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Reflexões sobre a violência na condição moderna

Reflections about violence in modern life

Resumos

A crise da representação progressista da história, na qual a violência possuía um sentido positivo como expressão da luta de classes, deu lugar, na modernidade, a uma concepção negativa da violência, segundo a qual ela aparece como um fracasso e é concebida como apelo a um mundo físico, material, numa sociedade na qual triunfa a informação altamente mediatizada. A violência é considerada, assim, uma espécie de irrupção do "primitivo". Ora, é preciso desconfiar de uma definição geral da violência; levar em conta que há situações contrastantes de exposição à violência nas sociedades modernas bem como examinar os mecanismos sociais e institucionais que a favorecem.

violência; mediatização; modernidade


The crisis in the progressist representation of History, in which the violence has got a positive meaning as regarded as expression of social classes dispute, gave place, nowadays, to a negative concept of violence, which is now regarded as a failure, and is understood as an appeal to the physical and material world, of a society which has got only mediate information. Therefore, the violence is considered a kind of irruption of the primitive. In this way, it is necessary to mistrust a general definition of violence and take into account that there are contrasting situations of exposure to violence into the modern societies, and that because of this, it is necessary to analyse the social and institutional mechanisms which support this idea.

violence; media; modernity


ARTIGO

Reflexões sobre a violência na condição moderna

Reflections about violence in modern life

Danilo Martuccelli

Professor da Université de Lille e do CADIS - EHESS

Tradução de Maria das Graças de Souza do Nascimento

RESUMO

A crise da representação progressista da história, na qual a violência possuía um sentido positivo como expressão da luta de classes, deu lugar, na modernidade, a uma concepção negativa da violência, segundo a qual ela aparece como um fracasso e é concebida como apelo a um mundo físico, material, numa sociedade na qual triunfa a informação altamente mediatizada. A violência é considerada, assim, uma espécie de irrupção do "primitivo". Ora, é preciso desconfiar de uma definição geral da violência; levar em conta que há situações contrastantes de exposição à violência nas sociedades modernas bem como examinar os mecanismos sociais e institucionais que a favorecem.

Palavras-chave: violência, mediatização, modernidade.

ABSTRACT

The crisis in the progressist representation of History, in which the violence has got a positive meaning as regarded as expression of social classes dispute, gave place, nowadays, to a negative concept of violence, which is now regarded as a failure, and is understood as an appeal to the physical and material world, of a society which has got only mediate information. Therefore, the violence is considered a kind of irruption of the primitive. In this way, it is necessary to mistrust a general definition of violence and take into account that there are contrasting situations of exposure to violence into the modern societies, and that because of this, it is necessary to analyse the social and institutional mechanisms which support this idea.

Keywords: violence, media, modernity.

As relações entre a violência e a modernidade são de tal modo plurais que não se trata aqui senão de esboçar, em forma de ensaio, alguns elementos de reflexão, a partir de uma caracterização global da condição moderna 1 1 Com efeito, e para citar apenas algumas, além das análises comparativas e históricas, as práticas violentas podem ser apresentadas sob a forma de níveis de ação. de problemáticas, de tipos, de atores, de paradigmas, de causalidade... Além disto, todas as nossas reflexões possuem, como pano de fundo, a situação francesa contemporânea. . Após uma breve apresentação das mudanças identificáveis nas significações da violência contemporânea, nós nos centraremos numa consideração fenomenológica da vida social na modernidade e no grau de tolerância induzido em relação aos diversos tipos de violência. Na seqüência desta consideração geral, duas problemáticas diferentes reterão brevemente nossa atenção. De um lado, a existência de situações socialmente contrastadas de exposição à violência e, de outro, a apresentação de alguns mecanismos sociais e institucionais que a favorecem.

