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Segurança alimentar e liberalização comercial do mercado de alimentos: uma revisão sistemática

Food security and trade liberalization of the food market: a systematic review

Resumo:

O objetivo deste artigo foi identificar o papel da liberalização do comércio de alimentos na segurança alimentar tomando como base dados científicos da literatura internacional e visando elucidar pontos positivos ou negativos. Uma revisão sistemática foi realizada nas bases Web of Science e Scopus no período de 2015 a 2019. Foram identificados dezesseis trabalhos, observando os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos. Foi possível constatar que a literatura sobre o tema em questão permanece ambígua, não havendo consenso sobre os reais ganhos ou perdas. A natureza e a magnitude do efeito da liberalização na segurança alimentar dependem de vários fatores, como o grau de adaptabilidade dos pobres às mudanças nas condições econômicas; o grau de exposição dos países às importações de alimentos; a presença de condições iniciais favoráveis; as medidas de acompanhamento; e o horizonte temporal considerado na pesquisa.

Palavras-chave:
abertura comercial; política comercial; mercado de alimentos

Abstract:

This paper aimed to identify in the international literature on food security the scientific results about the role of trade liberalization in the same. A systematic review was used in the Web of Science and Scopus databases from 2015 to 2019. It was identify 16 studies according the inclusion and exclusion criteria. It was found that the literature on the issues in question remains ambiguous, with no consensus on the real gains or losses. The nature and magnitude of the effect of liberalization on food security depends on several factors, such as: the degree of adaptability of the poor to changes in economic conditions; the degree of exposure of countries to food imports; the presence of favorable initial conditions; accompanying measures; and the time horizon considered in the research.

Keywords:
trade openness; trade policy; food market

1. INTRODUÇÃO

A segurança alimentar é uma preocupação crescente em todo o mundo. Para Barret (2010)Barret, C. B. (2010). Measuring food insecurity. Science, 327, 825-828., estima-se que 1 bilhão de pessoas carecem de disponibilidade suficiente de energia na dieta e, pelo menos, o dobro desse número sofre de deficiências de micronutrientes. Desse modo, a insegurança alimentar, isto é, quando não existe acesso adequado aos alimentos, e a desnutrição constituem problemas diretos para a saúde e o desenvolvimento humano, e acarretam problemas indiretos para o aprendizado, a produtividade individual e o desenvolvimento econômico (Banco Mundial, 2018Banco Mundial. (2018). Food Security. Washington, DC: Banco Mundial. Recuperado em 12 de setembro de 2019, de https://www.worldbank.org/en/topic/food-security
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). A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) evidencia a necessidade de inserir as questões relacionadas à segurança alimentar no topo da agenda política internacional a fim de criar um ambiente propício para a melhoria de seus níveis de investimentos, melhores práticas e melhores políticas (Dithmer & Abdulai, 2017Dithmer, J., & Abdulai, A. (2017). Does trade openness contribute to food security? A dynamic panel analysis. Food Policy, 69, 218-230.).

A insegurança alimentar e nutricional, provavelmente, se tornará o maior problema que a humanidade terá que enfrentar no futuro próximo e a longo prazo. Cerca de 11% da população mundial não foi capaz de suprir as necessidades energéticas da dieta considerada ideal entre 2014 e 2016. Para aumentar a complexidade da situação, a população global deverá atingir em torno de 8 bilhões de pessoas até 2023 e 9,8 bilhões em 2050 (Dillard, 2019Dillard, H. R. (2019). Food security. Global Food and Nutrition Scurity: From Challenges to Solutions, 11, 249-252.).

Alcançar a erradicação da fome global até 2030 é um objetivo fundamental da Organização das Nações Unidas (ONU) que se reflete na nova agenda de desenvolvimento sustentável pós 2015. À medida que os padrões de consumo e produção continuarem evoluindo, o comércio de produtos agrícolas e alimentícios desempenhará um papel cada vez mais importante para garantir que as crescentes demandas dos países com déficit alimentar possam ser atendidas (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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).

Contudo, em 2014, o contínuo declínio da fome e consequentemente as melhorias na segurança alimentar mundial, que haviam começado em 2005, foram interrompidas. O número de pessoas com desnutrição começou a aumentar lentamente até que, em 2020, o mundo testemunhou um retrocesso em seus esforços de erradicação da fome, conforme relatório da Food and Agriculture Organization of the United Nations (2020)Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2020). The State of Food Insecurity in the World 2020. Rome: FAO. Recuperado em 14 de dezembro de 2020, de http://www.fao.org/publications/sofi/2020
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. O mundo está em um contexto muito diferente daquele há seis anos, quando os países se comprometeram e assumiram a meta de acabar com a fome, a insegurança alimentar e todas as formas de desnutrição até 2030 (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2020Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2020). The State of Food Insecurity in the World 2020. Rome: FAO. Recuperado em 14 de dezembro de 2020, de http://www.fao.org/publications/sofi/2020
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).

Segundo relatório elaborado pela FAO sobre o estado da segurança alimentar no mundo, o número de pessoas afetadas pela fome, em nível global, aumentou em 2020, potencializado pela pandemia da Covid-19. Em termos populacionais, levando em consideração as margens de erro dos modelos estatísticos, estima-se que entre 720 e 811 milhões de pessoas no mundo passaram fome em 2020. Observando o intervalo projetado no relatório, em 2020, houve um aumento de 118 milhões de pessoas que passaram fome se comparado a 2019, podendo ter sido até 161 milhões se incluídas as margens de erro dos modelos utilizados (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2021Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2021). The State of Food Insecurity in the World 2021. Rome: FAO. Recuperado em 13 de agosto de 2021, de http://www.fao.org/3/cb4474en/online/cb4474en.html#chapter-1-introduction
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). Contudo, a FAO afirma que, mesmo antes da pandemia de Covid-19, vários outros fatores colocaram o mundo fora do caminho para acabar com a fome e a desnutrição em todas as suas formas até 2030. Nesse sentido, estratégias para o aumento da segurança alimentar são necessárias para o combate imediato desse problema.

Um debate que tem crescido na literatura científica internacional é sobre o papel do comércio na segurança alimentar. Questiona-se se o comércio é uma ameaça ou uma oportunidade para a melhoria da segurança alimentar, não havendo consenso a respeito dos reais ganhos de segurança alimentar a partir da liberalização comercial. Tal debate é de grande complexidade, o que se torna compreensível a medida que se considera a importância do setor agrícola e a série de funções que ele exerce na sociedade ao fornecer o alimento essencial para a sobrevivência humana e um meio de subsistência para cerca de 30% da força de trabalho ativa no mundo. Ao mesmo tempo, as exportações agrícolas são uma fonte significativa de receita para alguns estados e as importações de alimentos são cruciais para a segurança alimentar em outros. A produção agrícola também possui profundas conexões ecológicas e ambientas, além de importantes dimensões culturais. Devido a essas razões, o debate sobre as formas como o comércio internacional pode melhorar ou dificultar a capacidade da sociedade possui diferentes objetivos sociais e econômicos e, no que se refere à agricultura e à segurança alimentar, é um fenômeno complexo (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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).

