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Evolução e caracterização dos níveis de pobreza do Nordeste entre 1995 e 2005

Resumos

Existe um amplo consenso entre políticos e intelectuais de todo o mundo de que a redução da pobreza deve ser vista como uma das prioridades das políticas públicas. Deste modo, a mensuração do nível de pobreza se torna alvo de um intenso debate, na medida em que é necessário primeiramente identificar onde ela está localizada para, em seguida, ter-se condições de combatê-la. Hoje, no Brasil, esta preocupação se torna mais evidente quando as análises enfocam o espaço econômico do Nordeste, visto que esta Região é reconhecidamente a mais carente do País. Simultaneamente, é sabido que a partir de meados de 1994 uma nova realidade política foi imposta ao País, acarretando uma série de consequências sobre a população nacional e, automaticamente, também sobre a nordestina. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo mensurar e analisar a evolução da pobreza no Nordeste entre os anos de 1995 a 2005, expondo os principais atributos que influenciaram na dinâmica observada. De uma maneira geral, observou-se que, embora em 2005 os indicadores de pobreza ainda permanecessem em patamares alarmantes, houve uma tendência semelhante na sua evolução na Região - um considerável declínio entre 1995 e 2005 - contudo, com pequenas divergências nas intensidades de comportamento dos diferentes estados.

Medidas de Pobreza; Nordeste; Políticas Públicas Nacionais


All over the world, there is a broad consensus between politicians and intellectuals that poverty reduction should be seen as one priority regarding public policies. Therefore, measuring poverty level becomes the target of an intense debate, when it is necessary firstly to identify where poverty is located to have, afterwards, conditions of fighting it. Nowadays, in Brazil, this concern is more evident when the analyses focus the economical space of the Northeast, because this region is considered the poorest of the country. Simultaneously, it is known that since mid 1994, a new political reality was imposed to the country, resulting in several consequences for national population and also Northeaster population. In general terms, this article has as general objective to measure and analyze poverty evolution in nine states of the Brazilian Northeast Region among 1995 and 2005, exposing main attributes that influenced in the observed situation. In general, it was observed that, in spite of the fact that in 2005 the poverty indicators were in high levels, there was a similar tendency in poverty evolution in the region - a significant decline between 1995 and 2005 - however, with some divergences in the intensity of the behavior of different states.

Poverty Measures; Northeast; National Public Policy


Evolução e caracterização dos níveis de pobreza do Nordeste entre 1995 e 2005

Tiago Farias SobelI; Michela Barreto Camboim GonçalvesII; Ecio de Farias CostaIII

IDoutorando em Economia pelo Pimes/UFPE. Pesquisador Bolsista da Capes/Facepe. E-mail: tiagosobel@yahoo.com.br

IIDoutoranda em Economia pelo Pimes/UFPE. Pesquisadora Fundação Joaquim Nabuco. E-mail: michela.camboim@fundaj.gov.br

IIIM.S. e Ph.d. em Economia Agrícola, University of Georgia. Professor Adjunto III de Economia, Departamento de Economia / Pós-Graduação em Economia (Pimes), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). E-mail: ecio@yahoo.com

RESUMO

Existe um amplo consenso entre políticos e intelectuais de todo o mundo de que a redução da pobreza deve ser vista como uma das prioridades das políticas públicas. Deste modo, a mensuração do nível de pobreza se torna alvo de um intenso debate, na medida em que é necessário primeiramente identificar onde ela está localizada para, em seguida, ter-se condições de combatê-la. Hoje, no Brasil, esta preocupação se torna mais evidente quando as análises enfocam o espaço econômico do Nordeste, visto que esta Região é reconhecidamente a mais carente do País. Simultaneamente, é sabido que a partir de meados de 1994 uma nova realidade política foi imposta ao País, acarretando uma série de consequências sobre a população nacional e, automaticamente, também sobre a nordestina. Neste sentido, este trabalho tem como objetivo mensurar e analisar a evolução da pobreza no Nordeste entre os anos de 1995 a 2005, expondo os principais atributos que influenciaram na dinâmica observada. De uma maneira geral, observou-se que, embora em 2005 os indicadores de pobreza ainda permanecessem em patamares alarmantes, houve uma tendência semelhante na sua evolução na Região - um considerável declínio entre 1995 e 2005 - contudo, com pequenas divergências nas intensidades de comportamento dos diferentes estados.

Palavras-chaves: Medidas de Pobreza, Nordeste, Políticas Públicas Nacionais.

ABSTRACT

All over the world, there is a broad consensus between politicians and intellectuals that poverty reduction should be seen as one priority regarding public policies. Therefore, measuring poverty level becomes the target of an intense debate, when it is necessary firstly to identify where poverty is located to have, afterwards, conditions of fighting it. Nowadays, in Brazil, this concern is more evident when the analyses focus the economical space of the Northeast, because this region is considered the poorest of the country. Simultaneously, it is known that since mid 1994, a new political reality was imposed to the country, resulting in several consequences for national population and also Northeaster population. In general terms, this article has as general objective to measure and analyze poverty evolution in nine states of the Brazilian Northeast Region among 1995 and 2005, exposing main attributes that influenced in the observed situation. In general, it was observed that, in spite of the fact that in 2005 the poverty indicators were in high levels, there was a similar tendency in poverty evolution in the region - a significant decline between 1995 and 2005 - however, with some divergences in the intensity of the behavior of different states.

