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A MEDIAÇÃO LINGUÍSTICA COMO GARANTIA DE DIREITOS NO BRASIL: RUMO A POLÍTICAS INSTITUCIONAIS DE TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO NA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

LINGUISTIC MEDIATION AS A GUARANTEE OF RIGHTS IN BRAZIL: TOWARDS INSTITUTIONAL TRANSLATION AND INTERPRETATION POLICIES IN THE FEDERAL PUBLIC DEFENDERS’ OFFICE

RESUMO

Os recentes fluxos migratórios para o Brasil demandam do Estado um novo olhar sobre as necessidades sociais dos indivíduos recém-chegados ao país. A implementação de uma política linguística e de tradução é também, muitas vezes, condição de acesso da população imigrante aos sistemas de prestação de serviços públicos. Nesse sentido, incumbida da missão de garantidora de direitos humanos, a Defensoria Pública da União (DPU), visando ampliar e aperfeiçoar os serviços de assistência jurídica prestados a imigrantes no Brasil, criou a Coordenação de Tradução (CTRAD), antes Núcleo de Tradução (NuTrad), em parceria com a Universidade de Brasília (UnB). Inicialmente responsável pela tradução de documentos processuais, a CTRAD, frente ao aumento exponencial das demandas de atendimento por não falantes de português, vem ampliando suas atividades com a criação de um serviço de mediação linguística entre o agente público e o solicitante de direito. Esse crescimento das demandas relacionadas à tradução e interpretação revela a necessidade de institucionalizar políticas de tradução hoje em sua maioria implementadas pela sociedade civil. Para respaldar essas ações, buscou-se aqui traçar um diagnóstico da situação sociolinguística da DPU nesse contexto, por meio de uma coleta de dados junto aos setores de atendimento das diversas unidades da DPU. Foram aplicados questionários aos atendentes dessas unidades para conhecimento das dificuldades e necessidades linguísticas nos locais de atendimento. Os resultados revelam, por um lado, os desafios linguísticos enfrentados de acordo com os tipos de interação entre demandantes de direitos e agentes públicos e, por outro, o grande desamparo das instituições frente a esses desafios.

Palavras-chave:
estudos da tradução e da interpretação; interpretação comunitária; direitos linguísticos; políticas linguísticas e de tradução; Defensoria Pública da União

ABSTRACT

The recent migration flows to Brazil require the government to take a new look at the social needs of newly arrived individuals in the country. The implementation of a language and translation policy is also, many times, a condition for access by the immigrant population to public service delivery systems. In this sense, the Federal Public Defenders’ Office (DPU), charged with the mission of guaranteeing human rights, created the Department of Translation (CTRAD), formerly the Translation Unit (NuTrad), in partnership with the University of Brasilia (UnB), to expand and improve the legal assistance services provided to immigrants in Brazil. Initially responsible for the translation of procedural documents, the NuTrad, due to the exponential increase in the demand for services by non-Portuguese speakers, has been expanding its activities with the creation of a linguistic mediation service between the public agent and the person requesting the right. This growth in demands related to translation and interpretation reveals the need to develop institutional translation policies, most of which are currently implemented by civil society. To support these actions, we sought to establish a diagnosis of the sociolinguistic situation of the DPU in this context, by collecting data from the service sectors of the various units of the DPU. Questionnaires were applied to the attendants of these units to learn about the linguistic difficulties and needs in the service areas. The results reveal, on the one hand, the linguistic challenges faced according to the types of interaction between rights claimants and public officials and, on the other hand, the great helplessness of the institutions in the face of these challenges.

Keywords:
translation and interpretation studies; community interpretation; linguistic rights; linguistic and translation policies; Federal Public Defenders’ Office

INTRODUÇÃO

A Defensoria Pública da União (DPU) surge em 1988, com a promulgação da Constituição, da premente necessidade de se garantirem direitos de pessoas em situação de vulnerabilidade. Com base no princípio expresso no texto constitucional de que o acesso à justiça é direito fundamental de brasileiros e estrangeiros, a DPU atua nacional e internacionalmente para garantir a assistência jurídica gratuita àqueles que dela necessitam.

Paralelamente, à luz do leque de garantias fundamentais expressas na Carta Magna, as culturas, e consequentemente as línguas, são postas como garantidoras da dignidade humana, sendo consideradas direitos humanos. A promulgação de documentos como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) passou a garantir proteções ao indivíduo, como a de não-discriminação por sua cor, raça, sexo, língua, religião, opinião política, entre outras (ONU, 1948ONU. (1948). Organização das Nações Unidas. Declaração universal dos direitos humanos. Paris. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/91601-declaracao-universal-dos-direitos-humanos. Acesso em: 10 nov. 2020.
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). Nesse catálogo, a menção à língua primeira a eleva a elemento essencial para a garantia dos direitos humanos, com base no princípio de que é pela prática de sua língua primeira que o indivíduo preserva a sua dignidade e cidadania (HAMEL, 1995HAMEL, Rainer Enrique. (1995). Derechos lingüísticos como derechos humanos: debates y perspectivas. Alteridades, v. 5, n. 10, p. 11-23.).

Muitos outros documentos trazem a questão linguística como garantidora de direitos humanos, surgidos em sua maioria após e como consequência da DUDH, sendo o mais basilar a Declaração Universal dos Direitos Linguísticos (DUDL), de 1996, que tem como objetivo “corrigir os desequilíbrios linguísticos com vista a assegurar o respeito e o pleno desenvolvimento de todas as línguas e estabelecer os princípios de uma paz linguística planetária justa e equitativa, como fator fundamental da convivência social” (UNESCO; PEN INTERNACIONAL, 1996UNESCO; PEN INTERNACIONAL. (1996). Declaração universal dos direitos linguísticos. Barcelona. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/deconu/a_pdf/dec_universal_direitos_linguisticos.pdf Acesso em: 10 nov. 2020.
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).

Dentre as múltiplas recomendações da Declaração para proteger o indivíduo da discriminação em razão da língua, a de equipar os espaços institucionais que recebem falantes das mais variadas línguas impõe-se como condição de atendimento adequado. Para tanto, e considerando a impraticabilidade de capacitação em várias línguas dos agentes que trabalham com atendimento ao público, a tradução e a interpretação se colocam como recursos essenciais para atender as demandas de pessoas que não falam o idioma oficial de um país. Assim, ainda de acordo com a DUDL, a implementação dos serviços de assistência linguística em instituições públicas, ao possibilitar a interação para que a pessoa atendida aceda a seus direitos, institui-se efetivamente como forma de “corrigir os desequilíbrios linguísticos”.

No caso do Brasil, o Estado não tem favorecido esse tipo de assistência, muito pelo contrário. Num dos países mais plurilíngues do mundo, a diversidade linguística tem sido desconsiderada a ponto de a sociedade brasileira reivindicar seu monolinguismo. Essa negação vem se manifestando desde a colonização, quando a diversidade linguística passa a ser violentamente e sistematicamente reprimida. Essa construção histórica, ancorada tanto na ideia e no ideal de Nação, quanto no pressuposto de que essa consolida-se na homogeneidade linguística e cultural, institui-se enquanto um lamentável processo de aniquilação das línguas por meio da repressão de seus falantes (DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO & INSTITUTO DE INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO EM POLÍTICA LINGUÍSTICA, 2021DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO & INSTITUTO DE INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO EM POLÍTICA LINGUÍSTICA. (2021). Nota Técnica n. 8 – DPGU/DNDH: Conscientização do direito humano à diversidade linguística e formas de compensação pela história de repressão linguística no Brasil desde o início do processo de colonização. Brasília: DPU, 2021.).

É com base e em reação a esse triste pano de fundo que se inicia no Brasil um tímido movimento, impulsionado em grande medida por pesquisas sociolinguísticas, em direção ao reconhecimento da diversidade linguística e cultural constitutiva da paisagem social do país. A exemplo do cenário global, o processo no Brasil também se sustenta na promulgação de documentos internacionais em defesa dos direitos linguísticos, dando o país pequenos passos rumo, não à valorização, mas ao reconhecimento das línguas minorizadas praticadas em seu território.

De acordo com Ricardo Abreu (2016)ABREU, Ricardo. Nascimento. (2016). Prolegômenos para a compreensão dos direitos linguísticos: uma leitura a partir da Constituição da República Federativa do Brasil, p. 161-188. In: Sociolinguística e Política Linguística: olhares Contemporâneos. São Paulo: Blucher., a alavanca para o reconhecimento, no Brasil, do direito de essas minorias praticarem sua língua deriva do chamado pós-positivismo jurídico, que ganha força no Brasil no início dos anos 1990, após a promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/1988), com base no valor da dignidade da pessoa humana. Ainda assim, Abreu aponta que uma análise, mesmo que superficial, do texto constitucional acerca dos direitos linguísticos denuncia uma série de “lacunas ou questões controversas em relação ao tratamento da realidade plurilíngue nacional deixadas pelo constituinte originário e que a contemporaneidade deverá enfrentar” (2016, p. 170). O autor define que isso se deve ao fato de o texto constitucional considerar o Brasil como um país monolíngue, que ignora a diversidade linguística existente nas cerca de 200 línguas indígenas já registradas até o momento, além das línguas de imigração e das línguas de sinais.

Lamentavelmente, o processo, ainda embrionário, de reconhecimento da diversidade linguística brasileira não necessariamente se traduz na promoção de espaços de participação àqueles brasileiros e estrangeiros, que têm baixa ou nenhuma proficiência na língua portuguesa, por serem falantes de línguas indígenas, de migração, analfabetos ou analfabetos funcionais. Fato é que, seja qual for a proficiência em português, essas pessoas devem fazer jus aos direitos, na forma como estão expressos na carta constitucional brasileira.

É nesse sentido que a promoção, pelo Estado, de instrumentos de assistência linguística torna-se necessária para o acesso a serviços públicos pelas comunidades linguísticas nos mais variados contextos - saúde, justiça, educação, assistência social, entre tantos outros. Assim, por meio da atuação de intérpretes e tradutores comunitários profissionais em instituições de serviços públicos, seria assegurada a tão desejada participação das minorias linguísticas, tornando-as sujeitos de decisões e conferindo-lhes presença linguística e autonomia.

Infelizmente, no Brasil, ainda que permeiem a paisagem sociolinguística do país, essas comunidades linguísticas, além de serem desconsideradas, são alvo de desprezo e de estigma. Esse descaso se manifesta tanto na sociedade, quanto na organização política do país, em grande parte desprovido de marco legal acerca das necessidades e direitos linguísticos de sua população. Consequentemente, torna-se visível e concreto nas próprias instituições. Ao carecer, de modo geral, de instrumentos de acessibilidade linguística, e mais particularmente da intervenção de mediadores linguísticos profissionais, os órgãos públicos prestadores de serviços dão pouco ou nenhum amparo linguístico aos usuários desses serviços não falantes de português e aos seus agentes no seu intuito de atender.