A maior participação comercial dos países depende do nível de engajamento de cada um deles no mercado mundial de alimentos, o que está sujeito ao grau de liberalização que os países adotam como estratégia e, segundo a Food and Agriculture Organization of the United Nations (2015)Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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, a maioria dos economistas, geralmente, apoia o comércio mais livre e não o protecionista, incluindo o comércio de alimentos e a agricultura. O conceito de vantagem comparativa, extraído da teoria clássica do comércio delineada por David Ricardo em 1817, é frequentemente utilizado como uma justificativa para essa visão. Segundo a teoria, haverá ganhos com o comércio mesmo que um país não tenha vantagem absoluta em nenhum bem em particular. A chave é que todos os países são comparativamente melhores na produção de alguns bens do que na produção de outros, e essas vantagens comparativas no nível doméstico importam para obter ganhos com o comércio (Schumacher, 2013Schumacher, R. (2013). Deconstructing the theory of comparative advantage. World Economic Review, 2, 83-105.; Prasch, 1996Prasch, R. (1996). Reassessing the theory of comparative advantage. Review of Political Economy, 8(1), 37-56.).

Aqueles que defendem um maior engajamento no comércio de alimentos, como a Organização Mundial do Comércio (OMC) e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), advogam para um processo de liberalização e abertura comercial da comunidade internacional com vista a melhorias dos níveis de segurança alimentar e desnutrição. Os céticos em relação à liberalização do comércio defendem que o movimento social de soberania alimentar e várias organizações da sociedade civil tendem a ver a liberalização e a abertura comercial do mercado de alimentos como uma ameaça à segurança alimentar (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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).

A partir de leituras prévias sobre segurança alimentar e liberalização/abertura comercial, tendo por referência teórica Anderson (2010)Anderson, K. (2010). Krueger, Schiff, and Valdés revisited: Agricultural price and trade policy reform in developing countries since 1960. Applied Economic Perspectives and Policy, 32(2), 195-231., Defra (Department for Environment, Food and Rural Affairs, 2010Department for Environment, Food and Rural Affairs – DEFRA. (2010). Annex 3: export restrictions on food over 2007/08: an analysis of their impact and evaluation of policy options. In: Department for Environment, Food and Rural Affairs – DEFRA. The 2007/08 Agricultural Price Spikes: Causes and Policy Implications. London: DEFRA.), Kim (2010)Kim, J. (2010). Recent trends in export restrictions on raw materials. OECD Trade Policy Papers, 101., Rutten et al. (2013)Rutten, M., Shutes, L., & Meijerink, G. (2013). Sit down at the ball game: How trade barriers make the world less food secure. Food Policy, 38(1), 1-10. e Food and Agriculture Organization of the United Nations (2015)Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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, foi verificada a dualidade no debate a respeito do papel das políticas, sendo estas benéficas ou não para a segurança alimentar. Também foi observada a necessidade de conhecimento e aprofundamento das publicações sobre o tema e sobre os reais ganhos que o comércio internacional pode trazer para a segurança alimentar em diferentes níveis, países e regiões. Dada a complexidade atual e o estado de insegurança alimentar mundial, torna-se necessária a discussão sobre melhores políticas para a promoção da segurança alimentar. O objetivo da pesquisa foi, portanto, identificar o papel da liberalização do comércio de alimentos quanto à segurança alimentar, tomando como base dados científicos da literatura internacional e visando elucidar pontos positivos ou negativos. O presente estudo não possui a pretensão de defender pontos de vista, mas sim conhecer os contornos do debate e possíveis objetivos da polarização, com possibilidade de obter insights para a formulação de políticas internacionais.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O conceito de segurança alimentar foi apresentado pela primeira vez em 1974 na Conferência Mundial de Alimentação das Nações Unidas. Na ocasião, abarcou discussões sobre problemas alimentares internacionais em uma época de crise alimentar de impacto global. Como resultado do debate, a conferência definiu o conceito de segurança alimentar, basicamente, em termos de suprimento de alimentos, isto é, com o propósito de assegurar a disponibilidade e a estabilidade dos preços dos alimentos básicos a nível nacional e internacional. De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2003Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2003). Basic texts (Vol. 1, 2). Rome: FAO. Recuperado em 4 de dezembro de 2020, de http://www.fao.org/docrep/meeting/022/k8024e.pdf
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), tal conceito refere-se à disponibilidade, em todos os momentos, de fornecimento mundial adequado de alimentos básicos para sustentar uma expansão constante do consumo de alimentos, compensando as flutuações na produção e nos preços.

Em meados da década de 1990, a segurança alimentar era reconhecida, no âmbito internacional, como uma preocupação significativa, pois sua abrangência perpassa o aspecto individual e o coletivo, sendo global. Dessa forma, o conceito foi expandido com o objetivo de incluir, além da preocupação com o acesso e o fornecimento dos alimentos, a questão da desnutrição mundial e local. A definição de segurança alimentar foi, então, ampliada e passou a incorporar também questões relativas ao equilíbrio nutricional, refletindo preocupações sobre a composição dos alimentos e os requisitos mínimos de nutrientes para uma vida ativa saudável. As preferências alimentares, determinadas socialmente ou culturalmente, também se tornaram importantes fatores a serem incorporados no conceito (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2003Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2003). Basic texts (Vol. 1, 2). Rome: FAO. Recuperado em 4 de dezembro de 2020, de http://www.fao.org/docrep/meeting/022/k8024e.pdf
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).

Em 1996, na Cúpula Mundial de Alimentação, cerca de 150 países mais a União Europeia comprometeram-se a erradicar a fome no mundo, sendo o compromisso inicial reduzir pela metade o número de pessoas com desnutrição até 2015. Como fruto desse amplo debate, a Declaração de Roma foi firmada, a qual ampliou o conceito de segurança alimentar com o objetivo de nortear a agenda política dos países em direção aos objetivos propostos. Em síntese, foi definido que a segurança alimentar só existe quando todas as pessoas, em todos os momentos, têm acesso físico e econômico a uma alimentação que seja suficiente, segura, nutritiva e que atenda às necessidades nutricionais e preferências alimentares, propiciando uma vida ativa e saudável (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 1996Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (1996). World Food Summit. Declaration on World Food Security. Rome: FAO. ).

O conceito de segurança alimentar abrange quatro dimensões: a) disponibilidade de alimentos – engloba a oferta de quantidades suficientes de alimentos com qualidade adequada, fornecidos por meio da produção ou da importação doméstica; b) acesso a alimentos – acesso de indivíduos a recursos adequados para uma dieta nutritiva; c) utilização – utilização de alimentos por meio de dieta adequada, água potável, saneamento e assistência médica para alcançar o bem-estar nutricional e o atendimento de todas as necessidades fisiológicas; d) estabilidade de suprimento – para garantir a segurança alimentar, uma população, família ou indivíduo deve ter acesso adequado a alimentos o tempo todo, inclusive em anos de grave escassez de alimentos (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2006Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2006). Police Brief: Food Security (No. 2). Rome: FAO. Recuperado em 14 de setembro de 2019, de: http://www.fao.org/fileadmin/templates/faoitaly/documents/pdf/pdf_Food_Security_Cocept_Note.pdf
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).

Sendo assim, existem dois estados: a) o de segurança alimentar, quando todas as pessoas, em todos os momentos, têm acesso físico, social e econômico a alimentos suficientes, seguros e nutritivos, que atendem às suas necessidades e preferências alimentares para uma vida ativa e saudável; e b) o de insegurança alimentar, quando as pessoas não têm acesso físico, social ou econômico adequado aos alimentos (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2003Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2003). Basic texts (Vol. 1, 2). Rome: FAO. Recuperado em 4 de dezembro de 2020, de http://www.fao.org/docrep/meeting/022/k8024e.pdf
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).