Key-words: Poverty Measures, Northeast, National Public Policy.

Classificação JEL: I32; O18; R20.

1. Introdução

Existe um amplo consenso entre cientistas, políticos, pesquisadores e intelectuais de todo o mundo de que a redução da pobreza deve ser vista como uma das prioridades das políticas públicas. Deste modo, a mensuração do nível de pobreza se torna alvo de um intenso debate, no momento em que é necessário primeiramente identificar onde ela está localizada para, em seguida, ter-se condições de combatê-la.

Hoje no Brasil esta preocupação se torna mais evidente quando as análises enfocam o espaço econômico do Nordeste, visto que, mesmo havendo um movimento de “despolarização” das atividades econômicas do Sudeste em prol do Nordeste entre as décadas de 1960 e 1990 após a criação da Sudene1 1 Entre 1960 e 1989, o Nordeste cresceu a uma taxa média anual de 6,4%, enquanto a economia brasileira avançava em 6,0% ao ano. Ao mesmo tempo, o produto per capita do nordestino passa de 43,5% em 1960 para 61,4% do produto per capita do Brasil em 1988 (MAIA GOMES, 1991). Segundo Lima (1994), de uma maneira geral, esta melhoria se deve, em boa parte, aos incentivos fiscais dados ao Nordeste pela Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) ao longo de três décadas (para se ter uma ideia, entre 1963 e 1990, cerca de US$ 6,7 bilhões foram liberados). , esta Região ainda é reconhecidamente a mais carente do País2 2 Apesar de concentrar quase 30% da população do Brasil, a participação nordestina no PIB nacional não passava de cerca de 14% em 2005. Consequentemente, o seu PIB per capita neste ano atingia apenas o patamar de 47,5% do respectivo PIB nacional, segundo dados do IBGE. Adicionalmente, segundo levantamento da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), divulgado em 1999, as 150 cidades brasileiras com a maior taxa de desnutrição se encontram no Nordeste (UNICEF, 2008). .

No entanto, durante a década de 1990, apesar de se manter crescendo acima da média nacional (LIMA, 2003), este processo sofreu um impacto, já que a economia nordestina se viu envolvida em uma nova realidade política nacional, em que os esforços estavam voltados, quase que exclusivamente, para a estabilização inflacionária, ficando em segundo plano as questões regionais. Neste contexto, uma das principais atitudes do Estado brasileiro foi reduzir seu papel de produtor e investidor na economia, promovendo, deste modo, um amplo processo de privatizações e de abertura comercial forçando as empresas a elevarem seu nível de competitividade (ACSELRAD, 2002). Com isso, acabou se favorecendo, pelo menos num primeiro momento, um processo de reconcentração econômica regional no Sul e Sudeste em detrimento do Nordeste.

Apesar de reformulado o seu papel na economia, o Estado manteve o seu dever primário de buscar a melhoria no bem-estar da população, principalmente em se tratando da classe menos favorecida. Entretanto, à medida que todo esse processo de ajuste foi sendo implementado, foi ficando claro que ele, por si só, estava sendo insuficiente gerar crescimento e desenvolvimento no País3 3 Crescimento econômico não pode ser confundido com desenvolvimento. O primeiro se constitui no acréscimo de renda agregada, enquanto o segundo envolve um amplo conjunto de variáveis que indicam melhoria nas condições de vida da população, tais como expectativa de vida, acesso a serviços de saúde, educação, etc. (CARNEIRO, 2002). Visando combater esta defasagem com base em um “novo referencial” de atuação do Estado no campo social, foi criada, a partir do final da década de 1990, uma série de programas sociais. Mendonça & Ortega (2005) destacam o Programa Comunidade Ativa e, principalmente, o Programa Fome Zero.

Enfim, desde o Plano Real, uma nova realidade política foi imposta ao País, acarretando em uma série de consequências sobre a população nacional e, automaticamente, também sobre a nordestina. Assim, torna-se relevante o estudo da evolução de indicadores que permitam não apenas apontar as áreas e setores em que a pauperização da população evoluiu de forma mais dramática, como também subsidiar a formulação de políticas eficazes de combate à pobreza.

Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo geral mensurar e analisar, por meio de uma série de indicadores, a evolução da pobreza nos nove estados da Região Nordeste entre os anos de 1995 a 2005, período no qual a taxa de inflação encontrava-se baixa e sob controle, expondo os principais atributos que influenciaram na dinâmica observada. Vale destacar que, nos últimos anos, alguns pesquisadores já vêm se preocupando em estudar questões ligadas à pobreza na Região - Manso et al., 2006; Osório & Medeiros, 2003; Silveira Neto, 2005; entre outros. Deste modo, estes trabalhos foram utilizados como referência para se ter um melhor entendimento sobre os resultados obtidos neste estudo.

Para se atingir os objetivos propostos, o trabalho foi estruturado da seguinte forma: além desta introdução, na sequência são detalhados, respectivamente, a metodologia aplicada e os consequentes resultados obtidos. Por último, são feitas as considerações finais.