A Defensoria Pública da União, buscando sanar esse vácuo institucional e processar um número considerável de demandas represadas, sobrestadas há anos no âmbito da instituição, mobilizou-se, por meio da sua Assessoria Internacional, para criar um serviço de assistência linguística para o atendimento efetivo das pessoas com baixa ou nenhuma proficiência em português. Assim, em 2019, a DPU criou, em parceria com a Universidade de Brasília, seu Núcleo de Tradução (NuTrad) – que, em 2022, se tornou Coordenação de Tradução (CTRAD) – uma iniciativa pioneira no serviço público, que tem como um de seus principais objetivos o atendimento de demandas relacionadas à tradução de documentos de processos de assistência jurídica gratuita prestada a brasileiros no exterior e também a migrantes no Brasil (DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, 2021DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2021). Internacional. Site DPU, Brasília. Disponível em: https://www.dpu.def.br/internacional. Acesso em: 04 ago. 2021.
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). Com uma atuação inicialmente embrionária em Brasília, onde fica a sede da instituição, a CTRAD ficou conhecida por alguns outros setores e unidades da DPU, que se interessaram pelo trabalho e solicitaram o auxílio linguístico da coordenação para atender suas demandas de tradução e interpretação. Contudo, tendo em vista as limitações da equipe da Coordenação de Tradução, ainda reduzida e composta por tradutores em formação, tornou-se necessário não somente um mapeamento das necessidades de assistência linguística, como também a ampliação do seu escopo de atuação, especialmente num contexto de intensificação das mobilidades e dos fluxos migratórios para e a partir do Brasil que, na última década, apresentaram mudanças significativas1 1 Enquanto, em 2010, o Censo Demográfico apontava portugueses e japoneses como os estrangeiros mais numerosos no país, em 2020, haitianos e venezuelanos tornaram-se parte majoritária dos migrantes em território brasileiro. Essa predominância encontra explicação tanto na crise política, socioeconômica, sanitária e climática no Haiti, desencadeada em 2010, como no conflito sociopolítico da Venezuela a partir de 2018 (OBMigra, 2021). .

Essa alteração da paisagem linguística, cada vez mais heterogênea, tem afetado profundamente a rotina de trabalho da CTRAD no atendimento a solicitações de assistência jurídica recebidas pela Assessoria Internacional. Como indicado anteriormente, a Coordenação de Tradução atua majoritariamente em traduções de processos de assistência jurídica, tanto para brasileiros no exterior quanto para migrantes no Brasil, priorizadas devido ao caráter urgente e sensível dessas demandas. Pela diversidade de sua natureza – que envolvem documentação pessoal, relatos, decisões judiciais, entre outros documentos – apresentam grandes desafios tradutórios decorrentes tanto dessa variedade, quanto das diferenças entre sistemas jurídicos de países e do uso de terminologias especializadas. Além desses desafios, a CTRAD também vem se preparando para expandir suas atividades de tradução para outras unidades e para estruturar um serviço de interpretação comunitária no atendimento direto a solicitantes de serviços (DPU, 2020DPU e UnB realizam nova etapa do curso de interpretação online. (2020). Defensoria Pública da União, Brasília, abr. 2020. Disponível em https://www.dpu.def.br/noticias-institucional/233-slideshow/56631-dpu-e-unb-realizam-nova-etapa-do-curso-de-interpretacao-online Acesso em: 14 ago. 2021.
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)2 2 Mais uma vez, esse serviço tem sido implementando por meio da parceria da instituição com a UnB, especialmente com o projeto de pesquisa MOBILANG do Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução, que, desde 2019, já havia criado e nutria um banco de intérpretes voluntários, atuando principalmente em entrevistas de solicitação de refúgio realizadas pelo Comitê Nacional para os Refugiados – Conare. Disponível em: http://www.mobilang.unb.br/index.php?option=com_content&view=article&id=75&Itemid=710. Acesso em: 18 jan. 2022. .

Assim, considerando que essa necessidade de assistência linguística tem aumentado e se diversificado, num contexto em que o Brasil tem recebido imigrantes de origens cada vez mais variadas, interessou-nos pesquisar a situação sociolinguística da DPU na sua relação com esses usuários não falantes de português. Para isso, a partir de questionários, indagou-se especificamente como ocorriam, antes da criação da CTRAD, as interações entre prestadores de serviço da DPU e solicitantes com baixa ou nenhuma proficiência em português, inclusive indígenas e pessoas da comunidade surda brasileira, já que a Defensoria não dispõe de intérpretes e mediadores em seu quadro de pessoal. Esse instrumento de coleta e de consulta foi construído com foco na percepção dos agentes da DPU, sejam defensores, servidores ou colaboradores, sobre os serviços prestados pela própria instituição, partindo-se da constatação de que, antes da CTRAD, não existia nenhuma orientação ou regulamentação referente à assistência linguística de pessoas com baixa ou nenhuma proficiência em português, no âmbito da DPU, como é o caso da maioria das instituições públicas no Brasil.

Com base nesse recorte inicial, delineou-se uma visão mais ampla das necessidades das minorias linguísticas no território nacional (migrantes, indígenas e surdos) em termos de acesso a serviços públicos, tendo como sustentação conceitos relacionados aos direitos linguísticos e às políticas linguísticas e de tradução. Parte-se da premissa de que o Brasil não tem sido somente omisso com relação às ações institucionais de promoção e valorização da diversidade linguística. Como se viu, trata-se de um vácuo institucional que se origina historicamente numa ideologia pautada no monolinguismo como condição de pertencimento ao Estado-Nação, e que tristemente se perpetua no contexto brasileiro contemporâneo, em que a própria Constituição determina, em seu art. 13, que a língua portuguesa é o único “idioma oficial da República Federativa do Brasil” (BRASIL, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2020]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2020.
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), ainda que, supostamente, garanta o direito à educação básica das comunidades indígenas em suas línguas.

Assim respaldados, e tendo em vista que o direito das comunidades linguísticas deveria ter como desdobramento soluções jurídicas para garantir o usufruto dos direitos linguísticos com o mesmo alcance que os falantes das línguas de maior prestígio social, apontam-se caminhos que possam “promover a garantia dos direitos das minorias linguísticas por meio da elaboração de uma política nacional com este fim” (ABREU, 2016, p. 183ABREU, Ricardo. Nascimento. (2016). Prolegômenos para a compreensão dos direitos linguísticos: uma leitura a partir da Constituição da República Federativa do Brasil, p. 161-188. In: Sociolinguística e Política Linguística: olhares Contemporâneos. São Paulo: Blucher.). Com essa prerrogativa em mente e findada a pesquisa preliminar, os dados e sua análise respaldam a consolidação do serviço de tradução e do recém-criado serviço de interpretação da CTRAD, a partir da proposição de ações político-linguísticas que aprimorem seu fluxo de trabalho. Ademais da necessidade de expansão da atuação da CTRAD, busca-se dar amparo à defesa dos direitos linguísticos de pessoas com baixa ou nenhuma proficiência em português, para além da instituição, a exemplo do Projeto de Lei n. 5.182, acolhido pelo Senado em 20203 3 O Projeto de Lei n. 5.182, proposto por um grupo de pesquisadores e profissionais, foi acolhido, em novembro de 2020, pelo Senador Paulo Paim (PT), então Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, e atualmente tramita no Congresso Nacional. https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/145443 . O PL, que institui a obrigatoriedade de alocação de tradutores e intérpretes em todas as instituições públicas, constitui pré-requisito basilar para o processo em curso de defesa desses direitos no Brasil, especialmente em suas instituições provedoras de serviços básicos e garantidoras de Direitos Humanos, como é o caso da DPU.

1. A TRADUÇÃO NA DEFENSORIA PÚBLICA COMO FORMA DE GARANTIA DE DIREITOS DE PESSOAS COM BAIXA OU NENHUMA PROFICIÊNCIA EM PORTUGUÊS

A Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) estabelece que todos os indivíduos são iguais perante a lei (ONU, 1948ONU. (1948). Organização das Nações Unidas. Declaração universal dos direitos humanos. Paris. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/91601-declaracao-universal-dos-direitos-humanos. Acesso em: 10 nov. 2020.
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). Na realidade, isso não ocorre. No Brasil, a desigualdade é estrutural, com grande parcela da população vulnerabilizada. Visando o amparo jurídico dessa parte significativa da sociedade, a Defensoria Pública da União (DPU) surge da Constituição de 1988 enquanto instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, tendo por vocação, conforme o artigo 134 da Carta Magna, “[...] a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados” (BRASIL, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2020]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2020.
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). Dessa forma, o trabalho da Defensoria Pública busca equilibrar o sistema jurídico garantindo que as pessoas vulnerabilizadas e vítimas de ações estatais tenham acesso a mecanismos de defesa de maneira gratuita, sendo essa função indispensável para a realização justa do direito (FUNÇÃO, 2015FUNÇÃO jurisdicional. (2015). Conselho Nacional do Ministério Público. Brasília. Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/institucional/476-glossario/8042-funcao-jurisdicional Acesso em: 18 set. 2021.
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). A instituição é, então, estabelecida tendo como missão “democratizar o acesso à justiça e defender os direitos dos necessitados de forma integral e gratuita para promover a dignidade da pessoa humana” (DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, 2020DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2020). Assistência jurídica integral e gratuita no Brasil: Um panorama da atuação da Defensoria Pública da União. 4. ed. Brasília: DPU, 2020.), alinhando-se com os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, consignados na Constituição de 1988 (BRASIL, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2020]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2020.
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), quais sejam, contribuir, por meio das ações institucionais, para a “construção de uma sociedade livre, justa e solidária, diminuindo as desigualdades sociais e regionais, e garantindo o desenvolvimento da Nação, sem discriminação de origem, raça, sexo, cor ou idade”. O trabalho realizado pela Defensoria Pública da União, tal como se configura hoje, advém de um longo percurso da assistência jurídica no Brasil, que foi aos poucos ganhando espaço nos textos legislativos.

A DPU também atua em conformidade com os princípios estabelecidos pela DUDH, tendo como uma de suas funções, inscritas na Lei Complementar n. 80, de 1994, “representar aos sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, postulando perante seus órgãos” (BRASIL, 1994BRASIL. [LC 80 (1994)]. Lei complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994. Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2009]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp80.htm. Acesso em: 8 jul. 2021.
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). Nesse sentido, buscando alinhar-se com instrumentos e sistemas internacionais de direitos humanos para defender os interesses dos que estão dentro e fora do território nacional, impulsiona-se a internacionalização da instituição. Essa ampliação do escopo do trabalho defensorial demanda o uso de mais línguas, não só na comunicação interinstitucional, mas no diálogo da instituição com as pessoas em situação de vulnerabilidade.

