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Análise comparativa da competitividade das exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos e Argentina

Comparative analysis of the competitiveness of soybean exports from Brazil, the United States, and Argentina

Resumo

O objetivo do trabalho foi comparar o desempenho das exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos e Argentina no período de 2002 a 2017. Como procedimento metodológico, analisou-se as séries temporais dos maiores exportadores e importadores, e utilizou-se do modelo Constant Market Share para mensurar os efeitos crescimento do comércio mundial, destino das exportações e competitividade dos três maiores exportadores. A China foi o maior responsável por impulsionar o crescimento mundial das importações de soja em grão no período analisado. O efeito crescimento do comércio mundial favoreceu os três países exportadores. Os EUA e a Argentina foram favorecidos pelo destino das exportações. O efeito competitividade, por sua vez, se mostrou positivo para o Brasil e negativo para a Argentina e os Estados Unidos. Concluindo-se, o efeito competitividade positivo brasileiro se deveu ao crescimento da participação nas importações chinesas (de 29% para 44%) e dos Outros Mercados Importadores (de 18,74% para 38,63%). A Argentina e os EUA perderam participação no mercado chinês, nos outros mercados importadores e nas importações mundiais. No entanto, não se deve estender tal conclusão para o complexo agroindustrial da soja, pois a maior parte das exportações argentinas são de farelo e óleo de soja.

Palavras-chave:
competitividade; soja em grão; Brasil; Estados Unidos; Argentina

Abstract

The aim of the study was to compare the performance of Brazilian, North-American, and Argentine soybean exports in the period from 2002 to 2017. As a methodological procedure, we analyzed the time series of the largest exporters and importers and used the Constant Market Share model to measure the effects of world trade growth, export destination, and competitiveness of the three largest exporters. China was the main responsible for boosting the global growth of soybean imports in the analyzed period. The effect of world trade growth favored the three exporting countries. Meanwhile, the export destination effect favored the US and Argentina and disfavored Brazil. The competitiveness effect, in turn, was positive for Brazil and negative for Argentina and the United States. It can be concluded that the positive effect regarding Brazilian competitiveness was due to the increased participation in Chinese imports (from 29% to 44%) and in Other Import Markets (from 18.74% to 38.63%). Argentina and the US lost shares in the Chinese market, in other import markets, and in world imports. However, this conclusion should not be extended to the soy agro-industrial complex, as most Argentine exports are of soybean meal and oil.

Keywords:
competitiveness; soybean grain; Brazil; United States of America; Argentina


1 INTRODUÇÃO

A produção e exportação de soja em grão pelo Brasil tem apresentado crescimento nos últimos vinte anos. O aumento das exportações de um país é alavancado através do crescimento do comércio mundial de determinado produto, da inserção do país (devido a acordos comerciais ou atributos da mercadoria, como qualidade, menores preços, etc.) em mercados com maior crescimento de importações e/ou pela ampliação da participação do país em mercados importadores regionais e no mercado importador mundial.

O Brasil, os Estados Unidos da América (EUA) e a Argentina são os maiores produtores e exportadores da soja em grão no mundo. Conforme dados da Food and Agriculture Organization of the United Nations (2019)Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2019). FAOSTAT. Recuperado em 23 de novembro de 2019, de http://faostat.fao.org
http://faostat.fao.org...
, os três países responderam em média por aproximadamente 80,6% da produção mundial e 87,9% das exportações de soja em grão entre os anos de 2002 e 2017. A porcentagem das exportações em relação à produção de soja, principalmente no Brasil e nos Estados Unidos, apresenta-se bastante significativa. Nos dois países, a relação entre a exportação e produção de soja ampliou-se de 37,93% para 59,49% e de 36,57% para 46,34%, respectivamente, de 2002 a 2017, neste período ocorreu declínio na Argentina, passando de 20,54% para 13,46%, ressaltando-se para a maior relevância das exportações da ração e óleo de soja pelo país.

Cinquenta anos atrás, os EUA exportavam mais soja e produtos de soja do que qualquer outro país no mundo. Desde então, o Brasil e a Argentina tornaram-se importantes produtores e comerciantes dessa cultura, e agora competem com os Estados Unidos nos mercados mundiais. O crescimento da demanda chinesa permitiu a expansão da produção e exportação da soja, principalmente do Brasil (Meade et al., 2016Meade, B., Puricelli, E., Mcbride, W., Valdes, C., Hoffman, L., Foreman, L., & Dohlman, E. (2016). Corn and Soybean production costs and export competitiveness in Argentina, Brazil, and the United States (Economic Information Bulletin, No. 154, 52 p.). Washington.).

De acordo com dados divulgados pela Food and Agriculture Organization of the United Nations (2019)Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2019). FAOSTAT. Recuperado em 23 de novembro de 2019, de http://faostat.fao.org
http://faostat.fao.org...
, o Brasil, os EUA e a Argentina foram responsáveis pela exportação de 93,64% de toda a soja em grão demandada pela China no período de 2002 a 2017. Já o Brasil e os Estados Unidos, nesse mesmo período, supriram 70,43% da demanda da União Europeia. Os dois países no período foram responsáveis também por 81,11% da importação japonesa de soja em grão.

De 1960 até 2018, além do aumento no volume de produção, com fortes mudanças regionais e do comércio internacional, também aumentou consideravelmente a produtividade devido ao avanço tecnológico. Instituições e corporações de pesquisa, desenvolvimento e inovação, inicialmente nos Estados Unidos (para regiões temperadas) e, posteriormente, no Brasil (para soja tropical), desenvolveram cultivares mais produtivas e sistemas de produção mais eficientes.

Ampliou-se ainda a área ocupada com soja, principalmente no Brasil, devido à disponibilidade de terras aráveis, com o intuito de atender à crescente demanda mundial (Contini et al., 2018Contini, E., Gazzoni, D., Aragão, A., Mota, M., & Marra, R. (2018). Complexo soja: caracterização e desafios tecnológicos (Série Desafios do Agronegócio Brasileiro, 35 p.). Brasília: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.). A soja foi introduzida comercialmente no Brasil na década de 1960, no Rio Grande do Sul, e, nos últimos 50 anos, expandiu-se para todas as regiões do país. Destaca-se seu crescimento nos cerrados do Centro-Oeste e, mais recentemente, nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia (MATOPIBA). Além do crescimento da demanda chinesa e das mudanças tecnológicas, a isenção tributária promovida pela Lei Kandir, em 1996, exonerou a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre produtos primários, incentivando assim a exportação da soja em grão (Ramos et al., 2020Ramos, C., Pizaia, M., Caldarelli, C., & Camara, M. (2020). Competitividade e inserção da soja brasileira no mercado internacional. Revista de Ciências Agrárias, 43(1), 74-85.).

