Acesso em: 23 set. 2013, às 15h15min. . Além do fechamento das escolas e de instituições ligadas à língua alemã (imprensa, associações, clubes), decretos e leis impuseram, por meio da perseguição e da força física, o silenciamento dos teuto-brasileiros, que ficaram sem escola, muitos inclusive sem acesso à língua portuguesa e sem poderem se expressar na língua do seu grupo familiar.

Os depoimentos a seguir, de três teuto-brasileiros, recuperam vivências desse período:

Depois dos nove dez anos né, depois quando foi proibido, não tinha mais nenhum piu que podia falar em alemão. Nada. Eles chegaram até a botar óleo na boca da gente. Então todos tinham medo de falar. [...] Nem música não tinha mais, não podia ter música. Não podia ter assim nos casamentos. Quando tinha casamento não podia ter música nem foguete. Não podia ter nada, nada, nada. (Entrevista com Sr. Kilian, nascido em 1928).

Eu era empregado do Sr. Rudolf ainda e entrou uma senhora, quis comprar uma lâmpada elétrica né. Aí eu fui mostrando pra ela em alemão né'. O secreta me pegou por trás: "o senhor está preso!". E tem que obedecer né. Então eu digo: "o senhor me dá licença eu quero me despedir do meu patrão, pro meu patrão saber onde é que eu estou". Aí ele disse: "não senhor, você daqui vai direto pra cadeia, você não tem que dar satisfação a ninguém". Mas eu digo: "eu quero, eu não vou, eu quero primeiro dizer auf wiedersehen (tchau) para o Sr. Rudolf. Era o meu chefe. Aí eu insisti, entrei e chegando lá eu disse: "patrão, auf wiedersehen. Eu vou. Fui preso porque eu falei alemão". (Entrevista com Sr. Bernardo, nascido em 1916).

[...] Isso eu não me lembro agora em que ano que foi, que foi proibida a língua alemã. É que tinha guerra da Alemanha, não com o Brasil, mas infelizmente o Brasil também mandou soldados né, pra lá né. E então foi proibido, então eles até vinham nas casas ver quem é que tinha alguns livros em alemão. Então a gente escondeu, (risos) pois é. Eu me lembro ainda os melhores que nós tínhamos nós escondemos dentro de um, um... a gente diz como é que é? Colmeia de abelha. E depois quando nós fomos ver, depois de três meses, as formigas assim bem grandes tinham feito tudo um ninho ali e roído tudo, praticamente os livros todos. (Entrevista com Sra. Walburga, nascida em 1928).

O diálogo com o pesquisador por meio das entrevistas narrativas permitiu que esses sujeitos lançassem uma ponte entre o passado e o presente, revirassem suas reminiscências e reconstruíssem parte de suas memórias. "O processo de recordação não é simples; é construtivo, gradual e depende da situação do presente. Na maior parte das vezes, lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar com imagens de hoje, as experiências do passado. A memória não é sonho; é trabalho" (BOSI, 1994, p. 55). Nesse trabalho dos indivíduos teuto-brasileiros ao voltarem seu olhar para o passado, podemos perceber aproximações em suas experiências, que nos ajudam a entrelaçar os fios que vão tecendo as memórias coletivas do grupo.

Os indivíduos discorrem sobre a proibição da língua do seu grupo; os diálogos interrompidos (então todos tinham medo de falar); a imposição do silenciamento (não tinha mais nenhum piu que podia falar em alemão); as punições que sofreram (eles chegaram até a botar óleo na boca da gente; o secreta me pegou por trás: "o senhor está preso!") quando, de forma natural no seu cotidiano, empregavam a língua que aprenderam na família.

Também o valor dado à leitura e à escrita levou muitos teuto-brasileiros a utilizarem táticas para manterem seus bens culturais, no caso, livros em língua alemã, quando tiveram negado o acesso a práticas de letramento na sua língua de herança. O projeto nacionalista buscava a homogeneidade, e por isso "dentro das fronteiras do Estado só havia lugar para uma língua, uma memória histórica e um sentimento patriótico" (BAUMAN, 2003, p. 84).