2. Metodologia

Em geral, as medidas de pobreza têm por objetivo computar o número de pobres e diagnosticar a extensão e a distribuição da pobreza. No entanto, para tal, é necessário primeiramente definir o que é pobreza. Embora haja uma diversidade de definições possíveis, pode-se descrevê-la como uma situação de carência em que um (ou mais) indivíduo(s) não consegue(m) manter um padrão mínimo de vida condizente com as referências socialmente estabelecidas em cada contexto histórico. Neste contexto, nas economias modernas e monetizadas, nas quais parcela razoável das necessidades das pessoas é atendida por meio de trocas mercantis¸ é natural que a noção de atendimento às necessidades básicas seja operacionalizada de forma indireta, via renda (ROCHA, 2003).

Portanto, aqui a pobreza é vista na sua dimensão particular (e simplificadora) de insuficiência de renda. Neste sentido, são consideradas pobres todas as pessoas cuja renda seja igual ou menor que um valor pré-estabelecido; isto é, há pobreza apenas na medida em que existam pessoas vivendo com renda per capita inferior ao nível mínimo necessário para que possam satisfazer suas necessidades mais básicas. E este limite de renda à que este trabalho se refere é denominado linha de pobreza. Como afirma Barros et al. (2000:22), “(...) uma linha de pobreza pretende ser o parâmetro que permite, uma sociedade específica, considerar como pobres todos aqueles indivíduos que se encontrem abaixo do seu valor”.

Logo, para mensurar a pobreza de uma região é necessário, primeiramente, determinar a linha de pobreza a ser utilizada. No entanto, esta determinação tem sido objeto de intensos debates, visto que, mesmo envolvendo uma série de aspectos técnicos, sua fixação possui sempre um caráter arbitrário (SCHWARTZMAN, 2002).

Contudo, apesar deste caráter arbitrário, no Brasil tanto as instituições governamentais quanto vários pesquisadores adotam como referência para definição desta linha o Salário Mínimo (MACHADO, 2007). Isto porque, pelo menos por lei, no Brasil, o seu valor tem a obrigação de possibilitar ao trabalhador atender às necessidades vitais básicas de sua família ao longo de um mês. Deste modo, o salário mínimo deve ser suficiente para lhes proporcionar moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social (SEPLAG, 2008).

É comum, já há alguns anos no País, fortes críticas dirigidas ao “baixo valor” do salário mínimo, em que, a sociedade como um todo se refere ao seu valor como insuficiente para atender a todas as necessidades supracitadas. No entanto, esta questão nos conduz a um intenso debate que, em grande parte, foge aos objetivos deste trabalho. Para este estudo, o que importa é que, mesmo com as críticas, no Brasil, apenas as famílias com renda de até 1/2 salário mínimo per capita são consideradas pobres ou na linha de pobreza (SEPLAG, 2008). Deste modo, neste trabalho optou-se por seguir este mesmo critério, ao adotar uma linha de pobreza (Z) também de meio salário mínimo.

No entanto, como o período de análise varia de 1995 a 2005, foi dedicada uma especial atenção no sentido de manter constante o valor assumido pela linha de pobreza ao longo do tempo. Isto porque, durante esse período, o salário mínimo sofreu alterações de magnitude bastante diferenciada4 4 Entre 1995 e 2005 o valor do salário mínimo passou de R$ 100 para R$ 300, ou seja, houve um aumento em torno de 200%; enquanto no mesmo período a inflação variou 166%. Portanto, o salário mínimo teve um ganho real de cerca de 34%, descontada a inflação. ; contudo, para manter o grau comparativo entre os anos, não podem existir flutuações no valor real da linha de pobreza ao longo do tempo (MACHADO, 2007). Neste sentido, foi escolhido como base o ano de 2005, sendo deflacionado o valor correspondente a meio salário mínimo deste ano (R$ 150,00) de acordo com o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para os anos de 1995, 1999 e 2002. Esta opção permitiu transformar os valores nominais do salário mínimo em valores reais (ver Tabela 1).

Definidos, portanto, os valores da Tabela 1 como as linhas de pobreza a serem utilizadas, se torna apta a mensuração da pobreza. Neste trabalho, serão utilizadas as seguintes medidas: i) poverty headcount ratio (P0); ii) poverty gap (P1); iii) squared poverty gap (P2); e iv) income gap (I). Segundo Levy (1991), estes índices possuem importantes propriedades que possibilitam analisar a pobreza de forma detalhada, como será visto adiante.

O primeiro índice(poverty headcount ratio - P0) mede a proporção de pessoas pobres, ou seja, a proporção de pessoas que têm renda per capita domiciliar inferior à linha de pobreza. Este indicador é dado por:

Em que h é o número de pessoas pobres em uma população, ou seja, dada uma população com n pessoas ordenadas conforme valores crescentes da renda, h é dado por:

Em que li é igual a um se a pessoa estiver abaixo da linha de pobreza e igual a zero se estiver acima. Portanto, o P0 capta a extensão da pobreza e, devido às facilidades de cálculo e de interpretação, este índice é comumente utilizado como ponto de partida em estudos sobre pobreza. No entanto, a partir dele não é possível analisar a intensidade da pobreza, já que ele viola dois importantes axiomas que os índices de pobreza devem satisfazer5 5 Segundo LEVY (1991) os axiomas são o da monotonicidade e o da transferência. O primeiro diz que, dado outras coisas, uma redução no rendimento de uma família pobre deve aumentar o índice de pobreza. Já o segundo diz que, dado outras coisas, uma transferência de rendimentos de uma família pobre para qualquer outra família que é mais rica devem aumentar o índice de pobreza. .