Além do incentivo tributário, a expansão da produção e, consequentemente, das exportações brasileiras, podem ser atribuídas ao desenvolvimento de novas tecnologias, como o plantio direto, responsável pela redução da erosão a valores insignificantes; cultivares adequadas às condições brasileiras, em especial com insensibilidade ao comprimento do dia e tolerância ou resistência às principais enfermidades da cultura; correção e adubação do solo, otimizando o uso de corretivos e fertilizantes e permitindo a ocupação dos Cerrados; fixação biológica de nitrogênio, que permite poupar, anualmente, em fertilizantes nitrogenados; manejo de pragas da soja, que reduziu em estimados 70% o uso de agrotóxicos e a sua toxicidade, ao longo do período; manejo de plantas daninhas, que, entre outros aspectos, viabilizou a expansão do Plantio Direto; mecanização agrícola, com o acesso a máquinas e implementos modernos; múltiplas safras anuais, diluindo os investimentos e os custos fixos e otimizando os custos variáveis da propriedade. As novas tecnologias permitiram a adaptação da cultura em mais regiões brasileiras, o incremento da produtividade e a redução dos custos (Gazzoni, 2012Gazzoni, D. L. (2012) Sustentabilidade da soja no Brasil. In VI Congresso Brasileiro de Soja (pp. 1-5). Cuiabá, MT.). A expansão da área para ampliar a produção no Brasil ocorreu principalmente com a expansão dos Cerrados da região Centro-Oeste e, mais recentemente, para as regiões do Norte e Nordeste (MATOPIBA) (Contini et al., 2018Contini, E., Gazzoni, D., Aragão, A., Mota, M., & Marra, R. (2018). Complexo soja: caracterização e desafios tecnológicos (Série Desafios do Agronegócio Brasileiro, 35 p.). Brasília: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.).

As alterações tributárias e as novas tecnologias fizeram do Brasil um dos maiores produtores e exportadores de soja em grão. No ano de 2017, o Brasil foi o maior exportador mundial da commodity, exportando 68,2 milhões de toneladas, representando 44,68% de toda a soja exportada no mundo. Naquele ano, os Estados Unidos foram os maiores produtores mundiais, com produção de aproximadamente 119,5 milhões de toneladas de soja. O Brasil foi o segundo maior produtor, com produção de aproximadamente 114,6 milhões de toneladas, representando 32,49% de toda a soja produzida mundialmente (Companhia Nacional de Abastecimento, 2018Companhia Nacional de Abastecimento – CONAB. (2018). Prévia: perspectivas para agropecuária. Safra 2018/2019 (Vol. 6). Brasília: CONAB. Recuperado em 10 de novembro de 2019, de http://conab.gov.br/perspectivas-para-a-agropecuaria
http://conab.gov.br/perspectivas-para-a-...
).

Entre 2004/05 e 2018/19, ocorreu um crescimento da demanda mundial por soja. O maior aumento ocorreu na demanda da China, com uma variação positiva no período de 178,8%, enquanto nos Estados Unidos aumentou 16,3%, na Argentina 66,7% e no Brasil 44,6%. O consumo no Brasil deve-se principalmente à incorporação da soja na alimentação animal, particularmente de suínos e aves (Contini et al., 2018Contini, E., Gazzoni, D., Aragão, A., Mota, M., & Marra, R. (2018). Complexo soja: caracterização e desafios tecnológicos (Série Desafios do Agronegócio Brasileiro, 35 p.). Brasília: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.).

O objetivo geral desta pesquisa foi de comparar o desempenho das exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos da América e Argentina nos principais mercados de destino no período de 2002 a 2017. Para se atingir tal objetivo, o trabalho propôs os seguintes objetivos específicos: i) Apresentar as séries históricas das importações dos maiores importadores (China, União Europeia e Japão) e dos demais importadores; ii) Apresentar as séries históricas das exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos, Argentina e outros países, e iii) Mensurar o Constant Market Share para as exportações de soja em grão do Brasil, dos Estados Unidos e da Argentina.

A metodologia do indicador de Constant Market Share tem sido utilizada na literatura nacional e internacional para identificar os fatores geradores do crescimento das exportações: efeito crescimento do mercado, efeito destino das exportações e efeito competitividade. Na literatura internacional, destacam-se os trabalhos de Capobianco-Uriarte et al. (2017)Capobianco-Uriarte, M., Aparicio, J., & Pablo-Valenciano, J. (2017). Analysis of Spain’s competitiveness in the European tomato market: an application of the Constant Market Share method. Spanish Journal of Agricultural Research, 15(3), e0113. http://dx.doi.org/10.5424/sjar/2017153-10629
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e Liu et al. (2020)Liu, Y., Shi, X., & Laurenceson, J. (2020). Dynamics of Australia’s LNG export performance: a modified constant market share analysis. Energy Economics, 89, 104808., que também utilizaram deste método de análise. No primeiro estudo, analisou-se a competitividade das exportações de tomate da Espanha enquanto o segundo avaliou as exportações de Gás Natural Liquefeito (GNL) da Austrália.

No Brasil, esta metodologia tem sido amplamente utilizada para avaliar a competitividade das exportações de commodities agrícolas, destacando-se os seguintes artigos: Coronel (2008)Coronel, D. A. (2008) Fontes de crescimento e orientação regional das exportações brasileiras do complexo soja (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre., Coronel et al. (2009)Coronel, D. A., Machado, J. A. D., & Carvalho, F. M. A. (2009). Análise da competitividade das exportações do complexo soja brasileiro de 1995 a 2006: uma abordagem de Market Share. Revista de Economia Contemporânea, 13(2), 281-307., Ramos et al. (2020)Ramos, C., Pizaia, M., Caldarelli, C., & Camara, M. (2020). Competitividade e inserção da soja brasileira no mercado internacional. Revista de Ciências Agrárias, 43(1), 74-85., Souza & Bittencourt (2019)Souza, K. A., & Bittencourt, G. M. (2019). Avaliação do crescimento das exportações brasileiras de soja em grão. Revista de Política Agrícola, 28(4), 48-67., Marques et al. (2017)Marques, J. J. S., Araujo, J. M., Lima, S. S., & Reis, F. A. (2017). Competitividade das exportações brasileiras de castanha de caju e o efeito da crise de 2008. Ensaios FEE, 38(1), 135-162., Oliveira (2014)Oliveira, A. C. (2014). Competitividade e a parcela de mercado: uma abordagem Constant Market Share para soja em grão brasileira (2002-2017) (Tese de doutorado). Universidade Federal de Alfenas, Varginha., Vitti (2009)Vitti, A. (2009) Análise de competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas no mercado internacional (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba., Stalder (1997)Stalder, S. H. G. M. (1997). Análise da participação do Brasil no mercado internacional de açúcar (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba. e Burnquist & Stalder (1999)Burnquist, H. L., & Stalder, S. H. G. M. (1999). Desempenho recente das exportações brasileiras de açúcar: abordagem “Market Share” constante. Revista de Economia e Sociologia Rural, 37(3), 69-90.. Nestas pesquisas, foi utilizado o modelo Constant Market Share para avaliar as exportações de soja, frutas selecionadas, castanha de caju e açúcar.

A originalidade desta pesquisa frente aos demais trabalhos publicados na literatura consiste na mensuração dos três efeitos: crescimento do comércio mundial, destino das exportações e competitividade, mensurados pelo modelo de Constant Market Share para os três maiores exportadores de soja em grão do mundo (Brasil, Estados Unidos e Argentina), propiciando, assim, avaliar comparativamente o desempenho dos três países nos principais mercados importadores e nas importações totais do produto.