Em leis e decretos nacionalizadores, a referência às línguas de imigração foi feita como "línguas estrangeiras". No entanto, como citamos neste artigo, o alemão, o italiano, o polonês, bem como as demais línguas de imigração faladas no território brasileiro eram línguas usadas nas esferas familiar e social, faladas por indivíduos nascidos no Brasil. Dessa forma, não poderiam ser tratadas como línguas estrangeiras. Sabemos, porém, que em tempos de guerra, os sentidos de nação e de língua nacional ganham outras dimensões. A representação de língua estrangeira e dos indivíduos que as falam se relacionava com a ideia de estranho, inimigo, que se opõe à identidade nacional e à nação que os acolheu.

Esse sentimento inquestionável [ser brasileiro, catalão, francês], em nome do qual se ama e se odeia, se morre ou se mata, parece fazer parte da essência da natureza humana. No entanto, nada há de natural na identidade nacional, ela se constrói historicamente e adquire determinados sentidos ao longo das próprias histórias das nações (BERENBLUM, 2003, p. 32).

No caso específico do Brasil, o momento histórico que se vivia no Vale do Itajaí e em outras localidades do Sul do país, com a vasta produção cultural em língua alemã, com um sistema de ensino teuto-brasileiro solidificado e com a imprensa em plena circulação nessa língua, tornava visíveis e influentes manifestações cultuais de um grupo específico considerado "estrangeiro". Mas "o poder de Estado de que o nacionalismo precisava não podia ter competidores. Todas as autoridades alternativas eram potenciais focos de sedição. As comunidades étnicas ou locais eram os habituais suspeitos e os inimigos principais" (BAUMAN, 2003, p. 84), que poderiam criar obstáculos para a construção da identidade nacional.

No esforço de nacionalizar pela unificação da língua, denúncias eram constantes: militares, inspetores (de quarteirão, escolares) e vizinhos fizeram com que recrudescesse o medo. Interferindo diretamente nas escolas, nas famílias, e, por conseguinte, nas comunidades, a vida cotidiana foi alterada; homens e mulheres passaram a viver sob rigorosa censura e de certa forma "emudeceram" (FÁVERI, 2005, p. 113, grifo no original).

As memórias do indivíduo a seguir, que frequentava uma das escolas do sistema de ensino teuto-brasileiro, também desvelam as consequências das medidas nacionalistas na educação formal.

Tinha duas escolas, a luterana e a católica. [...] Tinha sempre uma tabuleta bem grande, estava escrito bem grande escola particular, na entrada. Mas um dia chegamos de manhã cedo, foi logo depois de ano novo, dia dois de janeiro, que as aulas já começavam em dois de janeiro né, e não era mais particular. Estava escrito bem grande escola estadual. Quando entramos na escola, aí nós vimos na parede duas fotos bem grandes, Nereu Ramos e Getúlio Vargas, governador e presidente. Daí o professor/ cantamos o hino nacional como sempre né, ele fez a chamada, aí ele falou: "ó, de hoje em diante as coisas mudam, a coisa vai ser bem mais dura, porque a escola não é mais o pai de vocês que paga, que mandam, é o governo do estado que manda". [...] Aí quando chegou o primeiro ano, depois que começou aí veio o dia sete de setembro. Uma semana antes do dia sete de setembro o professor disse: "essa semana nós temos aula só até no recreio e depois nós vamos aprender a marchar porque nesse ano nós temos que marchar no dia sete de setembro. Não é desfile, é marcha" (Entrevista com Sr. Ulmer, nascido em 1928).

Em suas vivências, o Sr. Ulmer relata a ruptura de um sistema de ensino comunitário ou religioso, como era o caso de algumas escolas luteranas e católicas da região, para um sistema de ensino público, controlado pelo Estado. A escola, durante o período de nacionalização, constituiu um importante instrumento de imposição da política nacionalista, de disseminação dos ideais monoculturais e monolinguísticos, em torno de uma identidade nacional única. Entretanto, como adverte Hall (2005, p. 48), "as identidades nacionais não são coisas com as quais nós nascemos, mas são formadas e transformadas no interior da representação". Dessa forma, a identidade nacional vai se construindo na criação de símbolos e heróis nacionais: o hino nacional, as fotos dos governantes, a marcha no dia 7 de setembro como data de comemoração da independência do Brasil. Dentre esses símbolos, a língua é um dos mais representativos (BERENBLUM, 2003). Decorre daí sua proibição, a vigilância e a punição sofrida pelos que não aderissem à assimilação forçada.