Dessa forma, partindo do princípio basilar de que a instituição deve orientar a sua atuação para garantir que as pessoas em situação de vulnerabilidade sejam ouvidas e que os seus direitos sejam respeitados, uma movimentação institucional foi iniciada para atender também aqueles com baixa ou nenhuma proficiência em português. Assim, o ambiente institucional da DPU precisou se adequar a novas características da sociedade brasileira, especialmente no contexto migratório, na superação das fronteiras linguísticas para atender necessidades de estrangeiros em situação de vulnerabilidade que chegam ao país em busca de proteção ou de melhores condições de vida. Então, alinhandose com as normas jurídicas internacionais, foi criada a Coordenação de Tradução, tendo como missão prover os solicitantes de direitos de assistência linguística, oral e escrita, inclusive estruturando as ações com a elaboração de instrumentos que regulamentem a presença de tradutores e intérpretes nas relações entre interlocutores que não falam a mesma língua.

1.1 A Coordenação de Tradução (CTRAD)

A Coordenação de Tradução surgiu de um acordo de cooperação entre a Defensoria Pública da União e a Universidade de Brasília4 4 Firmado durante o evento Traduzir-nos: idiomas e linguagens na defesa de direitos, no dia 28 de agosto de 2019. Disponível em: https://www.dpu.def.br/noticias-institucional/233-slideshow/52692-dpu-firma-parceria-com-a-unb-para-traducao-em-cooperacao-internacional. Acesso em: 5 fev. 2022. , com o objetivo inicial de implementar ações de tradução e interpretação na DPU para atender as demandas de assistência jurídica internacional (DPU, 2019DPU firma parceria com a UnB para tradução em cooperação internacional. (2019). Defensoria Pública da União, Brasília. Disponível em: https://www.dpu.def.br/noticias-institucional/233-slideshow/52692-dpu-firma-parceria-com-a-unb-para-traducao-em-cooperacao-internacional?fbclid=IwAR2NU0nsXEYOpC2xKV_FZNMDDnEKPU8bwcGStJfm2QRGe_kem3UGA4riUcs. Acesso em: 12 set. 2021.
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). Com sua atuação respaldada pelo regimento interno da DPU (DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, 2022DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2022). Resolução nº 202, de 8 de julho de 2022. Dispõe sobre o Regimento Interno da Defensoria Pública-Geral da União. Brasília: Defensoria Pública da União, 2022. Disponível em: https://www.dpu.def.br/resolucoes/69662-resolucao-n-202-de-08-de-julho-de-2022-dispoe-sobre-o-regimento-interno-da-defensoria-publica-geral-da-uniao. Acesso em 25 ago. 2022.
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), a Coordenação de Tradução surge do compromisso com a gestão do conhecimento na instituição e da relevância e “necessidade de ampliação estratégica da internacionalização da atuação da DPU no atendimento de brasileiros em territórios estrangeiros e de estrangeiros em território nacional” (DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, 2019DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2019). Portaria CAJI DPGU nº 2, de 20 de agosto de 2019. Dispõe sobre a criação do Núcleo de Tradução – NuTrad para atendimento de demandas tradutórias da DPU. Boletim Eletrônico interno da DPU, 176 ed. Brasília, DF, 21 agosto de 2019.). A primeira competência da CTRAD vem descrita no regimento como segue:

Art. 29 À Coordenação de Tradução – CTRAD – compete:

I - prospectar meios e implementar ações com objetivo de obter serviços de tradução e interpretação de línguas estrangeiras, majoritárias e minorizadas, línguas indígenas e língua de sinais no âmbito dos pedidos ativos de cooperação jurídica internacional, dos atendimentos a assistidos estrangeiros no território nacional, bem como dos demais pedidos enviados por setores pertencentes à estrutura administrativa da DPGU, preferencialmente; [...] (DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, 2022DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2022). Resolução nº 202, de 8 de julho de 2022. Dispõe sobre o Regimento Interno da Defensoria Pública-Geral da União. Brasília: Defensoria Pública da União, 2022. Disponível em: https://www.dpu.def.br/resolucoes/69662-resolucao-n-202-de-08-de-julho-de-2022-dispoe-sobre-o-regimento-interno-da-defensoria-publica-geral-da-uniao. Acesso em 25 ago. 2022.
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).

Trata-se da competência basilar da CTRAD, a maior motivação para a sua criação tendo sido o atendimento dos pedidos de cooperação jurídica internacional em línguas estrangeiras, até então sobrestados. Assim, por meio do trabalho da CTRAD, centenas de demandas jurídicas foram, enfim, tratadas.

A fim de cumprir essa e outras competências previstas no regimento interno, a CTRAD iniciou um processo de seleção de estagiários da Universidade de Brasília, nas três principais línguas estrangeiras de trabalho: inglês, francês e espanhol. Desse modo, foi constituída uma equipe que passou a trabalhar entre pares, o que promoveu a qualidade das traduções produzidas com base em discussões terminológicas e em um trabalho dialógico, colaborativo e coletivo. Além disso, a Coordenação de Tradução, desde o princípio, valoriza a formação continuada da equipe: pesquisas, discussões e encontros para debate têm sido organizados de modo a agregar novos conhecimentos às competências previamente adquiridas na academia, sempre com foco na assistência linguística e na defesa de direitos dos falantes com baixa ou nenhuma proficiência em português.

Hoje, a CTRAD atende todas as coordenações da Assessoria Internacional, além de outros setores da DPU, como a Assessoria de Comunicação Social e a Secretaria de Ações Estratégicas, e realiza projetos em parceria com universidades e outras instituições5 5 Especificamente, o Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística – IPOL (http://ipol.org.br/); o TRF3 e a Escola dos Escola de Magistrados da Justiça Federal da 3ª Região (https://www.trf3.jus.br/carta-servicos/escola-de-magistrados). Acesso em: 3 mar. 2022. . São realizadas, majoritariamente, traduções de processos de assistência jurídica, compostos por documentos pessoais, relatos sensíveis, decisões judiciais, entre outros. Também são traduzidas cartilhas e relatórios institucionais que têm como objetivo a internacionalização da instituição e a difusão da informação àqueles com baixa ou nenhuma proficiência em português. A disparidade entre sistemas jurídicos, a falta de equivalência e o uso de terminologia especializada são alguns dos desafios enfrentados na rotina tradutória da CTRAD.

A demanda por serviços de interpretação começou a surgir pouco depois da inauguração da Coordenação de Tradução. No fim de 2019, um defensor público solicitou o apoio da CTRAD para acompanhar uma audiência de custódia e garantir que o assistido entendesse e fosse entendido pelos presentes na sessão. Pouco depois, o setor de atendimento também demonstrou a necessidade de um intérprete para efetivar uma prestação de assistência. Assim, em reação a esse tipo de necessidade, em 2021, a CTRAD assumiu o gerenciamento do banco de intérpretes criado na UnB pelo grupo de pesquisa Mobilang. Com isso, a Coordenação conseguiu prestar os apoios solicitados, embora tivesse ciência de que os ofícios de tradutor e intérprete envolvem habilidades e competências distintas e que seria necessário um melhor planejamento para atender tais demandas.

Pensando nisso, ainda em parceria com a UnB, entre 2020 e 2022, foram realizados cursos de capacitação básica em Interpretação Comunitária com o objetivo de apresentar os princípios da atuação do intérprete em contextos legais a alunos e ex-alunos da UnB e de outras instituições superiores que falassem mais de uma língua e tivessem interesse em realizar a capacitação e prestar um serviço voluntário para a Defensoria Pública da União. Além das aulas teóricas sobre Interpretação Comunitária, foram convidados defensores, juízes e professores para compartilharem as características de instituições em que os intérpretes em formação atuariam futuramente (DPU, 2020DPU e UnB realizam nova etapa do curso de interpretação online. (2020). Defensoria Pública da União, Brasília, abr. 2020. Disponível em https://www.dpu.def.br/noticias-institucional/233-slideshow/56631-dpu-e-unb-realizam-nova-etapa-do-curso-de-interpretacao-online Acesso em: 14 ago. 2021.
https://www.dpu.def.br/noticias-instituc...
)6 6 As capacitações realizadas reuniram um total de 213 inscritos provenientes de 24 instituições nacionais e internacionais. Os cursos capacitaram voluntários de 14 línguas diferentes para atuarem como intérpretes. Os resultados da realização dos dois cursos foram organizados pela CTRAD, pela autora deste trabalho, e apresentados pela Profª. Drª. Sabine Gorovitz durante o webinário A Definição de Ombudsman e a Promoção dos Direitos Humanos, no dia 06 de julho (WEBINÁRIO, 2021). Além disso, as trocas de conhecimentos e saberes vivenciadas durante as duas edições do curso resultaram em um produto cultural Flor e Ser: Mediação linguística como garantia de direitos, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=AGhHDruoqWA. Tendo a responsabilidade do gerenciamento do banco, a Coordenação de Tradução trabalha atualmente na elaboração de materiais informativos e administrativos para a organização do serviço de interpretação e estuda a possibilidade de expansão posterior do serviço às outras unidades da DPU pelo Brasil. . Hoje o banco é composto de pessoas capacitadas, ainda que uma formação acadêmica mais robusta seja necessária para adequar a atuação dos profissionais às particularidades dos vários contextos e situações e à diversidade de perfis dos solicitantes com baixa ou nenhuma proficiência em português.

Dos poucos anos de atuação da CTRAD já é possível atestar que a prestação do serviço de interpretação a defensores(as), servidores(as) e colaboradores(as) no âmbito da Defensoria Pública da União é de suma importância para a garantia do cumprimento dos objetivos da DPU estabelecidos na Carta Magna. De fato, em uma interação em que prestador e solicitante de serviço não se entendem, não é só esse último que se encontra numa situação de vulnerabilidade. Nesses casos, há uma extensão da situação de vulnerabilidade ao prestador, na medida em que o próprio agente não consegue prestar o serviço para o qual é contratado. Quanto ao solicitante, ele se encontra duplamente vulnerabilizado. A incapacidade de interagir efetivamente com a pessoa com baixa ou nenhuma proficiência em português da instituição compromete a própria prestação de serviço e a garantia de direito.