O comércio afeta cada uma das quatro dimensões da segurança alimentar: disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade de suprimento. A interação do comércio com essas dimensões é complexa e depende de uma variedade de fatores subjacentes, produzindo grandes diferenças nas experiências dos países e dificultando a determinação de um padrão de relacionamento generalizável. A relação entre o nível de engajamento no comércio e a segurança alimentar é influenciada pela maneira como o mercado de alimentos funciona, pela capacidade e disposição dos produtores de responder às mudanças nos incentivos que o comércio pode trazer e pela geografia da segurança alimentar, pois cada fator deve ser levado em consideração na formulação da política comercial (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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).

Boonekamp (2012)Boonekamp, C. (2012). How can Trade Contribute to Food Security? World Trade Organization, Research and Analysis. argumenta que o comércio pode ser pensado como um meio de conectar aqueles que têm bastante comida com aqueles que não têm comida suficiente. A segurança alimentar, nesse contexto, é apoiada pela estabilização da interconexão entre os países. Em decorrência disso, a Organização Mundial do Comércio (OMC) tem um importante papel no cenário internacional, configurando-se como o palco para negociações e possuindo o objetivo de alcançar maior liberalização do comércio agrícola ao submeter medidas que afetam o acesso às importações e a concorrência nas exportações (General Agreement on Tariffs and Trade, 1986General Agreement on Tariffs and Trade – GATT. (1986). Punta del Este Declaration. Recuperado em 6 de novembro de 2019, de http://www.sice.oas.org/trade/Punta_e.asp
http://www.sice.oas.org/trade/Punta_e.as...
).

A teoria da vantagem comparativa é frequentemente referenciada por aqueles que argumentam que a liberalização do comércio aumenta a segurança alimentar (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2003Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2003). Basic texts (Vol. 1, 2). Rome: FAO. Recuperado em 4 de dezembro de 2020, de http://www.fao.org/docrep/meeting/022/k8024e.pdf
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, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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; Banco Mundial, 2007Banco Mundial. (2007). World Development Report 2008. Agriculture for development. Washington, DC: Banco Mundial. Recuperado em 2 de março de 2019, de http://siteresources.worldbank.org/INTWDR2008/Resources/WDR_00_book.pdf
http://siteresources.worldbank.org/INTWD...
, 2012Banco Mundial. (2012). Global Monitoring Report. Food prices, nutrition, and the Millennium Development Goals. Washington, DC: Banco Mundial.; Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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), fortalecendo a ideia de que os ganhos de eficiência por meio da especialização do comércio devem melhorar a disponibilidade e o acesso aos alimentos. As etapas para o argumento de liberalização comercial são (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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):

  • a remoção das barreiras comerciais a fim de incentivar a concorrência e a especialização do mercado com base em vantagens comparativas (conforme determinado pelas dotações naturais em relação à terra, ao trabalho, à tecnologia, ao clima, entre outros);

  • o aprimoramento da eficiência na produção de alimentos à medida que as culturas são cultivadas em países que têm menor custo de oportunidade em produzi-las;

  • a produção agrícola mais eficiente resulta em maior oferta de alimentos em escala global (a partir de ganhos de eficiência), além de maior crescimento econômico e criação de empregos (estimado por ganhos de eficiência em setores com vantagem competitiva) nos países, permitindo que o desenvolvimento tecnológico melhore ainda mais a produção;

  • maior oferta de alimentos, negociada livremente a fim de proporcionar mais disponibilidade e preços mais baixos em todos os países, conforme determinado pelas forças de oferta e demanda, resultando em maior acesso a uma variedade de alimentos e melhorando a segurança alimentar;

  • o crescimento econômico resultante de uma atividade econômica mais eficiente aumenta a renda e gera empregos, melhorando também o acesso a alimentos e aumentando a segurança alimentar.

Em contrapartida, desde meados da década de 90, os conceitos de soberania alimentar e direito à alimentação também ganharam a atenção crescente de pesquisadores preocupados com questões de fome e têm influenciado na definição de normas e ideias globais de segurança alimentar. A soberania alimentar surgiu como um conceito associado a um amplo movimento social que desafia um sistema alimentar controlado por corporações transnacionais e pelos interesses dos países industriais e defende os direitos dos estados e das comunidades de moldarem seus próprios sistemas alimentares. Para esse movimento, a soberania alimentar é um pré-requisito para a genuína segurança alimentar (Patel, 2009Patel, R. (2009). What does food sovereignty look like? The Journal of Peasant Studies, 36(3), 663-706.; Jarosz, 2011Jarosz, L. (2011). Defining world hunger: scale and neoliberal ideology in international food security policy discourse. Food, Culture, & Society, 14(1), 117-139.). Além disto, a soberania alimentar pode ser entendida como o direito dos povos a alimentos saudáveis e culturalmente adequados, produzidos por métodos ecologicamente sólidos e sustentáveis, e seu direito de definir seus próprios sistemas de alimentação e agricultura (Forum for Food Sovereignty, 2007Forum for Food Sovereignty. (2007). Declaration of Nyéléni. Recuperado em 27 de abril de 2015, de http://nyeleni.org/IMG/pdf/DeclNyeleni-en.pdf
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).

Economistas também argumentam que a especialização da produção baseada em vantagem comparativa prioriza as condições a curto prazo e tende a ignorar o potencial de crescimento dos países a longo prazo. Isso atrapalha o potencial de desenvolvimento e limita determinado país à produção de bens de baixo valor agregado, como as matérias-primas, dificultando a captura de valor agregado no processamento e na manufatura (Chang & Grabel, 2004Chang, H. J., & Grabel, I. (2004). Reclaiming development: an economic policy handbook for activists and policymakers. London: Zed Books Ltd.). Chang (2009)Chang, H. J. (2009). Rethinking public policy in agriculture: lessons from distant and recent history. Rome: FAO. argumenta que para países com baixos níveis de industrialização, uma política de autossuficiência alimentar é altamente sensata, pois a especialização da produção pode ser muito arriscada e resultar em prejuízos, como a fome e a desnutrição. Morrison & Sarris (2007)Morrison, J., & Sarris, A. (2007). Determining the appropriate level of import protection consistent with agriculture led development in the advancement of poverty reduction and improved food security. In J. Morrison & Sarris A. (Eds.), WTO Rules for Agriculture compatible with development (pp. 13-57). Rome: FAO. alertam que, no desenvolvimento de um país, a liberalização do setor agrícola muito cedo, pode deixá-lo fraco e impedir, em vez de melhorar, as perspectivas de crescimento, de alívio da pobreza e de segurança alimentar.

Outra narrativa em torno da liberalização do comércio de alimentos trata o comércio como uma oportunidade, relacionando a percepção econômica associada aos custos das políticas de proteção agrícola que, por sua vez, têm impactos negativos sobre a segurança alimentar. O Banco Mundial, por exemplo, aponta consistentemente os ganhos potenciais que a liberalização do setor agrícola pode trazer para os países em desenvolvimento (Banco Mundial, 2007Banco Mundial. (2007). World Development Report 2008. Agriculture for development. Washington, DC: Banco Mundial. Recuperado em 2 de março de 2019, de http://siteresources.worldbank.org/INTWDR2008/Resources/WDR_00_book.pdf
http://siteresources.worldbank.org/INTWD...
, 2012Banco Mundial. (2012). Global Monitoring Report. Food prices, nutrition, and the Millennium Development Goals. Washington, DC: Banco Mundial.). Anderson & Martin (2005)Anderson, K., & Martin, W. (2005). Agricultural trade reform and the Doha Development Agenda. World Economy, 28(9), 1301-1327. tratam as políticas agrícolas restritivas como altamente ineficientes, podendo resultar em preços mais altos dos alimentos. As tarifas, por exemplo podem aumentar os preços das importações de produtos alimentícios nos países com déficit de alimentos, deixando os alimentos importados fora do alcance das populações mais pobres. A liberalização do comércio ajuda a reduzir mercados fracos, aumenta a concorrência entre fornecedores e atenua a volatilidade dos preços, beneficiando, em última análise, a segurança alimentar (Headey, 2011Headey, D. (2011). Rethinking the global food crisis: the role of trade shocks. Food Policy, 36(2), 136-146.).