Quando a escola passou a ser subsidiada pelos cofres públicos (a escola não é mais o pai de vocês que paga, que mandam, é o governo do estado que manda), passou a fornecer única e obrigatoriamente o ensino em língua portuguesa, 'da língua e da cultura nacional'. No depoimento acima, o Sr. Ulmer deixa pistas linguísticas que nos levam a refletir sobre o poder do Estado e da comunidade teuto-brasileira, com relação às práticas escolares. Antes da nacionalização do ensino, a comunidade teuto-brasileira mantinha a escola financeiramente, assim, os pais dos alunos tinham poder para decidir questões relacionadas a ela, como a língua de instrução e ensino. Quando o Estado passa a manter a escola, por consequência, o poder muda de mãos. Essa transição foi um momento de tensão entre o Estado e a comunidade, entre a "ideologia do cotidiano" e a "ideologia oficial" (BAKHTIN, 1997/2006), transformadas no discurso e representativas para a constituição da identidade nacional.

Conforme Silva (2012, p. 91), "quem tem o poder de representar tem o poder de definir e determinar a identidade". As famílias teuto-brasileiras ficaram destituídas de poder para representar a identidade cultural da região, a qual passou pelo silenciamento12 12 É preciso observar, conforme Orlandi (1987, p. 264), que o sentido de silenciar está ligado à imposição de uma forma de dominação e exclusão, portanto, não se restringe a " calar o interlocutor" (grifo da autora). Nesse sentido, o termo silenciamento linguístico é aqui empregado com relação à imposição da língua portuguesa e, por conseguinte, à "dura repressão à língua alemã no período ditatorial do Estado Novo (1937-1945), [...] em que se proibiu o uso da língua em público e no lar, impondo aos cidadãos de origem teuta um silenciamento de sua língua materna" (MAILER, 2003, p. 09). Como o foco de nossa pesquisa são os grupos de descendentes de imigrantes alemães, destacamos o silenciamento imposto a esses grupos, mas reconhecemos que ele também atingiu outras etnias que viviam/vivem no território brasileiro. linguístico, na tentativa de assimilar as diferentes identidades culturais em uma identidade nacional unificada. Hall (2005, p.13) argumenta, porém, que "a identidade plenamente unificada, segura e coerente é uma fantasia". Assim, as identidades devem ser compreendidas por meio dos múltiplos sistemas de significação e representação cultural, nos quais as pessoas são confrontadas a diversas possibilidades de identidades, "com cada uma das quais poderíamos nos identificar – ao menos temporariamente." (HALL, 2005, p. 13).

Meu nome é Bertha, eu nasci em Blumenau na maternidade Johannastift no dia sete de abril de mil novecentos e trinta e quatro. Portanto completei setenta e oito anos. Tenho uma vivência dentro da minha cidade com muitas lembranças... Lembranças de períodos lindos, de períodos tristes. E entre os tristes é justamente quando eu era criança quando foi proibido o falar alemão. Nós em casa, nós falávamos o alemão e na época era tão comum que nós íamos falar o português somente na escola ou no jardim de infância. ESSE se não fosse ALEMÃO, porque nós tínhamos jardim de infância alemão também que foi fechado em mil novecentos e trinta e nove. Minha irmã mais velha chegou a frequentá-lo, eu não. Então com essa proibição de falar o alemão isso complicou nossa vida, a vida de todos, de todos os blumenauenses e de todo o pessoal da região aqui, os descendentes dos imigrantes. (Entrevista com Sra. Bertha, nascida em 1934).

As consequências da ditadura de Vargas repercutem ainda hoje. Falar do tema colonização alemã na região do Vale do Itajaí evoca, não raro, uma série de sentimentos controversos, toca em ressentimentos, traz à memória períodos tristes, que compõem as narrativas da Sra. Bertha, mas que fazem parte da história coletiva de todo o pessoal da região aqui, os descendentes de imigrantes, como ela enuncia.

As memórias da Sra. Bertha e dos demais entrevistados, portanto, nos auxiliam a compreender o silenciamento linguístico manifestado na história de todo um grupo étnico. Isso porque os depoimentos, os dizeres desses sujeitos, estão carregados de valores socialmente constituídos por meio de discursos seus e de "outros", ou seja, a "alteridade" (BAKHTIN, 1977/2006) está presente em seus enunciados.