2. A TRADUÇÃO COMO DIREITO LINGUÍSTICO: OS DESAFIOS DA TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO NOS SERVIÇOS PÚBLICOS

Como vimos, o reconhecimento dos direitos linguísticos enquanto direitos humanos é um passo para a implementação de ações em favor do direito de minorias linguísticas de acesso a serviços básicos, um deles sendo o direito à assistência linguística por tradutores e intérpretes. Expressar-se em língua primeira constitui um direito do indivíduo não sem razão, por possibilitar que o falante lance mão de todos os recursos disponíveis em seu repertório de modo a efetivar sua autonomia linguística e sua participação social. Dessa forma, negar àqueles que não falam a língua oficial local um serviço de interpretação implica privá-lo de capacidade de interação numa situação dialógica em que é o principal interessado.

Partindo do princípio de que a prestação de serviços públicos busca atender as necessidades fundamentais de todos os indivíduos em todos os âmbitos sociais, de modo a promover coesão social e diminuir a desigualdade, as instituições devem prezar pelo princípio da equidade, não delas privando nenhum grupo social, ainda menos por não falar a(s) língua(s) oficial(is) do Estado. Para tanto, faz-se imprescindível uma logística de gestão que contemple serviços de tradução e interpretação nas atividades cotidianas por elas exercidas. Frias destaca que a ausência desses serviços em instituições públicas revela que ainda hoje prevalece o descaso e até o preconceito por parte do Estado com relação às minorias linguísticas. Quando a diversidade linguística e cultural é assim ignorada, a tradução acaba desempenhando um papel de salvaguarda dos direitos linguísticos. Mais do que isso, promove o encontro entre culturas (FRIAS, 2016, p. 107FRIAS, Jose Yuste. (2016). Por una comunicación transcultural en los servicios públicos de traducción e interpretación. In: FERREIRO VÁZQUEZ, Óscar. Traducir e interpretar lo público. Granada: Editorial Comares.).

No caso da mediação entre agentes públicos e solicitantes de serviços, essa missão é desempenhada pelo intérprete comunitário. Essa modalidade comunitária da interpretação, por se tratar de um serviço prestado à comunidade, distingue-se de todas as outras, tanto por sua vocação como pelas características formais do processo.

A Interpretação Comunitária (IC) assume nomenclaturas diversas de acordo com os contextos, que revelam quais características são postas em destaque por cada região. Assim, é também conhecida como legal interpreting, court interpreting, public service interpreting, contact interpreting, dialogue interpreting, interpretación social, interpretación de enlace, ad hoc interpreting, cultural interpreting, Community-based interpreting, dialogue interpreting etc. (GARCIA, 2019, p. 34GARCIA, Fernanda de Deus. (2019). O papel do intérprete comunitário na entrevista de solicitação de refúgio. Dissertação de Mestrado em Estudos da Tradução. Universidade de Brasília, Brasília.; HALE, 2007, p. 28HALE, Sandra Beatriz. (2007). Community Interpreting. Inglaterra: Macmillan.). Se no Brasil, se opta pelo termo interpretação comunitária, trazendo enfoque à vocação de serviço prestado à comunidade, percebe-se que outros ressaltam características técnicas e formais, enquanto modalidade que se desenvolve num modo dialógico e interacional.

A Interpretação Comunitária (IC) só começa a ganhar destaque nas últimas décadas do século 20, com a intensificação dos fluxos migratórios que impulsionam contatos linguísticos cada vez mais diversos e desafiadores. Dessa reorganização social, emergem conflitos linguísticos e culturais, que fazem da intervenção de mediadores uma necessidade, especialmente na relação entre imigrantes e instituições públicas provedoras de serviços básicos: saúde, escola, justiça, administração geral, entre tantas outras. Assim, tendo como vocação mediar grupos culturalmente distintos, assumem simultaneamente o papel de agente social e de intérprete interlinguístico (PRUNC, 2012PRUNC, Erich. (2012). Rights, realities and responsibilities in community interpreting. The Interpreters’ Newsletter, Trieste, n. 17, p. 1-12.), uma sobreposição de papéis que tem chamado a atenção dos pesquisadores nos últimos anos.

Com efeito, o trabalho do intérprete comunitário reveste características que o distinguem de muitas outras tarefas de interpretação, tanto por, frequentemente, envolver línguas de pouca circulação, lidar com relações humanas bastante imprevisíveis, quanto por ocorrer em situações de interação altamente assimétricas. Entre o prestador de serviço e aquele que o solicita, se interpõem vários níveis de hierarquização, conforme expõe Klimkiewicz (2021, p. 3)KLIMKIEWICZ, Aurelia. (2021). Interpretação Comunitária: um Modelo de Comunicação “Trialógica”. Revista Belas Infiéis, Brasília, v. 10, n. 4, p. 01-15.: em primeiro lugar, as línguas em contato, muitas vezes uma sendo língua majoritária, a do prestador de serviço, a outra, língua minorizada do solicitante; depois, instituição versus indivíduo: de um lado, a instituição formalmente autorizada e possuidora de saber e competência, do outro, o indivíduo que não sabe e que depende do seu interlocutor em sua função de agente do Estado; e, por fim, estruturas legais e regulamentos versus experiência e sentimentos do indivíduo. Nesse confronto, por ser o único participante a entender tudo o que é dito pelas partes, o intérprete acaba também sendo o lócus dos conflitos, desenvolvendo um papel de reequilíbrio da interação. Por isso, é afetado, mas também afeta a assimetria de poder que permeia a situação de interação (RUDVIN, 2005RUDVIN, Mette. (2005). Power behind discourse and power in discourse in community interpreting: the effect of institutional power asymmetry on interpreter strategies. Revista canaria de estudios ingleses, n. 51, p. 159-179.).

Em contraponto, Salcedo (2010)SALCEDO, Juan Jiménez. (2010). Traducción-interpretación en los servicios públicos en Quebec: ¿Un modelo para Andalucía?. Sevilla: Fundación Pública Andaluza Centro de Estudios Andaluces. sugere que as relações de poder entre instituições e pessoas que a solicitam (um lado detendo o poder de acatar a solicitação do outro, ainda que, em teoria, a instituição tenha por vocação atender as necessidades e estar a serviço do cidadão) não podem ser neutralizadas pelo intérprete, tendo em vista que tais relações são anteriores às necessidades das pessoas migrantes e/ou indígenas, sejam elas ouvintes ou surdas. Assim, de acordo com o autor, imputar tal responsabilidade ao intérprete é exigir dele um esforço que deve partir do conjunto da sociedade.

Reforçamos, entretanto, que, embora não caiba ao intérprete promover uma inversão hierárquica, ele detém o poder, por meio da própria tradução, de exacerbar ou eufemizar esses desequilíbrios, ainda que o faça de forma inconsciente e movido por um grau de subjetividade inevitável. Por outro lado, assumir seu poder de mediação e de reparação, no intuito de restituir um certo nível de equidade, ainda que isso se manifeste apenas discursivamente, sem necessariamente acarretar efeitos concretos, pode ser considerado como uma forma de ativismo.

Outro aspecto que tem sido objeto de discussão e de polêmica refere-se à distinção, no escopo do trabalho do intérprete comunitário, entre interpretação e mediação linguísticas. Retomamos Salcedo (2010)SALCEDO, Juan Jiménez. (2010). Traducción-interpretación en los servicios públicos en Quebec: ¿Un modelo para Andalucía?. Sevilla: Fundación Pública Andaluza Centro de Estudios Andaluces., que sugere que há uma diferença processual entre as duas atividades, a interpretação não tendo por função a de explicar termos ou fatos desconhecidos. Ainda que o intérprete os conheça, podendo recorrer a definições e sinônimos, supõe-se que o prestador de serviço está mais capacitado para explicar os procedimentos em uma linguagem compreensível, competindo ao intérprete a promoção da autonomia comunicativa na interação, sendo essa “a capacidade de cada parte em um encontro de ser responsável e ter o controle de sua própria comunicação” (BANCROFT et al., 2015, p. 363BANCROFT, Marjory et al. (2015). The Community Interpreter - An International Textbook. Culture & Language Press, 1. ed., tradução nossa)7 7 Original: The capacity of each party in an encounter to be responsible for and in control of his or her own communication. .

Em contraponto, sugere-se que, seja qual for o contexto, a tradução implica sempre algum grau de mediação, ou seja, algum nível de interpretação/adaptação/explicação/explicitação. Essa característica inerente à tradução manifesta-se de forma ainda mais explícita em situações envolvendo um prestador de serviço e um falante pertencente a uma comunidade cujas características linguísticas e culturais os distanciam e os separam. Frente aos ruídos derivados dessas diferenças, que podem inclusive comprometer o entendimento entre as partes e tornar o atendimento inócuo, o intérprete, como mediador interposto entre essas particularidades, tem o poder de suavizar e/ou prevenir conflitos que possam emergir de tais diferenças (RUDVIN, 2005RUDVIN, Mette. (2005). Power behind discourse and power in discourse in community interpreting: the effect of institutional power asymmetry on interpreter strategies. Revista canaria de estudios ingleses, n. 51, p. 159-179.). Sendo o único interagente na posição de promover um movimento de desvinculação de sua própria cultura para compreender a do outro, o intérprete comunitário atua inevitavelmente como mediador cultural. Pöchhacker, corroborando tal perspectiva, afirma que todo intérprete é mediador, mas nem todo mediador é intérprete (2008, p. 14).

A perspectiva de Frias (2016)FRIAS, Jose Yuste. (2016). Por una comunicación transcultural en los servicios públicos de traducción e interpretación. In: FERREIRO VÁZQUEZ, Óscar. Traducir e interpretar lo público. Granada: Editorial Comares. corrobora nossa posição, quando enxerga a tradução e a interpretação em serviços públicos de uma perspectiva transcultural, que difere das abordagens inter e multicultural. Lançando mão de uma metáfora gastronômica, o autor sugere que, numa perspectiva intercultural, a tradução e interpretação em serviços públicos leva a uma fusão, uma mescla de diferentes identidades até que se tornem uma mistura homogênea e opaca, como um creme de legumes. Frias se contrapõe a uma perspectiva multiculturalista, que considera que diferenças culturais em contato podem coexistir, sem se sobreporem ou se misturarem, advertindo que essa perspectiva pode ser mobilizada para “excluir o migrante do espaço público ou segregá-lo a um gueto” (FRIAS, 2016, p. 116FRIAS, Jose Yuste. (2016). Por una comunicación transcultural en los servicios públicos de traducción e interpretación. In: FERREIRO VÁZQUEZ, Óscar. Traducir e interpretar lo público. Granada: Editorial Comares., tradução nossa)8 8 Original: excluir al migrante del espacio público o segregarlo en un gueto. . O autor recorre à mesma metáfora: essa abordagem seria como um buffet de restaurante, em que todos os alimentos são apresentados separadamente e quem se serve pode escolher exatamente o tipo e a quantidade de cada alimento, na ordem que deseja. Nessa perspectiva, os diferentes pertencimentos culturais de uma pessoa estão a mostra, mas a obsessão pelo respeito e o desejo de manter a cultura intacta pode ser um problema ao promover a compartimentação social. Por isso, Frias (2016)FRIAS, Jose Yuste. (2016). Por una comunicación transcultural en los servicios públicos de traducción e interpretación. In: FERREIRO VÁZQUEZ, Óscar. Traducir e interpretar lo público. Granada: Editorial Comares. defende a comunicação transcultural como perspectiva para servir de base à implementação dos serviços de tradução e interpretação pelas instituições públicas.