Além desta introdução, a sequência do artigo discorre sobre a revisão de literatura, contemplando as bases conceituais do modelo de Constant Market Share e sua utilização na cadeia produtiva da soja. Este tópico tem como finalidade o melhor entendimento das bases conceituais do modelo e apresentar resultados relevantes obtidos em outras pesquisas com potencial de subsidiar as discussões dos resultados deste estudo. Na sequência, nos Materiais e Métodos, apresentaremos as fontes dos dados utilizados na pesquisa e os procedimentos metodológicos. Posteriormente, discorre-se sobre os resultados obtidos com a pesquisa e realizam-se discussões sobre tais resultados. Finaliza-se o artigo com as conclusões.

2 FUNDAMENTAÇÃO TÉORICA: BASES CONCEITUAIS DO MODELO CONSTANT MARKET SHARE E SUA UTILIZAÇÃO NA CADEIA PRODUTIVA DA SOJA

A competitividade pode ser definida a partir das teorias de concorrência como sendo a capacidade de sobreviver de forma sustentável, crescendo em mercados novos e concorrentes (Farina, 1999Farina, E. M. M. Q. (1999). Competitividade e coordenação de sistemas agroindustriais: um ensaio conceitual. Revista Gestão & Produção, São Paulo, 6(3), 147-161.). Para Gasques & Conceição (2002)Gasques, J. G., & Conceição, J. C. P. R. (2002). Indicadores de competitividade e de comércio exterior da agropecuária brasileira (Texto para Discussão, No. 908, 97 p.). Brasília: Instituto de Pesquisa de Economia Aplicada., a competitividade pode ser entendida como a capacidade de uma empresa, região ou país de produzir um bem de forma mais eficiente em relação aos demais. A análise da competitividade utiliza dois indicadores: i) a eficiência técnica dos processos produtivos e ii) o desempenho de mercado. O modelo de Constant Market Share é utilizado como indicador de competitividade através do desempenho de mercado de um país nas exportações de um ou mais produtos (Lastres & Cassiolato, 1995Lastres, H. M. M., & Cassiolato, J. E. (1995). Contribuição do PADCT para a melhoria das condições de competitividade da indústria brasileira (102 p.). Ministério da Ciência e Tecnologia.).

No mercado de commodities, a competitividade reflete a influência de diferentes fatores, incluindo não apenas a dotação de recursos na produção e as condições agroclimáticas, mas também o impacto de políticas macroeconômicas (como a taxa de câmbio, disponibilidade e custos de trabalho, investimentos e energia, etc.), políticas específicas do setor (subsídios de crédito, impostos de importação ou exportação sobre insumos ou produtos finais) e infraestrutura (relacionado ao armazenamento e transporte), as quais ajudam mercados a funcionar de forma eficaz, depende também da demanda interna e dos retornos relativos de outras safras (Schnepf et al., 2001Schnepf, R. D., Dohlman, E., & Bolling, C. (2001). Agriculture in Brazil and Argentina: developments and prospects for major field crops (85 p.). Washington: United States Department of Agriculture, International Agriculture and Trade Outlook.).

O modelo de Constant Market Share tem como objetivo avaliar a participação de um país nas transações mundiais de comércio, bem como a desagregação das tendências de crescimento das exportações ou importações de acordo com as ações que as originaram. Constituem-se de estudos exploratórios sobre as exportações de um determinado país, englobando seus fatores estruturais e sua competitividade. Assim, o modelo de Constant Market Share é utilizado para mensurar os fatores influenciadores no desempenho das exportações de um determinado país ou bloco econômico para um ou mais produtos em certo período (Coronel et al., 2009Coronel, D. A., Machado, J. A. D., & Carvalho, F. M. A. (2009). Análise da competitividade das exportações do complexo soja brasileiro de 1995 a 2006: uma abordagem de Market Share. Revista de Economia Contemporânea, 13(2), 281-307.; Stalder, 1997Stalder, S. H. G. M. (1997). Análise da participação do Brasil no mercado internacional de açúcar (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba.).

Segundo Vitti (2009)Vitti, A. (2009) Análise de competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas no mercado internacional (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba., as análises realizadas utilizando o modelo de Constant Market Share permitem quantificar os efeitos do crescimento do comércio internacional, do destino das exportações e da competitividade nas exportações de um ou mais produtos de um país. Conforme Burnquist & Stalder (1999)Burnquist, H. L., & Stalder, S. H. G. M. (1999). Desempenho recente das exportações brasileiras de açúcar: abordagem “Market Share” constante. Revista de Economia e Sociologia Rural, 37(3), 69-90., o modelo descrito a seguir trata do volume exportado de uma determinada commodity i por um país A.

Tem-se assim:

j V j = V (1)

Vj= exportação de uma determinada commodity i do país A para o país j, no período 1;

V= exportação total de uma determinada commodity i do país A, no período 1.

Ainda segundo Burnquist & Stalder (1999)Burnquist, H. L., & Stalder, S. H. G. M. (1999). Desempenho recente das exportações brasileiras de açúcar: abordagem “Market Share” constante. Revista de Economia e Sociologia Rural, 37(3), 69-90., a Equação 1 representa o volume total exportado pelo país A para os mercados j no período 1, sendo a mesma aplicada no período 2, representada pela equação:

j V ' j = V ' (2)

Vj'= exportação de uma determinada commodity i do país A para o país j, no período 2;

V= exportação total de uma determinada commodity i do país A, no período 2.

Para Burnquist & Stalder (1999)Burnquist, H. L., & Stalder, S. H. G. M. (1999). Desempenho recente das exportações brasileiras de açúcar: abordagem “Market Share” constante. Revista de Economia e Sociologia Rural, 37(3), 69-90., a diferença do total exportado de uma determinada commodity i pelo país A entre o período 1 e 2 pode ser representada por (V’- V). Tem-se assim um primeiro nível de desagregação matemática:

V V = r V + V V r V (3)

r= variação percentual no total de exportações mundiais da commodity do período 1 para o 2.

Segundo Stalder (1997)Stalder, S. H. G. M. (1997). Análise da participação do Brasil no mercado internacional de açúcar (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba., a variação das exportações pode ter sido causada pelo crescimento das exportações globais, pelo destino das exportações da commodity do país e pela competitividade do país (ver Equação 4).

V V = r V + j ( r r j ) V j 0 + j ( V j ' V j r j V ) 1 2 3 (4)

rj= variação percentual nas exportações da commodity i do período 1 para o 2.