Todo indivíduo se constitui na relação com a alteridade. Para Bakhtin (2006), o sujeito se reflete e refrata no outro e, no momento em que se constitui, a partir da interação, também se altera (BAKHTIN, 1977/2006). As memórias, na forma de narrativas, dependem sempre das condições de produção dos discursos. Em todo ato dialógico, todo enunciado, há a ação do sujeito que enuncia e a ação do "outro", e por isso, o enunciado da Sra. Bertha já contém a voz do "outro". É nesse sentido que as memórias individuais dos sujeitos participantes do estudo, ao serem enunciadas, tornam-se histórias coletivas do grupo teuto-brasileiro.

Dentre essas histórias, há a proibição do uso da língua alemã na escola. Perdeu-se, desse modo, a referência para o aprendizado do código escrito. Assim, a escola deixou de exercer o papel de uma "agência de letramento" (KLEIMAN, 1995) com referência à língua de imigração. No entanto, como mostram os excertos abaixo, outras estratégias foram adotadas pelas famílias para dar continuidade ao uso da língua não só no âmbito da oralidade.

Filha de Elfrida: oh mãe, conta pra ela que vocês tinham que se esconder pra aprender o/ quando tu ia na doutrina né. Vocês não faziam lá escondido num galpão pra ninguém ver que vocês tavam aprendendo alemão?

Elfrida: sim nós fomo numa casa. Pra nós tinha doutrina tudo, tudo escondido. (Entrevista com Sra. Elfrida, nascida em 1928).

Tem uma passagem que eu lembro, nós fazíamos férias em São Bento do Sul e quando nós estávamos lá no hotel (cita o nome), de repente de manhã quando nós descemos aí tinha policiais parados à porta do refeitório e já o dono do hotel instruiu todo mundo que não podia se falar uma palavra em alemão no refeitório, eram todos descendentes de alemães que estavam lá. [...] Só sei que nós não acabamos de tomar o café e meu pai disse "vamos pra cima, vamos pro apartamento". Deixamos o hotel e voltamos pra casa, isso pra não complicar nem a vida do proprietário, nem a nossa. E a partir daí então era boca fechada, falando na rua. Dentro de casa papai NÃO permitiu que se falasse o português. Aqui nós estamos na nossa embaixada, nós aqui somos protegidos pelas nossas quatro paredes. Aqui nós falamos alemão. (Entrevista com Sra. Bertha, nascida em 1934).

Os movimentos de resistência à imposição de uma língua e de uma identidade única estão presentes nas narrativas dessas senhoras. Para a Sra. Elfrida, assim como para os grupos teuto-brasileiros, a igreja, especialmente a Igreja Evangélica de Confissão Luterana13 13 Estima-se que 98% dos imigrantes alemães que chegaram a Blumenau eram membros da Igreja Evangélica Luterana fundada por Martin Luther (Lutero) por ocasião da Reforma Protestante (1517). No Brasil, a igreja passou a ser denominada Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil (MAILER, 2003). , se tornou uma importante agência de letramentos (FRITZEN, 2007). Outros depoimentos já mostraram que, para muitos, a igreja promoveu o acesso à leitura e à escrita em alemão, o que se reflete no fato de ainda hoje, em Blumenau e região, haver cultos em alemão nas igrejas luteranas. Para os que não tiveram a oportunidade de aprender a escrita do idioma alemão na escola, a esfera religiosa ainda continua sendo um lugar onde podem se inserir em práticas de letramento na língua de imigração.

Também as famílias contribuíram para os acessos aos letramentos em língua alemã. A casa, para muitos, era o único lugar em que podiam empregar a sua língua de herança, não raro, a única língua que dominavam. Esse lugar privado passou a funcionar como "safe houses" (CANAGARAJAH, 2004, p. 120) isto é, "locais que estão relativamente livres da vigilância, principalmente por figuras de autoridade, talvez porque sejam considerados não-oficiais, extra-atividades ou extrapedagógicos" (tradução nossa).

