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O DESENVOLVIMENTO DE UM MODELO DIALÓGICO DE PLANEJAMENTO DE PROJETOS DE PESQUISA PARA ESTUDANTES DOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

THE DEVELOPMENT OF A DIALOGICAL MODEL FOR THE PLANNING OF RESEARCH PROJECTS FOR MIDDLE SCHOOL STUDENTS

RESUMO

As feiras de ciências impulsionam pesquisas científicas na escola. Como o conhecimento científico é privilegiado neste tipo de evento, os projetos mais prestigiados são os que resultam de uma investigação sistemática. Com o desafio de viabilizar o processo de planejamento de projetos investigativos em uma escola pública de Canoas (RS), este trabalho tem o objetivo de propor um modelo dialógico de planejamento de projetos de pesquisa para estudantes dos anos finais do ensino fundamental. A partir da perspectiva dos letramentos acadêmicos (LEA; STREET, 1998LEA, M.R.; STREET, B.V. (1998). Student writing in higher education: an academic literacies approach. UK Studies in Higher Education, v. 23, n. 2, p. 157-172.), o modelo apresentado neste artigo busca esclarecer aos estudantes aquilo que conta como conhecimento em determinada área e como isso aparece na escrita do projeto. Seguindo princípios da avaliação formativa (BLACK; WILIAM, 1998BLACK, P.; WILIAM, D. (1998). Assessment and Classroom Learning. Assessment in Education, v. 5, n. 1, pp. 07-74. ), foi elaborado um quadro com descritores avaliativos dos elementos de um projeto de pesquisa. Essa estratégia concebe os estudantes como protagonistas do processo de aprendizagem e também de avaliação, pois permite que eles saibam como serão avaliados de antemão e o que devem fazer para atingir os objetivos estabelecidos. Além disso, os estudantes também podem atuar como leitores interessados dos projetos uns dos outros, avaliando-os conforme os descritores e escrevendo pareceres como forma de feedback.

Palavras-chave:
projetos de pesquisa; letramentos acadêmicos; avaliação formativa

ABSTRACT

Science fairs boost scientific research at school. Since scientific knowledge is privileged in this kind of event, the most prestigious projects are the ones that result from a systematic investigation. In order to enable the planning of investigative projects in a public school of Canoas (RS), this paper aims to propose a dialogical model for the planning of research projects for middle school students. From the academic literacies perspective (LEA; STREET, 1998LEA, M.R.; STREET, B.V. (1998). Student writing in higher education: an academic literacies approach. UK Studies in Higher Education, v. 23, n. 2, p. 157-172.), the model proposed here seeks to clarify to students what counts as knowledge in a certain area and how it appears in the writing of the project. According to the principles of formative assessment (BLACK; WILIAM, 1998BLACK, P.; WILIAM, D. (1998). Assessment and Classroom Learning. Assessment in Education, v. 5, n. 1, pp. 07-74. ), it was developed a rubrics framework for the elements of a research project. This strategy sees students as protagonists of learning and assessment processes because it allows them to know beforehand how they will be evaluated and what they have to do to achieve the stated goals. In addition, students can also act as concerned readers of each other’s projects, grading them according to the rubrics framework and writing opinions as a form of feedback

Keywords:
research projects; academic literacies; formative assessment

INTRODUÇÃO

A pesquisa na escola tem sido impulsionada pelas feiras de ciência. As feiras, por vezes também chamadas de mostras, são entendidas como eventos em que o termo ciências deve ser percebido “no seu sentido mais amplo, referindo-se muito mais à pesquisa científica em qualquer ciência” (MANCUSO; LEITE FILHO, 2006MANCUSO, R.; LEITE FILHO, I. (2006). Feiras de Ciências no Brasil: uma trajetória de quatro décadas. In: BRASIL. Ministério da Educação. Programa Nacional de Apoio às Feiras de Ciências da Educação Básica Fenaceb. Brasília: MEC/SEB . Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/EnsMed/fenaceb.pdf>. Acesso em: 20 out. 2018.
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, p. 17, grifo dos autores). Com o movimento ganhando força no Rio Grande do Sul e no Brasil, uma escola pública do município de Canoas propõe que os alunos dos anos finais do ensino fundamental se envolvam em projetos de iniciação científica e apresentem os resultados de suas pesquisas em uma feira de ciências. Esse evento pode ser definido como “um processo de culminância dos trabalhos escolares realizados durante certo período letivo” (GONÇALVES, 2011GONÇALVES, T.V.O. (2011). Feiras de Ciências e formação de professores. In: PAVÃO, A. C.; FREITAS, D. (Org.) Quanta ciência há no ensino de ciências. São Carlos: EDUFSCAR, p. 207-216., p. 207). Em outras palavras, a feira é um produto da realização de projetos desenvolvidos ao longo de meses de trabalho conjunto entre alunos e professores, sendo esse um momento para o compartilhamento dos achados de pesquisa, expondo às críticas de diferentes públicos.