Em primeiro lugar, o indicador não se altera quando é reduzida a renda de uma pessoa situada abaixo da linha de pobreza ou o inverso, isto é, quando a renda deste mesmo indivíduo se eleva sem alcançar a linha de pobreza. Ou seja, o P0 é insensível à intensidade da pobreza estando, portanto, em desacordo com o axioma da monotonicidade. Em segundo lugar, o indicador também é insensível à distribuição de renda entre os pobres, ou seja, quando há uma transferência regressiva de renda entre dois indivíduos pobres (de um indivíduo mais pobre para outro menos pobre) que não altere o número de pessoas abaixo da linha, o P0 não se altera. Logo, este também não satisfaz o axioma da transferência.

Portanto, o P0 nada diz sobre a intensidade e a distribuição da pobreza. Deste modo, serão utilizados, além deste, outros indicadores de pobreza, buscando incorporar informações adicionais sobre a pobreza do Nordeste ao trabalho.

O primeiro, dentre estes, é o índice do hiato de pobreza (poverty gap - P1). Ele capta a intensidade da pobreza para o conjunto da população pobre através da “[...] diferença entre a renda do pobre e a linha de pobreza, acumulada com relação à linha de pobreza” (SEN, 2001 apud MACHADO, 2007:34). Ou seja, mede a proporção adicional da renda da população total (n) necessária para elevar a renda de todos os pobres ao nível da linha de pobreza, por meio de uma perfeita focalização das transferências de renda. Logo, pode-se interpretar P1 como sendo o custo per capita de redução da pobreza. Formalmente, este índice pode ser calculado da seguinte forma:

no qual xi é a renda per capita domiciliar da i-ésima pessoa; logo (Z - xi) mede, para o indivíduo i considerado pobre, a defasagem entre a sua renda e a linha de pobreza.

A insuficiência de renda máxima possível ocorreria quando todos os indivíduos que estão abaixo da linha de pobreza tivessem renda zero. A insuficiência de renda mínima possível ocorreria na situação em que, se todas as pessoas consideradas pobres ganhassem exatamente o valor correspondente à linha de pobreza.

Seguindo este mesmo raciocínio, no entanto, levando-se em consideração apenas a renda da população pobre, tem-se o índice “hiato da renda” (income gap - I). Este mede a proporção adicional da renda da população pobre (h) necessária para elevar a renda de todos os pobres ao nível da linha de pobreza (DE JANVRY & SAUDOLET, 1995). Este índice é definido pela equação:

Neste sentido, quanto mais pobre for o indivíduo i, maior será o seu peso na agregação destes índices (P1 e I); e, como consequência, quanto maior a diferença entre o somatório da renda dos pobres e a linha de pobreza, maior serão os valores dos índices P1 e I (MACHADO, 2007).

Portanto, fica claro que ambos os indicadores atendem ao axioma da monotonicidade, ou seja, se houver uma transferência de renda de uma pessoa pobre para uma não pobre, os índices irão aumentar. Entretanto, se a transferência ocorrer entre dois pobres, os índices não se alteram, isto é, eles não são sensíveis à distribuição da pobreza. Logo, apesar de satisfazer ao axioma da monotonicidade, estes não satisfazem ao axioma da transferência.

Para sanar esta limitação, Foster, Green e Thorbecke (1984), propuseram uma medida de pobreza (Pα) definida a partir de uma média ponderada das medidas de pobreza de diferentes populações. Também chamado de “severidade da pobreza” (squared poverty gap - P2), este índice dá um peso maior às pessoas mais pobres, fazendo com que a desigualdade de renda entre os pobres seja levada em conta no seu resultado final. Neste sentido, as medidas da classe FGT podem ser formalizadas da seguinte forma:

No qual, quando α = 0 essa medida é igual a P0; quando α = 1 ela igual a P1; e quando α = 2 temos o P2. Portanto, fica claro que, neste último caso, por ser maior o valor do parâmetro (α = 2), maior peso está sendo dado às pessoas que se encontram mais afastadas da linha de pobreza (NERI, 1996). Por conseguinte, este índice satisfaz ambos os axiomas e, por esta razão, diante dos demais citados, pode ser considerado o que melhor representa o nível de pobreza de determinada localidade.

Neste contexto, considerando-se a utilização destes índices para proposição de políticas públicas de combate à pobreza, nota-se que o primeiro indicador (P0) favorece a aplicação de políticas que busquem elevar a renda dos menos pobres (aqueles cuja renda é mais próxima de Z). Já os P1, I e P2 favorecem a aplicação de políticas voltadas àqueles que têm renda bem abaixo de Z, ou seja, os mais pobres dos pobres (NEDER & SILVA, 2004). Portanto, por possuir resultados apontando para diferentes vieses de políticas, foram aplicados todos estes diferentes indicadores.

Por fim, vale destacar que os dados das rendas per capita familiares foram retirados das PNADs (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio) de 1995, 1999, 2002 e 2005, sendo expostos os dados dos nove estados nordestinos, bem como do próprio Nordeste e do Brasil, estes dois últimos com função de base de comparação, dividindo-os por zonas (rural e urbana), visando verificar se a pobreza na Região é um fenômeno voltado fundamentalmente à área rural, o que é de se esperar já que, de uma forma geral, esta costuma possuir uma pior infraestrutura econômico-social.