Enfraquecimento e transformação dos significados da violência na modernidade

1- A opacidade significativa da violência

Não importa o que se pense sobre a veracidade da afirmação da diminuição empírica da violência durante o processo de modernização, ou do aumento de nossa sensibilidade em relação a ela2 2 Uma afirmação plausível, mas provavelmente indemonstrável de maneira exaustiva - basta fazer variar a definição de "violência" ou ampliar ou reduzir os períodos examinados para prová-la ou invalidá-la (cf. Chesnais, 1981). , deve-se partir da constatação de que a violência se desfaz progressivamente de toda significação "positiva" no seio da modernidade. O que se atenua principalmente é uma forma muito particular de legibilidade da violência, que a fazia decorrer mais ou menos diretamente do estado das relações sociais de dominação. De uma maneira ou de outra, o raciocínio foi durante muito tempo sempre o mesmo: a violência "vinda de baixo" é uma resposta à violência "vinda de cima" e esta é, por sua vez, uma maneira de controlar ou de prevenir a violência que vem de baixo3 3 Para uma versão extrema desta dialética, (cf. Sartre, [1960] 1985. p. 802 ss). . Ela poderia mesmo ser interpretada como parteira da história: o marxismo e a luta de classes foram sem dúvida a expressão maior desta representação. Essa violência, cuja inteligibilidade social era inteiramente política, conheceu muitas variantes, na medida em que era dotada de dimensões "existenciais", "psíquicas", até mesmo "estéticas", como foi o caso de algumas vanguardas artísticas. Para além da significação histórica, e porque sua significação é então inextricavelmente ligada a uma representação progressista da história, ela não é nada mais a não ser um meio coletivo de ação, ou um recurso indispensável ao ator dominado4 4 Duas versões muito diferentes destes processos encontramos em Sorel [1908] (1981) e Fanon (1961). . No limite, ela é um recurso "quase" como qualquer outro, diante do qual o juízo moral deve evitar qualquer conclusão apressada, tanto ela manifesta, no fundo, e por caminhos tortuosos, um estado de conflito ao mesmo tempo irreprimível e inexpressável. Por não dispor de outros meios, o ator recorre à violência para se fazer "ouvir". Essa leitura, que é tanto "política" quanto "ordinária", visava, nas suas formulações mais radicais, transformar toda forma de violência em manifestação apenas disfarçada da luta de classes. Deve-se ainda lembrar que nessa representação até mesmo a delinqüência foi inteiramente percebida como um exemplo de "justiça social autogerida" pelos setores populares5 5 Para um balanço crítico (cf. Inciardi, 1980). .

O significado imediatamente negativo da violência nas sociedades contemporâneas deve muito, talvez mais do que se pense normalmente, à crise intelectual e política dessa representação da história. O fato de que a idéia de "revolução" e mais tarde a de "liberação" tenham encarnado essa representação permite compreender que sua crise radical atual traz consigo uma definição da violência doravante profundamente deslegitimada. E contudo a crise contemporânea desse paradigma não deve nos fazer esquecer sua importância histórica e sua relativa atualidade. No final das contas, durante muito tempo, e em muitos países, até mesmo em situações atuais na América Latina, a violência esteve estreitamente ligada à obtenção de reformas sociais ou à transformação dos regimes políticos ilegítimos. Não esqueçamos também que, no registro da modernidade, esse paradigma foi com freqüência a única matriz no seio da qual a violência era dotada de uma significação positiva.

Com a crise dessa representação, difunde-se sub-repticiamente a idéia de que, já que a violência não esposa mais o sentido da história, ela não é nada mais do que um "fracasso", mais ou menos transitório, de uma solução negociada e pacificada. A tentação de se deixar levar por este tipo de afirmação é tanto maior quanto mais o recurso às instituições e à deliberação parece impor-se como uma evidência incontornável da democracia. Recurso que entretanto deixa passar em silêncio, além das crises ou das dificuldades atuais que abalam muitas instituições, a face de sombra constante presente em toda sociedade. Este é um dos riscos trazidos pelo enfraquecimento da representação da violência como manifestação de um conflito social. Essa interpretação pelo menos tinha o mérito de lembrar, contra uma tentação que afirmava depressa demais a possibilidade de uma institucionalização acabada dos conflitos sociais, a existência inelutável, no coração de qualquer sociedade, de práticas sociais institucionalmente recalcadas. E mesmo se essa posição nem sempre foi interpretada nestes termos, ela permitia contudo compreender que a violência era o resíduo estrutural constante, não institucionalmente tratado, porque não institucionalmente tratável, de um estado histórico de relações sociais de dominação.

