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A PESQUISA NARRATIVA VISUAL E O ESTUDO DA IDENTIDADE DO PROFESSOR DE LÍNGUA INGLESA

VISUAL NARRATIVE INQUIRY AND THE STUDY OF ENGLISH TEACHERS’ IDENTITY

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo discutir o valor de métodos visuais em estudos de cunho narrativo desenvolvidos dentro do escopo da Linguística Aplicada. Há um crescente interesse em métodos visuais na área como forma de melhor entender as experiências de participantes de pesquisa. Valemo-nos de nossas próprias experiências de uso métodos visuais, tais como o desenho e a linha do tempo, em estudos narrativos sobre a identidade do professor de língua inglesa. Trata-se, portanto, de uma pesquisa narrativa sobre o fazer pesquisa narrativa visual: compomos sentidos sobre esse processo, e discutimos o valor de abordagens narrativo-visuais a partir de nossas vivências e de reflexões desenvolvidas em outros estudos. Os valores formativo, empírico e analítico de métodos visuais em pesquisas narrativas são explorados. Concluímos ressaltando o potencial de métodos visuais enquanto ferramenta de reflexão, e recurso para se acessar as narrativas de experiência de participantes e identificar temas e enredos nelas articulados.

Palavras-chave:
pesquisa narrativa; métodos visuais; identidade do professor de línguas

ABSTRACT

This paper aims to discuss the value of visual methods in narrative studies developed under the scope of Applied Linguistics. There is a growing interest in visual methods in the area as a way of better understanding research participants’ experiences. We draw on our own experiences of using visual methods, such as the drawing and the timeline, in narrative studies focusing on English teachers’ identity. It is, therefore, a narrative inquiry on conducting visual narrative research: we compose meanings about this process, and discuss the value of visual narrative approaches based on our experiences and reflections developed in other studies. The formative, empirical and analytical value of visual methods is explored. We conclude highlighting visual methods’ potential as a tool for reflection, and as a resource for accessing participants’ narratives of experience and identifying themes and threads articulated in them.

Keywords:
narrative inquiry; visual methods; language teacher identiy

INTRODUÇÃO

“We know more than we can tell”

(Polanyi, 1966POLANYI, M. (1966). The tacit dimension. Gloucester, MA: Peter Smith Publisher., p. 4)

Enquanto seres humanos, fazemos uso de várias formas artísticas para nos comunicar. Expressamos conhecimentos, experiências e emoções valendo-se delas, por meio de linguagem verbal ou não verbal, em poemas escritos ou pinturas, por exemplo. Imagens como fotografias e desenhos, podem, inclusive, expressar o que é difícil colocar em palavras. Podem também “apresentar múltiplos pontos de vista simultaneamente ou gerar múltiplas interpretações, e chamar a atenção para questões do cotidiano ao causar estranhamento ou apontar novas perspectivas” (WEBER, 2008WEBER, S. (2008). Using visual images in research. In: Knowles, J.G.; Cole, A.L. (orgs.), Handbook of the arts in qualitative research: Perspectives, methodologies, examples, and issues. London: Sage, p. 41-53., p. 50). Explorar esse tipo de representação em iniciativas de pesquisa nos permite reconhecer, conforme ressalta Eisner (2008EISNER, E. (2008). Art and knowledge. In Knowles, J.G.; Cole, A. L. (orgs.), Handbook of the arts in qualitative research: perspectives, methodologies, examples, and issues. London: Sage, p. 3-12., p. 5), que “o conhecimento se materializa de diversas formas [e] que suas formas de produção se diferenciam”.

Há um crescente interesse em métodos visuais na Linguística Aplicada (doravante LA), determinado pela valorização do papel da multissemiose na compreensão das experiências de indivíduos (MELO-PFEIFER; KALAJA, 2019MELO-PFEIFER, S.; KALAJA, P. (2019). Conclusion; lessons learnt with and through visual narratives of multilingualism as lived, and research agenda. In: Kalaja, P.; Melo-pfeifer, S. (orgs.), Visualising multilingual lives: More than words. Bristol, UK: Multilingual Matters, p. 275-284.). Uma série de publicações marcam esse interesse. Dentre elas, estão dossiês temáticos em revistas, como os da Applied Linguistics Review (KALAJA; PITKÄNEN-HUHTA, 2018KALAJA, P.; PITKÄNEN-HUHTA, A. (orgs.) (2018). ALR special issue: Visual methods in applied language studies. Applied Linguistics Review, v. 9, n. 2-3, p. 157-449.) e da Revista X (MELO-PFEIFER et al., 2021MELO-PFEIFER, S. et al. (orgs.) (2021). Dossiê temático: Métodos visuais na investigação com públicos plurilíngues. Revista X, v. 16, n. 2, p. 319-647.), e dissertações e teses (BRANDÃO, 2017aBRANDÃO, A. C. L. (2017a). Designing and implementing language teaching materials: Composing an EFL teacher identity. Tese de doutorado em Linguística Aplicada. Department of Applied Linguistics and Communication, Birkbeck, University of London, Londres.; SANTOS, 2018SANTOS, S. L. C. (2018). Crenças de alunos sobre ensino e aprendizagem de espanhol. Dissertação de Mestrado em Letras. Departamento de Letras, UFV, Viçosa.; SILVA, 2018SILVA, J. B. M. (2018). Vozes apaixonadas pelo ensino de inglês: A construção da identidade de professores em formação inicial. Dissertação de Mestrado em Letras. Departamento de Letras, UFV, Viçosa.) contemplando o uso de métodos visuais (desenhos, fotografias, etc.). Há ainda livros compilando diversas experiências de pesquisa com materiais visuais, como Plurilinguismo vivido, plurilinguismo desenhado: Estudos sobre a relação dos sujeitos com as línguas (MELO-PFEIFER; SIMÕES, 2017MELO-PFEIFER, S.; SIMÕES, A. R. (orgs.) (2017). Plurilinguismo vivido, plurilinguismo desenhado: Estudos sobre a relação dos sujeitos com as línguas. Santarém, Portugal: Instituto Politécnico de Santarém. Disponível em: https://blogs.ua.pt/cidtff/wp-content/uploads/2017/11/livro_metodos_visuais_v3.pdf . Acesso em: 20 jul. 2021.
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), e Visualising multilingual lives: More than words (KALAJA; MELO-PFEIFER, 2019KALAJA, P.; MELO-PFEIFER, S. (orgs.) (2019). Visualising multilingual lives: More than words. Bristol, UK: Multilingual Matters.).

A utilização de métodos visuais em pesquisas realizadas dentro do escopo da LA propõe desafios como o de estabelecer procedimentos de análise que culminem na interpretação de elementos não verbais. Essa utilização nos oferece também possibilidades como as de “ver como um participante vê e sentir” (RIESSMAN, 2008RIESSMAN, C. K. (2008). Narrative methods for the human sciences. Thousand Oaks, CA: Sage., p. 142). Em pesquisas que têm como foco narrativas de experiência, os métodos visuais nos permitem, assim, acessar outras camadas de sentido (BACH, 2007BACH, H. (2007). Composing a visual narrative inquiry. In: Clandinin, D. J. (org.), Handbook of Narrative Inquiry: Mapping a Methodology. Thousand Oaks, CA: Sage, p. 280-307.; SHERIDAN; CHAMBERLAIN; DUPUIS, 2011SHERIDAN, J.; CHAMBERLAIN, K.; DUPUIS, A. (2011). Timelining: Visualizing experience. Qualitative Research, v. 11, n. 5, p. 552-569.).

Neste artigo, exploramos os desafios que vivenciamos e as possiblidades que vislumbramos ao desenvolvermos pesquisas narrativas com imagens produzidas por professores de inglês. O objetivo é discutir o valor de métodos visuais em pesquisas de cunho narrativo na LA. Para essa discussão, valemo-nos, portanto, de nossas próprias experiências de uso de imagens, tais como o desenho e a linha do tempo, em estudos narrativos envolvendo a identidade do professor de língua inglesa.

Há trabalhos como os de Kalaja, Dufva e Alanen (2013)KALAJA, P.; DUFVA, H.; ALANEN, R. (2013). Experimenting with visual narratives. In: Barkhuizen, G. (org.), Narrative Research in Applied Linguistics Cambridge: Cambridge University Press, p. 105-131. e Brandão (2017b)BRANDÃO, A. C. L. (2017b). Explorando o visual de uma profissão: Histórias de uma professora de línguas pré-serviço em contexto brasileiro. In: Melo-Pfeifer, S.; Simões, A. R. (orgs.), Plurilinguismo vivido, plurilinguismo desenhado: Estudos sobre a relação dos sujeitos com as línguas. Santarém, Portugal: Instituto Politécnico de Santarém. Disponível em: https://blogs.ua.pt/cidtff/wp-content/uploads/2017/11/livro_metodos_visuais_v3.pdf . Acesso em: 20 jul. 2021.
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, cujo foco é o delineamento metodológico de pesquisas que se valem de imagens na LA. Mas ainda são poucos os trabalhos na área que ilustram questões metodológicas relacionadas à inclusão de materiais visuais como instrumentos de geração de dados, como faz o presente artigo. Acreditamos que podemos contribuir nesse sentido: abordando o valor e as potencialidades dos métodos visuais, e questões práticas sobre o fazer pesquisa narrativa visual em LA, especialmente, no contexto da pesquisa sobre formação de professores de línguas adicionais.

Além desta introdução, o artigo conta com quatro seções. Na primeira seção, apresentamos considerações sobre a pesquisa narrativa visual. Na segunda, abordamos as concepções teórico-metodológicas que nortearam nossas experiências de pesquisa com materiais visuais. Na terceira, partilhamos essas experiências em três subseções, uma para cada pesquisadora. Na quarta e última, seção, ilustramos o valor da pesquisa narrativa visual, trazendo uma releitura de nossas experiências pautada em reflexões sobre métodos visuais realizadas em outros trabalhos.