Conforme Vitti (2009)Vitti, A. (2009) Análise de competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas no mercado internacional (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba., o crescimento efetivo das exportações de um país é decomposto em três efeitos distintos:

  1. i

    Efeito crescimento do comércio mundial: O crescimento das importações mundiais de um produto impulsiona o crescimento das exportações deste produto pelo país. Supondo a permanência do Market Share do país no comércio mundial, a variação das importações mundiais desencadeia uma variação nas exportações do país (Tomich, 1999Tomich, F. A. (1999). Competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas (Tese de doutorado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa.; Vitti, 2009Vitti, A. (2009) Análise de competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas no mercado internacional (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba.);

  2. ii

    Efeito destino das exportações: As exportações de um país não são distribuídas de forma homogênea entre os mercados importadores devido aos acordos comerciais e questões logísticas, entre outros motivos. O efeito destino das exportações avalia como as variações das importações dos mercados de destino impactam nas exportações de um ou mais produtos pelo país. Caso o país mantenha o Market Share nos mercados importadores, a variação do mercado importador deverá desencadear variações nas exportações do país (Tomich, 1999Tomich, F. A. (1999). Competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas (Tese de doutorado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa.; Vitti, 2009Vitti, A. (2009) Análise de competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas no mercado internacional (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba.);

  3. iii

    Efeito competitividade: O efeito competitividade capta a variação das exportações de um país não atribuída à manutenção do Market Share no mercado mundial e nos destinos das exportações (Burnquist & Stalder, 1999Burnquist, H. L., & Stalder, S. H. G. M. (1999). Desempenho recente das exportações brasileiras de açúcar: abordagem “Market Share” constante. Revista de Economia e Sociologia Rural, 37(3), 69-90.). Caso o país tenha aumentado as exportações em maior quantidade em relação ao crescimento do mercado mundial e dos mercados importadores, ocorre um ganho de competitividade do país em relação aos demais. Caso o país não tenha acompanhado a variação das importações mundiais ou dos mercados de destino, sinaliza-se para uma perda de competitividade. Conforme Vitti (2009)Vitti, A. (2009) Análise de competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas no mercado internacional (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba., países capazes de oferecer os mesmos produtos com preços menores em relação aos seus competidores desencadeiam um aumento no seu Market Share, refletindo em uma maior competitividade (Vitti, 2009Vitti, A. (2009) Análise de competitividade das exportações brasileiras de frutas selecionadas no mercado internacional (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba.). Segundo Stalder (1997)Stalder, S. H. G. M. (1997). Análise da participação do Brasil no mercado internacional de açúcar (Dissertação de mestrado). Escola Superior de Agricultura “Luiz Queiroz”, Universidade de São Paulo, Piracicaba., existem outros fatores pelos quais também interferem na atratividade relativa das exportações de um país, tais como: acordos comerciais, melhoria de qualidade, melhoria na eficiência do marketing ou termos financeiros das operações de vendas, eficiência no atendimento satisfatório das encomendas dos importadores, etc.

Na literatura, destacam-se os trabalhos de Figueiredo et al. (2004)Figueiredo, A. M., Santos, M. L., & Lírio, V. S. (2004). Análise de Market-Share: fontes de variação das exportações brasileiras de soja. Revista de Economia e Agronegócio, 2(3), 335-360., Coronel (2008)Coronel, D. A. (2008) Fontes de crescimento e orientação regional das exportações brasileiras do complexo soja (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. e Coronel et al. (2009)Coronel, D. A., Machado, J. A. D., & Carvalho, F. M. A. (2009). Análise da competitividade das exportações do complexo soja brasileiro de 1995 a 2006: uma abordagem de Market Share. Revista de Economia Contemporânea, 13(2), 281-307., Souza & Bittencourt (2019)Souza, K. A., & Bittencourt, G. M. (2019). Avaliação do crescimento das exportações brasileiras de soja em grão. Revista de Política Agrícola, 28(4), 48-67. e Ramos et al. (2020)Ramos, C., Pizaia, M., Caldarelli, C., & Camara, M. (2020). Competitividade e inserção da soja brasileira no mercado internacional. Revista de Ciências Agrárias, 43(1), 74-85. sobre a utilização do modelo Constant Market Share sobre a cadeia produtiva da soja no Brasil.

Figueiredo et al. (2004)Figueiredo, A. M., Santos, M. L., & Lírio, V. S. (2004). Análise de Market-Share: fontes de variação das exportações brasileiras de soja. Revista de Economia e Agronegócio, 2(3), 335-360. utilizaram o modelo Constant Market Share para o período de 1997 a 2002 em relação ao período de 1990 a 1996. Constatou-se um aumento da competitividade para a soja em grão e uma redução para o farelo e óleo de soja. Constou-se, inclusive, uma elevação da parcela de mercado da soja em grão e um declínio para o farelo e óleo de soja.

Coronel (2008)Coronel, D. A. (2008) Fontes de crescimento e orientação regional das exportações brasileiras do complexo soja (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. utilizou o modelo de Constant Market Share para identificar as principais fontes de crescimento do complexo soja (grão, farelo e óleo) brasileiro entre 1995 e 2004. Para a análise, dividiu-se o período em três partes: 1995 até 1998, 1999 até 2001 e 2002 até 2004. Constataram-se ganhos de competitividade positivos para os produtos analisados, sendo o maior ganho para a produção de soja em grão, ocorrendo menores ganhos no período de 2002 a 2004 em relação ao período de 1999 a 2001. Coronel et al. (2009)Coronel, D. A., Machado, J. A. D., & Carvalho, F. M. A. (2009). Análise da competitividade das exportações do complexo soja brasileiro de 1995 a 2006: uma abordagem de Market Share. Revista de Economia Contemporânea, 13(2), 281-307. realizaram a mesma análise para os períodos de 1995 a 1998, 1999 a 2001 e 2002 a 2006 para a soja em grão e o farelo e óleo. Eles também constataram ganhos de competitividade positivos para os produtos analisados, sendo o maior ganho para a produção de soja em grão. Entretanto, foi observada uma redução no ganho de competitividade no último período.

Souza & Bittencourt (2019)Souza, K. A., & Bittencourt, G. M. (2019). Avaliação do crescimento das exportações brasileiras de soja em grão. Revista de Política Agrícola, 28(4), 48-67. utilizaram o modelo de comércio internacional Constant Market Share entre o período de 1997 a 2016 para analisar as exportações da soja em grão no Brasil, dividindo-se a análise em cinco períodos: 1997 a 2000, 2001 a 2004, 2005 a 2008, 2009 a 2012 e 2013 a 2016. Em todos os períodos analisados foi constatado um efeito positivo, tanto do comércio internacional quanto da competitividade, para explicar o crescimento das exportações de soja em grão no país.

De acordo com Ramos et al. (2020)Ramos, C., Pizaia, M., Caldarelli, C., & Camara, M. (2020). Competitividade e inserção da soja brasileira no mercado internacional. Revista de Ciências Agrárias, 43(1), 74-85., o modelo Constant Market Share permitiu identificar as principais fontes de crescimento das exportações brasileiras do complexo agroindustrial de soja em três períodos: 2005 a 2008, 2009 a 2012 e 2013 a 2016. Constaram-se efeitos positivos do crescimento do comércio internacional, destinos das exportações e competitividade para as exportações do complexo agroindustrial da soja como um todo.

3 metodologia

As bases de dados utilizadas nesta pesquisa foram a Food and Agriculture Organization of the United Nations (2019)Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2019). FAOSTAT. Recuperado em 23 de novembro de 2019, de http://faostat.fao.org
http://faostat.fao.org...
, para dados de exportações/importações e produção gerais, e a Secretaria de Comércio Exterior [SECEX] (Brasil, 2019Brasil. Secretaria de Comércio Exterior – SECEX. (2019). Exportação e importação geral. Recuperado em 15 de outubro de 2019, de http://comexstat.mdic.gov.br/pt/geral
http://comexstat.mdic.gov.br/pt/geral...
), para dados específicos sobre as exportações brasileiras. Os dados referentes às exportações dos Estados Unidos foram coletados junto ao United States Department of Agriculture (2019)United States Department of Agriculture – USDA. (2019). Data products. Recuperado em 25 de outubro de 2019, de https://apps.fas.usda.gov/gats/default.aspx
https://apps.fas.usda.gov/gats/default.a...
, e os dados sobre as exportações argentinas foram coletados junto ao Ministerio de la Agricultura, Ganadería y Pesca (Argentina, 2019Argentina. Ministerio de Agricultura, Ganadería y Pesca. (2019). Datos agroindutriales. Recuperado em 2 de dezembro de 2019, de https://www.magyp. gob.ar/sitio/areas/ss_mercados_agropecuarios/exportaciones/
https://www.magyp. ...
) e ao Instituto Nacional de Estadística y Censos (2019)Instituto Nacional de Estadística y Censos – INDEC. (2019). Sistema de consulta de comercio exterior de bienes. Recuperado em 2 de dezembro de 2019, de https://comex.indec.gov.ar
https://comex.indec.gov.ar...
.