2- O crescimento da consciência dos riscos e da violência

A segunda dimensão deve ser relacionada com os progressos realizados pela sociedade moderna no que concerne às suas capacidades de auto-representação. Qualquer que seja a realidade causal do laço, aliás não unívoco, que une o espetáculo da violência e as práticas violentas6 6 No que diz respeito à França, cf. o dossiê do IHESI, Les cahiers de la sécurité intérieure, 20, 2, 1995. , somos forçados a constatar que os indivíduos vivem cada vez mais com uma consciência maior dos "riscos" ou das "violências" que os ameaçam, e, no geral, visto o crescimento dessas representações, com um conhecimento menor dos casos "reais" de violência. Distância que não se refere somente à superexposição midiática dos indivíduos à violência em relação ao seu cotidiano mais ou menos calmo7 7 J. Baudrillard já assinalava isto nos inícios dos anos 70 (cf. Baudrillard, 1985, p. 33-35). mas, mais profundamente, à diferença cognitiva entre sua consciência crescente quanto à virtualidade dos perigos que os ameaçam e seu sentimento, às vezes abusivo, de que nada é feito para realmente enfrentá-los. Essa atitude dupla deve ser associada ao aumento da auto-reflexibilidade da sociedade e dos indivíduos. Numa situação desse tipo, a ambivalência se torna a primeira definição da condição moderna (cf. Bauman, 1991). A violência é, antes de tudo, de natureza "subjetiva", um "sentimento", uma maneira de "ter experiência" do mundo exterior, de ser ou de se sentir exposto a ele... Os diversos processos de desinstitucionalização, assim como a dissolução de referências comunitárias ou classistas, apenas reforçam uma representação da violência na qual ela é percebida ao mesmo tempo como "negativa" e perturbadora.

O tema da insegurança, bem como as diversas teorizações dos riscos na sociedade moderna, sublinham, ao seu modo, essa dimensão da condição moderna, sem dúvida mais importante do que as manifestações de práticas violentas stricto sensu. O indivíduo se sente "exposto" a "novos" perigos que não são concebidos como simples fruto de uma distorção da modernidade, mas, ao contrário, são o próprio resultado de sua realização. Na modernidade, há riscos constantes ligados a efeitos colaterais impossíveis de serem eliminados. O indivíduo sente-se ameaçado por riscos econômicos (quedas das bolsas, inflação, desemprego), tecnológicos (centrais nucleares), sanitários (novas doenças)... O risco torna-se consubstancial à modernidade. E a incapacidade de controlá-lo no seio de sociedades em plena mutação organizacional, sem ter mais à sua disposição mecanismos para conjurá-lo (cf. Balandier, 1988), é suscetível de levar a um aumento generalizado do sentimento de insegurança (cf. Roché, 1993, 1995). Mas, sobretudo, por causa da extensão social do saber e dos lugares de debates, o elo entre esses diversos acontecimentos e o dano aparece cada vez menos como uma necessidade e cada vez mais como fruto de uma contingência que pode ser submetida à discussão. O perigo não é mais o fato do ambiente, mas os riscos atribuídos às conseqüências das decisões. Para a ecologia, é a acumulação das decisões passadas que, num período longo, leva a situações de prejuízos das quais não se consegue mais determinar com precisão a origem. No limite, não há mais decisão ou conduta desprovida de risco numa sociedade moderna, um risco que provém não somente das conseqüências das realizações técnicas mas também da complexidade crescente dos modos de cálculo racional e de imbricação entre as ações. Ora, é próprio da modernidade estender constantemente o domínio de sua representação sobre campos que antes eram deixados entregues à sua própria lógica, ou "fatalidade", e que sucessivamente tendem a ser interpretados como dependentes de decisões (ou da ausência de decisões, aliás). Os efeitos das tecnologias, dos produtos químicos, do casamento, das condutas econômicas face à variabilidade dos preços, do desemprego tendem a ser representados como resultado, mesmo vazio, dessas decisões. A origem última da violência aparece então como uma conseqüência dessas situações. Onde, de um lado, houve uma má decisão, haverá, de outro lado, um risco, até mesmo condutas violentas. Essa é a condição inevitável de uma sociedade moderna que se auto-representa cada vez mais como uma sociedade exposta ao risco, e portanto ao sentimento de insegurança dos indivíduos, e que, ao mesmo tempo, dada a vocação de domínio própria do projeto moderno, tende cada vez mais a interpretar as situações como conseqüências de decisões (cf. Beck, [1986]* * A data entre colchetes refere-se sempre à edição original da obra. Ela é indicada na 1a vez que a obra é citada. Nas demais, indica-se somente a edição utilizada pelo autor (nota do Editor). 1992; Luhmann, [1991] 1993).