1. A PESQUISA NARRATIVA VISUAL

Para tratarmos sobre pesquisa narrativa visual, precisamos discorrer sobre a virada narrativa que vem marcando a pesquisa em LA. Estudos explorando o discurso construído em narrativas, bem como o seu papel na vida em sociedade, e em processos de constituição/negociação identitária compõem essa virada (Cf. BASTOS; BIAR, 2015BASTOS, L. C.; BIAR, L. A. (2015). Análise de narrativa e práticas de entendimento da vida social. DELTA: Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada, v. 31, p. 97-126.; DE FINA, 2013DE FINA, A. (2013). Narratives as practices: Negotiating identities through storytelling. In: Barkhuizen, G. (org.), Narrative Research in Applied Linguistics Cambridge: Cambridge University Press, p. 154-175.; RIBEIRO; BASTOS, 2005RIBEIRO, B. T.; BASTOS, L. C. (2005). Telling stories in two psychiatric interviews: A discussion on frame and narrative. AILA Review, v. 18, n. 1, p. 58-75.). Também compõem essa virada estudos que se valem de histórias de vida como recurso para “compreender os universos mentais internos de professores de línguas e aprendizes, e a natureza do ensino-aprendizagem de línguas enquanto atividade social e educacional” (BARKHUIZEN; BENSON; CHIK, 2014BARKHUIZEN, G.; BENSON, P.; CHIK, A. (2014). Narrative inquiry in language teaching and learning research. New York: Routledge., p. 2).

O uso de abordagens narrativas tem se tornado cada vez mais recorrente em pesquisas cujo foco são questões relacionadas ao ensino-aprendizagem de línguas, temática de nosso interesse neste artigo (Cf. BARKHUIZEN, 2013BARKHUIZEN, G. (org.) (2013). Narrative research in applied linguistics. Cambridge: Cambridge University Press.; GOMES JÚNIOR, 2020GOMES JÚNIOR, R. C. (org.). Pesquisa narrativa: Histórias sobre ensinar e aprender línguas. São Paulo: Pimenta Cultural, 2020.; KALAJA; PAIVA; BARCELOS, 2008KALAJA, P.; PAIVA, V. L. M. O.; BARCELOS, A. M. F. (orgs.) (2008). Narratives of learning and teaching EFL. Basingstoke: Palgrave Macmillan.). Isso porque, conforme ressaltam Barkhuizen, Benson e Chik (2014, p. 5)BARKHUIZEN, G.; BENSON, P.; CHIK, A. (2014). Narrative inquiry in language teaching and learning research. New York: Routledge., esse tipo de abordagem “nos ajuda a entender como professores e aprendizes de línguas organizam suas experiências e identidades e as representam para si mesmos e os outros”, além de nos dar acesso às suas perspectivas sobre ensinar e aprender línguas. A pesquisa narrativa na LA se configura como uma maneira de ouvir e dialogar com professores e alunos de línguas. Constitui-se, também, como uma forma de viabilizar reflexões e aprendizagens a partir da narrativa de experiências vivenciadas em contextos de ensino-aprendizagem de línguas - tanto para os pesquisadores quanto para os próprios participantes de pesquisa.

Em linhas gerais, a pesquisa narrativa é concebida como qualquer abordagem metodológica que se vale do uso de histórias de vida/narrativas de experiência. Essas narrativas podem ser orais (como as produzidas em uma entrevista gravada), escritas (como as produzidas em diários reflexivos escritos) e visuais (como as produzidas em desenhos). Podem ainda ser multimodais ao combinarem diversos modos semióticos, como textos escritos, imagens, vídeos e sons (Cf. PAIVA; GOMES JÚNIOR, 2019PAIVA, V. L. M. O.; GOMES JÚNIOR, R. C. (2019). Multimodal language learning histories: Images telling stories. In Kalaja, P.; Melo-Pfeifer, S. (orgs.), Visualising multilingual lives: More than words. Bristol, UK: Multilingual Matters, p. 151-172.). Há diferentes abordagens de pesquisa narrativa: algumas têm como foco maior o sentido, outras a forma (Cf. LIEBLICH; TUVAL-MASHIACH; ZILBER, 1998LIEBLICH, A; TUVAL-MASHIACH, R.; ZILBER, T. (1998). Narrative research: Reading, analysis and interpretation. Thousand Oaks, CA: Sage.); algumas usam a narrativa apenas como fonte de dados, outras como ferramenta para compor sentidos sobre as experiências dos participantes e representá-los (Cf. BARCELOS, 2020BARCELOS, A. M. F. (2020). Compreendendo a pesquisa (de) narrativa. In: Gomes Júnior, R.C. (org.), Pesquisa narrativa: Histórias sobre ensinar e aprender línguas. São Paulo: Pimenta Cultural, 2020, p. 17-37.; BARKHUIZEN; BENSON; CHIK, 2014BARKHUIZEN, G.; BENSON, P.; CHIK, A. (2014). Narrative inquiry in language teaching and learning research. New York: Routledge.; POLKINGHORNE, 1995POLKINGHORNE, D. E. (1995). Narrative configuration in qualitative analysis. International Journal of Qualitative Studies in Education, v. 8, n. 1, 5-23.). Na pesquisa narrativa segundo Clandinin e Connelly (2000)CLANDININ, D. J.; CONNELLY, F. M. (2000). Narrative inquiry: Experience and story in qualitative research. San Francisco, CA: Jossey-Bass., por exemplo, a narrativa se constitui, ao mesmo tempo, como fenômeno de estudo (as histórias que os participantes contam sobre suas experiências) e metodologia (uma forma de entender a experiência narrada pelos participantes).

A pesquisa narrativa visual, por sua vez, é entendida como qualquer abordagem de cunho narrativo que se vale do uso de algum tipo de material visual (desenhos, fotografias, colagens, diagramas, etc.). Segundo Kress e Van Leeuwen (2006KRESS, G.; VAN LEEUWEN, T. (2006). Reading images: The grammar of visual design. 2. ed. London: Routledge., p. 79), imagens podem articular estruturas “tanto narrativas, contemplando ações e eventos, processos de mudança e disposições espaciais transitórias, quanto conceituais, representando os participantes em termos de sua essência mais generalizada, e mais ou menos duradoura e estável”. Imagens no contexto de uma pesquisa narrativa se constituem, portanto, como narrativas visuais, por meio das quais os participantes dividem suas experiências. Nessa perspectiva, “as imagens contam histórias”, proporcionando a participantes, como professores de línguas, oportunidades de “sintetizar, refletir e falar sobre seu próprio processo de (re)constituição identitária” (BRANDÃO, 2018BRANDÃO, A. C. L. (2018). Visualizing EFL teacher identity (re)construction in materials design and implementation. Applied Linguistics Review, v. 9, n. 2-3, p. 249-271., p. 268). Desenhos, por exemplo, podem ajudá-los a “expressar suas experiências, dilemas e dificuldades de maneira holística, e entender de forma criativa quem estão se tornando” (BRANDÃO, 2019BRANDÃO, A. C. L. (2019). Imagining second language teaching in Brazil: What stories do student teachers draw? In: Kalaja, P.; Melo-Pfeifer, S. (orgs.), Visualising multingual lives: More than words. Bristol, UK: Multingual Matters, 2019, p. 197-213., p. 210). Ademais, os métodos visuais são recursos úteis para comunicar emoções e impressões sobre questões difíceis de se verbalizar (BAGNOLI, 2009BAGNOLI, A. (2009). Beyond the standard interview: The use of graphic elicitation and arts-based methods. Qualitative Research, v. 9, n. 5, p. 547-570.; KEATS, 2009KEATS, P. A. (2009). Multiple text analysis in narrative research: Visual, written, and spoken stories of experience. Qualitative Research, v. 9, n. 2, p. 181-195.; WEBER, 2008WEBER, S. (2008). Using visual images in research. In: Knowles, J.G.; Cole, A.L. (orgs.), Handbook of the arts in qualitative research: Perspectives, methodologies, examples, and issues. London: Sage, p. 41-53.).

A interpretação de imagens não requer “seu tipo próprio de análise, (...) [este] depende mais das crenças epistemológicas e afiliações disciplinares do pesquisador, bem como do tipo e da riqueza do material a ser analisado” (HOLM; SAHLSTRÖM; ZILLIACUS, 2019HOLM, G.; SAHLSTRÖM, F.; ZILLIACUS, H. (2019). Arts-based visual research. In: Leavy, P. (org.), Handbook of arts-based research. New York: The Guilford Press, p. 311-335., p. 327). Em nosso caso, o fazemos a partir de nossa afiliação a abordagens de cunho narrativo, as quais entendem as histórias que participantes contam sobre suas experiências como uma forma de educar aos outros e a nós mesmos (CLANDININ 2013CLANDININ, D. J. (2013). Engaging in narrative inquiry. Walnut Creek, CA: Left Coast Press.; CLANDININ; CONNELLY, 2000CLANDININ, D. J.; CONNELLY, F. M. (2000). Narrative inquiry: Experience and story in qualitative research. San Francisco, CA: Jossey-Bass.). O processo de análise em pesquisas narrativas envolve, conforme destacam Lieblich, Tuval- Mashiach e Zilber (1998, p. 10), “uma escuta dialógica (Bakhtin, 1981) a três vozes (pelo menos): a voz do narrador, representada pela fita ou pelo texto; o referencial teórico, que fornece conceitos e ferramentas para interpretação; e um monitoramento reflexivo do ato de ler e interpretar”. Acrescentamos que a voz do narrador também pode ser “ouvida” em imagens.