Antes de executar as pesquisas, os estudantes, em grupos, sob orientação de um professor, são requisitados a produzir um projeto de pesquisa. Ribeiro (2015)RIBEIRO, F.A.S. (2015). Como organizar uma feira de ciências. Natal: Infinita Imagem., ao descrever os tipos de trabalho que podem ser apresentados em feiras de ciências, sugere que os projetos investigativos sejam preferidos em relação aos projetos demonstrativos. O autor afirma que os estudantes aprendem realizando esses trabalhos; no entanto, argumenta que “não se pode negar, porém, a grande diferença que há entre demonstrar algo já existente e construir o próprio conhecimento” (RIBEIRO, 2015RIBEIRO, F.A.S. (2015). Como organizar uma feira de ciências. Natal: Infinita Imagem., p. 40). Além disso, dentre as dez competências gerais elencadas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), há uma orientação clara para o exercício da pesquisa científica:

Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e inventar soluções com base nos conhecimentos das diferentes áreas (BRASIL, 2017BRASIL. (2017). Base Nacional Comum Curricular: educar é a base. Brasília: MEC/CONSED/UNDIME. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_publicacao.pdf>. Acesso em: 06 out. 2018.
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, p. 18).

Nesse processo de investigação na escola, há também uma reconfiguração do papel do professor, que já não passa mais a ser visto como detentor do conhecimento, mas, sim, como orientador, participando conjuntamente do processo de construção de novos saberes ao lado do aluno. Assim, o processo de planejamento e execução de projetos também é uma oportunidade para que os professores desenvolvam atributos importantes para o bom desenvolvimento da pesquisa na escola. Nesse sentido, compreendemos como Gallon, Silva e Madruga (2018, p. 167)GALLON, M.S.; SILVA, C.M.; MADRUGA, Z.E.F. (2018). O papel do professor orientador na visão de um grupo de estudantes de ensino médio. Revista Olh@res, São Paulo, v. 6, n. 1, p. 164-180., compreendemos que “a pesquisa em sala de aula é uma estratégia de ensino e aprendizagem que propõe reconstrução de saberes, autonomia e protagonismo não apenas aos estudantes, mas também aos professores que se envolvem no processo”. A formação de um professor orientador se dá na prática, orientando projetos dos alunos. Daí surge a necessidade do desenvolvimento de propostas e materiais que viabilizem esse trabalho, especialmente no que se refere à operacionalização do planejamento e da execução dos projetos de pesquisa.

Apesar dessas indicações sobre investigação científica, não existem trabalhos que investiguem ou proponham o processo de escrita de projetos de pesquisa, considerando a interação entre professor e aluno. Gallon, Rocha Filho e Nascimento (2017)GALLON, M.S.; ROCHA FILHO, J.B.; NASCIMENTO, S.S. (2017). Feiras de ciências nos ENPECs (1997-2015): identificando tendências e traçando possibilidades. In: Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências, 6., Florianópolis. Anais... Florianópolis: ABRAPEC, 2017. Disponível em: <http://www.abrapecnet.org.br/enpec/xi-enpec/anais/resumos/R1722-1.pdf>. Acesso em: 06 out. 2018.
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, em um levantamento de trabalhos apresentados nos Encontros Nacionais de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPECs) que de alguma forma abordavam as feiras de ciências em suas pesquisas, notaram que apenas dois trabalhos dos 24 trabalhos selecionados tinham seus objetivos centrados nos estudantes enquanto pesquisadores. Assim, o trabalho dos autores corrobora a demanda de produção de conhecimento sobre esse processo de pesquisa centrado no aluno, constatando “a necessidade de estudos que enfoquem nas etapas da pesquisa em sala de aula, como forma de compreender e ampliar as aprendizagens dos estudantes potencializando seus projetos e fazendo-os perceber-se e refletir como também sujeitos de uma pesquisa” (GALLON; ROCHA FILHO; NASCIMENTO, 2017GALLON, M.S.; ROCHA FILHO, J.B.; NASCIMENTO, S.S. (2017). Feiras de ciências nos ENPECs (1997-2015): identificando tendências e traçando possibilidades. In: Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências, 6., Florianópolis. Anais... Florianópolis: ABRAPEC, 2017. Disponível em: <http://www.abrapecnet.org.br/enpec/xi-enpec/anais/resumos/R1722-1.pdf>. Acesso em: 06 out. 2018.
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, p. 8).

Considerando que a projeção de uma pesquisa constitui uma etapa essencial para a investigação científica, este trabalho busca propor um modelo dialógico de planejamento de projetos de pesquisa para estudantes dos anos finais do ensino fundamental. Para isso, retomamos nas próximas seções os conceitos de letramentos acadêmicos (LEA; STREET, 1998LEA, M.R.; STREET, B.V. (1998). Student writing in higher education: an academic literacies approach. UK Studies in Higher Education, v. 23, n. 2, p. 157-172.) e avaliação formativa (BLACK; WILIAM, 1998BLACK, P.; WILIAM, D. (1998). Assessment and Classroom Learning. Assessment in Education, v. 5, n. 1, pp. 07-74. ) a fim de desenvolver uma ficha para elaboração dos projetos que explicite os parâmetros avaliativos de cada parte da pesquisa.