O dilema fenomenológico da violência na modernidade

O dilema contemporâneo, face à violência, decorre dessas duas realidades. A violência aparece como sendo puramente negativa e sob a forma de riscos que a sociedade se mostra incapaz de controlar. Essa primeira representação de conjunto cede lentamente o lugar para uma outra, já inscrita nela, e pela qual a violência se torna ao mesmo tempo "ilegível" socialmente e "sobre-representada" virtualmente. A distância é menos entre o autocontrole pulsional interno e a violência social externa (como, de certo modo, em Norbert Elias, [1939] 1991, [ 1939] 1975), do que entre os conhecimentos quanto à virtualidade dos riscos e as violências de uma parte, e, de outra, o sentimento de diminuição de nossa capacidade de ação, real ou simbólica, face a esses riscos.

Mas essa distância estrutural ganha importância maior quando é associada às mudanças ocorridas com nossas representações da condição moderna. Difunde-se a idéia de que a modernidade não seria, afinal, senão o triunfo da informação sobre a energia, da mediatização desmaterializante crescente contra os limites físicos e materiais inscritos na natureza. À sua maneira, trata-se da separação tendencial, pelo menos no nível das representações sociais dominantes, de duas relações cibernéticas próprias a todo sistema social, isoladas por Talcott Parsons nos anos sessenta, quando ele estabelecia uma dupla hierarquia entre os fatores de condicionamento (onde o primado é da energia) e os fatores de controle (onde o primado é da informação) (cf. Parsons, 1961, [1966] 1973, p. 6-38)8 8 Notamos contudo que o próprio Parsons leve uma tendência a se desviar para uma concepção que atribuía à informação cm sentido amplo um papel unilateralmente determinante na evolução das sociedades. . Essa articulação cede lugar a uma outra representação na qual os elementos de informação (e muitos outros elementos culturais) tornam-se autônomos em relação aos elementos físicos ou energéticos. Entretanto, essa representação do mundo social está longe de ser neutra, pelo fato de que reflete, de maneira fortemente estilizada, o que é próprio das comunidades de vida de alguns grupos sociais colocados no alto da estrutura social e que têm, além disso, formas de vida muito internacionalizadas. De modo indissociavelmente descritivo e normativo, essa representação veicula a imagem de um mundo social no qual a informação (às vezes até mesmo a reflexão) prima largamente sobre a ação, ou antes, no qual a informação detém o papel que outrora cabia à ação. Nesse mundo social altamente moderno, os indivíduos, assim como os sistemas peritos, operam cada vez mais à distância por meio de elementos simbólicos muito freqüentemente bastante mediatizados (canais informacionais diversos e meios impessoais) (cf. Giddens, [1990] 1994). No limite, nossa relação com o mundo é cada vez mais mediatizada pelo uso de símbolos e a ação se reduz à circulação e atualização de códigos no seio de sistemas peritos. Ora, de outro lado, e para aquém dessa representação, somos forçados a constatar que continuamos sempre a viver num mundo que ainda permanece irremediavelmente "físico", e sobretudo que um bom número de indivíduos situados nas posições inferiores da estrutura social têm o sentimento de estarem "ancorados" na matéria, "pregados" ao chão, "engolidos" pela espessura das relações sociais.

Numa situação dominada por esse tipo de representação, o centro do problema da violência na modernidade, num alto grau de abstração, encontra-se na inversão que ela opera dessa imagem da condição moderna. Ou melhor, da auto-representação normativa que as sociedades modernas querem dar de si mesmas. É neste sentido preciso que se deve interpretar a violência como um limite físico ou material no próprio coração da modernidade. Menos então o "retorno" da barbárie na civilização do que a resistência de uma certa forma de "matéria" social, efetivamente, o apelo do mundo físico em relação ao mundo da informação. A origem do caráter desconcertante da violência provém desse estado de fato, já que ela sempre quebra, mil e uma vezes, a ficção sistêmica e informacional do mundo moderno, sua tendência a se fechar na abstração, até mesmo sua tentação de uma imaterialização crescente das relações sociais em detrimento das relações diretas.