Perspectivas de cunho narrativo, de modo geral, atentam-se a diferentes níveis de narrativa: as histórias que participantes contam; os relatos interpretativos de um pesquisador; e a narrativa construída por um leitor a partir de seu contato com essas histórias e interpretações (RIESSMAN, 2008RIESSMAN, C. K. (2008). Narrative methods for the human sciences. Thousand Oaks, CA: Sage.). Consequentemente, contemplam diferentes níveis de composição de sentidos: os sentidos que participantes compõem sobre uma determinada experiência, os quais são narrados ao pesquisador (de forma escrita, visual, etc.); os sentidos que o pesquisador compõe sobre essa narrativa, que são, por sua vez, situados diante das discussões teóricas de sua área; e, em abordagens narrativas que estimulam o envolvimento de participantes de pesquisa no processo de análise (Cf. CLANDININ 2013CLANDININ, D. J. (2013). Engaging in narrative inquiry. Walnut Creek, CA: Left Coast Press.; CLANDININ; CONNELLY, 2000CLANDININ, D. J.; CONNELLY, F. M. (2000). Narrative inquiry: Experience and story in qualitative research. San Francisco, CA: Jossey-Bass.), os sentidos que participantes compõem a partir daqueles compostos pelo pesquisador.

Materiais visuais em estudos de cunho narrativo também precisam ser interpretados, pois, conforme ressalta Riessman (2008RIESSMAN, C. K. (2008). Narrative methods for the human sciences. Thousand Oaks, CA: Sage., p.177), “assim como as narrativas orais e escritas, as imagens não falam por si só”. Nesse sentido, enquanto pesquisadoras narrativas visuais que investigam a identidade do professor de inglês, precisamos contemplar em nosso processo de análise questões como: Que histórias sobre ensinar e aprender línguas a imagem nos conta? Que histórias sobre ser professor de inglês a imagem nos conta? Como essas histórias nos ajudam, enquanto linguistas aplicadas, a entender o processo de se constituir como professor? Como o entendimento dessas histórias podem contribuir para se repensar, por exemplo, práticas de formação de professores de línguas adicionais e de pesquisa?

Linguistas aplicados, como Mäntylä e Kalaja (2019)MÄNTYLÄ, K.; KALAJA, P. (2019). ‘The class of my dreams’ as envisioned by student teachers of English: What is there to teach about the language? In: Kalaja, P.; Melo-Pfeifer, S. (orgs.), Visualising multilingual lives: More than words. Bristol, UK; Blue Ridge Summit, PA: Multilingual Matters, p. 254-274., têm se dedicado a compor sentidos sobre as histórias que professores de línguas representam em materiais visuais. As pesquisadoras discutem imagens (feitas à mão e no computador, na forma de desenhos e colagens) produzidas por futuros professores de inglês, contemplando a aula que imaginariam ministrar após seu processo de formação inicial. O estudo evidencia o potencial de métodos visuais para promover reflexões sobre o papel do docente de línguas adicionais e, consequentemente, sobre as histórias profissionais que professores em formação gostariam de vivenciar.

Brandão (2018)BRANDÃO, A. C. L. (2018). Visualizing EFL teacher identity (re)construction in materials design and implementation. Applied Linguistics Review, v. 9, n. 2-3, p. 249-271. explora o percurso de constituição identitária de uma professora de inglês em formação valendo-se de uma série de desenhos (autorretratos feitos à mão), produzidos ao longo de experiências de elaboração e aplicação de material didático. Os desenhos funcionam como registros visuais do processo de formação inicial: ilustram desafios vivenciados por professores em estágio de formação inicial, bem como aspectos do conhecimento docente e sua relação com o desenvolvimento de uma identidade profissional.

Pinho (2017)PINHO, A. S. (2017). Narrativas (visuais) na formação de professores: Olhares da investigação. In: Melo-Pfeifer, S.; Simões, A.R. (orgs.), Plurilinguismo vivido, plurilinguismo desenhado: Estudos sobre a relação dos sujeitos com as línguas. Santarém, Portugal: Instituto Politécnico de Santarém, p. 219-241. Disponível em: https://blogs.ua.pt/cidtff/wpcontent/uploads/2017/11/livro_metodos_visuais_v3.pdf . Acesso em: 20 jul. 2021.
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, por sua vez, discute a representação visual (em forma de desenho feito à mão) de uma metáfora contemplando o significado da docência, feita por uma futura professora de inglês. O estudo demonstra como as narrativas visuais podem auxiliar na reconfiguração de práticas de formação ao oferecerem a futuros professores oportunidades para dividir suas aspirações e experiências, e a formadores possiblidades de explorá-las.

Borg e colaboradoras (2014) analisam desenhos (à mão) de professores em formação representando uma aula de inglês bem sucedida no ensino primário. Além de ilustrarem crenças sobre ensino de línguas, os desenhos funcionam como uma poderosa ferramenta de reflexão sobre o processo de formação docente.

Aragão (2008)ARAGÃO, R. (2008). Emoções e pesquisa narrativa: Transformando experiências de aprendizagem. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, v. 8, n. 2, p. 295-320. explora representações visuais (desenhos à mão) de emoções envolvendo experiências de aprender inglês vivenciadas por suas alunas, professoras em formação, em uma disciplina do curso de Letras/Inglês. A pesquisa demonstra que os desenhos se constituem como oportunidades para que professores em formação projetem suas trajetórias profissionais, e para que formadores os auxiliem na construção de sua identidade docente. Estudos como os apresentados aqui ilustram o potencial de métodos visuais na pesquisa sobre formação de professores de línguas para se explorar questões relacionadas à identidade desses profissionais, tais como crenças e emoções. Ilustram também uma série de argumentos elencados por Weber (2008)WEBER, S. (2008). Using visual images in research. In: Knowles, J.G.; Cole, A.L. (orgs.), Handbook of the arts in qualitative research: Perspectives, methodologies, examples, and issues. London: Sage, p. 41-53. a favor do uso de imagens em pesquisas qualitativas: as possibilidades de capturar o inefável, comunicar experiências de maneira mais holística, evocar histórias, representar conhecimentos e sentimentos, sintetizar informações, e facilitar momentos de reflexão. Ilustram, sobretudo, os valores formativo (como ferramenta de reflexão), empírico (como fonte de dados) e analítico (como recurso para mapear temas de pesquisa) de métodos visuais (BORG et al., 2014BORG, S. et al. (2014). The impact of teacher education on pre-service primary English language teachers. ELT Research Papers 14.03. London: British Council.; BRANDÃO, 2021BRANDÃO, A. C. L. (2021). First experiences of teaching EFL in metaphors. Teaching and Teacher Education, v. 97, p. 1-11.).

Neste artigo, exploramos esses valores a partir de nossas próprias experiências de pesquisa. Antes explorálos, faz-se necessário, entretanto, apresentarmos uma visão geral de nossos percursos narrativo-visuais: as concepções de identidade docente, pesquisa narrativa e metodologia visual que os nortearam. Dedicamos a seção seguinte a essa apresentação.

2. OS NOSSOS PERCURSOS NARRATIVO-VISUAIS

As nossas pesquisas se aproximam em alguns pontos e se distanciam em outros. Começaremos abordando o que nos aproxima. Um de nossos pontos de aproximação ao explorarmos processos de constituição identitária de professores de inglês é o entendimento da identidade docente como uma construção narrativa. Embasamo-nos na definição de identidade profissional proposta por Connelly e Clandinin (1999CONNELLY, F. M.; CLANDININ, D. J. (orgs.) (1999). Shaping a professional identity: Stories of educational practice. New York: Teachers College Press., p. 4) como “as histórias pelas quais vivemos”. Nessa perspectiva, as identidades docentes são entendidas como:

múltiplas, evolutivas, mutáveis e contraditórias. Ao longo da vida, as histórias pelas quais vive um professor estão em curso, mudando à medida que novas situações são vivenciadas, que um novo conteúdo é ensinado, que novas crianças são encontradas, que novos colegas chegam, que novas políticas são postas em vigor, que a vida de um professor acontece na escola. Entretanto, as histórias pelas quais vive um professor também estão em curso, se transformando à medida que ele/ela encontra novos parceiros, tem e cria filhos, muda de status socioeconômico, perde pais, amigos, colegas, participa de grandes eventos sociopolíticos (CLANDININ; HUBER, 2005CLANDININ, D. J.; HUBER, M. (2005). Shifting stories to live by: Interweaving the personal and professional in teachers’ lives. In: Beijaard, D. et al. (orgs.), Teacher professional development in changing conditions. Dordrecht, The Netherlands: Springer, p. 43-59., p. 45).

Adotar uma abordagem narrativa de identidade significa compreender que as histórias que professores vivem tanto em contextos profissionais quanto pessoais informam o seu desenvolvimento enquanto docentes. Os contextos profissionais de um professor abarcam experiências vivenciadas, por exemplo, no exercício de sua docência e em cursos de formação continuada. Já os contextos pessoais envolvem experiências vivenciadas, por exemplo, no âmbito familiar e escolar (enquanto aprendizes). Ao nos pautarmos por uma concepção narrativa de identidade, entendemos também que “nos conhecemos ou nos descobrimos, e nos revelamos aos outros, por meio das histórias que contamos” (LIEBLICH; TUVAL-MASHIACH; ZILBER, 1998LIEBLICH, A; TUVAL-MASHIACH, R.; ZILBER, T. (1998). Narrative research: Reading, analysis and interpretation. Thousand Oaks, CA: Sage., p.7).