A tradução, em sentido amplo, seria assim percebida como uma forma de transmitir a cultura/língua do outro colocando-as não somente em diálogo e em relação, mas fazendo com que as partes se misturem numa permanente construção. Assim, não se trata de integrar ou assimilar grupos minoritários, mas de compreender as diferentes manifestações linguísticas, paralinguísticas e materiais em contato, possibilitando transformação e enriquecimento cultural de ambas as partes envolvidas no diálogo. Retomando Frias em sua metáfora, a abordagem transcultural seria então como uma paella, em que todos os ingredientes estão postos juntos, mas tendo os seus sabores respeitados (FRIAS, 2016FRIAS, Jose Yuste. (2016). Por una comunicación transcultural en los servicios públicos de traducción e interpretación. In: FERREIRO VÁZQUEZ, Óscar. Traducir e interpretar lo público. Granada: Editorial Comares.).

Para além dessa missão de promoção de diálogo, sobreposição e mistura linguística e cultural, o intérprete comunitário ainda se depara com desafios de ordem técnica relativos às características da sua intervenção em serviços públicos: por transitar entre contextos formais variados, cada qual com sua especialidade, acaba lidando com as mais diversas linguagens socioprofissionais relacionadas aos serviços prestados por cada instituição. São os chamados desafios terminológicos da tradução.

3. OS DESAFIOS TERMINOLÓGICOS DA TRADUÇÃO NO ÂMBITO DA DPU

Ao prover uma assistência linguística a um solicitante em interlocução com especialistas cujo discurso é técnico, com um vocabulário desconhecido para uma pessoa leiga, o intérprete precisa também estar preparado para equilibrar essa desigualdade linguística, que vai além da fronteira entre línguas. A questão terminológica, desafio compartilhado por todos os intérpretes seja qual for o modo de interpretação e o ambiente, exige um preparo anterior à atividade em si, o que novamente pressupõe um alto nível de qualificação desses profissionais.

Aliás, reconhecendo a importância e a complexidade do trabalho do intérprete comunitário, criou-se, em 2014, a norma ISO 13611: 2014, que estabelece critérios e recomendações a serem respeitados para garantir um serviço de qualidade (ISO, 2014ISO. (2014). ISO 13611:2014 Interpreting — Guidelines for community interpreting. [S. l.]. Disponível em: https://www.iso.org/cms/render/live/en/sites/isoorg/contents/data/standard/05/40/54082.html. Acesso em: 18 jan. 2022.
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). De acordo com a norma, além de agir conforme princípios profissionais, o intérprete deve agregar a uma sólida proficiência nas línguas de trabalho e à habilidade de criar relações entre falantes e realidades culturais e linguísticas distintas a capacidade de gestão terminológica.

No caso de ambientes que envolvem especificamente a linguagem jurídica, como é o caso da DPU, os desafios podem ser, por vezes, insuperáveis. Harvey (2002)HARVEY, Malcolm. (2002). What’s so special about legal translation? Meta, v. 47, n. 2. Disponível em: https://www.erudit.org/fr/revues/meta/2002-v47-n2-meta692/008007ar/. Acesso em 7 fev. 2022.
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, em uma definição mais inclusiva, sugere que textos jurídicos são documentos que integram um processo jurídico, sejam contratos, sentenças, testemunhos etc., trazendo não apenas a palavra dos operadores do direito, mas também dos envolvidos no processo legal, como réus, testemunhas etc. No contexto da Defensoria Pública da União, intérpretes e tradutores se deparam majoritariamente com esses gêneros que acompanham processos de assistência jurídica internacional, como documentos pessoais, formulários de assistência, narrativas do processo, decisões, que possuem suas particularidades. Além de apresentarem terminologias da área do direito, trazem relatos sensíveis de pessoas assistidas pela DPU. Ou seja, os documentos relativos à assistência jurídica internacional congregam enunciados da mais alta precisão, tecnicidade e objetividade com outros marcados pela subjetividade e pela emoção, o que requer versatilidade do intérprete ou tradutor quando passa de um tipo para outro, opostos por suas características.

Voltando à tradução jurídica em si, ainda que integre o campo da tradução especializada por lidar com textos normativos e produzidos por grupos detentores de poder (juízes, legisladores, negociadores, entre outros), acaba usufruindo de um status especial em relação aos outros textos especializados (MEDHAT-LECOCQ, 2019MEDHAT-LECOCQ, Héba. (2019). Le langage du droit : quels défis pour le traducteur juridique ? Revue Langues, cultures et sociétés, v. 5, n. 1, p. 80-92.). Além disso, a tradução jurídica se destaca pela dificuldade de criar equivalência e correspondência entre conceitos de sistemas jurídicos distintos (GÉMAR, 2002GÉMAR, Jean-Claude. (2002). Le plus et le moins-disant culturel du texte juridique. Langue, culture et équivalence. Meta, v. 47, n. 2, p. 163–176. DOI: https://doi.org/10.7202/008006ar. Acesso em: 5 fev. 2022.
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). De acordo com Gémar, o texto jurídico, ironicamente, seria um dos mais marcados culturalmente pois “reflete a complexidade de uma sociedade, cujas instituições e vocabulário são a expressão de uma cultura, por vezes, multimilenar” (2002, p. 163, tradução nossa)9 9 Original : Il reflète la complexité d’une société, dont les institutions et le vocabulaire sont l’expression d’une culture parfois multimillénaire. .

Medhat-Lecocq (2019)MEDHAT-LECOCQ, Héba. (2019). Le langage du droit : quels défis pour le traducteur juridique ? Revue Langues, cultures et sociétés, v. 5, n. 1, p. 80-92. também destaca outros fatores que se apresentam como desafios difíceis de superar pelo tradutor jurídico. O primeiro, como já foi exposto acima, refere-se à opacidade da terminologia jurídica, de difícil entendimento aos não especialistas da área. O chamado juridiquês, além de lançar mão de termos que pouco ou nunca aparecem na linguagem cotidiana, ou que nela revestem significado distinto, recorre a fraseologias e construções sintáticas muito marcadas como constituindo o discurso jurídico. O autor ainda destaca que cada cultura, ao expressar o Direito, recorre a suas combinações linguísticas, a exemplo do Brasil, com o uso abusivo do gerúndio nos motivos de uma decisão. Somando-se às fraseologias próprias do discurso jurídico, cada tipo de documento apresenta uma estrutura engessada própria a ele, que também vai variar entre os diferentes sistemas e países. Cada país possui sua cultura jurídica, que simultaneamente revela e reverbera na cultura da própria sociedade que ela se deve de reger. Os conceitos de “casamento” e de “embrião”, por exemplo, ainda que possam subsumir características universais, irão apresentar particularidades relacionadas à cultura do país. Esse pressuposto tem desdobramentos múltiplos relativos à missão e função das instituições públicas, judiciárias e administrativas, cada qual com suas singularidades, mas todas supostamente regidas pelo bem-estar coletivo (MEDHAT-LECOCQ, 2019MEDHAT-LECOCQ, Héba. (2019). Le langage du droit : quels défis pour le traducteur juridique ? Revue Langues, cultures et sociétés, v. 5, n. 1, p. 80-92.).

Partindo dessa tela de fundo, e frente à complexidade de se traduzir o Direito, emerge uma nova área na imbricação dos estudos do direito e da tradução: a Juritradutologia, cujo objetivo é, segundo Reichmann e Beltrão (2021, p. 160)REICHMANN, Tinka.; BELTRÃO, Taciana Cahu. (2021). Direito e tradução – influências recíprocas. TradTerm, São Paulo, v. 40, p. 157-179., “estudar a complexidade da tradução jurídica a partir de uma perspectiva integrativa, por meio do diálogo epistemológico entre a ciência jurídica e a ciência da linguagem”. Esse novo campo entende que o Direito e a Tradução se influenciam mutuamente, a exemplo da recepção por um determinado país de normas jurídicas estrangeiras por meio de traduções e das cooperações jurídicas internacionais em que o Direito é influenciado pela Tradução. Reciprocamente, existem situações em que a Tradução é influenciada pelo Direito, como na tradução de textos jurídicos por tradutores juramentados que têm sua atuação regida por lei específica e podem ser penalizados em casos de erros (REICHMANN; BELTRÃO, 2021REICHMANN, Tinka.; BELTRÃO, Taciana Cahu. (2021). Direito e tradução – influências recíprocas. TradTerm, São Paulo, v. 40, p. 157-179.).

À luz da juritradutologia, respaldada por esses e tantos outros fatores que justificam o diálogo entre as duas áreas e a necessidades de colocá-las em perspectiva, percebe-se essa imbricação e seus desdobramentos nas atividades estruturantes da Coordenação de Tradução da DPU. Vale ressaltar que as traduções realizadas pela CTRAD, por objetivarem a divulgação de informações dos processos a defensores e servidores para que possam dar seguimento às ações necessárias para garantir o direito das pessoas assistidas10 10 O termo “assistido” é usado no âmbito da DPU para designar as pessoas hipossuficientes, vulnerabilizadas, que recebem assistência da instituição e, não fosse isso, seria adotado, nesta pesquisa, outro termo não-estigmatizante. , são chanceladas pela instituição, embora não tenham valor de tradução juramentada, ou seja, dotadas de fé pública11 11 Legalmente reconhecidas como uma “reprodução fiel do original” (AUBERT, 1998, apud ROMÃO, 2015, p. 148), só podem ser realizadas por um tradutor público, aprovado em concurso público e que assume o papel de agente do Estado. No Brasil, cujo título do ofício é Tradutor e Intérprete público, esse agente é regido pela nova lei n. 14.195, de 26 de agosto de 2021, que revogou o Decreto-Lei nº 13.609, de 1943, que regia o ofício até então (PIETROLUONGO; CARNEIRO, 2017). .