O professor (cita o nome) que foi diretor do Pedro II foi nosso professor de alemão. Nosso primeiro professor de alemão. E naquela época ainda praticamente não se podia falar, dizer que tem aula de alemão porque ainda era muito fiscalizado. E nós tínhamos aula de alemão nos fundos de uma camisaria. Éramos cinco alunos e foram uns dois anos, quarenta e sete, quarenta e oito, quarenta e nove. Foram três anos. Foi uma época maravilhosa porque nós aprendemos os cantos em alemão. Seu (cita o nome) tocava na orquestra do Teatro Carlos Gomes14 14 A Sociedade Dramático Musical "Carlos Gomes" foi criada na então Colônia Blumenau em 1860 e até hoje atua como uma importante instituição cultural do município e da região. < http://www.teatrocarlosgomes.com.br>. Acesso em: 23 set. 2013, às 15h55min. e ele tocava a viola e nós cantávamos. (Entrevista com Sra. Bertha, nascida em 1934)

As memórias da Sra. Bertha evocam lembranças das aulas de alemão de que participava na infância, após o rompimento do sistema de ensino teuto-brasileiro da região. Mesmo em se tratando de um período pós-guerra (1947 em diante), as marcas do nacionalismo persistem por meio da vigilância e fiscalização (naquela época ainda praticamente não se podia falar, dizer que tem aula de alemão porque ainda era muito fiscalizado). Assim, algumas famílias utilizavam táticas, como ter aulas de alemão nos fundos de uma camisaria para permitir que seus filhos tivessem acesso à escrita em alemão, uma vez que o português era aprendido na escola regular.

No depoimento da Sra. Bertha, verificamos mais uma vez o valor dado à música, à educação musical entre os teuto-brasileiros. Ainda hoje em Blumenau e região há vários grupos de canto coral que têm em seu repertório músicas em alemão. Para algumas pessoas, fazer parte de um coral possibilita o contato e o aprendizado do alemão escrito.

A formação musical, a circulação de materiais escritos em língua alemã, em suportes de gêneros como jornais, almanaques, livros, e o aprendizado do código escrito da língua de imigração desvelam os valores atribuídos pelos grupos teuto-brasileiros a práticas de letramentos das quais participavam. Algumas dessas práticas sociais ainda são mantidas, outras permanecem nas memórias desses sujeitos e, quando descobertas, podem dizer muito sobre os conhecimentos locais no tocante à história educacional e linguística do Vale do Itajaí.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não há dúvidas de que manifestações culturais de minorias linguísticas no Brasil, neste caso os grupos teuto-brasileiros, nos desafiam a conviver e a lidar com questões identitárias, políticas e de poder que não podem ser descoladas dos fenômenos linguísticos e das políticas educacionais. É preciso reforçar que não pretendemos aqui justificar discursivamente a pretensa superioridade ou inferioridade de determinadas línguas, de letramentos em língua alemã, de indivíduos ou grupos sociais, mas mostrar que as línguas de imigração ainda presentes no Brasil deveriam ser tratadas como línguas brasileiras de imigração, como bens culturais, como matrimônio cultural imaterial do país.

Nesse sentido, procuramos dar visibilidade a práticas de letramentos em cenário de imigração alemã no Vale do Itajaí, SC, a fim de fornecer subsídios para se (re)pensar a educação numa perspectiva intercultural, que vai além do discurso da diversidade, pois reconhece as tensões e conflitos que o encontro de "diferentes" provoca nas sociedades e na escola.

As histórias de letramentos dos sujeitos desta pesquisa sugerem que os significados da escrita transcendem a esfera escolar, uma vez que são produzidos na inserção dos sujeitos em práticas de letramentos vivenciadas na família, na esfera religiosa, entre outras esferas. Assim, o acesso aos letramentos em língua alemã não se deu apenas pela escola, mas outras agências de letramento (igreja, imprensa) foram determinantes nesse sentido. Além disso, os depoimentos dos sujeitos trazem à tona os conflitos gerados pela imposição de uma identidade nacional única, os ressentimentos decorrentes do processo de assimilação, mas também os movimentos e táticas de resistência desses grupos em manterem sua língua de herança.

Sustentamos, assim, que o esforço deveria se concentrar agora na abertura para o diálogo intercultural, a fim de reforçar as políticas linguísticas já existentes em alguns municípios da região foco da pesquisa, além de implantar novas. É preciso ainda articular as políticas nos sistemas de ensino, para que não haja rupturas e descontinuidades, como sinalizaram os dados da pesquisa. Outro aspecto importante para a efetivação dessa agenda é a necessidade de se problematizar na formação inicial e continuada de professores a constituição desse cenário plurilíngue, num processo de valorização dos saberes locais e do reconhecimento dos direitos das crianças, entre eles, o direito à ampliação do seu repertório linguístico na educação formal.