Outro ponto que nos aproxima é a adoção de uma perspectiva de análise narrativa do tipo holística com foco no conteúdo (LIEBLICH; TUVAL-MASHIACH; ZILBER, 1998LIEBLICH, A; TUVAL-MASHIACH, R.; ZILBER, T. (1998). Narrative research: Reading, analysis and interpretation. Thousand Oaks, CA: Sage.). Trata-se de uma abordagem que “se utiliza da história completa de um indivíduo e que tem como foco o conteúdo apresentado por ela” (1998, p. 13). Envolve processos de múltiplas leituras com o intuito de se identificar e acompanhar o desenrolar de temas e enredos que permeiam as narrativas de experiência de participantes.

Entretanto, nossos trabalhos se distanciam em relação ao formato de pesquisa narrativa desenvolvido. Polkinghorne (1995)POLKINGHORNE, D. E. (1995). Narrative configuration in qualitative analysis. International Journal of Qualitative Studies in Education, v. 8, n. 1, 5-23. estabelece uma distinção básica entre formatos de pesquisa narrativa: as que se utilizam das narrativas dos participantes enquanto dados, e as que se utilizam da narrativa também como uma forma de analisar dados e apresentar resultados (narrativa no sentido de storytelling). Essas duas vertentes equivalem a distinção apresentada por Barcelos (2020)BARCELOS, A. M. F. (2020). Compreendendo a pesquisa (de) narrativa. In: Gomes Júnior, R.C. (org.), Pesquisa narrativa: Histórias sobre ensinar e aprender línguas. São Paulo: Pimenta Cultural, 2020, p. 17-37. entre pesquisa com narrativas (que se vale da narrativa apenas como fonte de dados) e pesquisa narrativa (que se vale da narrativa também como uma forma de analisar dados e apresentar resultados). O trabalho com materiais visuais que eu, Ana, discuto neste artigo se constitui como uma pesquisa narrativa. Já os trabalhos que nós, Vanesa e Geralda, discutimos aqui se configuram como pesquisas com narrativas.

O estudo em que eu, Ana, me baseio para discutir o uso de materiais visuais explora a construção da identidade docente a partir de histórias de elaboração e aplicação de material didático de inglês vivenciadas em um projeto de formação inicial. Desenvolveu-se nos moldes da pesquisa narrativa segundo Clandinin e Connelly (2000)CLANDININ, D. J.; CONNELLY, F. M. (2000). Narrative inquiry: Experience and story in qualitative research. San Francisco, CA: Jossey-Bass., cujo foco é o estudo da experiência enquanto fenômeno historiado. Nessa abordagem, a experiência é entendida como uma construção narrativa e o pesquisador é também um participante de pesquisa. Em meu estudo, me constituí como participante enquanto professora formadora que atuava no projeto de formação inicial. A leitura holística com foco no conteúdo que fiz envolveu a identificação do que Clandinin e Connelly chamam de fios narrativos, enredos particulares que articulam tempo e lugar. Os resultados assumiram a forma de relatos narrativos (um para cada participante), estruturados pelos fios narrativos que emergiram ao longo do processo de análise.

Nós, Vanesa e Geralda, ao desenvolvermos pesquisas com narrativas, valemo-nos de uma leitura holística com foco no conteúdo para explorarmos temas relacionados à construção da identidade docente em narrativas contemplando nossos objetos de estudo: em meu caso, Vanesa, as experiências de ensino de inglês em escolas periféricas; e em meu caso, Geralda, as experiências de adaptação ao ensino bilíngue português/inglês. Em nossos estudos, os resultados foram estruturados em torno de temas identificados durante o processo de análise.

Julgamos relevante combinar metodologias narrativas e visuais para melhor compreendermos as histórias que as imagens produzidas por nossos participantes contavam. Adotamos a metodologia crítica visual proposta por Rose (2012ROSE, G. (2012). Visual methodologies: An introduction to researching with visual materials, 3. ed. London: Sage., 2016ROSE, G. (2016). Visual methodologies: An introduction to researching with visual materials, 4. ed. London: Sage.), cuja análise se pauta em esferas nas quais os sentidos de uma imagem são construídos: a da imagem em si (envolvendo elementos visuais e a maneira como são dispostos em uma imagem); a da produção (envolvendo as circunstâncias de produção de uma imagem); a da audiência (envolvendo a recepção de uma imagem por audiências particulares) e a da circulação (envolvendo a maneira como a circulação de uma imagem acontece).

Em meu estudo, eu, Ana, pedi para que minhas participantes se desenhassem ao final de nossas conversas gravadas sobre as experiências vivenciadas no projeto do qual participávamos: ao final das conversas, era solicitado a cada participante que produzisse e explicasse uma imagem a representando como professora de inglês. Quando a explicação sobre algum elemento visual não ficava clara, eu solicitava à participante que me apresentasse mais detalhes. Além das explicações gravadas, diários reflexivos escritos ao longo do projeto e as próprias conversas gravadas contextualizaram os desenhos. As narrativas foram coletadas de forma presencial. Pautei minha análise visual nas esferas da imagem em si e do contexto. Posteriormente, situei essa análise em relação à interpretação das contextualizações verbais dos desenhos (explicações gravadas, etc.).

Eu, Vanesa, pedi para que meus participantes produzissem um único desenho contemplando a experiência de lecionar inglês em escola periférica. O desenho foi contextualizado por materiais escritos: trajetórias profissionais dos participantes e explicações sobre a imagem. As explicações foram fornecidas de maneira escrita em descrições enviadas junto com os desenhos e em respostas a perguntas complementares feitas posteriormente (solicitando maiores detalhes sobre a imagem). Antes de relacionar desenhos e contextualizações verbais, pautei minha análise visual em uma única esfera, a da imagem em si.

Já eu, Geralda, adotei um método visual diferente: solicitei a cada participante que produzisse uma linha do tempo contemplando seu processo de adaptação ao ensino bilíngue. Depois, realizei entrevistas com o intuito de entender melhor esse processo a partir das linhas. Também solicitei às minhas participantes que me enviassem uma explicação escrita de suas linhas. A linha do tempo se constituiu como um método de elicitação gráfica. Tal método envolve a produção de imagens, tais como mapas mentais e diagramas, como forma de estimular a reflexão de participantes sobre uma determinada questão e facilitar a comunicação pesquisador-participante em entrevistas (BAGNOLI, 2009BAGNOLI, A. (2009). Beyond the standard interview: The use of graphic elicitation and arts-based methods. Qualitative Research, v. 9, n. 5, p. 547-570.). As narrativas foram coletadas virtualmente, por meio da realização de teleconferências via Google Meet (para as entrevistas) e de trocas de e-mail (para as linhas do tempo e suas explicações). Antes de relacionar linhas do tempo e contextualizações verbais, também pautei minha análise visual em uma única esfera, a da imagem em si.

Apresentamos nossos percursos narrativos-visuais de maneira mais pontual no quadro a seguir.

Quadro 1
Os nossos percursos narrativos-visuais: aproximações e distanciamentos.

Os percursos aqui apresentados ilustram as diversas formas de se fazer pesquisa narrativa visual. Não temos como objetivo principal neste artigo explorar os resultados de nossos estudos com profundidade, embora eles sejam apresentados de maneira parcial na seção seguinte. Exploramos aqui nossas histórias sobre o fazer pesquisa narrativa visual. Trata-se, portanto, de uma pesquisa narrativa acerca do processo de fazer pesquisa narrativa visual sobre a identidade do professor de inglês: compomos sentidos sobre esse processo, e discutimos o valor de abordagens narrativo-visuais a partir de nossas vivências e das reflexões apresentadas em outros estudos.

3. EXPLORANDO AS IMAGENS DE UMA PROFISSÃO

Apresentamos aqui nossas experiências de utilizar métodos visuais em pesquisas narrativas que exploram a identidade do professor de inglês1 1 Os estudos apresentados neste artigo são oriundos de projetos de pesquisa aprovados pelo comitê de ética da instituição na qual foram desenvolvidos. . Dividimos essa apresentação em subseções, as quais contemplam a experiência de cada pesquisadora.

3.1. A EXPERIÊNCIA DE ANA: desenhos da formação da identidade do professor de inglês ao longo do desenvolvimento de material didático

A minha história com a utilização de métodos visuais começa em 2014. De lá pra cá, tenho experimentado o uso de imagens, tais como desenhos e linhas do tempo, em pesquisas envolvendo aspectos da vida do professor de inglês, e em disciplinas da graduação e pós-graduação. A história que divido aqui é sobre a minha primeira experiência de uso de narrativas visuais.

Em 2014, eu desenvolvia um estudo longitudinal que explorava a constituição identitária de seis professoras de inglês em formação ao longo de experiências de elaboração e aplicação de material didático. O contexto de pesquisa era uma iniciativa de formação inicial da qual participavam estudantes de um curso de Letras português-inglês, e eu, enquanto professora formadora. O estudo previa a coleta de narrativas escritas (por meio de diários reflexivos), orais (por meio de conversas gravadas) e visuais (por meio de desenhos). Pautava-me pelo entendimento do material didático enquanto artefato curricular e cultural, “por meio do qual sentidos sobre a língua que está sendo ensinada emergem, associando-a a formas particulares de ser, e a variedades da língua e formas de uso de língua particulares” (GRAY, 2013GRAY, J. (org.) (2013). Critical perspectives on language teaching materials. Basingstoke: Palgrave Macmillan., p. 7). A elaboração de material didático era concebida como um processo no qual um professor imprimia sua identidade ao mobilizar diferentes conhecimentos e experiências: um lócus de construção de identidade docente, especialmente para professores em formação.