Já as traduções de relatórios, cartilhas e outros materiais de divulgação institucionais realizadas pela CTRAD podem ser entendidas como traduções oficiais, por serem realizadas por pessoas contratadas pela instituição e difundidas em nome dela, tornando-as responsáveis pelo texto divulgado (ROMÃO, 2015ROMÃO, Tito Lívio Cruz. (2015). Editais de concursos públicos para provimento de TPIC: algumas considerações teórico-práticas sobre a situação brasileira. Cadernos de Terminologia e Tradução: Temas de Tradução Juramentada II, p. 143-165.).

Assim, sejam elas produzidas por tradutores juramentados ou oficiais, as traduções jurídicas são objeto de um embate comum: busca-se equivalência a partir do texto fonte ou da função do texto? Conforme aponta Harvey (2002)HARVEY, Malcolm. (2002). What’s so special about legal translation? Meta, v. 47, n. 2. Disponível em: https://www.erudit.org/fr/revues/meta/2002-v47-n2-meta692/008007ar/. Acesso em 7 fev. 2022.
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, especialistas em tradução jurídica acreditam que a equivalência é criada pelo tradutor com base no efeito que o texto produz. Se o texto de chegada (a tradução) produzir o mesmo efeito que o texto de partida, isso justifica adaptações que possam parecer mais ousadas e que, a priori, distanciam mais um texto do outro em suas características formais. O autor acrescenta que a falta de referentes universais na área do Direito, distintamente da Medicina ou da Matemática, dificulta a busca por equivalentes, principalmente quando se trata de termos relacionados a conceitos, procedimentos, instituições, entre outros (HARVEY, 2002HARVEY, Malcolm. (2002). What’s so special about legal translation? Meta, v. 47, n. 2. Disponível em: https://www.erudit.org/fr/revues/meta/2002-v47-n2-meta692/008007ar/. Acesso em 7 fev. 2022.
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). Por esse motivo, Gémar coaduna Harvey, apontando que

[...] a tradução jurídica não pode ser rigorosamente exata. Trata-se de uma operação aproximada, cuja margem de erro deve ser avaliada. Em suma, uma tradução jurídica é uma mera presunção, que os interessados devem sempre ser capazes de contestar, recorrendo ao texto autêntico (2002, p. 174, tradução nossa)12 12 Original: […] la traduction juridique ne saurait jamais être rigoureusement exacte. C’est une opération approximative, dont il convient d’apprécier la marge d’erreur. En somme, une traduction juridique constitue une simple présomption, que les intéressés doivent toujours pouvoir contester en se référant au texte authentique. .

Reverberando essa citação de Gémar, notamos que a incapacidade de exatidão da tradução jurídica, contrariando o que se poderia imaginar do discurso do Direito, coloca novamente em pauta a importância da qualificação de intérpretes e tradutores que atuam em meios jurídicos. Ainda que possa sempre haver uma margem de desvio a ser considerada, o profissional capacitado que atua nas instituições públicas, e que acaba assumindo por procuração as mesmas missões do que o próprio agente, saberá muito melhor que uma pessoa leiga lidar com as particularidades elencadas. Nesse sentido, deve garantir, respaldando os objetivos das instituições que prestam serviços à população com baixa ou nenhuma proficiência em português, que as informações prestadas ao solicitante de serviço sejam devidamente compreendidas por ele, e, inversamente, que sua demanda possa ser levada em consideração pelo agente prestador de serviço.

4. RESULTADOS DE PESQUISA: NECESSIDADES DE TRADUÇÃO DA DPU

Tendo esse panorama conceitual como base, foi preciso colher dados diretamente junto aos prestadores sobre as necessidades de assistência linguística de solicitantes com baixa ou nenhuma proficiência em português para subsidiar a elaboração de um diagnóstico sociolinguístico capaz de orientar as ações necessárias para a implementação de serviços de tradução e interpretação na instituição. Para tanto, foram encaminhados formulários a 75 unidades DPU, que foram respondidos por 43 delas13 13 A pesquisa foi realizada com a ferramenta Formulários Google e, após chancela da Chefe de Gabinete do Defensor Público Geral Federal, Aline Papazis, enviada às unidades da DPU. O formulário foi enviado às seguintes unidades DPU: ABC Paulista/SP, Altamira/PA, Aracaju/SE, Arapiraca/AL, Bagé/RS, Baixada Fluminense/RJ, Belém/PA, Belo Horizonte/MG, Boa Vista/RR, Brasília – 1ª Categoria, Brasília – 2ª Categoria, Cáceres/MT, Campina Grande/PB, Campinas/SP, Campo Grande/MS, Canoas/RS, Caruaru/PE, Cascavel/PR, Cidade do Rio De Janeiro – 2ª Categoria, Criciúma/SC, Cuiabá/MT, Curitiba – 1ª Categoria, Curitiba – 2ª Categoria, Dourados/MS, Feira de Santana/ BA, Florianópolis/SC, Fortaleza/CE, Foz do Iguaçu/PR, Goiânia / Aparecida De Goiânia, Governador Valadares/MG, Guarulhos/SP, Jales/ S P, João Pessoa/PB, Joinville/SC, Juiz De Fora/MG, Linhares/ES, Londrina/PR, Macapá/AP, Maceió/AL, Manaus/AM, Mogi das Cruzes/SP, Montes Claros/MG, Mossoró/RN, Natal/RN, Niterói, São Gonçalo e Itaboraí/RJ, Osasco/SP, Pelotas/RS, Petrolina/PE e Juazeiro/BA, Porto Alegre – 1ª Categoria, Porto Alegre – 2ª Categoria, Porto Velho/RO, Recife/PE, Registro/SP, Ribeirão Preto/SP, Rio Branco/AC, Rio de Janeiro – 1ª Categoria, Rio Grande/RS, Rondonópolis/MT, Salvador/BA, Santa Maria/RS, Santarém/PA, Santos e São Vicente/SP, São José dos Campos/SP, São Luís/MA, São Paulo – Capital, Sobral/CE, Sorocaba/SP, Teresina/PI, Uberlândia/MG, Umuarama/PR, Uruguaiana/RS, Vitória da Conquista/BA, Vitória/ES, Volta Redonda/RJ. Responderam à pesquisa as unidades: Aracaju/SE, Bagé/RS, Belém/PA, Campinas/ S P, Canoas/RS, Criciúma/SC, Campo Grande/MS, Caruaru/PE, Cuiabá/MT, Porto Alegre (a categoria não foi identificada), Joinville/SC, Petrolina/PE e Juazeiro/BA, Rio Branco/AC, Rio de Janeiro, Maceió/AL, ABC Paulista/SP, Altamira/PA, Brasília – 1ª Categoria, Brasília – 2ª Categoria, RS – 1ª categoria, Florianópolis/SC, Foz do Iguaçu/PR, Guarulhos/SP, Linhares/ES, Macapá/AP, Pelotas/RS, Registro/SP, Rio Grande/RS, Boa Vista/RR, Santarém/PA, Santos e São Vicente/SP, São José dos Campos/SP, São Paulo – Capital, Sobral/CE. .

As respostas foram sistematizadas, consolidadas e cruzadas, em tabelas Excel, com foco nos procedimentos e estratégias de atendimento a falantes com baixa ou nenhuma proficiência em português pelas unidades. Assim, por meio de 20 perguntas ‒ algumas abertas, outras semiabertas e fechadas ‒, questionamos os agentes de cada unidade sobre as estratégias de atendimento de pessoas com baixa ou nenhuma proficiência em português, de acordo com suas nacionalidades e as línguas faladas, considerando a ausência de serviços institucionalizados de assistência linguística.

As unidades respondentes foram separadas por região e, a partir do cruzamento dos dados com as línguas mais demandadas, obtivemos os seguintes resultados:

Tabela 1
Cruzamento de dados de região das unidades e línguas demandadas

A língua espanhola, demandada em todas as regiões, é a mais recorrente nas unidades DPU, tendo sido solicitada em 33 unidades. Segue-se a língua inglesa, em 15 unidades, a francesa, em 11, e a língua brasileira de sinais, Libras, em 7 unidades. Em relação às línguas minorizadas, o árabe foi demandado em 3 unidades da DPU e o farsi e a língua indígena warao, em uma unidade cada. Quanto às nacionalidades atendidas, a variedade é ainda mais surpreendente:

Figura 1
Nacionalidades atendidas na DPU

Percebe-se, pela alta demanda da língua espanhola nas unidades da DPU em todas as regiões do Brasil, a forte presença e a grande capilaridade dos imigrantes oriundos de outros países da América Latina, como Venezuela, Uruguai, Argentina, Bolívia, Colômbia e Cuba. Como apontado na introdução, a expressiva presença de imigrantes venezuelanos e haitianos relaciona-se à crise sociopolítica vivida na Venezuela e aos desastres naturais e crises políticas, sanitárias e socioeconômicas que ocorrem no Haiti (OBMigra, 2021OBSERVATÓRIO DAS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS [OBMigra]. (2021). Imigração e refúgio no Brasil: retratos da década de 2010. Brasília, DF: OBMigra. Disponível em: https://portaldeimigracao.mj.gov.br/pt/dados/relatorios-a. Acesso em: 28 mar. 2022.
https://portaldeimigracao.mj.gov.br/pt/d...
).

Quando questionadas sobre as dificuldades encontradas durante o atendimento de pessoas com baixa ou nenhuma proficiência em português, 25 das 43 respostas das unidades apontaram a compreensão da língua como o maior desafio. Seis atendentes também mencionaram o desafio de lidar com diferenças culturais e jurídicas, e 5, a ausência de profissionais qualificados na equipe para tratar essas demandas, conforme gráfico a seguir:

Quais são as maiores dificuldades no atendimento de pessoas não-falantes de português?

Figura 2
Dificuldades encontradas durante o atendimento de pessoas não-falantes de português

Apesar da variedade de línguas e nacionalidades atendidas, 26 unidades defensoriais, o que corresponde a 60,5% das unidades respondentes, afirmaram não dispor de pessoas capacitadas em outras línguas além da portuguesa; 93% das unidades indicaram a não existência de materiais institucionais traduzidos, como cartilhas, mapas, formulários, entre outros.

Além da inexistência de materiais traduzidos, 97,7% das unidades informaram também não haver tradutores disponíveis. Frente a essa carência, quando se deparam com a necessidade de tradução de documentos, várias são as estratégias das unidades, todas elas recorrendo a soluções improvisadas sem apoio institucional, quais sejam: solicitar ajuda aos colaboradores da DPU que porventura falem outras línguas (10 respostas); recorrer à tradução automática do Google Tradutor (9 respostas); solicitar que a própria pessoa assistida consiga a tradução do documento (9 respostas).