Recebido: 20/03/2013

Aceito: 04/10/2013

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  • *
    Parte dos dados aqui apresentados foi discutida no
    III Simpósio Nacional e I Simpósio Internacional Discurso, Identidade e Sociedade, realizado na Unicamp, em fevereiro de 2012.
  • 1
    A pesquisa teve apoio do CNPq, Processo 477434/2010-0.
  • 2
    O conceito de
    língua minoritária não é definido pelo número de falantes, mas associa-se à falta de prestígio que a língua desfruta no meio social, sendo, pois, entendido em seu sentido político (MAHER, 2007; ACHARD, 1989). No caso do alemão, considerando o contexto brasileiro, apesar de ter sido, em termos numéricos, a língua mais falada no Vale do Itajaí até 1940, pode-se dizer que sempre foi língua minoritária, por não desfrutar do
    status de língua oficial do Brasil (FRITZEN, 2007).
  • 3
    No caso da pesquisa aqui relatada, os sujeitos são descendentes de alemães da terceira e quarta geração.
  • 4
    Tendo em vista o espaço limitado deste artigo, serão discutidos dados parciais do
    corpus da pesquisa.
  • 5
    Segundo Cavalcanti (1999, p. 390), os primeiros portugueses e os africanos não são vistos como imigrantes. Aqueles "parecem ter um
    status superior como 'donos/donatários' das terras", enquanto estes, cerca de 6 milhões de pessoas que serviram como mão de obra escrava, foram a razão da adoção de uma política de "branqueamento" do País, em favor da imigração europeia.
  • 6
    São usados pseudônimos para identificar os sujeitos a fim de preservar sua identidade.
  • 7
    Convenções de transcrição adaptadas de Marcuschi (1986): MAIÚSCULA: ênfase; (abcd): comentários do pesquisador; [...]: omissão de trecho; /: interrupção abrupta. Não foi feita a tradução do alemão no trecho da fala da entrevistada, visto que ela mesma traduz para a entrevistadora.
  • 8
    O Dr. Hermann Blumenau permaneceu na direção da Colônia até 1880, quando foi elevada à categoria de município (SILVA, 1972).
  • 9
    Segundo Oliveira (2002, p. 88), "de todos os censos brasileiros, somente os de 1940 e 1950 se interessaram por perguntar qual língua os brasileiros usavam no lar, e se sabiam falar português". O censo de 2010 incluiu, para a população indígena, pergunta com relação à etnia ou povo a que pertence e à língua falada. No caso das antigas zonas de imigração, não há dados oficiais sobre as línguas ainda faladas hoje, salvo por iniciativas de pesquisadores.
  • 10
    Para Bakhtin, toda compreensão é ativa e responsiva: "Compreender é opor à palavra do locutor uma
    contrapalavra" (BAKHTIN, 1977/2006, p. 135).
  • 11
    Art. 1º. do Decreto-Lei 1545, de 25 de agosto de 1939. Disponível em <
  • 12
    É preciso observar, conforme Orlandi (1987, p. 264), que o sentido de silenciar está ligado à imposição de uma forma de dominação e exclusão, portanto, não se restringe a "
    calar o interlocutor" (grifo da autora). Nesse sentido, o termo silenciamento linguístico é aqui empregado com relação à imposição da língua portuguesa e, por conseguinte, à "dura repressão à língua alemã no período ditatorial do Estado Novo (1937-1945), [...] em que se proibiu o uso da língua em público e no lar, impondo aos cidadãos de origem teuta um silenciamento de sua língua materna" (MAILER, 2003, p. 09). Como o foco de nossa pesquisa são os grupos de descendentes de imigrantes alemães, destacamos o silenciamento imposto a esses grupos, mas reconhecemos que ele também atingiu outras etnias que viviam/vivem no território brasileiro.
  • 13
    Estima-se que 98% dos imigrantes alemães que chegaram a Blumenau eram membros da Igreja Evangélica Luterana fundada por Martin Luther (Lutero) por ocasião da Reforma Protestante (1517). No Brasil, a igreja passou a ser denominada Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil (MAILER, 2003).
  • 14
    A Sociedade Dramático Musical "Carlos Gomes" foi criada na então Colônia Blumenau em 1860 e até hoje atua como uma importante instituição cultural do município e da região. <
    http://www.teatrocarlosgomes.com.br>. Acesso em: 23 set. 2013, às 15h55min.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      20 Mar 2013
    • Aceito
      04 Out 2013
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