1. LETRAMENTOS ACADÊMICOS

Os usos acadêmicos da leitura e da escrita têm sido objeto de pesquisa dos estudos de letramento no âmbito do ensino superior. Diversas pesquisas no campo voltam-se ao discurso do déficit, que afirma que os estudantes chegam à universidade sem saber ler e escrever (LEA; STREET, 1998LEA, M.R.; STREET, B.V. (1998). Student writing in higher education: an academic literacies approach. UK Studies in Higher Education, v. 23, n. 2, p. 157-172.). Esse discurso é problemático, pois se baseia no modelo de letramento autônomo (STREET, 1984), que compreende o letramento como um conjunto de habilidades as quais podem ser aprendidas e aplicadas a todos contextos. Normalmente é essa concepção de letramento que orienta o processo de escolarização. Se a universidade entende que letramento é um conjunto universal de habilidades, então os alunos que não as dominam estão em déficit. Em contrapartida, Street (1984)STREET, B.V. (1984). Literacy in Theory and Practice. Cambridge: Cambridge University Press. desenvolveu o conceito de letramento ideológico, que compreende letramento como prática social. Mais culturalmente sensível, esse modelo entende que as práticas de letramento variam de um contexto para outro. Nessa perspectiva as pessoas chegam à universidade após diversas experiências com práticas de letramento; estas podem ou não ser aquelas demandadas no ensino superior. Nesse sentido, Fischer (2007)FISCHER, A. (2007). A construção de letramentos na esfera acadêmica. Tese (Doutorado em Linguística) - Programa de Pós-Graduação em Linguística, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. buscou apresentar um modelo de letramento na esfera acadêmica que não negue as práticas sociais de linguagem vivenciadas na escolarização básica dos estudantes, mas que, a partir delas, negocie novas práticas sociais e identidades propostas pelo meio acadêmico.

Ao estudarem as abordagens institucionais da escrita acadêmica, Lea e Street (1998LEA, M.R.; STREET, B.V. (1998). Student writing in higher education: an academic literacies approach. UK Studies in Higher Education, v. 23, n. 2, p. 157-172., 2006)LEA, M.R.; STREET, B.V. (2006). The “Academic Literacies” Model: Theory and Applications. Theory into Practice, v. 45, n. 4, p. 368-377. descreveram três modelos de aprendizagem: o modelo de habilidades de estudo (study skills), que compreende a escrita como uma habilidade cognitiva individual e foca nos aspectos formais da língua. A premissa desse modelo é que, depois de aprendidos, os estudantes podem transferir, de um contexto para outro, os conhecimentos sobre escrita e letramento sem nenhum problema (LEA; STREET, 2006LEA, M.R.; STREET, B.V. (2006). The “Academic Literacies” Model: Theory and Applications. Theory into Practice, v. 45, n. 4, p. 368-377.). Mais epistemologicamente associado ao letramento autônomo (STREET, 1984STREET, B.V. (1984). Literacy in Theory and Practice. Cambridge: Cambridge University Press.), tal modelo de aprendizagem pretende resolver os problemas da escrita dos estudantes, buscando desfazer o déficit.

O segundo modelo é chamado de socialização acadêmica (academic socialization), que compreende a academia como uma cultura na qual os estudantes devem ser inseridos. Nessa perspectiva a cultura acadêmica é relativamente homogênea; assim, bastaria que os estudantes aprendessem jeitos de falar e escrever da academia para poder circular por todas áreas do conhecimento (LEA; STREET, 1998LEA, M.R.; STREET, B.V. (1998). Student writing in higher education: an academic literacies approach. UK Studies in Higher Education, v. 23, n. 2, p. 157-172.). O terceiro e último modelo é o de letramentos acadêmicos (academic literacies), que, assim como na perspectiva ideológica de letramento (STREET, 1984STREET, B.V. (1984). Literacy in Theory and Practice. Cambridge: Cambridge University Press.), compreende o letramento acadêmico como prática social. Esse modelo busca evidenciar aquilo que conta como conhecimento para um contexto acadêmico específico (LEA; STREET, 2006LEA, M.R.; STREET, B.V. (2006). The “Academic Literacies” Model: Theory and Applications. Theory into Practice, v. 45, n. 4, p. 368-377.). É similar ao modelo de socialização acadêmica, porém compreende que os usos efetivos do letramento são mais complexos e situados. Assim, na perspectiva do estudante, algumas das características dominantes do letramento são “alternar as práticas conforme o ambiente, desenvolver um repertório de práticas linguísticas apropriados para cada ambiente e lidar significados e identidades sociais que cada ambiente evoca”1 1 To switch practices between one setting and another, to deploy a repertoire of linguistic practice appropriate to each setting, and to handle the social meanings and identities that each evokes. (LEA; STREET, 1998LEA, M.R.; STREET, B.V. (1998). Student writing in higher education: an academic literacies approach. UK Studies in Higher Education, v. 23, n. 2, p. 157-172., p. 159, tradução nossa2).

O presente estudo busca dialogar o modelo de letramentos acadêmicos com a educação básica, mais especificamente com os anos finais do ensino fundamental. Nesse sentido, Lea e Street (2006, p.368)LEA, M.R.; STREET, B.V. (2006). The “Academic Literacies” Model: Theory and Applications. Theory into Practice, v. 45, n. 4, p. 368-377. afirmam que, “embora o termo ‘letramentos acadêmicos’ tenha sido originalmente desenvolvido no que diz respeito ao estudo dos letramentos no ensino superior e na universidade, o conceito também se aplica da educação infantil ao ensino médio”3 3 Although the term academic literacies was originally developed with regard to the study of literacies in higher education and the university, the concept also applies to K-12 education. . Sendo assim, a partir da compreensão de que os letramentos acadêmicos interpretam a escrita de modo mais situado, identificando aquilo que conta como conhecimento em determinado ambiente acadêmico, este artigo discute como didatizar e tornar explícito os elementos de um projeto de pesquisa na educação básica.