À guisa de resultados gerais, os dados mostram que nenhuma unidade contou com o trabalho de um tradutor profissional e que, em contraponto, 67,4% das unidades já enfrentaram a situação de não haver ninguém que falasse a língua da pessoa assistida. Quanto às soluções encontradas para prosseguir com o atendimento desses solicitantes, foram mencionadas as seguintes estratégias: uso de tradução automática (13 respostas); solicitar que a pessoa assistida retornasse com alguém que falasse português (12); buscar um intérprete (7 respostas); tentar se comunicar por meio da mistura de línguas (1 resposta – nesse caso, a unidade informou que falou “portunhol” para se comunicar com a pessoa assistida).

Com base nessas respostas, podemos, preliminarmente, afirmar que a DPU tem a CTRAD como única ação político-linguística institucional. Ainda que atenda uma grande variedade de nacionalidades, a Defensoria não conta com a figura do intérprete para possibilitar esse atendimento. Por isso, é fato afirmar que a interação entre instituição, na pessoa do agente público, e solicitante de direitos (chamada na DPU de pessoa assistida) é precarizada, a interpretação ficando a cargo de prestadores de serviço, defensores, servidores, colaboradores e estagiários, quando não da própria pessoa assistida, incumbida de encontrar alguém que fale português para acompanhá-la. Como vimos, acabam também recorrendo a tradutores automáticos. Assim, ainda que os atendimentos tenham ocorrido ‒ vale lembrar, por meio de estratégias improvisadas ‒, a maioria das unidades reconhece que a disponibilização de intérprete, de forma presencial ou remota, facilitaria o atendimento de pessoas com baixa ou nenhuma proficiência em português.

Preocupa o fato de apenas 6 unidades terem contado com a intervenção de um intérprete profissional para mediar a interação, especialmente considerando-se o caráter sensível dos atendimentos de pessoas que, além de geralmente se encontrarem em situação vulnerável, têm baixa ou nenhuma proficiência em português. Inquietante também é observar que nenhum documento traduzido na Defensoria Pública da União foi produzido por um profissional. Com base nesses dados preliminares, que revelam o desamparo das instituições e dos agentes para lidar com essas demandas, que se estende à maioria dos órgãos de atendimento, não surpreende que a CTRAD seja hoje ainda a única iniciativa institucionalizada de assistência linguística no serviço público.

Percebendo-se, com base nos resultados, que as ações de políticas de tradução devem ser implementadas coletiva e transversalmente, sugerem-se, à guisa de orientação geral, algumas possibilidades de ação a serem vislumbradas para consolidar o trabalho da CTRAD no provimento de assistência linguística a solicitantes de direitos no âmbito da Defensoria Pública da União: parcerias com IES e instituições públicas para a promoção de capacitações em tradução e interpretação e inserção de estudantes de Tradução nas atividades laborais por meio de estágio, a exemplo do acordo com a UnB; inserção das atividades de tradução e interpretação nos documentos institucionais, regulamentando-as internamente; ampliação e consolidação da equipe por meio da contratação efetiva de profissionais e tradutores e intérpretes, inserindo línguas de sinais, indígenas e outras línguas minorizadas; previsão orçamentária destinada à tradução e interpretação, tanto para cobrir custos de equipamentos e softwares quanto para contratações esporádicas de tradutores e intérpretes; ampliação e divulgação de bancos terminológicos multilíngues alimentados a partir do trabalho gerado pela Coordenação de Tradução.

Como se percebe, não se trata de inovar, mas de colocar os direitos de pessoas falantes com baixa ou nenhuma proficiência em português na pauta e atuar em seu favor.

CONCLUSÃO: A MEDIAÇÃO LINGUÍSTICA COMO GARANTIA DE ASSISTÊNCIA AO CIDADÃO

Para além de um diagnóstico sociolinguístico das necessidades de tradução e interpretação da DPU, os dados obtidos abrem caminho para entendermos como os direitos linguísticos têm sido considerados socialmente no Brasil e como deveriam ser tratados. Os resultados reafirmam a ausência de mecanismos institucionais de assistência linguística, corroborando com o quadro geral que serviu de pano de fundo desse trabalho: uma situação em que a diversidade linguística é desconsiderada, ou pior, é tida como um problema a ser superado.

Os resultados mostram ainda que a assistência linguística, quando eventualmente provida, é exercida, na maioria das vezes, de forma improvisada por indivíduos que assumem a função ad hoc, enquanto “intérpretes por acidente” (FRIAS, 2013FRIAS, Jose Yuste. (2013). Aux seuils de la traduction et de l’interprétation en milieu social. In: BENAYOUN, Jean-Michel; NAVARRO, Elisabeth (ed.). Interprétation-médiation : L’An II d’un nouveau métier. Presses Universitaires de Sainte Gemme: Reims.). Partindo da definição, bastante sucinta, de Bancroft et al., que sugerem que o intérprete comunitário é “um indivíduo bilíngue ou multilíngue que é considerado profissionalmente qualificado para interpretar em ambientes de serviços comunitários” (BANCROFT et al., 2015, p. 40BANCROFT, Marjory et al. (2015). The Community Interpreter - An International Textbook. Culture & Language Press, 1. ed., tradução nossa)14 14 Original: A bilingual or multilingual individual who is deemed professionally qualifed to interpret in community service settings , pressupõe-se que aquele que fornece a assistência linguística fortuitamente ‒ amigo, parente, ou pessoa que também aguarda um atendimento e possui proficiência na língua do país ‒, ainda que ocorra em instituições que oferecem serviços, não deve ser considerado como tal. Esse pressuposto se afilia à importância da qualificação para a prestação do serviço de interpretação comunitária.

Para buscar definir como a assistência linguística deve comparecer no âmbito da DPU em adequação com as especificidades das suas demandas, foi também preciso entender os desdobramentos da vocação da instituição de resguarda dos direitos humanos por meio do sistema de assistência jurídica. No Brasil, a justiça gratuita, ainda que implantada com a Lei n. 1.060, em 1950, foi consagrada somente em 1988 pela nova Constituição que trouxe, no título de direitos e garantias fundamentais, em seu artigo 5º, inciso LXXIV, a obrigação de o Estado, sem a qual a função jurisdicional não pode funcionar, prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovem insuficiência de recursos, destinando uma seção à Defensoria Pública a quem deu o status de

[...] instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados [...] (BRASIL, 1988BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2020]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 22 jan. 2020.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/con...
).

Assim, pela primeira vez, uma constituição brasileira garante a assistência aos necessitados por uma instituição própria responsável por prestá-la. A Defensoria ganha então protagonismo enquanto espaço de expressão que possibilita a garantia dos direitos humanos. Partindo dessa prerrogativa e da evidência de que é por meio da língua que se invocam direitos, a instituição passa a enfrentar os desafios, linguísticos e culturais, de prover uma assistência a pessoas eventualmente com baixa ou nenhuma proficiência em português, sejam eles migrantes, indígenas, pessoas com deficiências, entre outros grupos vulneráveis.

Hoje, essa necessidade tem se manifestado nos depoimentos dos próprios agentes que enfrentam na pele os desafios quotidianos da assistência a grupos linguisticamente heterogêneos. Ao perceberem que só podem assegurála se instrumentalizados jurisdicionalmente pela instituição, reivindicam recursos como a intervenção de tradutores e intérpretes comunitários, enquanto instrumentos de expressão e garantia de presença linguística. Ainda assim, permanece uma função desconsiderada, e quando levada em conta, com caráter de subalternidade. Lamentavelmente, percebe-se que o fato de não usufruir do mesmo status da interpretação em contextos de conferência revela que a Interpretação Comunitária é desprestigiada por beneficiar grupos marginalizados e estigmatizados pela sociedade.

Se a sociedade como um todo tem muito a ganhar na restauração dessa consciência, as instituições também precisam tirar partido da diversidade cultural e linguística que caracteriza a paisagem social brasileira, o que só pode se efetivar por meio de mecanismos de reparação das desigualdades, inclusive linguísticas. Esse papel não pode ser atribuído a um único agente, a exemplo do que poderia se esperar do tradutor/intérprete, que também é movido por suas subjetividades, seus preconceitos e suas representações dessas diferenças (FRIAS, 2016FRIAS, Jose Yuste. (2016). Por una comunicación transcultural en los servicios públicos de traducción e interpretación. In: FERREIRO VÁZQUEZ, Óscar. Traducir e interpretar lo público. Granada: Editorial Comares.). Ele pode, sim, contribuir para apaziguar tensões e criar relações. Porém, a defesa dos direitos linguísticos é uma atribuição das próprias instituições e de toda a sociedade. Para além da intervenção top-down do Estado, os eventuais conflitos linguísticos e culturais que emergem da interação acabam sendo negociados pelos próprios falantes na busca por participação e reconhecimento social.