O início de minha experiência com narrativas visuais foi marcado por uma série de dúvidas. As primeiras delas envolveram a instrução do desenho e sua finalidade em meu estudo: o que pediria para minhas participantes desenharem? De que maneira o desenho me auxiliaria a contemplar meu objetivo de pesquisa? Em que momento solicitaria o desenho? Quantos desenhos solicitaria? Recorri, então, a pesquisas desenvolvidas na LA que se utilizam de métodos visuais para estudar aspectos da vida do professor de línguas em formação, como as de Borg et al. (2014)BORG, S. et al. (2014). The impact of teacher education on pre-service primary English language teachers. ELT Research Papers 14.03. London: British Council. e Kalaja, Dufva e Alanen (2013)KALAJA, P.; DUFVA, H.; ALANEN, R. (2013). Experimenting with visual narratives. In: Barkhuizen, G. (org.), Narrative Research in Applied Linguistics Cambridge: Cambridge University Press, p. 105-131.. Esses trabalhos ilustram formas de se utilizar métodos visuais em projetos de pesquisa e de se instruir participantes para sua produção. Entretanto, percebi que minhas decisões em relação a essas questões deveriam levar em consideração as particularidades de meu estudo. Decidi solicitar mais de mais de um desenho. Neles, as participantes se representariam como professoras de inglês em momentos diferentes do processo de desenvolvimento material didático. Dessa forma, teria acesso às representações visuais do impacto dessa experiência em suas identidades docentes: os desenhos funcionariam como “retratos” da formação da identidade profissional.

A solicitação do primeiro desenho foi recebida com estranheza - o que era perfeitamente compreensível. Não se tratava apenas da falta de hábito de desenhar: a produção desse tipo de imagem demandava a síntese de uma série de informações e experiências relacionadas ao processo de elaborar e aplicar material didático no espaço de uma folha em branco. Para a produção das imagens, as participantes recebiam uma folha de papel A4, um lápis e uma borracha. Elas contaram muitas histórias sobre o processo de se tornar professoras de inglês em seus desenhos. Para uma delas, Carla, o desenho foi, inclusive, uma ferramenta crucial para expressar suas percepções em relação a esse processo. Valho-me de dois desenhos produzidos por ela, entre outubro e dezembro de 2014, para contextualizar minha narrativa de uso de métodos visuais.

Carla tinha 24 anos e cursava o segundo ano do curso de Letras. Era a única participante que manifestava o desejo em se tornar professora de inglês já no início do projeto de formação. O projeto do qual participávamos previa a elaboração de material didático de inglês para alunos dos ensinos fundamental e médio da rede pública. Carla optou por elaborar atividades de leitura contemplando uma tirinha do personagem Garfield em inglês para alunos do 6º ano do ensino fundamental. Falava pouco, era muito tímida e não tinha o costume de pedir ajuda. Sempre que a abordava, dizia que estava tudo bem. Enquanto professora formadora e pesquisadora, eu sentia muita dificuldade em ter acesso à maneira como Carla vivenciava o projeto de formação. Nos diários que escrevia e nas conversas gravadas que tínhamos, incialmente, ela não dividia muito: era preciso insistir com perguntas e pedidos de esclarecimento. Nos desenhos, entretanto, Carla sentia maior facilidade em se expressar.

Carla carregava consigo uma visão idealizada da sala de aula de inglês: a entendia como um espaço harmonioso e livre de conflitos. No entanto, essa visão começava a ser questionada à medida que ela observava aulas de inglês na turma na qual aplicaria seu material:

É aquela bagunça, [os alunos] não prestam atenção, [ficam] conversando com o colega, a professora fica falando ‘presta atenção, menino!’ E eles não estão nem aí, continuam conversando, [e] jogando papelzinho no outro.

Carla, 2ª conversa gravada, 01/10/14.

Logo após a experiência de elaboração de material didático, Carla produziu um desenho seguindo a instrução de representá-la como professora de inglês (Imagem 1).

Imagem 1
Desenho de Carla, 16/10/2014.

Carla está de frente para os alunos com um rosto sorridente. A palavra “inglês” está escrita no quadro. Em sua mesa, há um livro ou um caderno. Os alunos estão todos sentados e há algo em suas carteiras, o que sugere que estão desenvolvendo alguma tarefa. Não há problemas de disciplina: os alunos parecem respeitar Carla e estar motivados. A sala de aula desenhada de Carla parece não ter relação alguma com a sala na qual ela observava aulas. Em sua explicação, Carla esclarece:

Aqui está eu, aqui a mesa, né? O quadro, a cadeira, o livro que eu vou dar aula (...) aqui estão os alunos. Eu passei uma atividade pra eles. Aqui está a folha na mesa pra eles fazerem os exercícios. No meu ponto de vista, é assim, eles são atenciosos, educados, não fazem bagunça, quer dizer, eu queria que fosse assim (...) lá [na escola] é a realidade, né? Isso aqui é só um sonho mesmo (...) tem uns que não querem estudar, vai lá só pra falar que está estudando (...) pega o caderno, abre quando a professora está perto. A professora vai lá pra mesa, ele vai e fecha. Estão nem aí (...) um pouco porque, talvez, ela [a professora] usa o livro, né? Porque todo dia o livro (...) é cansativo. Aí uma atividade nova sobre tirinhas, sobre aquelas figuras, é mais interessante (...) bom sair também do livro né? Porque tá certo que é muito bom dar aula com o livro

(...) porque ali tem a gramática do inglês, tem os verbos, ensina um montão de coisas importantes ali, mas também é bom montar [suas atividades] (...) mudar, sair do livro e trazer, por exemplo, umas tirinhas, fazer uns slides (...) acho que até desperta o interesse.

Carla, explicação do desenho gravada, 16/10/14.

O desenho representa a tensão que Carla vivenciava entre a sala de aula real e a sala de aula de seus sonhos em sua narrativa do processo de se tornar professora de inglês. Representa, sobretudo, suas expectativas em relação ao material que elaborava e as histórias que gostaria de vivenciar ao longo de sua aplicação. Carla acreditava que a tirinha despertaria o interesse dos alunos: eles se sentiriam motivados e colaborariam mais nas aulas de inglês, tal como os alunos do desenho. Eu me preocupava com o modo como ela estabeleceria uma ponte entre sonho e realidade. Ela sempre me dizia que estava um pouco ansiosa, mas disposta a aplicar seu material.

Carla fez mais um desenho a representando como professora de inglês. A imagem seria produzida após a aplicação de seu material didático. Entretanto, ela não conseguiu aplicá-lo. Quando entrou na sala, os alunos gritavam muito. Carla foi para a frente da sala e os alunos a aguardaram falar, mas ela permaneceu em silêncio. Os alunos, então, começaram a conversar entre si:

Fiquei parada que nem uma estátua (...) não soube explicar direito (...) uma ansiedade, nervosismo! Nossa! Pensei ‘eu não vou dar conta’, aí eu vi que não ia dar.

Carla, 4ª conversa gravada, 19/11/2014.

Acabei dando a aula toda. Carla ainda tentou mais uma vez com a ajuda de outra professora em formação, mas, novamente, não conseguiu. O desenho (Imagem 2) ilustra o impacto dessas tentativas em Carla.

Imagem 2
Desenho de Carla, 04/12/2014.

Os alunos, sem rosto e anônimos, estão sentados como antes, sem nada sobre suas carteiras dessa vez. Carla está na frente da sala segurando algo. Seu rosto foi desenhado sem sorriso. Quadro e mesa estão vazios. A mesa do professor está entre Carla e seus alunos, como se fosse uma forma de proteção. Ela está mais distante deles em comparação ao desenho anterior. Carla explica:

É eu aí, que eu ainda vou tentar mais uma vez. Quando eu tiver outra oportunidade, vou tentar dar aula, e eu vou tentar dar o melhor de mim pra essas crianças, esses alunos (...) eu ainda vou aprender a dar aula, tenho muito o que aprender pra dar aula, porque é difícil (...) O modo, como chegar na sala e conversar com os alunos, eu não sei bem. Chega na hora, parece que dá aquele branco, aí eu já esqueço o que que tem que fazer, aí eu acho que já tem que falar da atividade, mas não, tem que falar primeiro, se apresentar e depois falar que vai trabalhar tal coisa (...) o problema tá no meu nervosismo (...) o ponto negativo é só esse, né? Que eu tenho dificuldade em chegar e falar (...) o ponto positivo é que eu tô gostando de estar no projeto (...) porque antes eu não tinha noção de certas coisas, assim, como se trabalhava uma tirinha, os PCNs, eu nem sabia.

Carla, 5ª conversa gravada, 04/12/2014.

O desenho representa Carla encarando a realidade após as tentativas de aplicar o material que produziu. Reflete, principalmente, seu percurso enquanto professora em formação: a identificação da dificuldade que precisava superar e do que aprendeu ao longo do projeto. O desenho representa também as experiências como professora que Carla ainda esperava vivenciar ao contemplar seu desejo de ser capaz de dar uma aula de inglês.

Rose (2012)ROSE, G. (2012). Visual methodologies: An introduction to researching with visual materials, 3. ed. London: Sage. ressalta que, embora a contextualização por palavras de imagens produzidas em projetos de pesquisa seja necessária, os materiais visuais em si precisam ser interpretados. A análise dos desenhos foi um grande desafio para mim. Os diálogos que estabeleci com os trabalhos da própria Rose (2012)ROSE, G. (2012). Visual methodologies: An introduction to researching with visual materials, 3. ed. London: Sage. e de Bach (2007)BACH, H. (2007). Composing a visual narrative inquiry. In: Clandinin, D. J. (org.), Handbook of Narrative Inquiry: Mapping a Methodology. Thousand Oaks, CA: Sage, p. 280-307. foram cruciais para lidar com ele. As autoras me auxiliaram a exercitar um certo distanciamento de toda contextualização verbal para compor sentidos sobre as histórias que os elementos visuais contavam: Rose, por meio de suas esferas de análise, principalmente, ao propor atenção à disposição e à composição de elementos visuais, e ao contexto de produção; Bach, por meio de sua pesquisa narrativa com fotografias, ao propor exercícios de reflexão sobre as histórias que uma imagem conta. Esse distanciamento me ajudou a relacionar melhor desenhos, suas explicações e outras narrativas produzidas por Carla. Pautei minha análise em dois movimentos de composição de sentidos para relacionar narrativas visuais e verbais: o da intepretação da imagem em si; e o da interpretação do material verbal que o contextualizava (explicações dos desenhos e relatos de experiência feitos em diários e conversas gravadas).