3. Resultados

Na Tabela 2, a seguir, são apresentadas as estimativas da proporção de pobres (P0) para os anos de 1995, 1999, 2002 e 2005 para os estados do Nordeste, bem como para as suas áreas rural e urbana, enquanto a Tabela 3, em seguida, apresenta a razão percentual entre o P0 estadual e os regional e nacional, visando facilitar a visualização dos diferenciais de pobreza existentes entre estas localidades. À primeira vista, analisando a Região como um todo, observa-se que, apesar de o Nordeste apresentar uma retração média abaixo da nacional (23,2% contra 27,5% do País), todos os seus estados reduziram sua proporção de pobres entre 1995 e 2005, destacando-se, neste período, Sergipe (29,0%) e Bahia (25,9%). Inclusive, o desempenho durante estes 10 anos fez com que ambos (Sergipe e Bahia) invertessem o posto de estados com menor proporção de pobres com Pernambuco, contudo, ambos mantendo-se ainda em pior situação quando comparado a média nacional (ver Tabela 3). Já Alagoas (15,7%) e Piauí (20,2%) foram os estados que apresentaram a tendência declinante menos acentuada no P0 entre 1995-2005. No caso de Alagoas a razão fundamental para este péssimo desempenho foi, claramente, o seu "mau desempenho" relativo entre 1999-2005, sendo o único estado a registrar elevação da pobreza neste período (2,4%). Por fim, vale destacar que, de 1995 a 2005, o estado que manteve a maior quantidade relativa de pobres foi o Maranhão, seguido de perto pelo Piauí.

Analisando, agora, as áreas urbana e rural, fica claro que há uma maior proporção de pobres no meio rural que no urbano. E, apesar da melhoria deste índice vir ocorrendo não só no meio urbano, mas também no rural em todos os estados, observa-se que, de um modo geral, está havendo uma crescente disparidade na distribuição da pobreza entre estes meios, já que dentre os nove estados que reduziram seu P0 total, em oito esta redução foi mais acentuada no meio urbano que no rural - a única exceção ficou com a Paraíba. Já em termos de proporção total, Piauí se manteve, de 1995 a 2005, como o estado de maior percentual de pobreza rural seguido, no ano de 2005, por Alagoas. Além disso, este alto índice de pobreza rural influenciou para que o Piauí se destacasse também no Nordeste como o estado com a maior disparidade rural-urbana no P0 em 2005 (36,7%). Já na zona urbana, o Maranhão se apresentou como o estado de maior P0 da Região em 2005 (52,4%), seguido por Piauí e Alagoas (ambos com 49,1%). No entanto, mesmo com este alto índice, o Maranhão se manteve com a maior equidade rural-urbana da Região tanto em 1995 quanto em 2005, o que indica que a pobreza também no seu meio rural se encontra alta, seguido por Sergipe no ano de 2005.

Nas Tabelas 4 e 5, a seguir, são apresentados, respectivamente, os valores do hiato de pobreza (P1) e a razão percentual destes valores referentes aos estados em função do Nordeste e do Brasil, para os mesmos anos. À primeira vista, analisando a Região como um todo, observa-se que, mesmo apresentando desempenho menos satisfatório quando comparado ao País (27,9% contra 30,4% do Brasil), o Nordeste apresentou em todos os seus estados uma redução neste índice entre 1995 e 2005, destacando-se, neste período, novamente Sergipe (33,3%) e Bahia (30,0%). Em razão deste bom desempenho, mais uma vez Sergipe e Bahia se sobressaem ao tomarem o posto de estados de menor P1, entre 1995 e 2005, apesar de ambos ainda se manterem em situação desfavorável quando comparados a situação do País (ver Tabela 5). Já o pior desempenho, no mesmo período, ficou novamente com Alagoas que acabou reduzindo o seu P1 de forma menos intensa que os demais estados - em apenas 19,4%, contra 25,4% de Pernambuco, que teve o segundo pior desempenho. Inclusive, em consequência deste mau desempenho, Alagoas acabou se tornando o estado com maior hiato de pobreza do Nordeste, ultrapassando o Maranhão que passou a ter em 2005 o segundo pior P1.

Analisando, agora, as áreas urbana e rural, fica novamente claro que o meio rural apresenta piores índices de pobreza que o urbano. No entanto, apesar de todos os estados reduzirem seus respectivos P1 em ambas as áreas entre 1995 e 2005, de um modo geral, novamente observa-se que o P1 se reduz na área urbana de forma mais intensa do que na rural na maioria dos estados (todos exceto Paraíba e Ceará) aumentando, assim, o desequilíbrio rural-urbano intraestadual na Região. Neste sentido, em 2005, Pernambuco aparece como o estado do Nordeste com maior dessemelhança rural-urbana neste índice; enquanto que Sergipe novamente se destaca positivamente, só que desta vez como o estado com a maior paridade, ultrapassando o Maranhão que tinha a maior equidade em 1995. Por fim, vale destacar mais uma vez Sergipe como o detentor do menor P1 rural em 2005, com a Bahia se sobressaindo no mesmo sentido no meio urbano; ao passo que, em termos negativos, Alagoas e Maranhão mais uma vez se mantiveram, também neste indicador, como os estados de maiores P1 rural e urbano do Nordeste.