As externalidades, geralmente, não são consideradas na teoria do comércio. Alguns autores argumentam que, para os recursos serem alocados com eficiência, todos os custos devem ser incorporados nos preços das mercadorias (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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). No entanto, estudos realizaram modelagem para mostrar que se os custos ambientais externos da produção agrícola fossem incorporados aos preços globalmente comercializados, eles superariam quaisquer ganhos potenciais do comércio (Schmitz et al., 2012Schmitz, C., Biewald, A., Lotze-Campen, H., Popp, A., Dietrich, J. P., Bodirsky, B., Krause, M., & Weindl, I. (2012). Trading more food: implications for land use, greenhouse gas emissions, and the food system. Global Environmental Change, 22(1), 189-209.). As externalidades associadas ao comércio global de alimentos estão relacionadas ao impacto ambiental do transporte, do processamento, da embalagem e do armazenamento, bem como a questões de saúde pública devido ao aumento do consumo de alimentos processados (Friel et al., 2015Friel, S., Hattersley, L., & Townsend, R. (2015). Trade policy and public health. Annual Review of Public Health, 36, 325-344.).

Devido à complexidade na relação entre comércio e segurança alimentar, as orientações políticas nem sempre são diretas ou unificadas entre os países. Existem muitos fatores a serem considerados, por exemplo, as barreiras comerciais podem restringir a disponibilidade em regiões com déficits alimentares, acarretando preços mais altos e acesso restrito a alimentos. Níveis altos de subsídios à agricultura podem pressionar os preços mundiais e reduzir a renda de outros exportadores agrícolas. Os preços mais baixos dos alimentos, resultantes do apoio a subsídios, podem beneficiar os consumidores urbanos nos países importadores ao mesmo tempo que podem prejudicar a renda dos agricultores nesses mesmos países. Entretanto, a dependência extrema a alimentos importados pode trazer vulnerabilidade e choques externos, como picos de preços, podendo sobrecarregar as contas de importação de um país em um curto período de tempo. A dependência excessiva a exportações agrícolas como fonte primária de divisas também apresenta riscos, incluindo as possibilidades de quedas prolongadas de preços ou, inversamente, preços altamente voláteis, os quais afetam a segurança alimentar dos produtores. Como os governos lidam com essas preocupações por meio da política comercial depende da sua própria situação e características (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2015Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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).

3. METODOLOGIA

Neste estudo, foi realizada uma revisão sistemática da literatura sobre segurança alimentar e liberalização comercial. Foram feitas buscas em duas bases de dados internacionais, Web of Science e Scopus, a fim de verificar a produção científica em torno das duas temáticas. Os seguintes descritores foram utilizados: food security + trade liberalization e food security + trade openness com o descritor booleano and, sendo selecionandos, então, apenas artigos na língua inglesa.

A etapa subsequente compreendeu na mineração dos dados, sendo que o marco temporal para a realização das buscas deu-se no período de 10 de agosto de 2019 até 20 de julho de 2020. Foi utilizado como critério de seleção artigos publicados entre os anos de 2015 a 2019, visando as publicações mais recentes sobre o tema.

Para a revisão sistemática proposta, o método de Ensslin et al. (2010)Ensslin, L., Ensslin, S. R., Lacerda, R. T. O., & Tasca, J. E. (2010). ProKnow-C, Knowledge Development Process Constructivist: processo técnico com patente de registro pendente junto ao INPI. Rio de Janeiro: INPI., intitulado Knowledge Development Process - Construtivist (ProKnow-C), foi utilizado. A metodologia ProKnow-C mostra-se como uma ferramenta de grande validade para a construção de conhecimento em determinado campo de pesquisa, proporcionando um procedimento estruturado, rigoroso e que minimiza o uso de aleatoriedade e subjetividade no processo de revisão bibliográfica (Afonso et al., 2012Afonso, M. H. F., Souza, J. V., Ensslin, S. R., & Ensslin, L. (2012). Como construir conhecimento sobre o tema de pesquisa? Aplicação do processo proknow-c na busca de literatura sobre avaliação do desenvolvimento sustentável.Revista de Gestão Social e Ambiental,5(2), 47-62. https://doi.org/10.24857/rgsa.v5i2.424.
https://doi.org/10.24857/rgsa.v5i2.424...
). O método proposto pelo autor estrutura-se da seguinte forma: 1) identificação das palavras-chaves; 2) seleção das bases de dados; 3) pesquisa dos artigos; 4) delimitação do tema e 5) análise dos artigos. Dessa forma, as seguintes etapas foram realizadas:

Primeira etapa: identificação dos resultados da busca das temáticas abordadas nas bases de dados a partir dos descritores. Para isso, foram considerados os artigos publicados entre 2015 e 2019 e realizada uma primeira filtragem dos artigos encontrados. Quanto à análise e organização dos dados encontrados, foi utilizado o software StArt, que auxiliou a eliminar os artigos repetidos nas duas bases utilizadas. Foram encontrados 79 artigos, dos quais 22 eram duplicados, restando 57 para análise. Os resultados são demonstrados na Tabela 1.

Tabela 1
Artigos encontrados conforme o método Knowledge Development Process - Construtivist (ProKnow-C).

Segunda etapa: delimitação dos resultados encontrados. Para essa fase, alguns critérios de inclusão foram adotados, entre eles, publicações em formato de artigo científico que se relacionaram aos temas de segurança alimentar e liberalização/abertura comercial. Foi primeiramente observado o título dos artigos e, posteriormente, analisados os resumos. Somente quando a liberalização era citada como possível problema ou solução, o artigo era incorporado à análise prévia. Na sequência, foi realizada uma nova seleção aplicando os seguintes critérios de inclusão: a) os artigos deveriam abordar as duas temáticas diretamente (segurança alimentar e liberalização/abertura comercial); b) os artigos deveriam tratar excepcionalmente do comércio de alimentos; c) os artigos deveriam ter como objetivo investigar as implicações da liberalização/abertura do comércio na segurança alimentar.

Desta forma, foram criados os seguintes critérios de exclusão para a seleção dos artigos: a) não tratar da segurança alimentar; b) não tratar da abertura comercial; c) tratar da segurança alimentar relacionada ao uso da água; d) tratar das implicações relacionadas ao meio-ambiente; e) tratar de segurança alimentar e uso da terra; f) tratar de competitividade; e g) impossibilidade de realizar o download.

Seguindo os critérios de inclusão/exclusão propostos para a análise, foram rejeitados 41 artigos por não se enquadrarem nos critérios de seleção, restando 16 aptos a serem analisados, conforme Quadro 1.

Quadro 1
Artigos excluídos conforme os critérios de exclusão para análise proposta.

Terceira etapa: de posse dos artigos, a análise foi iniciada. No Quadro 2, além da autoria dos artigos, há o ano de publicação, o título, o periódico e o fator de impacto (JCR).

Quadro 2
Detalhamento dos trabalhos analisados.