Os desenhos deram voz a Carla que sentia dificuldade em expressar suas angústias e expectativas ao longo do projeto apenas de maneira verbal. Eles também se constituíram como ferramentas de reflexão sobre sua trajetória docente. Para mim, os desenhos proporcionaram oportunidades de não só compreender holisticamente a experiência de se tornar professor de inglês, mas também de vivenciar os desafios de um processo de análise que extrapola o verbal.

3.2 A EXPERIÊNCIA DE VANESA: a identidade do professor de inglês de periferia desenhada

A minha história com métodos visuais é bem mais recente. Começa em 2020 com uma pesquisa que se vale de desenhos para explorar a identidade do professor de inglês de escolas de periferia. A escola da periferia é geralmente a pública, marcada, muitas vezes, pela ausência de políticas que estimulem uma educação emancipadora (GADOTTI, 2007GADOTTI, M. (2007). A escola e o professor: Paulo Freire e a paixão de ensinar. São Paulo: Publisher Brasil.). É um cenário também determinado pelo frequente “discurso da ineficiência do ensino de inglês” da escola pública, no qual “falta tudo” e “professores e alunos sentem-se sozinhos, abandonados na empreitada para ensinar/aprender inglês” (ASSIS-PETERSON; COX, 2007ASSIS-PETERSON, A. A.; COX, M. I. P. (2007). Inglês em tempos de globalização: Para além de bem e mal. Calidoscópio, v. 5, n. 1, 5-14., p. 10-12). Atuei como professora de inglês em cinco escolas de periferia diferentes. Eram tantos problemas sociais e dificuldades familiares que os alunos traziam para a sala de aula que meu conteúdo acabava sendo irrelevante: uso de drogas, gravidez precoce, negligência familiar e fome. Percebia que havia ali crianças e adolescentes que careciam de tudo. Sentia-me impotente diante de todas as questões extraclasse com as quais meus alunos lidavam. Achei pertinente ouvir o que colegas que atuam nesse espaço tinham a dizer, ou melhor, “ver” o que vivenciavam, por meio de minha pesquisa.

Solicitei aos seis professores de inglês que participaram de minha pesquisa que representassem em forma de desenho a experiência de atuar em contexto periférico. Os desenhos foram coletados por e-mail: seguindo a instrução fornecida, cada participante fazia um desenho à mão em uma folha A4 em branco, tirava uma foto bem nítida da imagem ou a escaneava, e me enviava esse material junto com sua descrição. As explicações dos desenhos foram coletadas por escrito de duas formas: via descrição enviada junto com o desenho; e via perguntas complementares sobre o desenho. As perguntas complementares solicitavam detalhes sobre: cada elemento desenhado; o professor representado; e se/como o desenho seria diferente caso a instrução para sua produção não envolvesse a docência em contexto periférico.

Um dos meus desafios também foi definir a instrução para a produção do desenho: como pedir aos meus participantes que desenhassem algo que não tem forma, como identidade? Foi necessário pensar muito sobre como a instrução poderia ajudá-los a trazer elementos que representassem suas identidades profissionais sem comprometer sua liberdade de expressão criativa. Leituras de dissertações que se utilizam de métodos visuais, como as de Santos (2018)SANTOS, S. L. C. (2018). Crenças de alunos sobre ensino e aprendizagem de espanhol. Dissertação de Mestrado em Letras. Departamento de Letras, UFV, Viçosa. e Silva (2018)SILVA, J. B. M. (2018). Vozes apaixonadas pelo ensino de inglês: A construção da identidade de professores em formação inicial. Dissertação de Mestrado em Letras. Departamento de Letras, UFV, Viçosa. me ajudaram muito nesse sentido. Outro desafio foi lidar com o estranhamento causado pela solicitação de um desenho: uma coleta de dados que se valia, primordialmente, de desenhos soou incomum para os participantes, que esperavam questionários ou entrevistas como instrumentos. Tranquilizei-os reforçando que meu estudo não tinha o intuito de avaliar a habilidade de desenhar.

Trago aqui o desenho produzido por Guinever (Imagem 3). Guinever é formada em Letras portuguêsinglês. Tinha 32 anos e atuava como professora de inglês em contexto periférico havia dois anos quando o desenho lhe foi solicitado.

Imagem 3
Desenho de Guinever, 28/07/2021.

No desenho, a professora usa uma máscara, o que remete ao contexto de pandemia. A aula desenhada é presencial, o que remete à instituição do ensino híbrido após o primeiro ano de pandemia. A professora está no centro da imagem e de frente para quem a vê. Há um balão ligado a ela com o comando em inglês: “Abram seus livros!” Atrás dela, há apenas um quadro em branco, o que sugere que não há muitos recursos didáticos disponíveis. Há três alunos enfileirados que estão de costas para quem vê a imagem. Eles são representados com camisetas da mesma cor, o que sugere o uso de uniforme. Os cabelos são de cores diferentes e os balões ligados a cada um deles possuem conteúdos distintos, o que aponta para a heterogeneidade da sala. Dois alunos são desenhados com balões de fala, o de cabelo laranja e o de cabelo azul. O de cabelo laranja diz, em inglês, que não tem o livro. O de cabelo azul tenta dizer, com uma mistura de inglês e português, que não entende o livro. Já o aluno de cabelo rosa é desenhado com um balão de pensamento com um ponto de interrogação, o que sugere que está se sentindo perdido. Guinever explica que:

O desenho representa uma professora de língua inglesa que tem como único material pedagógico o livro didático, material que não é condizente com o nível dos estudantes (...) em alguns casos não há livros suficientes para a quantidade de crianças (...) é algo que acontece nas escolas públicas em geral. A fala dos alunos tenta representar a diferença que estudantes têm quanto a língua, enquanto alguns estudantes conhecem, ao menos, o básico da língua, outros nunca tiveram contato com ela e outros poucos conseguem desenvolver suas habilidades em língua inglesa por fatores que o influenciaram nesse sentido durante sua trajetória escolar. Quanto às cores apresentadas nos estudantes, elas buscam mostrar a diversidade que a sala de aula apresenta, sejam elas de etnia, religiosa, cultural, etc. A professora usando máscara representa o momento histórico que nos encontramos, além de representar que em alguns casos o professor é silenciado em sala de aula no sentido de não lhe ser permitido produzir seu próprio material e/ou diversificar as aulas para priorizar o aprendizado dos estudantes, em vez disso (...) o professor [é] orientado a cumprir metas e números ao invés da aprendizagem em si (...) A professora apresentada no desenho é aquela que não tem material didático que condiz com a realidade do aluno, em uma escola com poucos recursos que vão além de quadro e giz e com alunos que tiveram língua inglesa como algo pautado em tradução de palavras e textos (...) ser professor nesses contextos que apresentam diversos problemas sociais exige do professor de escola periférica sabedoria e discernimento para entender que a aprendizagem de seus estudantes está vinculada a questões que saem dos limites de sala de aula

Guinever, explicação do desenho, perguntas complementares, 10/08/2021.

Em seu desenho, Guinever nos conta que ser professora de inglês na periferia é lidar com uma série desafios: salas heterogêneas em termos de diversidade, percursos e níveis de aprendizagem, e acesso ao material didático; problemas sociais; escassez de recursos didático-pedagógicos; falta de oportunidades para diversificar metodologias e imprimir sua identidade no material didático; e ênfase em testes e metas de aprendizagem. É, sobretudo, lidar com o silenciamento de sua identidade profissional, já que faltam condições de trabalho e um entendimento melhor acerca do objetivo da educação escolar.

Assim como Ana, também baseei minha análise em dois momentos de composição de sentidos: o da intepretação do desenho em si e o da interpretação do material verbal que o contextualizava. Senti muita dificuldade em compor sentidos sobre a imagem em si. Os apontamentos de Rose (2016ROSE, G. (2016). Visual methodologies: An introduction to researching with visual materials, 4. ed. London: Sage., p. 374) em relação à esfera da imagem me ajudaram nesse sentido, principalmente as perguntas que autora sugere para contemplá-la, tais como: “O que está sendo mostrado? Quais são os componentes da imagem? Como estão organizados?”

Penso que o desenho deu a Guinever a possibilidade de delimitar seu próprio tempo para refletir sobre os aspectos que compõem a experiência de atuar em contexto periférico. Em uma entrevista, por exemplo, talvez, o tempo disponibilizado não fosse suficiente para tal reflexão. A mim, a utilização de um método visual tem oferecido meios de acessar, de maneira mais holística, o perfil do professor de inglês que atua em escola periférica, as histórias que esse profissional conta sobre esse espaço e os desafios que enfrenta.