2. AVALIAÇÃO FORMATIVA

É comum que as práticas avaliativas sejam pensadas “como forma de manutenção do poder do professor e como instrumento de punição, para disciplinar os alunos” (RIO GRANDE DO SUL, 2009, p. 165). Esses dois valores somados a uma avaliação centrada nos resultados de uma prova costumam fazer com que ser avaliado seja uma experiência negativa, causando medo e resistência às metas educacionais. Gonçalves et al. (2007)GONÇALVES, A.A.G.; SILVA, C.S.R.; BREGUNCI, M.G.; CASTANHEIRA, M.L.; MONTEIRO, S.M. (2008). Alfabetização e Letramento: Questões sobre Avaliação. In: BRASIL. Pró-Letramento: Programa de Formação Continuada de Professores dos Anos/Séries Iniciais do Ensino Fundamental: alfabetização e linguagem. Brasília: MEC/SEB, p. 01-50., sustentam que essa concepção de avaliação privilegia a dimensão técnica ou burocrática4 4 Também chamada de avaliação somativa (BLACK; WILIAM, 1998). , com a função de regular os resultados obtidos em um recorte específico do tempo escolar, como um trimestre ou ano escolar, certificando se o estudante será promovido ou reprovado. Por outro lado, Gonçalves et al. (2007, p.7)GONÇALVES, A.A.G.; SILVA, C.S.R.; BREGUNCI, M.G.; CASTANHEIRA, M.L.; MONTEIRO, S.M. (2008). Alfabetização e Letramento: Questões sobre Avaliação. In: BRASIL. Pró-Letramento: Programa de Formação Continuada de Professores dos Anos/Séries Iniciais do Ensino Fundamental: alfabetização e linguagem. Brasília: MEC/SEB, p. 01-50. apontam que as avaliações escolares também podem apresentar uma dimensão formativa, com uma função “diagnóstica, processual, descritiva e qualitativa, capaz de indicar os níveis já consolidados pelo aluno, suas dificuldades ao longo do processo e as estratégias de intervenção necessárias a seus avanços”. Uma avaliação que contempla a dimensão formativa deve estar a serviço da aprendizagem dos alunos, diagnosticando o quanto das metas de aprendizagem foram atingidas e subsidiando professores e alunos para tomar decisões quanto às ações necessárias. Ambas dimensões não são necessariamente excludentes, pois cada uma tem sua função na avaliação escolar. O problema está no fato de que a dimensão burocrática historicamente tem sido privilegiada em detrimento do desenvolvimento da aprendizagem do estudante.

Com base na revisão de literatura realizada por Black e Wiliam (1998)BLACK, P.; WILIAM, D. (1998). Assessment and Classroom Learning. Assessment in Education, v. 5, n. 1, pp. 07-74. , Sadler (1998, p. 77)SADLER, D.R. (1998). Formative assessment: revisiting the territory, Assessment in Education , v. 5. n. 1, p. 77-84. define avaliação formativa como “avaliação que se destina especificamente a fornecer feedback sobre o desempenho para melhorar e acelerar a aprendizagem”5 5 Assessment that is specifically intended to provide feedback on performance to improve and accelerate learning. . Nessa concepção de avaliação, o fornecimento de feedback tem um papel central, pois é a partir dele se torna possível informar se os aspectos valorizados em determinada tarefa estão sendo abordados e como ajustar a aprendizagem para contemplá-los. Wiliam (2007, p. 1065)WILIAM, D. (2007). Keep learning on track: classrooms assessment and the regulation of learning. In: LESTER, F. K. Second Handbook of Research on Mathematics Teaching and Learning. (Org.). Charlotte: Information Age Publishing, p. 1051-1098. afirma que “a grande ideia [da avaliação formativa] é que a evidência sobre a aprendizagem do estudante é utilizada para adequar a instrução para melhor atender a necessidade dos estudantes”6 6 The big idea is that evidence about student learning is used to adjust instruction to better meet student needs. . Além do feedback, a adaptação das práticas instrucionais para favorecer a aprendizagem é uma característica da avaliação formativa. Nessa perspectiva o termo instrução se refere a qualquer atividade realizada com objetivo de aprendizagem, seja nos processos de ensino ou nos processos de aprendizagem.

Em estudo posterior, Black e Wiliam (2009, p. 8)BLACK, P.; WILIAM, D. (2009). Developing the theory of formative assessment. Educational Assessment, Evaluation and Accountability, v. 21, n. 1, p. 05-31. propõem uma teoria de avaliação formativa baseada na prática. Nesse sentido, os autores estabelecem cinco estratégias que fundamentam essa concepção de avaliação:

  1. Esclarecer e compartilhar os propósitos de aprendizagem e critérios para sucesso;

  2. Desenvolver discussões eficazes em sala de aula e outras tarefas de aprendizagem que indiquem evidências da compreensão do aluno;

  3. Fornecer feedback para que os alunos progridam;

  4. Tornar os alunos recursos instrucionais uns para os outros; e

  5. Tornar os alunos donos da sua aprendizagem.7 7 1. Clarifying and sharing learning intentions and criteria for success; 2. Engineering effective classroom discussions and other learning tasks that elicit evidence of student understanding; 3. Providing feedback that moves learners forward; 4. Activating students as instructional resources for one another; and 5. Activating students as the owners of their own learning.