De posse do material, foram feitas as leituras do conteúdo dos artigos objetivando enquadrá-los em dois grandes grupos: a) os que tiveram como resultado a política de liberalização/abertura comercial como benéfica e b) os que obtiveram resultados negativos acerca da política de liberalização/abertura comercial.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir dos resultados encontrados, foi possível analisar a dualidade existente no debate acerca do papel do comércio internacional e da liberalização na segurança alimentar. Dos 16 trabalhos analisados, 8 apontam o papel benéfico da abertura comercial sobre a segurança alimentar, 5 apresentam resultados desfavoráveis, 1 apresenta os efeitos heterogêneos e 2s são artigos teóricos, que destacam o ordenamento jurídico que permeia a regulamentação e condução do comércio internacional de alimentos. A síntese dos principais resultados encontrados pode ser verificada no Quadro 3.

Quadro 3
Principais aspectos do debate sobre abertura comercial e segurança alimentar.

Constatou-se que a maioria dos artigos publicados nos últimos cinco anos analisaram os países em desenvolvimento evidenciando que estes são severamente afetados pela insegurança alimentar. Foi possível encontrar o registro de cinco estudos sobre o continente africano (Thow et al., 2018Thow, A. M., Greenberg, S., Hara, M., Friel, S., Dutoit, A., & Sanders, D. (2018). Improving policy coherence for food security and nutrition in South Africa: a qualitative policy analysis. Food Security, 10(4), 1105-1130.; Tinta et al., 2018Tinta, A. A., Sarpong, B. D., Ouedrago, M. I., Hassan, A. R., Mensah-Bonsu, A., & Onumah, E. E. (2018). The effect of integration, global value chains and international trade on economic growth and food security in ECOWAS. Cogent Food & Agriculture, 4(1), 1-15.; Pirkle et al., 2015Pirkle, C. M., Polikin, H., Sia, D., Kouakou, J. K., & Sangna, T. (2015). Re-envisioning global agricultural trade: time for a paradigm shift to ensure food security and population health in low-income countries. Global Health Promotion, 22, 60-63.; Ogundari & Ito, 2015Ogundari, K., & Ito, S. (2015). Convergence and determinants of change in nutrient supply: Evidence from sub-Saharan African countries. British Food Journal, 117(12), 2880-2898.; Sibanda, 2015Sibanda, O. S. (2015). Trade liberalisation and its impact on food security in Sub-Saharan Africa. International Journal of Public Law and Policy, 5(1), 92-107.), região com maior gravidade de insegurança alimentar, que apresentaram divergências quanto aos benefícios ou malefícios do processo de liberalização na segurança alimentar.

Com relação às técnicas metodológicas, no Quadro 4 são apresentados os direcionamentos.

Quadro 4
Técnicas metodológicas empregadas nos artigos analisados.

Com relação aos métodos adotados nos estudos analisados, houve predominância dos quantitativos, representando 56,2% do total, enquanto as abordagens qualitativas representaram 43,8%. O método mais utilizado foi a regressão com Modelos de Dados Fixos em Painel. Nos estudos qualitativos, a maioria foi de estudos exploratórios descritivos.

Farsund et al. (2015)Farsund, A. A., Daugbjerg, C., & Langhelle, O. (2015). Food security and trade: reconciling discourses in the Food and Agriculture Organization and the World Trade Organization. Food Security, 7(2), 383-391. e Daugbjerg et al. (2017)Daugbjerg, C., Farsund, A. A., & Langhelle, O. (2017). The resilience of paradigm mixes: food security in a post-exceptionalist trade regime. Journal of European Public Policy, 24(11), 1698-1715. apontaram os aspectos institucionais que permeiam o regime de comércio e alimentos existente no sistema internacional. A principal preocupação dos autores foi demonstrar como as questões de segurança alimentar e comércio, em direção à liberalização comercial, têm sido conduzidas nas principais organizações internacionais que regem a formulação de políticas econômicas e alimentares no sistema internacional, sendo elas a da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).

Farsund et al. (2015)Farsund, A. A., Daugbjerg, C., & Langhelle, O. (2015). Food security and trade: reconciling discourses in the Food and Agriculture Organization and the World Trade Organization. Food Security, 7(2), 383-391. apontam mudanças identificáveis na posição da FAO em relação à segurança alimentar e à liberalização comercial. Entre 1980 e 1990, a agenda de políticas da instituição entrou em convergência com a da OMC, adotando a premissa de que a liberalização comercial é necessária e propícia para a promoção e garantia da segurança alimentar global. Desse modo, a FAO se comprometeu com a agenda de liberalização comercial no mercado de alimentos da OMC (Farsund et al., 2015Farsund, A. A., Daugbjerg, C., & Langhelle, O. (2015). Food security and trade: reconciling discourses in the Food and Agriculture Organization and the World Trade Organization. Food Security, 7(2), 383-391.).

Pontos de consonância entre Farsund et al. (2015)Farsund, A. A., Daugbjerg, C., & Langhelle, O. (2015). Food security and trade: reconciling discourses in the Food and Agriculture Organization and the World Trade Organization. Food Security, 7(2), 383-391. e Daugbjerg et al. (2017)Daugbjerg, C., Farsund, A. A., & Langhelle, O. (2017). The resilience of paradigm mixes: food security in a post-exceptionalist trade regime. Journal of European Public Policy, 24(11), 1698-1715. foram encontrados em relação à Rodada de Doha, que ocorreu no âmbito da OMC. Farsund et al. (2015)Farsund, A. A., Daugbjerg, C., & Langhelle, O. (2015). Food security and trade: reconciling discourses in the Food and Agriculture Organization and the World Trade Organization. Food Security, 7(2), 383-391. apontam que o discurso de liberalização agrícola e de alimentos tem sido questionado, principalmente pelos países em desenvolvimento organizados no G-33, pois os países desenvolvidos não têm demonstrado seus compromissos com as reformas de liberalização e de política agrícola. Daugbjerg et al. (2017)Daugbjerg, C., Farsund, A. A., & Langhelle, O. (2017). The resilience of paradigm mixes: food security in a post-exceptionalist trade regime. Journal of European Public Policy, 24(11), 1698-1715. buscaram evidenciar como a questão da segurança alimentar e a alteração de equilíbrio de poder influenciaram as negociações da Rodada de Doha. Os autores destacam as preocupações econômicas dos países desenvolvidos relacionadas às dificuldades de implementação da agenda de segurança alimentar e evidenciam as coalizões do G-20 e do G-33 para a articulação, o que permitiu o avanço na liberalização do comércio mundial de alimentos entre 2008 e 2015, em especial com relação ao acordo de eliminação dos subsídios às exportações. Além disso, os autores argumentam que a falta de compromisso dos países desenvolvidos com as negociações da OMC pode levar ao colapso da Rodada de Doha, provocando sérios impactos para os países de baixa renda.

O trabalho de Baylis et al. (2018)Baylis, K., Fan, L., & Nogueira, L. (2018). Agricultural market liberalization and household food security in rural China. American Journal of Agricultural Economics, 101(1), 250-269. apresenta resultados heterogêneos. Os autores realizaram um estudo para investigar se a liberalização do comércio agrícola afetou a segurança alimentar das famílias rurais da China. Observaram que as famílias produtoras concorrentes com os produtos importados, em situação de insegurança alimentar, diminuíram o valor de sua produção agrícola sem aumentar sua renda fora da fazenda, agravando a situação de insegurança alimentar e diminuindo a ingestão calórica dessas famílias. As famílias em situação de segurança alimentar, produtoras de alimentos para exportação e concorrentes com os produtos das importações, aumentaram seu consumo de calorias de alimentos. Os autores concluíram que os efeitos da liberalização de mercado são heterogêneos dependendo do tipo de produtor e da situação inicial de segurança alimentar da família. Esses resultados demonstram a variabilidade dos efeitos da liberalização e, dependendo da situação na qual o produtor se encontra, ela é determinante nas respostas à segurança alimentar.