3.3 A EXPERIÊNCIA DE GERALDA: a linha do tempo da construção da identidade do professor de inglês de escola bilíngue

A minha experiência com o uso de métodos visuais também começa em 2020. Em meu estudo, valho-me de linhas do tempo e entrevistas para analisar o processo de adaptação de professores de inglês à educação bilíngue e o impacto dessa experiência em suas identidades profissionais. Apoiando-me em uma visão heteroglóssica de língua, entendo a educação bilíngue como “o desenvolvimento multidimensional das duas ou mais línguas envolvidas, a promoção de saberes entre elas e a valorização do translinguar como forma de construção da compreensão de mundo de sujeitos bilíngues” (MEGALE, 2018MEGALE, A. H. (2018). Educação bilíngue de línguas de prestígio no Brasil: Uma análise dos documentos oficiais. The Especialist, v. 39, n. 2, p. 1-17., p. 5).

Atuo como professora de inglês desde 2015. Nos últimos três anos, me enveredei pelos caminhos do ensino bilíngue. Não foi algo planejado: a escola particular na qual eu atuava passou a adotar a modalidade e eu precisei me adaptar. Embora a escola tenha oferecido treinamento, foi um grande desafio profissional para mim. Principalmente, porque sentia que minha formação em Letras português-inglês não havia me preparado para o ensino bilíngue.

Inicialmente, eu me valeria apenas de entrevistas. Trabalhos como os de Bagnoli (2009)BAGNOLI, A. (2009). Beyond the standard interview: The use of graphic elicitation and arts-based methods. Qualitative Research, v. 9, n. 5, p. 547-570. e Sheridan, Chamberlain e Dupuis, (2011)SHERIDAN, J.; CHAMBERLAIN, K.; DUPUIS, A. (2011). Timelining: Visualizing experience. Qualitative Research, v. 11, n. 5, p. 552-569., que exploram o valor da linha do tempo enquanto método de elicitação gráfica na pesquisa narrativa, determinaram a opção pela linha do tempo como um instrumento adicional. A linha do tempo “estimula o relato narrativo e permite tanto ao participante quanto ao pesquisador focar em aspectos específicos dos dados para aprofundar e enriquecer a narração [de experiências]”, e é “eficaz para se destacar momentos decisivos e epifanias na vida das pessoas” (SHERIDAN; CHAMBERLAIN; DUPUIS, 2011SHERIDAN, J.; CHAMBERLAIN, K.; DUPUIS, A. (2011). Timelining: Visualizing experience. Qualitative Research, v. 11, n. 5, p. 552-569., p. 565). Julguei o método relevante para estudar a adaptação ao contexto bilíngue de minhas participantes, já que se trata de um período marcado por eventos e mudanças significativas em suas vidas profissionais.

Em um primeiro momento, senti dificuldade em propor uma orientação clara e objetiva para a confecção da linha do tempo. Realizei, então, uma coleta piloto. Foi um exercício muito válido: a partir da dificuldade de interpretar as minhas orientações, vivenciada pela participante da coleta piloto, pude ponderar o que melhorar na instrução da linha do tempo. Ao longo da coleta de textos de campo, também precisei lidar com a resistência inicial de algumas participantes para produzir material visual, ocasionada pela falta de habilidade de desenhar.

Cinco professoras de inglês que se adaptaram ao ensino bilíngue participaram da minha pesquisa. Antes das entrevistas, solicitei a elas que elaborassem e me enviassem por e-mail uma linha do tempo representando suas trajetórias de adaptação à educação bilíngue. As linhas eram feitas à mão e previam o uso de cores. Nas entrevistas, as professoras me contavam sobre o processo de adaptação que vivenciaram a partir das linhas. Posteriormente, solicitei explicações escritas das linhas, pois percebi que algumas participantes não tinham descrito elementos das imagens com detalhes nas entrevistas.

Apresento aqui a linha do tempo de Julia (Imagem 4), uma professora de inglês de 38 anos. Julia atuava na educação bilíngue infantil havia 15 anos. Antes de atuar nesse contexto, foi professora de inglês de uma escola de idiomas. Licenciou-se em Letras português-inglês em 2004 e em Pedagogia em 2017.

Figura 4
Linha do tempo de Julia, 21/12/21.

Por meio de um traço sinuoso, Julia parece representar a não linearidade de sua trajetória de adaptação ao ensino bilíngue. Os eventos discriminados na linha do tempo se iniciam com uma observação em 2005, e finalizam com pontos de interrogação em 2022, o que sugere a continuidade de seu processo de adaptação/formação. No intervalo desses anos, Julia apresenta os seguintes acontecimentos: a regência em turmas com alunos entre 4 e 5 anos em 2005; a saída do ensino bilíngue em 2007; o retorno ao ensino infantil e Fundamental I em 2011; a participação em congressos e a realização de cursos e portfólios bilíngues entre 2011 e 2015; a experiência de assumir uma coordenação em 2015; e as experiências de mestrado e doutorado em 2020 e 2021. Em sua descrição, Julia explica que:

A sinuosidade ilustra um caminho que nem sempre é simples, reto e linear, como a vida, em especial, a vida de um profissional da educação. Deixei ainda um longo espaço futuro, pois pretendo contribuir muito com a educação bilíngue (...) os marcos escolhidos representam grandes picos de mudança na vida profissional.

Julia, explicação da linha do tempo, 06/04/2022.

Na entrevista, Julia narra esses marcos com detalhes:

Levei o meu currículo pra uma escola bilíngue (...) tinha uma professora grávida na época e eles precisariam, assim, de alguém que observasse, acompanhasse ela durante a gravidez, pra depois assumir a regência (...) eu não sabia nada, absolutamente nada de como fazer bilíngue (...) não tinha visto isso na faculdade, não tinha noção de como lidar com isso (...) ela me permitia fazer algumas intervenções, ela me ensinava como conversar com as crianças, a como preparar e, assim, eu fui aprendendo (...) quando ela saiu de licença, eu realmente tive a oportunidade de assumir os grupos dela (...) não foi fácil (...) eu conseguia reproduzir as coisas que ela fazia, mas eu não tinha um repertório próprio de práticas, de metodologia, principalmente, da parte pedagógica mesmo. Eu sabia falar inglês, mas eu não sabia muito o que ensinar para as crianças (...) outra coisa que eu senti muita dificuldade foi lidar com o cuidado de crianças e o contato com as famílias (...) o professor da escola bilíngue é responsável pela educação da criança (...) você tem que ajudar ele a usar o banheiro. Se eles têm uma disputa de brinquedo, você tem que resolver, e resolver de uma maneira adequada (...) aquele universo infantil pra mim era muito novo, então eu fui aprendendo aos trancos e barrancos (...) fui aprendendo muito mesmo na dificuldade, fazendo errado, levando bronca (...) [Depois de deixar o ensino bilíngue,] retornei bem mais madura, sabendo muito mais o que fazer (...) eu acho que a maternidade me trouxe isso também, de cuidado da criança (...) nessa época, a gente já tinha muito mais congressos, cursos, uma formação, mesmo que interna, melhor, então isso me motivou (...) [depois,] eu tive a oportunidade de assumir a coordenação, auxiliar de coordenação, e me apaixonei (...) fiz um material, um portfólio bilíngue (...) a gente transformou isso num material didático da escola. Acabei assumindo a coordenação, e hoje o que eu gosto de fazer é formar os professores pra atuar. Fiz Pedagogia no meio do caminho, fiz uma pós em Educação Infantil pra eu me encontrar, e tudo isso foi corroborando, assim, pra eu construir uma boa prática (...) me ampliou o olhar pro que eu precisava desenvolver com as crianças, que não era só cantar musiquinha, que não era só fazer brincadeira no parque, que eu precisava realmente desenvolver conteúdos.

Julia, entrevista, 21/12/2021.

Julia nos conta que a formação de sua identidade enquanto professora de contexto bilíngue foi fortemente marcada pelo “aprender fazendo”. A licenciatura em Letras não havia lhe proporcionado subsídios didáticopedagógicos para atuar no contexto. Ademais, inciativas de formação voltadas à modalidade bilíngue eram escassas quando Julia iniciou a docência nesse contexto. A narrativa de Julia ecoa não só a minha própria história de adaptação à educação bilíngue, mas também a preocupação de pesquisadores da área. De fato, dada à proliferação de escolas bilíngues no país, questões como a carência de iniciativas de formação para atuar nesse contexto e de políticas norteadoras da modalidade têm preocupado pesquisadores (Cf. MEGALE; LIBERALI, 2016MEGALE, A. H.; LIBERALI, F. (2016). Caminhos da educação bilíngue no Brasil: Perspectivas da Linguística Aplicada. Raído, v. 10, n. 23, p. 9-24.).

Atentar-me às narrativas de experiência de minha participante sem negligenciar a análise do método visual adotado foi um desafio. Consegui enfrentá-lo ao me valer da metodologia crítica visual de Rose (2016)ROSE, G. (2016). Visual methodologies: An introduction to researching with visual materials, 4. ed. London: Sage., assim como Ana e Vanesa, particularmente, ao contemplar a esfera da imagem em si. Apesar dos desafios, a linha do tempo enriqueceu meu processo de coleta de narrativas em, pelo menos, dois sentidos: ao proporcionar a Julia oportunidades de refletir com calma sobre seu percurso na educação bilíngue e de delimitar nele marcos importantes - afinal, são 15 anos em uma folha de papel; ao proporcionar a mim o acesso às diversas histórias que dão forma a sua identidade de educadora bilíngue.

4. O VALOR DAS NARRATIVAS VISUAIS

Exploramos neste artigo nossas histórias de fazer pesquisa narrativa visual. Vivenciamos desafios, como o de delimitar instruções para a produção de imagens que permitissem ao participante dividir suas narrativas de experiências e, ao mesmo tempo, exercitar sua liberdade criativa. Para isso, procuramos mantê-las mais abertas e gerais possíveis. Outro desafio foi lidar com o estranhamento - tanto do participante quanto nosso - ocasionado pela falta de experiência com materiais visuais. No caso do participante, esse estranhamento se deu, principalmente, pela preocupação com a habilidade de desenhar. Em nosso caso, ele se deu pela dificuldade inicial de identificar e interpretar as histórias que os elementos visuais representavam. Todavia, também vislumbramos possibilidades, como as de se ter uma compreensão mais holística da experiência de se constituir como docente de língua inglesa, e de proporcionar a professores oportunidades criativas de refletir sobre sua trajetória profissional.