Em termos teóricos, pode-se assim dizer que a violência aparece então como a reafirmação dos direitos da "energia" contra a "informação" e que, na verdade, ela dá forma a uma oposição social maior entre setores sociais caracterizados por modos diversos de acesso a esse mundo de informação e de imaterialidade. Esta fórmula, a seu modo, resume a crise da significação da violência na passagem de uma sociedade industrial, que supervalorizava o esforço e a estilização da força física, para uma sociedade de informação, que supervaloriza o conhecimento e a estilização do imaterial e da distância. Se o elogio da energia era moeda corrente no coração da sociedade industrial (basta pensar em Marx e para além dele na supervalorização do trabalho durante todo esse período), na sociedade de informação tudo que depende de desgaste físico toma-se, pelo menos, objeto de sentimentos ambivalentes. De um lado, há efetivamente uma supervalorização do esporte e da proeza física, mas antes de tudo enquanto manifestações acabadas do ideal de igualdade próprio das sociedades democráticas (cf. Ehremberg, 1991). De outro lado, inúmeras representações acentuam fortemente a carga negativa associada doravante ao cansaço, menos enquanto não-performance do que como um resíduo natural no meio de uma sociedade que se concebe, em seu imaginário central, na ausência (na verdade, no recalque) do recurso à energia.

O sentido último da violência não é então outra coisa a não ser a derrubada da representação tendencialmente dominante da condição moderna. A condição moderna se auto-representa como mergulhada num excesso de conhecimento e de informação que às vezes substituem a própria ação, ou, em todo caso, que são considerados capazes de responder aos déficits observáveis de ação. A violência, ao contrário, só é representada sob a forma de um déficit de informação e um excesso de ação física ou de energia. Na violência, a ação impõe-se sobre a informação; ela é uma desmedida energética num mundo de fluxos imateriais de informação.

Ora, a despeito da caracterização precedente, é preciso desconfiar de uma representação geral da violência que faça dela um simples "resíduo" "pré"-moderno no seio das sociedades contemporâneas. Na verdade, deve-se classificar as diversas manifestações da violência segundo seu maior ou menor grau de imaterialidade ou de estilização, segundo elas tenham sido objeto de um crescimento de informação e uma diminuição de sua "materialidade". Não tanto porque a violência demonstre a impossibilidade de manter até o fim a sociedade por meio de redes impessoais e mediatizadas, na ausência de qualquer operação "física" (por exemplo, quando a estética tolerada da violência e da ordem encarnada pela arma do policial torna-se um excesso desde o momento em que ele se serve dela), mas porque ela muda de natureza e de significação segundo o grau de racionalização que incorpora. Em outras palavras, uma vez efetuada a caracterização geral da violência no seio da condição moderna, seria inútil afirmar peremptoriamente que a violência é o outro da modernidade. Ao contrário, e a esse respeito Anthony Giddens soube muito bem assinalar toda a importância que ela tem na dinâmica institucional própria da sociedade moderna (cf. Giddens, 1985). Sem se deixar perder em visões extremas da normalização institucional e da subordinação (cf. Foucault, 1975,1994), ele sublinha fortemente a importância crescente dos meios específicos de vigilância e de controle (controle da informação e supervisão social de práticas sociais pelo Estado ou outras organizações), assim como o peso, nos Estados-nações, dos aspectos propriamente militares no seio da modernização (crescimento e monopolização, pelo Estado, dos meios de violência e de destruição). Ora, se esses aspectos são parte integrante da corrente subterrânea da modernidade, eles estão longe de dirigir a sua dinâmica, tanto estão contrabalançados por outras dimensões institucionais e por movimentos de contestação coletiva. É preciso então prestar mais atenção à pluralidade das formas de violência e sobretudo às diferentes maneiras de aceitá-las. As análises empíricas deveriam permitir que se chegasse a diferenciar as suas formas e o grau de tolerância de que elas gozam, em função do grau de pertinência ao mundo da informação. De maneira especulativa, muito esquematicamente e apenas a título de indicação, talvez seja possível distinguir os seus grandes tipos.