Procedimentos Metodológicos

Para se cumprir os objetivos propostos, realizou-se inicialmente uma análise comparativa das séries históricas das importações da China, União Europeia, Japão e demais importadores, e das importações totais. Em seguida, foi realizada uma análise comparativa das séries históricas das exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos, Argentina e outros países no período de 2002 a 2017, permitindo assim avaliar as dinâmicas dos mercados importadores e dos países exportadores no período.

Posteriormente, foram realizados os procedimentos para as mensurações do modelo de Constant Market Share, seguindo as etapas subsequentes:

  1. i

    Agrupando-se as séries analisadas em dois períodos de análise: o primeiro, entre 2002 e 2008 (ano da crise financeira global1 1 Em 2008, ocorreu a grande crise financeira mundial. A crise surge nos Estados Unidos da América como uma crise de inadimplência no mercado financeiro imobiliário americano. As quebras de bancos espalham a crise para para a economia real americana, devido a redução das vendas, contraindo a demanda, retração da produção e aumento do desemprego. A crise iniciada nos EUA se espalham para o mundo pela retração do comércio internacional e restrição da oferta de crédio (Gremaud et al., 2016). ), e o segundo, de 2009 a 2017. Mensuração do somatório da quantidade de soja em grão importada nos dois períodos pela China, União Europeia e Japão e o total importado no mundo, além do montante total exportado pelo Brasil, Estados Unidos, Argentina e outros países exportadores para os mercados importadores.

  2. ii

    Quantificou-se a participação de mercado (Market Share) do Brasil, Estados Unidos, Argentina e outros países exportadores para a China, União Europeia, Japão e outros países importadores, e o total importado no mundo nos dois períodos analisados.

  3. iii

    Realizou-se a mensuração das etapas do modelo de Constant Market Share para discriminar os efeitos (efeito crescimento do comércio mundial, efeito destino das exportações e efeito competitividade) causadores das exportações dos três maiores exportadores mundiais de soja em grão: Brasil, Estados Unidos e Argentina.

Inicialmente, o modelo consiste na mensuração da quantidade potencial de soja exportada pelo Brasil, Estados Unidos e Argentina, caso mantenham o Market Share das exportações mundiais do período de 2002-2008 no período de 2009-2017, conforme consta na Equação 5:

P S M S M = I M S 2009 2017 × M S P S 2002 2008 (5)

Onde: PSMSM = Potencial das exportações do país exportador no período de 2009/2017, caso mantenha o mesmo Market Share das importações mundiais do período de 2002/2008;

IMS (2009-2017) = Importações Mundiais de soja em grão no período de 2009 a 2017;

MSPS (2002-2008) = Market Share do país exportador nas importações mundiais de soja em grão no período de 2002 a 2008.

Realizou-se ainda a mensuração do potencial das exportações, caso mantivesse o Market Share do período 2002-2008 nas importações dos mercados individuais no período de 2009-2017, conforme Equação 6:

P S M S I = I S C 2009 2017 × M S P C 2002 2008 + I S U E 2009 2017 × M S P U E 2002 2008 + I S J 2009 2017 × M S P J 2002 2008 + I S O P 2009 2017 × M S P O P 2002 2008 (6)

Onde: PSMSI = Potencial das exportações do país exportador no período de 2009-2017, caso mantenha o mesmo Market Share das importações dos mercados individuais do período de 2002-2008;

ISC (2009-2017) = Importações de soja da China no período de 2009 a 2017;

MSPIC (2002-2008) = Market Share do país exportador nas importações da China no período de 2002 a 2008;

ISUE (2009-2017) = Importações de soja da União Europeia no período de 2009 a 2017;

MSPUE (2002-2008) = Market Share do país exportador nas importações da União Europeia no período de 2002 a 2008;

ISJ (2009-2017) = Importações de soja do Japão no período de 2009 a 2017;

MSPJ (2002-2008) = Market Share do país exportador nas importações do Japão no período de 2002 a 2008;

ISOP (2009-2017) = Importações de soja dos Outros Países Importadores no período de 2009 a 2017;

MSPOP (2002-2008) = Market Share do país exportador nas importações dos Outros Países Importadores no período de 2002 a 2008.

Foi possível mensurar os efeitos do crescimento do Comércio Mundial, do Destino das Exportações e da Competividade sobre as exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos e Argentina utilizando-se dos resultados das Equações 1 e 2. O efeito do crescimento do comércio mundial sobre as exportações foi mensurado utilizando a fórmula contida na Equação 7:

E C C M = P S M S M E S P 2002 2008 (7)

Onde: ECCCM = Efeito do crescimento do comércio mundial sobre as exportações de soja do país exportador;

ESP (2002-2008) = Quantidade de soja exportada do país exportador no período de 2002 a 2008.

O efeito do Destino das Exportações capta o impacto da manutenção do Market Share nos mercados importadores sobre as quantidades de soja exportadas pelo país exportador (ver Equação 8).

E D E = P S M S I P S M S M (8)

Onde: EDE = efeito do destino das exportações sobre as exportações de soja do país exportador no período de 2002 a 2008.

O efeito competitividade, por sua vez, reflete a diferença entre o crescimento efetivo e o crescimento potencial das exportações do país A. O crescimento potencial é mensurado pressupondo-se a manutenção do Market Share do produto para cada país (ver Equação 9).

E C = E S P 2009 / 2017 P S M S I (9)

EC = Efeito competitividade;

ESP (2009/2017) = Quantidade efetiva de soja em grão exportada pelo país exportador no período de 2009 a 2017.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta seção apresentam-se inicialmente as séries históricas dos maiores importadores e exportadores de soja entre 2002 e 2017. Posteriormente, mensuram-se o modelo de Constant Market Share para as exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos e Argentina. Conclui-se o tópico com discussões sobre os resultados obtidos.

Análise geral do mercado mundial de soja em grão

As importações mundiais de soja em grão aumentaram de 56,8 milhões de toneladas em 2002 para 148,3 milhões de toneladas em 2017 (ver Figura 1). A China foi quem mais contribuiu para o crescimento das importações de soja em grão, passando de 13,9 milhões de toneladas em 2002 para 98,1 milhões de toneladas importadas em 2017, uma variação positiva de 605,7%. A quantidade importada pela União Europeia e pelo Japão apresentou declínio no período. Os demais países também apresentaram crescimento das importações no período analisado, passando de aproximadamente 17,3 milhões de toneladas em 2002 para cerca de 31,5 milhões de toneladas em 2017, um crescimento de aproximadamente 82%.