Os percursos de pesquisa aqui explorados ilustram o valor de métodos visuais em estudos narrativos desenvolvidos na perspectiva da LA. Em termos empíricos, esse valor envolve as possibilidades que oferecem de evocar histórias (BACH, 2007BACH, H. (2007). Composing a visual narrative inquiry. In: Clandinin, D. J. (org.), Handbook of Narrative Inquiry: Mapping a Methodology. Thousand Oaks, CA: Sage, p. 280-307.; BAGNOLI, 2009BAGNOLI, A. (2009). Beyond the standard interview: The use of graphic elicitation and arts-based methods. Qualitative Research, v. 9, n. 5, p. 547-570.; BRANDÃO, 2017bBRANDÃO, A. C. L. (2017b). Explorando o visual de uma profissão: Histórias de uma professora de línguas pré-serviço em contexto brasileiro. In: Melo-Pfeifer, S.; Simões, A. R. (orgs.), Plurilinguismo vivido, plurilinguismo desenhado: Estudos sobre a relação dos sujeitos com as línguas. Santarém, Portugal: Instituto Politécnico de Santarém. Disponível em: https://blogs.ua.pt/cidtff/wp-content/uploads/2017/11/livro_metodos_visuais_v3.pdf . Acesso em: 20 jul. 2021.
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, 2021BRANDÃO, A. C. L. (2021). First experiences of teaching EFL in metaphors. Teaching and Teacher Education, v. 97, p. 1-11.; KALAJA; DUFVA; ALANEN, 2013KALAJA, P.; DUFVA, H.; ALANEN, R. (2013). Experimenting with visual narratives. In: Barkhuizen, G. (org.), Narrative Research in Applied Linguistics Cambridge: Cambridge University Press, p. 105-131.; KEATS, 2009KEATS, P. A. (2009). Multiple text analysis in narrative research: Visual, written, and spoken stories of experience. Qualitative Research, v. 9, n. 2, p. 181-195.; KRESS; VAN LEEUWEN, 2006KRESS, G.; VAN LEEUWEN, T. (2006). Reading images: The grammar of visual design. 2. ed. London: Routledge.; RIESSMAN, 2008RIESSMAN, C. K. (2008). Narrative methods for the human sciences. Thousand Oaks, CA: Sage.; WEBER, 2008WEBER, S. (2008). Using visual images in research. In: Knowles, J.G.; Cole, A.L. (orgs.), Handbook of the arts in qualitative research: Perspectives, methodologies, examples, and issues. London: Sage, p. 41-53.). Na linha do tempo de Julia, por exemplo, os eventos representam diferentes histórias relacionadas a sua adaptação à educação bilíngue (de observar turmas do ensino bilíngue infantil, de assumir suas próprias turmas, etc.). No caso de Guinever, o desenho articula uma série de histórias vivenciadas ao longo de sua atuação como professora de inglês em escolas de periferia (de lidar com alunos de perfis diferentes, de ser silenciada enquanto profissional, etc.). Já os desenhos de Carla articulam diversas histórias relacionadas ao desenvolvimento de material didático de inglês (de vivenciar a tensão entre sala de aula real e imaginada, de tentativa de aplicação de material, etc.). No caso de Carla, essas histórias se articulam, inclusive, de duas maneiras: em cada desenho e entre os dois desenhos produzidos no projeto de formação do qual participava. Os métodos visuais contemplam ainda as histórias que algumas participantes gostariam de vivenciar. Exemplos disso são a linha do tempo de Julia (ao evocar seu desejo de continuar contribuindo com o ensino bilíngue) e os desenhos de Carla, especialmente, o último (ao evocar o desejo de um dia ser capaz de dar aula de inglês).

Ainda sob uma perspectiva empírica, vale destacar que os métodos visuais podem auxiliar participantes a registrar sentimentos e impressões que, para eles, são difíceis de verbalizar (BAGNOLI, 2009BAGNOLI, A. (2009). Beyond the standard interview: The use of graphic elicitation and arts-based methods. Qualitative Research, v. 9, n. 5, p. 547-570.; KEATS, 2009KEATS, P. A. (2009). Multiple text analysis in narrative research: Visual, written, and spoken stories of experience. Qualitative Research, v. 9, n. 2, p. 181-195.; WEBER, 2008WEBER, S. (2008). Using visual images in research. In: Knowles, J.G.; Cole, A.L. (orgs.), Handbook of the arts in qualitative research: Perspectives, methodologies, examples, and issues. London: Sage, p. 41-53.). São, portanto, recursos muito úteis para se “superar silêncios” (BAGNOLI, 2009BAGNOLI, A. (2009). Beyond the standard interview: The use of graphic elicitation and arts-based methods. Qualitative Research, v. 9, n. 5, p. 547-570., p. 566). Um exemplo disso são os desenhos de Carla, que lhe permitiram comunicar a tensão que vivenciava, o que, muitas vezes, não era possível por meio de textos de campo que se valiam, essencialmente, de linguagem verbal.

Em termos analíticos, o valor de métodos visuais está na possibilidade que oferecem de “sintetizar conhecimento de maneira muito eficiente”: por exemplo, “uma justaposição de figuras e objetos em uma foto pode revelar tanta informação quanto muitas páginas de texto escrito” (WEBER, 2008WEBER, S. (2008). Using visual images in research. In: Knowles, J.G.; Cole, A.L. (orgs.), Handbook of the arts in qualitative research: Perspectives, methodologies, examples, and issues. London: Sage, p. 41-53., p. 45). Possuem o que Bagnoli (2009BAGNOLI, A. (2009). Beyond the standard interview: The use of graphic elicitation and arts-based methods. Qualitative Research, v. 9, n. 5, p. 547-570., p. 568) chama de “efeito condensante”. Esse efeito é perceptível nas imagens produzidas por Carla, Guinever e Julia, que sintetizam uma série de informações no espaço de uma folha A4 - marcos, experiências e questões relevantes para elas. Essa característica auxilia pesquisadores narrativos a mapear momentos importantes da vida de um participante, e identificar temas e fios narrativos (BRANDÃO, 2017bBRANDÃO, A. C. L. (2017b). Explorando o visual de uma profissão: Histórias de uma professora de línguas pré-serviço em contexto brasileiro. In: Melo-Pfeifer, S.; Simões, A. R. (orgs.), Plurilinguismo vivido, plurilinguismo desenhado: Estudos sobre a relação dos sujeitos com as línguas. Santarém, Portugal: Instituto Politécnico de Santarém. Disponível em: https://blogs.ua.pt/cidtff/wp-content/uploads/2017/11/livro_metodos_visuais_v3.pdf . Acesso em: 20 jul. 2021.
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, 2021BRANDÃO, A. C. L. (2021). First experiences of teaching EFL in metaphors. Teaching and Teacher Education, v. 97, p. 1-11.). Em pesquisas que exploram a constituição identitária do professor de línguas, tal característica auxilia pesquisadores a capturar a essência desse processo.

Em termos formativos, o valor de métodos visuais está nas oportunidades de reflexão que oferecem a professores de línguas (BORG et al., 2014BORG, S. et al. (2014). The impact of teacher education on pre-service primary English language teachers. ELT Research Papers 14.03. London: British Council.; BRANDÃO, 2021BRANDÃO, A. C. L. (2021). First experiences of teaching EFL in metaphors. Teaching and Teacher Education, v. 97, p. 1-11.; PINHO, 2017PINHO, A. S. (2017). Narrativas (visuais) na formação de professores: Olhares da investigação. In: Melo-Pfeifer, S.; Simões, A.R. (orgs.), Plurilinguismo vivido, plurilinguismo desenhado: Estudos sobre a relação dos sujeitos com as línguas. Santarém, Portugal: Instituto Politécnico de Santarém, p. 219-241. Disponível em: https://blogs.ua.pt/cidtff/wpcontent/uploads/2017/11/livro_metodos_visuais_v3.pdf . Acesso em: 20 jul. 2021.
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). Embora não tenhamos explorado o uso formativo de métodos visuais nas pesquisas que apresentamos aqui, percebemos que eles se configuraram como poderosas ferramentas de reflexão docente para Carla, Guinever e Julia. Os métodos visuais podem proporcionar a professores de línguas oportunidades de refletir sobre concepções e crenças de ensino, bem como experiências e desafios profissionais, por exemplo. A formadores, podem proporcionar oportunidades de entender as necessidades profissionais de professores e auxiliá-los de maneira mais significativa em seu processo de constituição identitária.

Esperamos que este trabalho tenha ilustrado o valor e as potencialidades de uso de métodos visuais, tanto em pesquisas desenvolvidas na LA quanto em iniciativas de formação de professores de línguas. Esperamos também que sirva de inspiração para que outros linguistas aplicados e formadores vislumbrem e explorem outras potencialidades.

DECLARAÇÃO DE DISPONIBILIDADE DE DADOS DA PESQUISA

Os dados analisados não estão disponíveis ao público, uma vez que este material contém informações que podem vir a comprometer a privacidade e a segurança dos participantes na investigação.

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    Os estudos apresentados neste artigo são oriundos de projetos de pesquisa aprovados pelo comitê de ética da instituição na qual foram desenvolvidos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    20 Jun 2022
  • Aceito
    21 Dez 2022
  • Publicado
    17 Maio 2023
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