As diversas práticas de avaliação formativa podem ser interpretadas como maneiras de operacionalizar essas cinco estratégias8 8 Wiliam (2011) explora detalhadamente cada uma dessas estratégias. . Conforme será discutido posteriormente, no processo de escrita e reescrita dos projetos de pesquisa no contexto de anos finais do ensino fundamental, todas estratégias podem ser contempladas em maior ou menor grau.

3. DESCRITORES AVALIATIVOS PARA UM PROJETO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA

Com base em Clark (2000)CLARK, H.H. (2000). O uso da linguagem. Cadernos de Tradução, Porto Alegre, n. 09, p. 49-71., Dilli, Schoffen e Schlatter (2012, p. 172)DILLI, C.; SCHOFFEN, J.R.; SCHLATTER, M. (2012). Parâmetros para a avaliação de produção escrita orientados pela noção de gêneros do discurso. In: SCHOFFEN, J. R.; KUNRATH, S. P.; ANDRIGHETTI, G. H.; SANTOS, L. G. (Org.) Português como Língua Adicional: Reflexões para a Prática Docente. 1 ed. Porto Alegre: Bem Brasil, p. 171-199. utilizam uma concepção de uso da linguagem, “que compreende as práticas sociais como construídas na ação conjunta dos participantes em uma situação de comunicação com um determinado propósito negociado por eles”. Nessa concepção de língua, a comunicação humana ocorre por meio de gêneros do discurso, que, nas palavras de Bakhtin (2003, p. 279)BAKHTIN, M. (2003). Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes., são “tipos relativamente estáveis de enunciados”, que são definidos pelas condições de produção em cada esfera da atividade humana.

Considerando a iniciação científica na educação básica como uma esfera da atividade humana, um projeto de pesquisa é um dos gêneros do discurso que circula em tal esfera. Quando se propõe que o gênero projeto de pesquisa seja objeto de aprendizagem e, consequentemente, de avaliação, cria-se a necessidade de se elaborar parâmetros para que alunos e professores possam escrever e avaliar projetos. Além disso, explicitar esses parâmetros é essencial para uma boa avaliação. Schlatter e Garcez (2012, p. 161)SCHLATTER, M.; GARCEZ, P.M. (2012). Línguas Adicionais na Escola: aprendizagens colaborativas em inglês. Erechim: Edelbra. afirmam que “essa explicitação orienta os alunos e o professor no desenvolvimento do projeto, pois desde o início é possível saber as linhas gerais do que é esperado de cada um e o que é necessário em termos de condições para levar o projeto a cabo”. É nesse sentido que este artigo propõe descritores para guiar os processos de escrita e reescrita e de avaliação.

Reddy e Andrade (2010, p. 435)REDDY, Y.M.; ANDRADE, H. (2010). A review of rubric use in higher education. Assessment & Evaluation in Higher Education, v. 35, n. 4, p. 435-448. definem descritores como “um documento que articula as expectativas para uma tarefa ao listar critérios ou o que conta e descreve níveis de qualidade, de excelente a ruim”9 9 A document that articulates the expectations for an assignment by listing the criteria or what counts, and describing levels of quality from excellent to poor. . Segundo esses autores, os descritores possuem três características essenciais: (1) critérios de avaliação, que são os fatores que serão levados em conta ao determinar a qualidade de um trabalho, aparecendo muitas vezes em forma de lista de diretrizes; (2) definições de qualidade, que tem o objetivo de explicar detalhadamente o que deve ser feito para demonstrar determinada habilidade ou conhecimento, servindo para pontuação e para o fornecimento de feedback; e, por fim, (3) uma estratégia de pontuação, que geralmente envolve uma escala que interpreta os julgamentos sobre determinado produto ou processo, servindo para o cálculo da nota final de um recorte específico do tempo escolar (REDDY; ANDRADE, 2010REDDY, Y.M.; ANDRADE, H. (2010). A review of rubric use in higher education. Assessment & Evaluation in Higher Education, v. 35, n. 4, p. 435-448. ).