Tinta et al. (2018)Tinta, A. A., Sarpong, B. D., Ouedrago, M. I., Hassan, A. R., Mensah-Bonsu, A., & Onumah, E. E. (2018). The effect of integration, global value chains and international trade on economic growth and food security in ECOWAS. Cogent Food & Agriculture, 4(1), 1-15., Ogundari & Ito (2015)Ogundari, K., & Ito, S. (2015). Convergence and determinants of change in nutrient supply: Evidence from sub-Saharan African countries. British Food Journal, 117(12), 2880-2898., Zakaria et al. (2016)Zakaria, M., Junyang, X., & Fida, B. A. (2016). Trade openness, malnourishment and income inequality in South Asia. African and Asian Studies, 15(4), 347-371., Kang (2015)Kang, H. (2015). A study on the relationship between international trade and food security: evidence from less developed countries (LDCs). Agricultural Economics, 61, 475-483., Aliyeva et al. (2019)Aliyeva, L., Huseynova, S., Babayeva, S. J., Huseynova, V. A., Nasirova, O. A., & Hasanzade, F. (2019). Food security and optimal government intervention level in agriculture (Comparative analysis). Bulgarian Journal of Agricultural Science, 25, 12-20., Hosoe (2016)Hosoe, N. (2016). The double dividend of agricultural trade liberalization: consistency between national food security and gains from trade. Journal of Asian Economics, 43, 27-36., Erokhin (2017)Erokhin, V. (2017). Self-sufficiency versus security: How trade protectionism challenges the sustainability of the food supply in Russia. Sustainability (Switzerland), 9, 1. e Dithmer & Abdulai (2017)Dithmer, J., & Abdulai, A. (2017). Does trade openness contribute to food security? A dynamic panel analysis. Food Policy, 69, 218-230. demonstraram resultados favoráveis ao processo de liberalização do mercado de alimentos na saúde alimentar.

Tinta et al. (2018)Tinta, A. A., Sarpong, B. D., Ouedrago, M. I., Hassan, A. R., Mensah-Bonsu, A., & Onumah, E. E. (2018). The effect of integration, global value chains and international trade on economic growth and food security in ECOWAS. Cogent Food & Agriculture, 4(1), 1-15. e Ogundari & Ito (2015)Ogundari, K., & Ito, S. (2015). Convergence and determinants of change in nutrient supply: Evidence from sub-Saharan African countries. British Food Journal, 117(12), 2880-2898. desenvolveram seus estudos sobre o continente africano. Enquanto os primeiros autores focaram na Comunidade Econômica dos Estados da África ocidental (CEDEAO), os segundos voltaram a atenção para a região da África subsaariana. Estudos sobre essa região são importantes, pois o continente africano é a região do planeta com a maior prevalência de desnutrição, a qual afeta quase 21% da população, sendo mais de 256 milhões de pessoas (Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2019Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2019). The State of Food Insecurity in the World 2019. Rome: FAO. Recuperado em 6 de junho de 2020, de http://www.fao.org/state-of-food-security-nutrition/2019/en
http://www.fao.org/state-of-food-securit...
).

As análises de Tinta et al. (2018)Tinta, A. A., Sarpong, B. D., Ouedrago, M. I., Hassan, A. R., Mensah-Bonsu, A., & Onumah, E. E. (2018). The effect of integration, global value chains and international trade on economic growth and food security in ECOWAS. Cogent Food & Agriculture, 4(1), 1-15. indicaram que a abertura comercial afeta positivamente o suprimento da energia per capita da população dos países da CEDEAO e aumenta significativamente o status da segurança alimentar desses países. A liberalização do comércio em nível mundial funcionaria de maneira mais eficaz do que a integração regional devido à fragilidade das capacidades comerciais dos países de integração regional.

Ogundari & Ito (2015)Ogundari, K., & Ito, S. (2015). Convergence and determinants of change in nutrient supply: Evidence from sub-Saharan African countries. British Food Journal, 117(12), 2880-2898. apontaram para a convergência entre o fornecimento de nutrientes na África subsaariana e o aumento das importações de alimentos da região. Além disso, a confirmação da convergência implica em crescimento no fornecimento de nutrientes e redução da pobreza alimentar da região, que é considerada a mais pobre e com maior insegurança alimentar em todo o mundo.

Para analisar os efeitos da liberalização do comércio de alimentos na segurança alimentar, Zakaria et al. (2016)Zakaria, M., Junyang, X., & Fida, B. A. (2016). Trade openness, malnourishment and income inequality in South Asia. African and Asian Studies, 15(4), 347-371. analisou os países do sul da Ásia (Bangladesh, Índia, Nepal, Paquistão e Sri Lanka). Os resultados revelaram que a desnutrição diminuiu enquanto a desigualdade de renda aumentou na região após a liberalização. O autor verificou que a abertura comercial melhorou a nutrição na região, principalmente impulsionada por reformas econômicas realizadas nas décadas de 1980 e 1990 e pela criação de tratados inter-regionais.

Kang (2015)Kang, H. (2015). A study on the relationship between international trade and food security: evidence from less developed countries (LDCs). Agricultural Economics, 61, 475-483. analisou os países menos desenvolvidos (PMD’s). Nas fases iniciais da abertura comercial, existem impactos negativos sobre os alimentos locais, sendo possível afirmar, com base na teoria da vantagem comparativa, que o aumento da abertura comercial contribui para a redistribuição da produção mundial. Certas indústrias em um país importador podem escolher importar produtos devido à crescente disponibilidade de importações mais baratas e à sua estrutura de produção, podendo ter um efeito negativo na segurança alimentar doméstica. Entretanto, além de um certo limiar de expansão do comércio, a segurança alimentar tende a melhorar. Isso indica que os produtos mais baratos importados podem estimular o consumo interno e o investimento, podendo aumentar a segurança alimentar.

Contudo, Kang (2015)Kang, H. (2015). A study on the relationship between international trade and food security: evidence from less developed countries (LDCs). Agricultural Economics, 61, 475-483. traz uma importante reflexão acerca da generalização do processo de abertura comercial. A participação no comércio global não é garantia de melhoria da segurança alimentar em determinado país e não pode ser aplicada universalmente porque as políticas de restrição comercial variam entre as nações. Além disso, dependem diretamente do status inicial de segurança alimentar dos países e do engajamento político governamental para acordos justos, que proporcionem autonomia para os países em risco de segurança alimentar.

Aliyeva et al. (2019)Aliyeva, L., Huseynova, S., Babayeva, S. J., Huseynova, V. A., Nasirova, O. A., & Hasanzade, F. (2019). Food security and optimal government intervention level in agriculture (Comparative analysis). Bulgarian Journal of Agricultural Science, 25, 12-20. buscaram analisar comparativamente o impacto da intervenção governamental na segurança alimentar de 65 países, demonstrando que a intervenção, nesse setor, é generalizada tanto para países desenvolvidos como para países em desenvolvimento. O nível de liberalização do comércio exterior e o crescimento econômico desempenham um papel essencial na garantia da segurança alimentar e facilitam a relação entre os países de modo que cada país deveria escolher uma área de prioridade estratégica com base em suas vantagens comparativas.