Em primeiro lugar, deve-se reconhecer a existência de uma violência profundamente moderna, principalmente aquela ligada aos grandes aparelhos militares que, mesmo que esteja longe de ser consensual (basta pensar nos movimentos pacifistas), caracteriza-se por um grau não desprezível de aceitação. A guerra do Golfo é um bom exemplo da mudança de significação dessa violência: ela não somente opôs um exército da "terceira" onda a um outro da "segunda" onda, para retomar as palavras de Toffler (1994), mas duas concepções da violência "militar". Para a primeira, mais tradicional, é a mobilização organizada da energia social que define a força de um exército, como na ocasião da Revolução Francesa e das duas grandes guerras mundiais, ou ainda a exemplo das guerrilhas. Para a segunda, ao contrário, é a capacidade mediatizada do uso da violência por mecanismos experts que define a "modernidade" de uma forma de violência. A relativa facilidade com que a opinião pública de países centrais aceita esse tipo de intervenções militares, para além de considerações mais políticas, deve provavelmente ser interpretada em relação ao caráter cada vez mais imaterial dessas formas de violência que se efetuam com o auxílio de informação por satélites, longe da visualização física direta de seus efeitos, ou ainda, pela intervenção de grupos de elite munidos de engenhos técnicos cada vez mais sofisticados (cf. Michaud, 1996, p. 10-26). Nesse sentido, o fato que a representação midiática da guerra do Golfo tenha se cristalizado em torno da fórmula de ataques "cirúrgicos" fala muito sobre a vontade de imaterialidade doravante necessária para tornar aceitáveis as manifestações de violência9 9 No sentido inverso, esta é provavelmente a conclusão a ser tirada da evolução dissimulada identificável há trinta anos, para além da variação dos atores e do caráter bastante aleatório de uma interpretação deste tipo, no personagem James Bond. Num mundo da energia, ainda amplamente industrial, ele era definido sobretudo pela posse de engenhos "técnicos" de alto grau de informação. No mundo da informação de hoje, ele é, de maneira sutil mas crescente, definido seja por suas capacidades "energéticas", físicas, seja por capacidades "humanas" de reflexão. .

Em oposição a essas formas de violência, existe toda uma série de manifestações, sentidas como brutais, porque se servem de instrumentos com um grau menor de especialização e informação, ou simplesmente porque são produzidas mais perto de nós, e cujo peso material é impossível de ser ocultado. É o caso por excelência da violência contra rebeliões ou da violência policial banal. A racionalização da violência é nesse caso limitada, apresenta ainda muitos elementos físicos e materiais para poder ser verdadeiramente representada como uma violência "racionalizada" e "moderna". Uma vez mais, para além das considerações propriamente políticas quanto ao bem fundado ou não do uso da força, a sensibilidade de muitos cidadãos é ofendida por aquilo que aparece como uma manifestação ainda por demais "primitiva" de violência. Insistimos sobre o fato que o que é recusado é menos o caráter "institucional" dessa violência, do que sua manifestação "física", por demais "física". É assim, por exemplo, que no domínio escolar a reprovação da violência física exercida entre os alunos ou contra os alunos é inversamente proporcional à aceitação pelo menos tácita, freqüentemente sob a forma de resignação, da "violência" altamente mediatizada exercida contra eles na ocasião das orientações escolares. É certo que a visibilidade interativa da primeira contrasta com a opacidade institucional da segunda, mas ambas são "violências" institucionais, aliás freqüentemente sentidas como tais pelos alunos (cf. Debarbieux, 1996; Peralva, 1997). Acrescentemos ainda a existência de violências forte e abertamente materiais, de violências "nuas", sem mediação alguma, decorrendo diretamente de um diferencial de força física e fortemente sentidas como moralmente repreensíveis, como a violência delituosa, a violência contra as crianças, contra as mulheres, as brigas de rua...

Para saber se a violência é mais ou menos aceita hoje do que o fora ontem, é preciso doravante fazer intervir seu grau de racionalização e de informatização. A violência aparece como tanto mais aceitável quanto se apresente sob uma face "asséptica", quanto ela mesma participe deste trabalho de redefinição das fronteiras do "real" e de recalcamento da energia, pela via da informação.