Os resultados da severidade da pobreza (P2) mantêm a mesma tendência dos índices anteriores (ver Tabelas 6 e 7, a seguir). Inicialmente, observa-se que, apesar de ter havido uma redução do P2 no período 1995-2005 em todos os estados do Nordeste, destacando-se, mais uma vez, Sergipe (35,5%), seguido desta vez do Piauí (33,1%), a Região como um todo apresentou desempenho pior que o nacional (30,5% contra 32,0% do País). Assim como nos indicadores anteriores, devido ao seu bom desempenho Sergipe se tornou o estado de menor P2 do Nordeste, ultrapassando o Rio Grande do Norte nestes 10 anos, contudo mantendo-se em pior situação quando comparado a média nacional (ver Tabela 7). No sentido inverso, Alagoas também repetiu seu mau desempenho obtido nos indicadores anteriores, registrando a menor redução do P2 do Nordeste durante o mesmo período (apenas 21,8%, contra 27,9% de Pernambuco que obteve novamente o segundo pior desempenho), tornando-se, assim, o estado com maior severidade na pobreza (46,8%), ultrapassando o Maranhão, que passou a ser o segundo pior P2 do Nordeste entre 1995 e 2005.

Analisando, agora, a diferença rural-urbana, fica claro que, mesmo com a redução ocorrida em ambas as áreas no período 1995-2005, de uma forma geral, o meio rural apresenta índices de pobreza bem maiores que o urbano. No entanto, diferentemente dos demais índices, neste último não se observa uma forte tendência de ascensão na desigualdade da distribuição da severidade da pobreza entre os meios rural e urbano, já que dos nove estados do Nordeste, cinco (Maranhão, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Sergipe e Bahia) viram seu P2 urbano elevar-se mais que o rural. Os quatro estados restantes (Piauí, Ceará, Paraíba e Alagoas) viram seu P2 evoluir de forma inversa: rural acima do urbano. Examinando agora os dados de 2005, percebe-se que também neste índice mais uma vez se destacam: i) Sergipe e Paraíba como os estados que apresentaram o menor P2 rural e a menor disparidade rural-urbana neste índice; ii) Bahia e Rio Grande do Norte com o menor P2 urbano; e iii) Alagoas e Maranhão como os maiores índices de severidade de pobreza tanto no meio rural quanto urbano. Por último, vale destacar que Bahia e Pernambuco foram os estados que apresentaram a maior diferença entre o P2 rural e urbano.

Para finalizar, nas Tabelas 8 e 9, em seguida, encontram-se as mesmas informações anteriores, contudo, agora, referentes aos valores do hiato de renda (I). Nela, nota-se que não há uma diferença notável entre os indicadores dos estados; mas, como era de se esperar, há algumas modificações nos resultados gerais quando comparados aos obtidos anteriormente, já que, como visto nas Tabelas supracitadas, os indicadores de pobreza nordestinos são maiores quando comparados a média nacional. Deste modo, a renda agregada da população pobre na Região é, também, proporcionalmente maior quando comparada à do País. Sendo assim, no Nordeste é necessária uma menor proporção da renda de sua população pobre para elevar a condição destes indivíduos para acima da linha de pobreza. Deste modo, observa-se na Tabela 9 que todos os estados nordestinos apresentam razão percentual de seu hiato de renda abaixo da média nacional.

Analisando a Região como um todo, observa-se uma redução dos seus indicadores superior a média nacional (6% contra 4% do País), conduzido pela significativa redução relativa deste índice em todos os estados nordestinos entre 1995 e 2005, destacando-se, neste período, Piauí (10,8%) e Paraíba (8,0%). Por esta razão, Piauí ganhou o posto de menor hiato de renda entre os anos de 1995 e 2005 para o Maranhão. Já o estado com pior desempenho nestes 10 anos foi novamente Alagoas que, apesar de ter também melhorado o seu hiato de renda, esta se deu de forma menos intensa que nos demais estados (4,2%); enquanto que Pernambuco se manteve durante este 10 anos como o estado com o maior hiato de renda do Nordeste.

Analisando agora as áreas urbana e rural, observa-se que em todos os estados o hiato da renda era levemente maior no meio urbano que no rural em 2005; no entanto, excetuando-se o meio rural na Paraíba, a redução deste indicador se deu em ambas as áreas em todos os estados entre 1995-2005. Por fim, em termos brutos, vale salientar que Rio Grande do Norte apareceu como o estado com maior hiato de renda na área urbana do Nordeste, enquanto Alagoas se destaca mais uma vez, neste mesmo sentido, na zona rural; ambos os estados, inclusive, ultrapassaram Pernambuco no decorrer dos 10 anos de análise. Portanto, quando levado em conta apenas este índice, nota-se haver alguma mudança na ordenação da classificação dos estados, quando comparados aos índices anteriores, como era de se esperar.

De uma maneira geral, entre os estados analisados, observou-se que Sergipe e Bahia tiveram um melhor desempenho na redução dos índices de pobreza entre os anos de 1995 e 2005. No primeiro estado, isto se deve, não só a uma considerável elevação do seu PIB em relação aos demais, entre os anos de 1990 e 2003, como, principalmente, ao forte aumento no número de pessoas com idade legal para receber aposentadoria e cobertura previdenciária a partir de 1988 (OLIVEIRA, 2008). Já na Bahia, de acordo com Machado (2006), esta trajetória se deu principalmente devido à ocorrência de uma participação mais efetiva do governo estadual no combate à pobreza a partir da segunda metade da década de 1990, tendo como feito mais relevante a criação da Secretaria de Combate à Pobreza e Desigualdades Sociais (Secomp), em 2001.