Em razão das características apontadas por Reddy e Andrade (2010)REDDY, Y.M.; ANDRADE, H. (2010). A review of rubric use in higher education. Assessment & Evaluation in Higher Education, v. 35, n. 4, p. 435-448. , a utilização de descritores favorece a reescrita dos projetos numa perspectiva dialógica. Com critérios de avaliação e com uma estratégia de pontuação explicitados com clareza, os estudantes podem realizar a tarefa de escrever um projeto de pesquisa sabendo como serão avaliados e que itens devem estar presentes nos documentos elaborados por eles. Com definições de qualidade bem estabelecidas, a revisão dos textos pode ser feita tanto pelo professor como por outros estudantes, pois o feedback servirá para apontar se o projeto atingiu, atingiu parcialmente ou se não atingiu os objetivos estabelecidos. Nesse sentido, os descritores também podem funcionar como bilhetes orientadores (MANGABEIRA; COSTA; SIMÕES, 2011MANGABEIRA, A.B.A.; COSTA, E.V.; SIMÕES, L.J. (2011). O Bilhete Orientador: um gênero discursivo em favor da avaliação de textos na aula de línguas. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 42, p. 293-307. ). Segundo Mangabeira, Costa e Simões (2011)MANGABEIRA, A.B.A.; COSTA, E.V.; SIMÕES, L.J. (2011). O Bilhete Orientador: um gênero discursivo em favor da avaliação de textos na aula de línguas. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 42, p. 293-307. , “a reescrita orientada por bilhetes constitui-se como uma maneira de avaliação dos textos que vai além do que se intitula correção indicativa” (p. 296), pois não se resume a apenas apontar os problemas do texto produzido pelo aluno, mas, numa “correção interativa” (p. 297), em que se privilegia o que o aluno quer dizer. Nessa perspectiva o professor media o processo de apropriação de um determinado gênero pelo aluno. No modelo dialógico de planejamento de projeto de pesquisa aqui proposto, esse papel de leitor interessado pode ser desempenhado tanto pelo professor como por outros alunos, pois os descritores para atingir os objetivos da tarefa são compartilhados e servem como bilhetes para orientar a reescrita.

Schlatter e Garcez (2012, p. 165-166)SCHLATTER, M.; GARCEZ, P.M. (2012). Línguas Adicionais na Escola: aprendizagens colaborativas em inglês. Erechim: Edelbra. também parecem concordar com a relação proposta entre descritores e bilhetes orientadores. Ao elaborar tabelas com parâmetros de avaliação de leitura e escrita e de compreensão e produção oral, os autores propuseram descritores para “não cumpre a tarefa”, para “cumpre a tarefa parcialmente” e para “cumpre a tarefa adequadamente”. Para cada nível, os autores descreveram, em uma terceira coluna, uma recomendação de reescrita, relacionada com o descritor do nível seguinte. Apesar de não estar explícito no texto de Schlatter e Garcez (2012)SCHLATTER, M.; GARCEZ, P.M. (2012). Línguas Adicionais na Escola: aprendizagens colaborativas em inglês. Erechim: Edelbra. , essas recomendações seguem a proposta de escrita orientada por bilhetes (MANGABEIRA; COSTA; SIMÕES, 2011MANGABEIRA, A.B.A.; COSTA, E.V.; SIMÕES, L.J. (2011). O Bilhete Orientador: um gênero discursivo em favor da avaliação de textos na aula de línguas. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 42, p. 293-307. ), pois enunciam “uma nova tarefa, explicitando para o aluno como deve proceder na reescrita de seu texto” (MANGABEIRA; COSTA; SIMÕES, 2011MANGABEIRA, A.B.A.; COSTA, E.V.; SIMÕES, L.J. (2011). O Bilhete Orientador: um gênero discursivo em favor da avaliação de textos na aula de línguas. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 42, p. 293-307. , p. 301).

Na ficha que apresentamos neste artigo, além dos descritores, também propomos um espaço (Figura 1) no qual o revisor, que pode ser professor ou aluno, é encorajado a redigir comentários que orientem o autor do projeto a como atingir plenamente os objetivos estabelecidos, “posicionando-se como um leitor que sugere mudanças, faz perguntas para esclarecer alguns pontos que não ficaram claros na leitura do texto” MANGABEIRA; COSTA; SIMÕES, 2011MANGABEIRA, A.B.A.; COSTA, E.V.; SIMÕES, L.J. (2011). O Bilhete Orientador: um gênero discursivo em favor da avaliação de textos na aula de línguas. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 42, p. 293-307. , p. 303). Ao comentar os projetos, o revisor coloca-se como um leitor interessado, que busca compreender o que o autor quis dizer e escreve sugestões para que todos os elementos do projeto possam ganhar o conceito de “atingido” (Quadro 1).

Figura 1
Ficha do projeto de pesquisa

Quadro 1
Descritores dos elementos do projeto de pesquisa

O projeto de pesquisa enquanto gênero do discurso apresenta uma estrutura relativamente estável. Gil (2002)GIL, A.C. (2002). Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed. São Paulo: Atlas. , Marconi e Lakatos (2003)MARCONI, M.A.; LAKATOS, E.M. (2003). Fundamentos de Metodologia Científica. São Paulo: Editora Atlas. e Gerhardt et al. (2009)GERHARDT, T.E.; RAMOS, I.C.A.; RIQUINHO, D.L.; SANTOS, D.N. (2009). Unidade 4: estrutura do projeto de pesquisa. In: GERHARDT, T. E.; SILVEIRA, D. T. (Orgs.). Métodos de Pesquisa. Porto Alegre: Editora da UFRGS, p. 65-88. são exemplos de autores que apresentam sugestões de como organizar projetos. No entanto, essas obras são referências tradicionais utilizadas para a construção de projetos de pesquisa no ambiente universitário. Para o contexto onde este trabalho foi desenvolvido, interessam-nos autores que buscaram adaptar essas orientações para o contexto de pesquisa na educação básica e para projetos de feiras de ciências. Palacios (2016)PALACIOS, G. G. (2016). Letramento acadêmico no ensino médio: uma experiência pedagógica a partir do material didático autoral “Manual do Jovem Pesquisador. Dissertação (Mestrado Profissional em Ensino de Línguas) - Universidade Federal do Pampa, Bagé., ao adaptar o projeto de pesquisa para alunos de ensino médio, propôs a seguinte estrutura: tema; justificativa; objetivos; perguntas de pesquisa; hipóteses; metodologia; e tempo de duração. Já Nascimento e Ventura (2017)NASCIMENTO, S.S.; VENTURA, P.C.S. (2017). Projetos Escolares para Feiras de Ciências. Belo Horizonte: Rolimã. propuseram algumas etapas para projetos para feiras de ciências: título; equipe; situação-problema; objetivos; justificativa; metodologia; etapas; cronograma de trabalho; e orçamento. Por fim, a Feira de Ciências Univates sugere um modelo de plano de pesquisa10 10 Disponível em: <https://www.univates.br/media/evento/feiradeciencias2018/modelo.doc>. Acesso em: 23 set. 2018. contendo título, identificação do grupo, tema, problema, objetivos, justificativa, revisão bibliográfica, metodologia, materiais e reagentes (quando houver), cronograma, resultados esperados e referências.