Figura 1
Importações anuais de soja em grão entre os anos de 2002 e 2017. Unidade de medida: milhões de toneladas. Fonte: elaborado pelos autores utilizando-se de dados da Food and Agriculture Organization of the United Nations [FAO] (2019).

O Brasil e os Estados Unidos foram os países que mais ampliaram as exportações entre 2003 e 2017 (ver Figura 2). A quantidade de soja em grão exportada pelo Brasil passou de aproximadamente 16 milhões de toneladas em 2002 para cerca de 68 milhões de toneladas em 2017. Já as exportações dos Estados Unidos aumentaram de 27,4 milhões de toneladas em 2002 para aproximadamente 55 milhões de toneladas em 2017. Ocorreu ainda o crescimento das exportações dos outros países produtores, passando de 5 para 21 milhões de toneladas entre 2002 e 2017. A Argentina foi o país com menor crescimento no período, registrando um aumento nas exportações até 2010, com posterior declínio.

Figura 2
Exportações anuais de soja em grão entre os anos de 2002 e 2017. Unidade de medida: milhões de toneladas. Fonte: elaborado pelos autores utilizando-se de dados da Food and Agriculture Organization of the United Nations [FAO] (2019).

Análise comparativa das exportações de soja em grão do Brasil, dos Estados Unidos e da Argentina sob o enfoque do modelo Constant Market Share

Inicia-se então a metodologia de Constant Market Share, em que foi realizada uma análise agrupando quantitativamente as importações dos maiores importadores (China, União Europeia, Japão e outros países) com as exportações dos três maiores exportadores (Brasil, Estados Unidos e Argentina) em dois períodos: 2002/2008 e 2009/2017 (ver Tabela 1). A China se destacou em ambos os períodos como o maior importador global, ampliando a importação de 191,9 milhões de toneladas no primeiro período para 626,19 milhões de toneladas no segundo. O Brasil foi o país com maior crescimento de exportações para a China, passando de 55,69 milhões de toneladas para 278,18 milhões de toneladas, seguido dos Estados Unidos. Destaca-se ainda o crescimento das importações dos outros países, com os Estados Unidos exportando uma quantidade maior em relação ao Brasil, tanto no período de 2002/2008, quanto no período de 2009/2017.

Tabela 1
Quantidade de soja em grão importada pela China, União Europeia, Japão e outros países e o total, e as exportações do Brasil, Estados Unidos e Argentina para estes mercados entre 2002/2008 e 2009/2017. Unidade de medida: milhões de toneladas.

Ao analisar o Market Share dos principais mercados importadores (China, União Europeia e Japão; ver Figura 3), constatou-se o crescimento da participação de mercado das exportações brasileiras para a China, passando de 29% para 44%. Os outros países exportadores também apresentaram crescimento, embora em menor quantidade, passando de 5% para 7%. A Argentina e os Estados Unidos apresentaram perda na participação de mercado nas importações, com maior declínio na perda de participação das exportações Argentinas, reduzindo de 24% para 10%.

Figura 3
Market Share das importações de soja em grão da China, União Europeia e Japão no período entre 2002/2008 e 2009/2017. Fonte: elaborado pelos autores como resultado da pesquisa.

Na União Europeia ocorreu a mais acentuada elevação na participação de mercado dos outros exportadores, passando de 21% para 36%. Ocorreu também o crescimento das exportações americanas para a União Europeia, de 21% para 25%, além de um decrescimento do Market Share das exportações brasileiras e da Argentina para a União Europeia.

No Japão, apenas o Brasil apresentou crescimento no Market Share, passando de 11% para 17%, ocorrendo declínio no Market Share dos Estados Unidos e dos outros exportadores. A Argentina manteve participação inexpressiva nas exportações para o Japão.

Nos outros importadores (ver Figura 4), o Brasil e os outros países exportadores ampliaram sua participação de mercado: no primeiro caso, passou-se de 19% para 24%, e no segundo, de 9% para 14%. Os Estados Unidos e a Argentina perderam participação nestes mercados: no primeiro caso, de 60% para 56%, e no segundo, de 12% para 6%.

Figura 4
Market Share das importações de soja em grão dos outros mercados importadores e das importações totais no período entre 2002/2008 e 2009/2017. Fonte: elaborado pelos autores como resultado da pesquisa.

Considerando-se as importações totais, ocorreu uma elevação da participação do Market Share do Brasil, passando de 32% para 39%, e dos outros países exportadores, de 11% para 12%. A Argentina e os Estados Unidos perderam participação no Market Share mundial: no primeiro caso ocorreu um decréscimo de 12% para 6%, e no segundo, de 43% para 42%.

Finaliza-se o método do modelo de Constant Market Share com os fatores geradores do crescimento das exportações considerando-se os seguintes efeitos: crescimento do comércio mundial, destino das exportações e competitividade (ver Tabela 2). O crescimento das importações mundiais favoreceria os três exportadores caso mantivessem a participação de mercado do período de 2002-2008. A manutenção do destino das exportações do período 2002-2008 favoreceria o crescimento das exportações dos Estados Unidos e da Argentina e não favoreceria o crescimento das exportações brasileiras. O efeito competitividade influenciou positivamente as exportações brasileiras em detrimento das exportações dos Estados Unidos e da Argentina.

Tabela 2
Efeitos geradores das variações nas exportações de soja em grão do Brasil, dos Estados Unidos e da Argentina do período de 2009/2017 em relação ao período de 2002/2008. Unidade de medida: milhões de toneladas.

Discussões

No período de 2009 a 2017, o crescimento das importações mundiais de soja em grão favoreceu as exportações do Brasil, Estados Unidos e Argentina. O crescimento das importações da China foi o que mais propiciou o aumento das importações mundiais da commodity. Tal observação corrobora o trabalho de Song et al. (2006)Song, B., Marchant, M. A., & Xu, S. (2006). Competitive analysis of Chinese soybean import suppliers – U.S., Brazil, and Argentina. In American Agricultural Economics Association Annual Meeting (25 p.). Long Beach, California., no qual salienta para a competição dos Estados Unidos, Brasil e Argentina no mercado chinês, um mercado muito significante para o mercado internacional de soja.

Conjugado com a crescente urbanização e mudanças nos padrões de renda e de consumo da maior população do planeta, o crescimento da economia chinesa é um desafio para a China em termos de autossuficiência alimentar, ao mesmo tempo em que representa uma oportunidade de mercado amplamente cobiçada por todos os países exportadores agrícolas (Moraes, 2004Moraes, A. L. (2004). A liberalização econômica da China e sua importância para as exportações do agronegócio brasileiro (Texto para Discussão, No. 22, 93 p.). Brasília: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Tecnológicas.). As elevadas taxas de crescimento econômico da China ampliam a demanda por alimentos e matérias-primas. No entanto, existem limitações para o crescimento da produção agrícola chinesa em quantidade suficiente para abastecer o seu crescente mercado consumidor. Tais limitações decorrem da quantidade insuficiente de água para sustentar a demanda de irrigação agrícola necessária em parte do seu território e a existência de campos montanhosos. Como o Brasil se caracteriza por ser um grande exportador mundial de produtos vinculados ao agronegócio, o país se apresenta como um parceiro natural da China em vários mercados, incluindo o da soja (Lopes et al., 2013Lopes, M. M., Silva, R. A., Coronel, D. A., Vieira, K. M., & Freitas, C. A. (2013). Análise da competitividade das exportações agrícolas brasileiras para a China: uma análise do complexo soja e fumo. Revista Uniabeu, 6(13), 189-208.).