Por outro lado, mesmo verificando uma considerável redução nos índices de pobreza alagoano - fruto de um conjunto de esforços empreendidos pelos governos federal e estadual e pela sociedade civil -, os dados das Tabelas anteriores mostram que este estado passou a ser o mais problemático do Nordeste, ultrapassando o Maranhão e o Piauí como possuidor dos piores índices de pobreza. De acordo com Tejada (2007), Jucema (2009) e Gomes (1999) esta infeliz realidade, comum aos três estados, é consequência da mesma razão: elevada desigualdade de renda e baixos níveis de escolaridade e de produtividade agrícola.

No entanto, apesar de serem observadas estas divergências nas intensidades dos comportamentos dos diferentes estados nordestinos, também se verificou que houve uma tendência semelhante na evolução dos indicadores de pobreza na Região - um considerável declínio entre 1995 e 2005.

Para Silveira Neto (2005), de um modo geral, a falta de estrutura social - com elevados níveis de desigualdade nas posses da renda e dos ativos produtivos - seria o principal responsável pelos péssimos índices de pobreza encontrados na Região no início da amostra. Contudo, nos primeiros anos do Plano Real - mesmo impondo uma política que visava principalmente eliminar inflação e expandir a renda em nível agregado, relegando, a segundo plano, problemas sociais e regionais do País - os indicadores de pobreza apresentaram uma tendência declinante, como mostram os dados. No entanto, apesar deste bom desempenho dos indicadores, segundo Gomes (1999), estas ações políticas pareciam ser pouco eficientes no combate à pobreza da Região, já que elas não batiam de frente com os problemas estruturais lá existentes.

Neste sentido, a partir do final daquela década, durante o segundo mandato de FHC, o governo federal estabeleceu uma série de políticas que não se restringiam à área econômica, mas que englobava ao conjunto das políticas públicas, incluindo as sociais, com o objetivo básico de combater de frente a pobreza e promover o desenvolvimento local dos espaços menos favorecidos do País (MANSO et al., 2006). Neste sentido, em julho de 1999, o governo articulou a criação do Programa Comunidade Ativa em parceria com as comunidades locais, governos estaduais e municipais e com o Sebra e, contribuindo para o enfrentamento da pobreza nos territórios mais deprimidos do Nordeste.

A partir de 2003, entra em cena o governo Lula e, junto com ele, uma forte expectativa popular de mudanças nos rumos das políticas públicas que, desde o início do governo FHC, tinha um claro protagonismo liberal (abertura comercial, privatizações, etc.). Deste modo, apesar de a política econômica manter-se ortodoxa, a necessidade de resposta às expectativas fez com que o governo federal iniciasse um programa social denominado Fome Zero. Aliada as péssimas condições de vida, uma grave seca no semiárido nordestino em 2003 fez com que o foco inicial deste programa fosse dado às famílias pobres dos municípios sertanejos, utilizando, inclusive, as características destas famílias como parâmetros para a escolha das demais famílias a serem beneficiadas com as transferências de renda, tratando secundariamente as demais regiões do País (BELIK & DEL GROSI, 2003).

Portanto, observa-se, de uma forma geral, que a partir de meados de 1994 uma série de ações - não só no âmbito assistencialista, como também nos âmbitos macroeconômico e de autossustentabilidade das economias locais - possibilitou o aumento na renda de várias comunidades carentes nordestinas criando, deste modo, condições para que a Região melhorasse (reduzisse) seus índices de pobreza. No entanto, vale salientar que: i) apesar desta melhoria, em 2005, os indicadores de pobreza no Nordeste ainda se encontravam em patamares alarmantes; e ii) apesar de o País ter gasto um montante considerável de recursos públicos com programas sociais, segundo Mendonça & Ortega (2005), em geral ainda há a necessidade de uma maior eficiência nestes gastos para que os impactos no combate à pobreza sejam maiores.

Por fim, vale destacar que, no Nordeste, a intensidade (P1) e a severidade (P2) da pobreza, além do hiato da renda (I), diminuíram em todos os estados em que houve redução expressiva da proporção de pobres (P0). Em outras palavras, para esses estados, a pobreza diminuiu em número, intensidade e severidade. Além disso, os estados com maior proporção de pobreza também possuíam as maiores intensidade e severidade da pobreza e hiato de renda.

4. Considerações Finais

Procurou-se captar neste trabalho a evolução da pobreza na Região Nordeste no período de 1995 a 2005. De uma maneira geral, todos os estados da Região apresentaram uma tendência semelhante no que diz respeito à evolução de seus indicadores. Isto ocorre, em boa parte, devido ao ajuste sofrido por estes, às políticas nacionais aplicadas no mesmo período: i) entre 1995 e 1999, melhoria considerável nos índices de pobreza, coincidindo com a fase inicial do Plano Real, quando os esforços estavam voltados, quase que exclusivamente, para a estabilização inflacionária e a elevação da renda agregada; e ii) entre 1999 e 2005, nova melhoria nos indicadores de pobreza, coincidindo com o período de criação e funcionamento de programas nacionais de combate à pobreza, após ficar claro que a estabilização, por si só, estava sendo insuficiente para gerar desenvolvimento sustentável no País.