Com base nesses autores e eventos, a estrutura do modelo aqui apresentado foi pensada para ser sintética e didática. Assim, propomos uma ficha para que os alunos possam elaborar seus projetos de pesquisa (Figura 1), contendo título, grupo de pesquisa, tema, justificativa, problema de pesquisa, objetivos, metodologia, resultados esperados, cronograma e referências. Pelo fato de a escola onde este estudo foi realizado não dispor de infraestrutura suficiente para que os alunos elaborem seus projetos em suporte digital, essa ficha foi pensada para que possa ser preenchida como suporte físico.

A partir de uma leitura intensiva das orientações de Gil (2002, p. 161-170)GIL, A.C. (2002). Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed. São Paulo: Atlas. , Marconi e Lakatos (2003, p. 216-227)MARCONI, M.A.; LAKATOS, E.M. (2003). Fundamentos de Metodologia Científica. São Paulo: Editora Atlas. , Bagno (2005, p. 26-42)BAGNO, M. (2005). Pesquisa na Escola: o que é, como se faz. São Paulo: Edições Loyola., Gerhardt et al. (2009)GERHARDT, T.E.; RAMOS, I.C.A.; RIQUINHO, D.L.; SANTOS, D.N. (2009). Unidade 4: estrutura do projeto de pesquisa. In: GERHARDT, T. E.; SILVEIRA, D. T. (Orgs.). Métodos de Pesquisa. Porto Alegre: Editora da UFRGS, p. 65-88. , Souza et al. (2013, p. 21-29)SOUZA, D.I.; MÜLLER, D.M.; FRACASSI, M.A.T.; ROMEIRO, S.B.B. (2013). Manual de Orientações para Projetos de Pesquisa. Novo Hamburgo: FESLSVC. Disponível em: <http://www.liberato.com.br/sites/default/files/manual_de_orientacoes_para_projetos_de_pesquisa.pdf>. Acesso em: 15 out. 2018.
http://www.liberato.com.br/sites/default...
, Palacios (2016, p. 232-233)PALACIOS, G. G. (2016). Letramento acadêmico no ensino médio: uma experiência pedagógica a partir do material didático autoral “Manual do Jovem Pesquisador. Dissertação (Mestrado Profissional em Ensino de Línguas) - Universidade Federal do Pampa, Bagé. e Nascimento e Ventura (2017, p.26-35)NASCIMENTO, S.S.; VENTURA, P.C.S. (2017). Projetos Escolares para Feiras de Ciências. Belo Horizonte: Rolimã., foram construídos descritores para cada um dos elementos do projeto de pesquisa, estabelecendo critérios para “atingido”, “parcialmente atingido” e “não atingido” (Quadro 1). Essa divisão favorece uma estratégia de pontuação (REDDY; ANDRADE, 2010REDDY, Y.M.; ANDRADE, H. (2010). A review of rubric use in higher education. Assessment & Evaluation in Higher Education, v. 35, n. 4, p. 435-448. ) que permite que critérios qualitativos, na medida do possível, possam ser quantificados para avaliação escolar. Além disso, essa estratégia também possui um caráter orientador, pois os descritores funcionam como bilhetes para orientar a reescrita (MANGABEIRA; COSTA; SIMÕES, 2011MANGABEIRA, A.B.A.; COSTA, E.V.; SIMÕES, L.J. (2011). O Bilhete Orientador: um gênero discursivo em favor da avaliação de textos na aula de línguas. Cadernos do IL, Porto Alegre, n. 42, p. 293-307. ), permitindo que professores e estudantes estejam cientes sobre o que fazer para que um projeto passe de “atingido parcialmente” para “atingido”, por exemplo.

Os parâmetros avaliativos acima propostos foram desenvolvidos com o objetivo de operacionalizar a primeira estratégia de avaliação formativa proposta por Black e Wiliam (2009, p.8)BLACK, P.; WILIAM, D. (2009). Developing the theory of formative assessment. Educational Assessment, Evaluation and Accountability, v. 21, n. 1, p. 05-31.: “esclarecer e compartilhar os propósitos de aprendizagem e critérios para sucesso”. Assim, professores e alunos compartilham os critérios necessários para escrever um projeto de pesquisa com sucesso. Para pôr em prática a segunda estratégia, que é “desenvolver discussões eficazes em sala de aula e outras tarefas de aprendizagem que indiquem evidências da compreensão do aluno” (BLACK; WILIAM, 2009BLACK, P.; WILIAM, D. (2009). Developing the theory of formative assessment. Educational Assessment, Evaluation and Accountability, v. 21, n. 1, p. 05-31., p. 8), elaborou-se a ficha apresentada na Figura 1. Após ser discutida e relacionada aos descritores, os alunos, em seus grupos de pesquisa, preencherão com os dados da suas pesquisas projetadas.