Hosoe (2016)Hosoe, N. (2016). The double dividend of agricultural trade liberalization: consistency between national food security and gains from trade. Journal of Asian Economics, 43, 27-36. estudou os efeitos da liberalização do mercado de alimentos na segurança alimentar do Japão, o que suspostamente traria ganhos no bem-estar da população conforme previsto pela teoria do comércio convencional, com efeitos significativos para o arroz e o trigo. Erokhin (2017)Erokhin, V. (2017). Self-sufficiency versus security: How trade protectionism challenges the sustainability of the food supply in Russia. Sustainability (Switzerland), 9, 1. realizou um estudo para investigar os impactos das políticas protecionistas e de liberalização no mercado de alimentos da Rússia entre 1990 e 2015, e seus impactos na segurança alimentar do país, apontando que a insegurança alimentar aumenta em tempos de política protecionista. Nessas condições, o mercado interno não tem fontes de importação acessíveis e nem fontes internas de abastecimento alimentar de qualidade. Como consequência, os consumidores russos responderam às caras importações mudando o comportamento de compra para produtos alimentares mais baratos e fontes de proteína mais acessíveis. Outro efeito das medidas protecionistas foi a diminuição da variedade de alimentos disponíveis, reduzindo as opções para a escolha do comprador. Além disso, os preços ao consumidor aumentaram e, em alguns casos, subiram mais de 70%.

Dithmer & Abdulai (2017)Dithmer, J., & Abdulai, A. (2017). Does trade openness contribute to food security? A dynamic panel analysis. Food Policy, 69, 218-230. usaram dados de vários países para investigar as consequências da abertura comercial e as implicações na segurança alimentar, medidas pelo consumo de energia na dieta. A abertura comercial e o crescimento econômico exerceram impactos significativos sobre o consumo de energia na dieta e contribuíram para melhorias na diversidade alimentar. Os resultados são robustos quanto à inclusão de variáveis adicionais como restrições agroclimáticas, características regionais e de desenvolvimento econômico e demográfico, variáveis as quais captam eventos não econômicos (choques externos), além do ambiente político. Embasando-se nesses achados, os autores demostram que a liberalização comercial deve constituir um componente fundamental nas políticas voltadas para a segurança alimentar no sentido de reduções progressivas dos níveis de proteção e eliminação de políticas que distorcem o comércio.

Avaliando os achados da literatura, é possível destacar o aumento do suprimento energético e a diminuição da desnutrição resultantes da liberalização econômica nos países analisados. Essas são consequências da maior distribuição de alimentos e redução dos preços no cenário internacional devido à maior oferta alimentar, mantendo o alinhamento com a teoria ricardiana de vantagens comparativas. Vale destacar que os ganhos apresentados por tais trabalhos são para países em desenvolvimento, bem como para os desenvolvidos.

Em contraponto às vantagens da liberalização econômica e do livre comércio está a disponibilidade de alimentos não locais nas redes de supermercados (Asfaw, 2008Asfaw, A. (2008). Does supermarket purchase affect the dietary practices of households? some empirical evidence from Guatemala. Development Policy Review, 26(2), 227-243.). Embora esse fenômeno tenha o potencial de proporcionar aos seus consumidores maior diversidade de escolhas alimentares, também oferece acesso a alimentos baratos e menos nutritivos, incluindo lanches, carnes embaladas e processadas, além de itens adoçados e com alto teor calórico (Hawkes, 2008Hawkes, C. (2008). Dietary implications of supermarket development: a global perspective. Social Science & Medicine, 26(6), 657-692.). Tais fatores estão diretamente associados ao aumento mundial de doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes e obesidade, que se enquadram no conceito de insegurança alimentar por impactarem vários aspectos da saúde da população.

Nesse sentido, Thow et al. (2018)Thow, A. M., Greenberg, S., Hara, M., Friel, S., Dutoit, A., & Sanders, D. (2018). Improving policy coherence for food security and nutrition in South Africa: a qualitative policy analysis. Food Security, 10(4), 1105-1130. realizaram um estudo sobre as políticas de abastecimento alimentar e econômicas da África do Sul visando analisar possíveis oportunidades para a melhoria em todos os setores que regem o abastecimento de alimentos no país. Os achados desse estudo indicaram que a agenda de liberalização econômica no país tem contribuído negativamente para a segurança alimentar, havendo maior oferta de alimentos com baixa qualidade nutricional e alto valor energético (altamente processados), o que contribui para doenças relacionadas à alimentação. Como solução, é necessário haver o fortalecimento de mercados locais, incentivos para a diversificação de culturas ricas em nutrientes e promoção da agricultura de pequena escala para fornecer alimentos mais nutritivos para a população. Tais medidas não são adotadas na África do Sul devido ao comprometimento com a agenda de liberalização comercial, resultando em incoerências na formulação de políticas voltadas à segurança alimentar.

Cantor et al. (2018)Cantor, A. R., Chan, I., & Baines, K. (2018). From the Chacra to the Tienda: dietary delocalization in the Peruvian Andes. Food & Foodways, 26(3), 198-222. avaliaram as mudanças nos padrões de consumo, como a abertura dos mercados, na província de Carhuaz, Peru, e como elas afetaram a segurança alimentar e o estado nutricional da população, mais especificamente das mulheres em idade reprodutiva. Os resultados mostraram que os participantes estavam, em média, acima do peso e consumindo grandes quantidades de calorias. As mulheres, além de mais pesadas, estavam menores em comparação a dados anteriores e a insegurança alimentar estava presente em todas as famílias participantes do estudo. Embora as faixas de macronutrientes estivessem de acordo com a porcentagem recomendada para a dieta diária, a ingestão calórica e o IMC médio da amostra estavam altos, demonstrando um paradoxo entre a insegurança alimentar e a obesidade. A disponibilidade de grãos importados baratos, alimentos com trigo e sua grande oferta nas redes de supermercado contribuíram para o declínio do consumo de alimentos locais ricos em nutrientes e para a ascensão da ingestão de alimentos com alto teor calórico.

Botella-Rodríguez (2016)Botella-Rodríguez, E. (2016). Costa Rica’s Outward-Looking Development: From ‘Agriculture of Change’ to Food Insecurity. Bulletin of Latin American Research, 37(1), 57-72. explorou as políticas de liberalização econômica implementadas pela Costa Rica, seguidas pela agenda neoliberal desde a década de 1990, e os efeitos na produção agrícola no uso da terra e na segurança alimentar nacional. Embora a produção tenha sido intensificada para aumentar a competitividade, a agricultura costarriquenha tornou-se altamente dependente de tecnologia, insumos e maquinários estrangeiros. As instituições responsáveis pela promoção da produção agrícola para o mercado interno foram negligenciadas e prejudicaram a capacidade dos pequenos agricultores de obter insumos e tecnologias para participar do mercado tanto externo quanto interno. Além disso, o número de pequenos agricultores diminuiu significativamente, com consequências para a produção nacional de alimentos e o aumento da dependência na importação. Houve concentração em poucas culturas voltadas para exportação, tornando o país vulnerável a choques externos.