Constatou-se também o crescimento dos outros mercados importadores na importação de soja em grão, passando de 17 milhões para 32 milhões de toneladas de 2002 a 2017. Por outro lado, ocorreu uma redução nas importações mundiais dos países já desenvolvidos, como a União Europeia, reduzindo as importações de 21 para 15 milhões de toneladas no período analisado, e o Japão, cuja redução foi de 5 para 3 milhões de toneladas.

O efeito destino das exportações mostrou-se positivo para os Estados Unidos e Argentina, e negativo para o Brasil. Portanto, a manutenção do Market Share do período de 2002/2008 favoreceria o crescimento das exportações dos Estados Unidos e da Argentina e não favoreceria o crescimento das exportações brasileiras.

Já o efeito competitividade mostrou-se positivo para o Brasil e negativo para a Argentina e Estados Unidos no período de 2009-2017 em relação a 2002-2008. No período de 2009-2017, ocorreu uma ampliação da participação brasileira no mercado chinês, passando de 29% a 44%, e também no incremento da participação nos outros mercados importadores, passando de 19% para 24%. Tanto os Estados Unidos quanto a Argentina perderam Market Share nestes mercados. Ampliou-se assim a participação brasileira no mercado importador mundial, passando de 32% para 39%.

O efeito competitividade brasileiro pode ser explicado pelas alterações tributárias realizadas na década de 1990, pela expansão de área cultivada com soja e pela melhoria da produtividade. Conforme Wesz Junior (2011), a lei Kandir, pelo qual reduziu as tributações sobre as exportações de produtos primários, e a existência de escalada tarifária nas importações da soja pela China, tendo menor incidência sobre tributos sobre importações de soja em grão em comparação com o farelo e o óleo de soja, permitiu maior competitividade nas exportações de soja em grão do Brasil. No entanto, reduziu-se a viabilidade das exportações de farelo e óleo de soja.

Contini et al. (2018)Contini, E., Gazzoni, D., Aragão, A., Mota, M., & Marra, R. (2018). Complexo soja: caracterização e desafios tecnológicos (Série Desafios do Agronegócio Brasileiro, 35 p.). Brasília: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. salientaram para o fato de, além do incentivo tributário, a expansão da produção e, consequentemente, das exportações brasileiras, pode ser atribuída ao desenvolvimento de novas tecnologias que permitiram a adaptação da cultura em mais regiões brasileiras, com destaque para o Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia (conhecida como MATOPIBA), o incremento da produtividade e a redução dos custos.

Ao realizar uma análise comparativa dos custos da produção agrícola de soja nos três maiores países produtores, Meade et al. (2016)Meade, B., Puricelli, E., Mcbride, W., Valdes, C., Hoffman, L., Foreman, L., & Dohlman, E. (2016). Corn and Soybean production costs and export competitiveness in Argentina, Brazil, and the United States (Economic Information Bulletin, No. 154, 52 p.). Washington. salientaram para os menores custos no Brasil (analisando as regiões produtoras do Mato Grosso e Paraná), seguido da Argentina (analisando as regiões de Buenos Aires, Santa Fé e Chaco), e os maiores custos de produção nos Estados Unidos (região produtora de Ohio, Indiana, Illinois, Iowa, Minnesota, Missouri, Nebraska, Dakota do Sul e Kentucky). Os menores custos e o tamanho da terra (principalmente no Mato Grosso) gerando economia de escala foram os grandes responsáveis pelos menores custos no Brasil em relação à Argentina e EUA. Ressalta-se ainda a desvalorização cambial das moedas brasileira e argentina em relação ao dólar, desencadeando menores custos da produção de soja no Brasil e na Argentina em relação aos Estados Unidos da América.

A Argentina se destacou pela perda de participação de mercado tanto no mercado global, quanto em todos os destinos analisados, devendo-se ressaltar para o direcionamento da soja em grão da Argentina para a produção de ração e óleo de soja destinados para o consumo interno e as exportações. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (2017)Companhia Nacional de Abastecimento – CONAB. (2017). A produtividade da soja: análise perspectivas (34 p.). Brasília: CONAB. Recuperado em 29 de novembro de 2019, de https://www.conab.gov.br
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, a Argentina direcionou 40,73 milhões de toneladas de soja em grão para o esmagamento, representando 74,10% de toda a soja produzida pelo país no ano de 2017. Song et al. (2006)Song, B., Marchant, M. A., & Xu, S. (2006). Competitive analysis of Chinese soybean import suppliers – U.S., Brazil, and Argentina. In American Agricultural Economics Association Annual Meeting (25 p.). Long Beach, California. destacaram a aplicação de tarifas na Argentina sobre as exportações de soja em grão para favorecer a produção de farelo e óleo de soja no país. Meade et al. (2016)Meade, B., Puricelli, E., Mcbride, W., Valdes, C., Hoffman, L., Foreman, L., & Dohlman, E. (2016). Corn and Soybean production costs and export competitiveness in Argentina, Brazil, and the United States (Economic Information Bulletin, No. 154, 52 p.). Washington. salientaram o impacto desta política tributária nos produtores rurais argentinos, que recebem valores menores em relação aos preços pagos aos produtores brasileiros e americanos; os últimos são quem mais recebem pela soja.

Embora tenha ocorrido maior competitividade da soja brasileira, ampliando sua participação de mercado, existem desafios para manter a competitividade nos próximos anos. Contini et al. (2018)Contini, E., Gazzoni, D., Aragão, A., Mota, M., & Marra, R. (2018). Complexo soja: caracterização e desafios tecnológicos (Série Desafios do Agronegócio Brasileiro, 35 p.). Brasília: Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. destacaram o potencial para ampliação da produtividade brasileira, pois a produtividade média encontra-se muito inferior dos produtores mais eficientes. Ressalta-se ainda para os desafios da produtividade nos próximos anos devido a problemas climáticos, o uso intenso de maquinaria pesada degradando o solo, entre outros motivos. Schnepf et al. (2001)Schnepf, R. D., Dohlman, E., & Bolling, C. (2001). Agriculture in Brazil and Argentina: developments and prospects for major field crops (85 p.). Washington: United States Department of Agriculture, International Agriculture and Trade Outlook. destacaram os menores custos de transporte nos Estados Unidos em relação ao Brasil e Argentina. A diferença de custos se amplia quanto mais longe a produção for dos portos utilizados para exportação.

Como limitações para a presente análise, deve-se considerar que a cadeia produtiva da soja possui como principais produtos a soja em grão, o farelo de soja e o óleo de soja. O escopo desta análise foi o relevante mercado da soja em grão, necessitando-se de outros estudos para se realizar análises semelhantes à realizada aqui no mercado de farelo e óleo de soja.