Situações sociais contrastadas

Mas é preciso prolongar estes elementos de reflexão tomando em consideração a natureza bastante contrastada do vivido e da exposição à violência nas sociedades contemporâneas. Neste sentido, se o próprio da condição moderna é, num grau muito alto de generalidade, definir-se por uma representação normativa e valorizante do primado crescente dos estilos de vida imateriais, deve-se compreender que nem todos os indivíduos participam da mesma maneira desta experiência, e que existem pois contrastes importantes. Uma das dimensões da dominação, e para além da problemática tradicional da segregação espacial, é que ela situa os indivíduos em registros socialmente diferenciais de relação com o real. Limitar-nos-emos a apresentar dois casos de figuras paradigmáticas, esquemáticas e extremas, que correspondem a posições sociais estruturais muito opostas.

No alto da hierarquia social encontram-se aqueles que habitam efetivamente num mundo cada vez mais desmaterializado fisicamente falando, mas que, ao mesmo tempo, guardam o monopólio da definição socialmente legítima do "real". Diversas constatações organizam sua situação social. Primeiramente, seu mundo é, de maneira crescente, "imaterial", porque eles estão conectados a redes abstratas, que lhes permitem agir instantaneamente à distância, e porque sua vida cotidiana efetivamente tende a se desconectar de qualquer enraizamento estritamente local. Em seguida, e ao mesmo tempo, é seu nível e estilo de vida que, por meio do jogo da dominação simbólica, impõe-se para definir normativamente a "realidade". Na verdade, a mudança a este respeito é ao mesmo tempo de grau e de natureza. De "grau" porque afinal são sempre os grupos dominantes que, por meio de diferentes estratégias de distinção, exemplificam por sua vida os costumes valorizados num determinado período, definindo então, pelo desejo de grupos subalternos de copiar seu estilo de vida, o sentido de uma possível tendência a se tornar uma realidade futura10 10 A constatação foi feita muitas vezes por diversos autores e para diferentes períodos e sociedades. Entre outros, Elias (1985); Veblen [1899] (1970); Bourdieu, (1979). . De "natureza" já que a ruptura introduzida não concerne mais somente aos estilos de vida opostos, mas tende a definir verdadeiramente universos sociais de ação incomensuráveis. A prática desse mundo tendencialmente "imaterial", operando cada vez mais à distância, é própria de alguns grupos sociais fortemente internacionalizados, cuja experiência individual é marcada, assim como o assinala justamente Bauman, por uma falta radical de tempo e por um grande sentimento de domínio do espaço (cf. Bauman, 1997).

Nessa posição social, a vida se desenvolve no meio de universos integrados por sistemas informacionais que operam com o auxílio de símbolos generalizados e impessoais, entre os quais figura em primeiro lugar o dinheiro, cujas capacidades de circulação não cessaram de crescer ao longo de toda a modernidade, segundo a análise pioneira desenvolvida por George Simmel [1900] (1987)11 11 Para uma apresentação destas evoluções ao longo do século XX, cf. Haesler (1995). . Estes meios impessoais gerem "objetivamente" a distância existencial vivida entre o mundo exterior e a vida interior. O indivíduo vive num mundo no qual sua segurança, individual e social, é fortemente garantida por relações sociais altamente abstratas e impessoais. Os diversos seguros, a seguridade social, a posição social não são nada mais do que o resultado de uma arbitragem, o mais freqüentemente implícita, e sempre opaca, dos diferentes riscos entre os diversos atores. Embora o sentimento de segurança não seja total - longe disso -, como resultado dessas arbitragens esses grupos sociais experimentam, em todo caso, diante dessas situações, o sentimento de estarem "protegidos". É certo que isto não exclui as figuras individuais de insegurança, mas o risco, e sobretudo o risco físico direto, é limitado, tanto mais que a vida cotidiana se desenrola no meio de mecanismos "objetivos" impessoais. A violência é aqui, então, o sentimento de um perigo físico virtual, de uma "penetração" de um elemento ativo e energético estranho no seio desse universo regulado objetivamente por símbolos de informação. Para esses atores, a violência é uma "contingência" mais ou menos longínqua. Em todo caso, ela é sempre fruto de um "acidente". Isto mostra a que ponto o conjunto dos dispositivos sociais e culturais aos quais eles pertencem traçam uma fronteira, mais ou menos visível, mas muito real, separando-os da violência. A esses dispositivos simbólicos ou à distância deve-se ainda acrescentar os elementos de proteção e de dissuasão física. É assim que, para dar apenas uma ilustração, um número doravante importante de indivíduos trabalham em atividades de vigilância12 12 Nos Estados Unidos, por exemplo, os guardas particulares, em 1990, representavam 2,6% da população ativa total (cf. Reich, [1991] 1993). .