Pirkle et al. (2015)Pirkle, C. M., Polikin, H., Sia, D., Kouakou, J. K., & Sangna, T. (2015). Re-envisioning global agricultural trade: time for a paradigm shift to ensure food security and population health in low-income countries. Global Health Promotion, 22, 60-63. verificaram que os acordos de liberalização comercial da África ocidental com seus parceiros comerciais são exploratórios, permitindo que países ricos, como os Estados Unidos e os da União Europeia, subsidiem maciçamente a agricultura doméstica ao mesmo tempo que pressionam os países de baixa renda a removerem suas próprias políticas de proteção. Isso levou à perda do meio de subsistência de milhões de agricultores devido às importações mais baratas (Bond, 2007Bond, P. (2007). The dispossession of African wealth at the cost of Africa’s health. International Journal of Health Services, 37(1), 171-192.; Pirkle et al., 2015Pirkle, C. M., Polikin, H., Sia, D., Kouakou, J. K., & Sangna, T. (2015). Re-envisioning global agricultural trade: time for a paradigm shift to ensure food security and population health in low-income countries. Global Health Promotion, 22, 60-63.).

Tal dedução dialoga diretamente com a premissa de Tokarick (2008)Tokarick, S. (2008). Dispelling some misconceptions about agricultural trade liberalization. The Journal of Economic Perspectives, 22(1), 199-216. http://dx.doi.org/10.1257/jep.22.1.199
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, segundo a qual o comércio agrícola globalizado, como é conduzido atualmente, beneficia desproporcionalmente os países ricos em relação aos de baixa renda, tendo, muitas vezes, consequências desastrosas para os últimos, incluindo maior insegurança alimentar e ameaça à saúde da população. Thow et al. (2018)Thow, A. M., Greenberg, S., Hara, M., Friel, S., Dutoit, A., & Sanders, D. (2018). Improving policy coherence for food security and nutrition in South Africa: a qualitative policy analysis. Food Security, 10(4), 1105-1130. destacam a necessidade de reconsideração da agenda política que favorece a liberalização, incluindo a rescisão da maioria dos tratados bilaterais. Esse aspecto pode proporcionar uma oportunidade para melhor reconhecimento das prioridades de segurança alimentar e nutrição na formulação de políticas de abastecimento alimentar.

A partir do ponto de vista do setor agrícola, Sibanda (2015)Sibanda, O. S. (2015). Trade liberalisation and its impact on food security in Sub-Saharan Africa. International Journal of Public Law and Policy, 5(1), 92-107. verificou que a liberalização do comércio de alimentos gerou consequências complexas e imprevisíveis na África subsaariana em função das condições econômicas específicas da época. Enquanto muitas pessoas estão passando fome na região, algumas empresas dedicam a única fonte de alívio da fome para produzir combustíveis. O autor defende que a vantagem comparativa, como consequência da liberalização do comércio agrícola, pode aumentar o custo do acesso a alimentos e a insegurança alimentar, além de possivelmente ameaçar as indústrias locais da África subsaariana.

A presença de acordos exploratórios bilaterais ou multilaterais de países subdesenvolvidos com os países ricos acaba por afetar a capacidade produtiva e acarreta dependência de insumos e maquinários agrícolas estrangeiros, desestimulando a produtividade agrícola e ameaçando os pequenos produtores devido à concorrência com produtos importados mais baratos. Também foi possível notar os efeitos da abertura dos mercados sobre a qualidade nutricional das dietas e, principalmente, quanto às doenças crônicas não transmissíveis relacionadas às dietas, que contribuem para o agravamento da insegurança alimentar de algumas populações.

É notável a dualidade dos resultados encontrados na literatura relacionados a fatores regionais individuais, bem como das relações e dos acordos comerciais firmados entre países desenvolvidos ou não, o que demonstra a heterogeneidade dos estudos e corrobora com os achados da Food and Agriculture Organization of the United Nations (2015)Food and Agriculture Organization of the United Nations – FAO. (2015). Food Security and International Trade: Unpacking Disputed Narratives. Rome: FAO. Recuperado em 13 de dezembro de 2019, de http://www.fao.org/3/a-i5160e.pdf
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.

5. CONCLUSÕES

Podemos argumentar que a literatura sobre os temas em questão permanece ambígua, sendo tal ambiguidade inerente ao tema devido à sua complexidade e ao caráter multifacetado da segurança alimentar. A natureza e a magnitude do efeito da liberalização na segurança alimentar dependem de vários fatores, como o grau de adaptabilidade dos pobres às mudanças nas condições econômicas, o grau de exposição dos países às importações de alimentos, a presença de condições iniciais favoráveis, as medidas de acompanhamento e o horizonte temporal considerado na pesquisa. Esta revisão das políticas comerciais que afetam a segurança alimentar indica, portanto, que não há uma base sólida de evidências para conclusões sobre a eficiência das intervenções analisadas. Em outras palavras, desta revisão não podemos distinguir, em termos gerais, o que funciona ou não, ou qual intervenção funciona melhor em comparação a outra.

É possível afirmar que as estratégias que visam melhorar a segurança alimentar dependem de diferentes ações para cada país, de maneira que os efeitos da política de liberalização apresentam resultados heterogêneos em diferentes regiões. Os formuladores de política devem considerar os impactos nos pequenos produtores, pois eles são muitas vezes marginalizados durante o processo de abertura comercial, o que acarreta perdas para a segurança alimentar na área rural. Os tratados comerciais referentes aos alimentos em diversos países devem passar por uma reconsideração para que não beneficiem apenas os países mais desenvolvidos e apresentem ganhos equitativos com vistas a melhorar a segurança alimentar nos países pobres e menos desenvolvidos, como os do continente africano. Considerando que os trabalhos analisados nesta revisão, quase em sua totalidade, analisam países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, sugerimos quatro caminhos para a melhoria da segurança alimentar nesses locais: aumento da produtividade agrícola, desenvolvimento de cadeias de valor, revisão dos acordos comerciais e melhoria da segurança da posse de terra.

A teoria da vantagem comparativa, quando analisada em países em desenvolvimento, parece acarretar maiores ganhos para a segurança alimentar doméstica. Contudo, somente a abertura comercial não é garantia de maior oferta de alimentos e maior oferta de alimentos com melhor qualidade nutricional. As preocupações relacionadas com a insegurança alimentar, por exemplo, doenças como obesidade e diabetes, aparentemente têm ganhado espaço na literatura.

A insegurança alimentar permanece um grande desafio para a comunidade internacional e a realização de estudos sobre os efeitos das políticas comerciais torna-se extremamente importante. A experiência dos países pode ser um fator-chave a ser considerado para a reconsideração do seu tratamento em âmbito internacional. Vale ressaltar a relevância da continuidade de estudos que analisem o papel das políticas comerciais, como a de liberalização, para servir de amparo aos seus formuladores e ao debate acadêmico sobre a importância de tais políticas na segurança alimentar. Eventualmente, essa linha de pesquisa pode contribuir para o desenho de arranjos de governança institucionais que sejam capazes de lidar com a insegurança alimentar de maneira mais eficaz do que é possível atualmente, em particular no âmbito da Organização Mundial do Comércio. Quanto às limitações do estudo, elas se relacionam à natureza de revisões sistemáticas, pois os recortes temporais e critérios de elegibilidade dos trabalhos podem ter provocado alguma perda em termos de conteúdo.

  • Como citar: Machado, M. V., Burbarelli, M. F. C., Garcia, R. G., Binotto, E., & Borges, H. G. (2023). Segurança alimentar e liberalização comercial do mercado de alimentos: uma revisão sistemática. Revista de Economia e Sociologia Rural, 61(3), e256624. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2022.256624
  • JEL Classification: Q17.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    22 Set 2021
  • Aceito
    13 Jul 2022
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