A terceira estratégia, que propõe “fornecer feedback para que os alunos progridam” (BLACK; WILIAM, 2009BLACK, P.; WILIAM, D. (2009). Developing the theory of formative assessment. Educational Assessment, Evaluation and Accountability, v. 21, n. 1, p. 05-31., p. 8), pode ser realizada de diversas maneiras. Uma delas é o professor orientador de um determinado grupo de pesquisa realizar a leitura do projeto com vistas aos parâmetros avaliativos e, em um encontro com o grupo, discutir o texto para orientar a reescrita, caso necessário. O feedback também pode aparecer por escrito no campo de comentários da ficha e na classificação dos níveis descritos nos parâmetros de avaliação. Ainda há uma outra maneira que já operacionaliza também a quarta estratégia, “Tornar os alunos recursos instrucionais uns para os outros” (BLACK; WILIAM, 2009BLACK, P.; WILIAM, D. (2009). Developing the theory of formative assessment. Educational Assessment, Evaluation and Accountability, v. 21, n. 1, p. 05-31., p. 8). Como mencionado anteriormente, com o esclarecimento dos parâmetros de avaliação, os próprios alunos podem cumprir o papel de leitores interessados e, assim, fornecerem feedback para uma primeira reescrita. Assim, de maneira geral, pode-se dizer que o modelo dialógico de planejamento de projetos de pesquisa que é proposto e discutido neste artigo visa à prática da quinta e última estratégia de avaliação formativa, que é “tornar os alunos donos da sua aprendizagem” (BLACK; WILIAM, 2009BLACK, P.; WILIAM, D. (2009). Developing the theory of formative assessment. Educational Assessment, Evaluation and Accountability, v. 21, n. 1, p. 05-31., p. 8).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo propomos um modelo dialógico para elaborar projetos de pesquisa no contexto de ensino fundamental na perspectiva do modelo de letramentos acadêmicos a fim de que os estudantes saibam identificar os conhecimentos valorizados na área de conhecimento do seu projeto. Também refletimos sobre a importância de se pensar a avaliação na sua dimensão formativa que privilegie o processo em relação aos resultados e que possa subsidiar decisões de professores e alunos.

A estratégia proposta neste trabalho é a utilização de parâmetros avaliativos claros e definidos, mais especificamente na forma de descritores de elementos de um projeto de pesquisa. Ao conhecer esses parâmetros antes mesmo de planejar os projetos, os alunos se tornam mais autônomos durante o processo de escrita e reescrita, pois sabem de antemão como serão avaliados e o que devem fazer para atingir os objetivos estabelecidos. Essa autonomia também se expressa na possibilidade de assumirem o papel de leitores interessados dos projetos uns dos outros, podendo comparar o projeto com os descritores e escrever pareceres.

Destacamos também que os parâmetros apresentados neste artigo foram construídos para o planejamento de projetos de pesquisa de uma escola municipal de ensino fundamental. Sendo assim, tanto a ficha (Figura 1) quanto os descritores (Quadro 1) aqui propostos podem ser adaptados para adequar às especificidades de outros contextos escolares ou para atender exigências de determinadas feiras de ciências ou programas de iniciação científica. Nesse sentido, é essencial comunicar a comunidade acadêmica, incluindo aqui a escola, sobre as potencialidades, os desafios e as limitações da proposta aqui apresentada bem como de suas alterações.

  • 1
    To switch practices between one setting and another, to deploy a repertoire of linguistic practice appropriate to each setting, and to handle the social meanings and identities that each evokes.
  • 2
    Essa e todas as traduções deste artigo foram realizadas pelos autores.
  • 3
    Although the term academic literacies was originally developed with regard to the study of literacies in higher education and the university, the concept also applies to K-12 education.
  • 4
    Também chamada de avaliação somativa (BLACK; WILIAM, 1998BLACK, P.; WILIAM, D. (2009). Developing the theory of formative assessment. Educational Assessment, Evaluation and Accountability, v. 21, n. 1, p. 05-31.).
  • 5
    Assessment that is specifically intended to provide feedback on performance to improve and accelerate learning.
  • 6
    The big idea is that evidence about student learning is used to adjust instruction to better meet student needs.
  • 7
    1. Clarifying and sharing learning intentions and criteria for success; 2. Engineering effective classroom discussions and other learning tasks that elicit evidence of student understanding; 3. Providing feedback that moves learners forward; 4. Activating students as instructional resources for one another; and 5. Activating students as the owners of their own learning.
  • 8
    Wiliam (2011)WILIAM, D. (2011). Embedding Formative Assessment. Bloomington: Solution Tree Press. explora detalhadamente cada uma dessas estratégias.
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    A document that articulates the expectations for an assignment by listing the criteria or what counts, and describing levels of quality from excellent to poor.
  • 10

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    06 Nov 2018
  • Revisado
    08 Abr 2019
  • Aceito
    07 Ago 2019
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