Portanto, fica evidente que algumas mudanças ocorridas no Nordeste neste período se deram em função das políticas nacionais econômicas e sociais. No entanto, analisando mais detidamente a dinâmica dos estados, também foram observadas algumas tendências mais específicas. As principais são as seguintes: i) Sergipe e Bahia mantiveram os melhores desempenhos na redução dos índices que captam pobreza dentre os demais estados entre 1995 e 2005, ultrapassando, em alguns casos, Rio Grande do Norte e Paraíba, como os detentores dos melhores (mais baixos) índices de pobreza em 2005; e ii) Alagoas apresentou a menor redução entre 1995 e 2005, em razão, principalmente, do seu péssimo desempenho relativo entre 1999 e 2005, ultrapassando, deste modo, Maranhão e Piauí neste período como o estado possuidor dos piores indicadores de pobreza em 2005.

Já analisando a diferença rural-urbana, fica claro que a pobreza na Região é um fenômeno voltado principalmente à área rural, o que era de se esperar já que, de uma forma geral, esta possui uma pior infraestrutura econômico-social. Além disso, a disparidade na distribuição da pobreza entre estas duas zonas está se intensificando, uma vez que entre 1995 e 2005, de um modo geral, houve uma redução menos acentuada nos níveis de pobreza rural quando comparada com a urbana.

Por outro lado, ao examinar com minúcia o desempenho dos estados, são observadas algumas especificidades gerais, dentre as quais as principais para o ano de 2005 são: i) Sergipe e Paraíba possuem a menor disparidade rural-urbana; ii) Alagoas e Maranhão possuem os maiores indicadores de pobreza, tanto no meio rural quanto no urbano; iii) Bahia e Rio Grande do Norte possuem os menores índices de pobreza urbana, enquanto Sergipe e Paraíba se destacam neste mesmo sentido no meio rural.

Vale também destacar que, embora os resultados do hiato de renda difiram um pouco dos demais três índices - mas, sem maiores consequências para as conclusões gerais acima expostas - os resultados sugerem que os estados com maior proporção de pobreza também possuíam as maiores intensidade e severidade da pobreza e hiato de renda. Além disso, vale salientar que, embora a partir de 1995 os indicadores de pobreza venham melhorando, em 2005 estes ainda se encontravam em patamares alarmantes.

Portanto, fica patente que, mesmo com uma menor capacidade de investimento do estado pós-Plano Real, a dinâmica da pobreza no Nordeste sofre influência decisiva da ação federal, já que ele mantém um papel decisivo no estímulo e na coordenação das políticas implantadas, fato este que não pode ser totalmente descartado como influente na dinâmica econômica, principalmente, dos territórios menos desenvolvidos. Deste modo, no momento em que se discute o andamento das políticas implementadas pelos governos é imprescindível lembrar esse seu papel indutor, para que, com isso, estas políticas sejam voltadas àqueles(as): i) cidadãos que mais precisem; ii) localidades mais pobres; e iii) atividades/setores capazes de reduzir a pobreza. Esta focalização é fundamental para a manutenção da tendência visível de redução da pobreza no Nordeste durante a década de análise.

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  • 1
    Entre 1960 e 1989, o Nordeste cresceu a uma taxa média anual de 6,4%, enquanto a economia brasileira avançava em 6,0% ao ano. Ao mesmo tempo, o produto
    per capita do nordestino passa de 43,5% em 1960 para 61,4% do produto
    per capita do Brasil em 1988 (MAIA GOMES, 1991). Segundo Lima (1994), de uma maneira geral, esta melhoria se deve, em boa parte, aos incentivos fiscais dados ao Nordeste pela Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) ao longo de três décadas (para se ter uma ideia, entre 1963 e 1990, cerca de US$ 6,7 bilhões foram liberados).
  • 2
    Apesar de concentrar quase 30% da população do Brasil, a participação nordestina no PIB nacional não passava de cerca de 14% em 2005. Consequentemente, o seu PIB
    per capita neste ano atingia apenas o patamar de 47,5% do respectivo PIB nacional, segundo dados do IBGE. Adicionalmente, segundo levantamento da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), divulgado em 1999, as 150 cidades brasileiras com a maior taxa de desnutrição se encontram no Nordeste (UNICEF, 2008).
  • 3
    Crescimento econômico não pode ser confundido com desenvolvimento. O primeiro se constitui no acréscimo de renda agregada, enquanto o segundo envolve um amplo conjunto de variáveis que indicam melhoria nas condições de vida da população, tais como expectativa de vida, acesso a serviços de saúde, educação, etc.
  • 4
    Entre 1995 e 2005 o valor do salário mínimo passou de R$ 100 para R$ 300, ou seja, houve um aumento em torno de 200%; enquanto no mesmo período a inflação variou 166%. Portanto, o salário mínimo teve um ganho real de cerca de 34%, descontada a inflação.
  • 5
    Segundo LEVY (1991) os axiomas são o da monotonicidade e o da transferência. O primeiro diz que, dado outras coisas, uma redução no rendimento de uma família pobre deve aumentar o índice de pobreza. Já o segundo diz que, dado outras coisas, uma transferência de rendimentos de uma família pobre para qualquer outra família que é mais rica devem aumentar o índice de pobreza.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Set 2010
    • Data do Fascículo
      Mar 2010
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