Comparando-se os três maiores países exportadores e a China, Rhoden et al. (2020)Rhoden, A. C., Costa, N. L., Santana, A. C., Oliveira, G. N., & Gabbi, M. T. T. (2020). Análise das tendências de oferta e demanda para o grão, farelo e óleo de soja no Brasil e nos principais mercados globais. Desenvolvimento em Questão, 18(51), 93-112. ressaltaram para o fato de o Brasil apresentar maior crescimento da produção de soja ente 1998/99 e 2017/18, com uma taxa média de crescimento anual de 6,36% contra o crescimento de 4,57% da Argentina e 2,37% dos Estados Unidos. Tal maior crescimento da produção brasileira impulsionou o aumento das exportações de soja em grão, ocorrendo crescimento anual das exportações brasileiras de 9,96%, enquanto o crescimento americano foi de 4,78% e o argentino de 4,45%. No mercado do farelo de soja, as exportações argentinas apresentaram maior taxa de crescimento anual, de 4,28%, seguido dos Estados Unidos com 3,58% e do Brasil com 1,57%. No mercado do óleo de soja, a Argentina apresentou crescimento anual das exportações no período de 2,27% e os Estados Unidos de 1,84%, enquanto o Brasil apresentou uma redução de -1,41%, com a Argentina respondendo por cerca de 45% das exportações mundiais do óleo de soja.

Figueiredo et al. (2004)Figueiredo, A. M., Santos, M. L., & Lírio, V. S. (2004). Análise de Market-Share: fontes de variação das exportações brasileiras de soja. Revista de Economia e Agronegócio, 2(3), 335-360. constataram no período de 1997 a 2002 um efeito competitividade positivo para as exportações de soja em grão e negativo para as exportações do farelo e óleo de soja, destacando-se que o impacto positivo da competitividade no segmento da soja em grão mais que compensou, em valores monetários, os impactos negativos nos segmentos de farelo e óleo.

Coronel (2008)Coronel, D. A. (2008) Fontes de crescimento e orientação regional das exportações brasileiras do complexo soja (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. e Coronel et al. (2009)Coronel, D. A., Machado, J. A. D., & Carvalho, F. M. A. (2009). Análise da competitividade das exportações do complexo soja brasileiro de 1995 a 2006: uma abordagem de Market Share. Revista de Economia Contemporânea, 13(2), 281-307. realizaram a análise de Constant Market Share para soja em grão, farelo e óleo de soja. No primeiro trabalho, realizou-se a análise entre 1995 e 2004, o qual foi dividido em três períodos: 1995 a 1998, 1999 a 2001 e 2002 a 2004. No segundo, a análise compreendeu os anos de 1995 a 2006, os quais foram divididos em três períodos: 1995 a 1998, 1999 a 2001 e 2002 a 2006. Nestas análises, o efeito competitividade foi positivo tanto para a soja em grão, quanto para o farelo e o óleo de soja, destacando-se o efeito competitividade para a soja em grão em relação ao farelo e o óleo de soja. No entanto, para os três produtos, o efeito competitividade tornou-se menor no terceiro período em relação ao segundo.

5. CONCLUSÕES

Desde a década de 2000, vem ocorrendo um crescimento das exportações brasileiras de soja em grão. Neste período, a China foi responsável por elevar as importações mundiais desta commodity. O Brasil, Estados Unidos e Argentina, os maiores exportadores mundiais, competem pelo mercado importador em geral e pelo mercado chinês em particular.

O objetivo geral desta pesquisa foi o de comparar o desempenho das exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos e Argentina nos principais mercados de destino no período de 2002 a 2017. Para se atingir o objetivo geral, o trabalho possuiu os seguintes objetivos específicos: i) Apresentar as séries históricas das importações dos maiores importadores: China, União Europeia, Japão e demais importadores; ii) Apresentar as séries históricas das exportações de soja em grão do Brasil, Estados Unidos, Argentina e outros exportadores e iii) Mensurar o Constant Market Share para as exportações de soja em grão do Brasil, dos Estados Unidos e da Argentina.

Constatou-se o crescimento contínuo das importações mundiais, independentemente da crise de 2008, passando de 57 milhões de toneladas para 148 milhões de toneladas. As importações chinesas foram as maiores responsáveis pelas importações globais, passando de 23 para 98 milhões de toneladas. Ao se analisar as exportações, o Brasil foi quem mais, passando de 16 para 68 milhões de toneladas.

Analisando-se o Market Share das importações mundiais, foi observada uma expansão do Market Share brasileiro no período agregado de 2009-2017 em relação ao período de 2002-2008, passando de 32% para 39%, euma pequena expansão do Market Share dos outros países exportadores, de 11% para 12%, e um declínio do Market Share argentino, de 14% para 8%, e americano, de 43% para 41%.

Na China, foi o maior mercado importador que apresentou maior crescimento no período analisado, ocorreu uma elevação do Market Share brasileiro, passando de 29% no período de 2002-2008 para 44% no período de 2009-2017. Os outros países exportadores também ampliaram sua participação, de 5% para 7% das exportações para a China. Por outro lado, a Argentina apresentou o maior declínio do Market Share, passando de 32% para 10%, enquanto os Estados Unidos passaram de 42% para 39%. Nos outros países importadores, segundo maior importador mundial, também ocorreu uma expansão do Market Share brasileiro, passando de 19% para 24%, e também dos outros exportadores para este destino. A Argentina e os Estados Unidos perderam mercado, passando de 12% para 6% no primeiro caso, e de 60% para 56% no segundo.

Efetuando-se a análise dos fatores influenciadores das exportações (crescimento do comércio mundial, destino das exportações e competitividade), o Brasil se destacou pelo efeito competitividade positivo, enquanto a Argentina, de forma mais intensa, e os Estados Unidos apresentaram efeito competitividade negativo. Tal fenômeno se deveu à expansão do Market Share brasileiro nos mercados importadores mais dinâmicos.

No entanto, deve-se considerar o fato de a Argentina adotar impostos sobre as exportações de soja em grão, priorizando a produção interna e a exportação do farelo e óleo de soja. Desta forma, necessita-se de pesquisas futuras que incorporem a análise de Market Share da soja em grão e do farelo e óleo de soja. Conforme Rhoden et al. (2020)Rhoden, A. C., Costa, N. L., Santana, A. C., Oliveira, G. N., & Gabbi, M. T. T. (2020). Análise das tendências de oferta e demanda para o grão, farelo e óleo de soja no Brasil e nos principais mercados globais. Desenvolvimento em Questão, 18(51), 93-112., o Brasil destacou-se entre 1998-1999 e 2017-18 pelo maior crescimento nas exportações de soja em grão entre os três maiores exportadores. A Argentina se destacou pelo maior crescimento das exportações do farelo e óleo de soja, seguido dos Estados Unidos e do Brasil, ficandoom o terceiro lugar no desempenho das exportações.

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    Em 2008, ocorreu a grande crise financeira mundial. A crise surge nos Estados Unidos da América como uma crise de inadimplência no mercado financeiro imobiliário americano. As quebras de bancos espalham a crise para para a economia real americana, devido a redução das vendas, contraindo a demanda, retração da produção e aumento do desemprego. A crise iniciada nos EUA se espalham para o mundo pela retração do comércio internacional e restrição da oferta de crédio (Gremaud et al., 2016Gremaud, A. P., Toneto Junior, R., & Vasconcellos, A. S. (2016). Economia brasileira contemporânes (741 p.). São Paulo: Atlas S. A.).
  • JEL Classification: F14

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    09 Nov 2020
  • Aceito
    04 Jan 2022
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