  • 1
    Enquanto, em 2010, o Censo Demográfico apontava portugueses e japoneses como os estrangeiros mais numerosos no país, em 2020, haitianos e venezuelanos tornaram-se parte majoritária dos migrantes em território brasileiro. Essa predominância encontra explicação tanto na crise política, socioeconômica, sanitária e climática no Haiti, desencadeada em 2010, como no conflito sociopolítico da Venezuela a partir de 2018 (OBMigra, 2021OBSERVATÓRIO DAS MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS [OBMigra]. (2021). Imigração e refúgio no Brasil: retratos da década de 2010. Brasília, DF: OBMigra. Disponível em: https://portaldeimigracao.mj.gov.br/pt/dados/relatorios-a. Acesso em: 28 mar. 2022.
    https://portaldeimigracao.mj.gov.br/pt/d...
    ).
  • 2
    Mais uma vez, esse serviço tem sido implementando por meio da parceria da instituição com a UnB, especialmente com o projeto de pesquisa MOBILANG do Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução, que, desde 2019, já havia criado e nutria um banco de intérpretes voluntários, atuando principalmente em entrevistas de solicitação de refúgio realizadas pelo Comitê Nacional para os Refugiados – Conare. Disponível em: http://www.mobilang.unb.br/index.php?option=com_content&view=article&id=75&Itemid=710. Acesso em: 18 jan. 2022.
  • 3
    O Projeto de Lei n. 5.182, proposto por um grupo de pesquisadores e profissionais, foi acolhido, em novembro de 2020, pelo Senador Paulo Paim (PT), então Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, e atualmente tramita no Congresso Nacional. https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/145443
  • 4
    Firmado durante o evento Traduzir-nos: idiomas e linguagens na defesa de direitos, no dia 28 de agosto de 2019. Disponível em: https://www.dpu.def.br/noticias-institucional/233-slideshow/52692-dpu-firma-parceria-com-a-unb-para-traducao-em-cooperacao-internacional. Acesso em: 5 fev. 2022.
  • 5
    Especificamente, o Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística – IPOL (http://ipol.org.br/); o TRF3 e a Escola dos Escola de Magistrados da Justiça Federal da 3ª Região (https://www.trf3.jus.br/carta-servicos/escola-de-magistrados). Acesso em: 3 mar. 2022.
  • 6
    As capacitações realizadas reuniram um total de 213 inscritos provenientes de 24 instituições nacionais e internacionais. Os cursos capacitaram voluntários de 14 línguas diferentes para atuarem como intérpretes. Os resultados da realização dos dois cursos foram organizados pela CTRAD, pela autora deste trabalho, e apresentados pela Profª. Drª. Sabine Gorovitz durante o webinário A Definição de Ombudsman e a Promoção dos Direitos Humanos, no dia 06 de julho (WEBINÁRIO, 2021WEBINÁRIO. (2021). A Definição de Ombudsman e a Promoção dos Direitos Humanos (6 de julho) [S. l.: s. n.]. 1 vídeo (3 h 37 min). Publicado pelo canal Escola Nacional da DPU. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HEUQuScdynQ. Acesso em 12 set. 2021.
    https://www.youtube.com/watch?v=HEUQuScd...
    ). Além disso, as trocas de conhecimentos e saberes vivenciadas durante as duas edições do curso resultaram em um produto cultural Flor e Ser: Mediação linguística como garantia de direitos, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=AGhHDruoqWA. Tendo a responsabilidade do gerenciamento do banco, a Coordenação de Tradução trabalha atualmente na elaboração de materiais informativos e administrativos para a organização do serviço de interpretação e estuda a possibilidade de expansão posterior do serviço às outras unidades da DPU pelo Brasil.
  • 7
    Original: The capacity of each party in an encounter to be responsible for and in control of his or her own communication.
  • 8
    Original: excluir al migrante del espacio público o segregarlo en un gueto.
  • 9
    Original : Il reflète la complexité d’une société, dont les institutions et le vocabulaire sont l’expression d’une culture parfois multimillénaire.
  • 10
    O termo “assistido” é usado no âmbito da DPU para designar as pessoas hipossuficientes, vulnerabilizadas, que recebem assistência da instituição e, não fosse isso, seria adotado, nesta pesquisa, outro termo não-estigmatizante.
  • 11
    Legalmente reconhecidas como uma “reprodução fiel do original” (AUBERT, 1998AUBERT, Francis Henrik. (1998). Tipologia e procedimentos da Tradução Juramentada. Teoria, legislação, modelos e exercícios práticos. São Paulo: Centro Interdepartamental de Tradução e Terminologia/FFLCH apud ROMÃO (2015)., apud ROMÃO, 2015, p. 148ROMÃO, Tito Lívio Cruz. (2015). Editais de concursos públicos para provimento de TPIC: algumas considerações teórico-práticas sobre a situação brasileira. Cadernos de Terminologia e Tradução: Temas de Tradução Juramentada II, p. 143-165.), só podem ser realizadas por um tradutor público, aprovado em concurso público e que assume o papel de agente do Estado. No Brasil, cujo título do ofício é Tradutor e Intérprete público, esse agente é regido pela nova lei n. 14.195, de 26 de agosto de 2021, que revogou o Decreto-Lei nº 13.609, de 1943, que regia o ofício até então (PIETROLUONGO; CARNEIRO, 2017PIETROLUONGO, Márcia Atalla; CARNEIRO, Teresa Dias. (2017). Tradução juramentada, segurança jurídica e formação do tradutor público. Domínios de Lingu@gem, Uberlândia, v. 11, n. 5, p. 1685-1706.).
  • 12
    Original: […] la traduction juridique ne saurait jamais être rigoureusement exacte. C’est une opération approximative, dont il convient d’apprécier la marge d’erreur. En somme, une traduction juridique constitue une simple présomption, que les intéressés doivent toujours pouvoir contester en se référant au texte authentique.
  • 13
    A pesquisa foi realizada com a ferramenta Formulários Google e, após chancela da Chefe de Gabinete do Defensor Público Geral Federal, Aline Papazis, enviada às unidades da DPU. O formulário foi enviado às seguintes unidades DPU: ABC Paulista/SP, Altamira/PA, Aracaju/SE, Arapiraca/AL, Bagé/RS, Baixada Fluminense/RJ, Belém/PA, Belo Horizonte/MG, Boa Vista/RR, Brasília – 1ª Categoria, Brasília – 2ª Categoria, Cáceres/MT, Campina Grande/PB, Campinas/SP, Campo Grande/MS, Canoas/RS, Caruaru/PE, Cascavel/PR, Cidade do Rio De Janeiro – 2ª Categoria, Criciúma/SC, Cuiabá/MT, Curitiba – 1ª Categoria, Curitiba – 2ª Categoria, Dourados/MS, Feira de Santana/ BA, Florianópolis/SC, Fortaleza/CE, Foz do Iguaçu/PR, Goiânia / Aparecida De Goiânia, Governador Valadares/MG, Guarulhos/SP, Jales/ S P, João Pessoa/PB, Joinville/SC, Juiz De Fora/MG, Linhares/ES, Londrina/PR, Macapá/AP, Maceió/AL, Manaus/AM, Mogi das Cruzes/SP, Montes Claros/MG, Mossoró/RN, Natal/RN, Niterói, São Gonçalo e Itaboraí/RJ, Osasco/SP, Pelotas/RS, Petrolina/PE e Juazeiro/BA, Porto Alegre – 1ª Categoria, Porto Alegre – 2ª Categoria, Porto Velho/RO, Recife/PE, Registro/SP, Ribeirão Preto/SP, Rio Branco/AC, Rio de Janeiro – 1ª Categoria, Rio Grande/RS, Rondonópolis/MT, Salvador/BA, Santa Maria/RS, Santarém/PA, Santos e São Vicente/SP, São José dos Campos/SP, São Luís/MA, São Paulo – Capital, Sobral/CE, Sorocaba/SP, Teresina/PI, Uberlândia/MG, Umuarama/PR, Uruguaiana/RS, Vitória da Conquista/BA, Vitória/ES, Volta Redonda/RJ. Responderam à pesquisa as unidades: Aracaju/SE, Bagé/RS, Belém/PA, Campinas/ S P, Canoas/RS, Criciúma/SC, Campo Grande/MS, Caruaru/PE, Cuiabá/MT, Porto Alegre (a categoria não foi identificada), Joinville/SC, Petrolina/PE e Juazeiro/BA, Rio Branco/AC, Rio de Janeiro, Maceió/AL, ABC Paulista/SP, Altamira/PA, Brasília – 1ª Categoria, Brasília – 2ª Categoria, RS – 1ª categoria, Florianópolis/SC, Foz do Iguaçu/PR, Guarulhos/SP, Linhares/ES, Macapá/AP, Pelotas/RS, Registro/SP, Rio Grande/RS, Boa Vista/RR, Santarém/PA, Santos e São Vicente/SP, São José dos Campos/SP, São Paulo – Capital, Sobral/CE.
  • 14
    Original: A bilingual or multilingual individual who is deemed professionally qualifed to interpret in community service settings
  • DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS DA PESQUISA

    Os questionários aplicados ainda não estão acessíveis, pois ainda estão sendo tratados. Os documentos que embasaram a pesquisa estão disponíveis no site da Defensoria Pública da União, no link: https://promocaodedireitoshumanos.dpu.def.br/assessoria-internacional-aint/

REFERÊNCIAS

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  • AUBERT, Francis Henrik. (1998). Tipologia e procedimentos da Tradução Juramentada. Teoria, legislação, modelos e exercícios práticos São Paulo: Centro Interdepartamental de Tradução e Terminologia/FFLCH apud ROMÃO (2015).
  • BANCROFT, Marjory et al. (2015). The Community Interpreter - An International Textbook. Culture & Language Press, 1. ed.
  • BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 Brasília, DF: Presidência da República, [2020]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm Acesso em: 22 jan. 2020.
    » http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
  • BRASIL. [LC 80 (1994)]. Lei complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994 Organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2009]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp80.htm Acesso em: 8 jul. 2021.
    » http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp80.htm
  • DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2019). Portaria CAJI DPGU nº 2, de 20 de agosto de 2019. Dispõe sobre a criação do Núcleo de Tradução – NuTrad para atendimento de demandas tradutórias da DPU. Boletim Eletrônico interno da DPU, 176 ed. Brasília, DF, 21 agosto de 2019.
  • DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2020). Assistência jurídica integral e gratuita no Brasil: Um panorama da atuação da Defensoria Pública da União 4. ed. Brasília: DPU, 2020.
  • DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2021). Internacional. Site DPU, Brasília. Disponível em: https://www.dpu.def.br/internacional Acesso em: 04 ago. 2021.
    » https://www.dpu.def.br/internacional
  • DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO & INSTITUTO DE INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO EM POLÍTICA LINGUÍSTICA. (2021). Nota Técnica n. 8 – DPGU/DNDH: Conscientização do direito humano à diversidade linguística e formas de compensação pela história de repressão linguística no Brasil desde o início do processo de colonização. Brasília: DPU, 2021.
  • DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. (2022). Resolução nº 202, de 8 de julho de 2022 Dispõe sobre o Regimento Interno da Defensoria Pública-Geral da União. Brasília: Defensoria Pública da União, 2022. Disponível em: https://www.dpu.def.br/resolucoes/69662-resolucao-n-202-de-08-de-julho-de-2022-dispoe-sobre-o-regimento-interno-da-defensoria-publica-geral-da-uniao Acesso em 25 ago. 2022.
    » https://www.dpu.def.br/resolucoes/69662-resolucao-n-202-de-08-de-julho-de-2022-dispoe-sobre-o-regimento-interno-da-defensoria-publica-geral-da-uniao
  • DPU e UnB realizam nova etapa do curso de interpretação online. (2020). Defensoria Pública da União, Brasília, abr. 2020. Disponível em https://www.dpu.def.br/noticias-institucional/233-slideshow/56631-dpu-e-unb-realizam-nova-etapa-do-curso-de-interpretacao-online Acesso em: 14 ago. 2021.
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Disponibilidade de dados

Os questionários aplicados ainda não estão acessíveis, pois ainda estão sendo tratados. Os documentos que embasaram a pesquisa estão disponíveis no site da Defensoria Pública da União, no link: https://promocaodedireitoshumanos.dpu.def.br/assessoria-internacional-aint/

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    09 Maio 2022
  • Aceito
    05 Out 2022
  • Publicado
    11 Out 2022
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