No outro extremo da escala social, há todos aqueles que, paradoxalmente, são os mais confrontados à materialidade do mundo e à insegurança, mas cujo mundo social, embora delimitado por limites físicos, é deficitário do ponto de vista da capacidade de dar uma definição social legítima do real. Por causa do jogo de distinção social, e do fato de sua vida social ser de modo crescente assumida por mecanismos institucionais, esses indivíduos às vezes têm a impressão de ter "falsos" empregos, de subsistir numa "falsa" economia, em suma, de não poder realizar a não ser "falsas" atividades. Nesse contexto, a violência pode receber um sentido preciso: ela é um vômito do físico-material contra a ficção e a dominação de um mundo social desrealizado. A violência lembra a existência desse "outro" mundo, "material", para além e para aquém de todas as próteses colocadas por trabalhadores sociais ou outras instituições. Ela guarda assim uma significação histórica precisa, mas não consegue mais inserir-se num relato ordenador dos acontecimentos humanos. É percebida como uma violência cega e irracional (como foi aliás o caso da violência das classes laboriosas no início do século XIX) (cf. Chevalier, [1958] 1984), mas se, recolocada no contexto dessa desigualdade social, chegar a se dotar de uma significação no seio da modernidade, a violência será contudo incapaz realmente de assumir um sentido histórico positivo, como foi antes o caso graças ao movimento operário e à sua representação intelectual.

Entretanto, seria falso afirmar apenas que o ator dominado vive no meio de um déficit de informação e um excesso de energia13 1 Com efeito, e para citar apenas algumas, além das análises comparativas e históricas, as práticas violentas podem ser apresentadas sob a forma de níveis de ação. de problemáticas, de tipos, de atores, de paradigmas, de causalidade... Além disto, todas as nossas reflexões possuem, como pano de fundo, a situação francesa contemporânea. . Trata-se antes de compreender em que sentido preciso ele sofre a este respeito uma dominação social. Doravante, o que está em causa não é mais somente a definição de situações, mas a consolidação de um conjunto de oposições sociais que giram em torno de experiências contrastadas da "realidade". A dominação simbólica, sustentada por um conjunto de elementos que asseguram a dominação social, monopoliza a definição legítima da "realidade". E do mesmo modo que a "natureza" foi o nome cultural da "matéria", a "realidade" não é senão seu nome social. A tendência atual leva a um aparente paradoxo: a definição dominante da "realidade" social incorpora, cada vez mais, doses crescentes de imaterialidade, e, de outro lado, o que é designado e aprovado como um não-mundo social, como "irrealidade" social, caracteriza, justamente ao contrário, situações de vida marcadas por um forte enraizamento na materialidade.

Mas sobretudo, conseqüentemente às novas formas de desligamento social, o critério determinante para apreender o grau de insegurança "física", real ou imaginária, face à violência, não é outro senão a natureza dos mecanismos que definem a inserção do ator em relação à sociedade. A esse respeito, dois processos devem ser distinguidos.

O primeiro remete mais precisamente à natureza da inserção social. Os indivíduos colocados em baixo da escala social são constantemente constrangidos a apelar para a solidariedade pública e sobretudo, na imediatez do cotidiano, a mecanismos "subjetivos" de solidariedade (vizinhança, família...). Aliás, em casos extremos, não nos esqueçamos que mesmo o auxílio público é recebido por esses indivíduos por meio de procedimentos altamente personalizados e estigmatizantes, principalmente junto aos trabalhadores sociais. A vida é apenas fracamente regulada por mecanismos objetivos impessoais e é fortemente regulada por relações muito impregnadas afetivamente. A "violência" designa então casos concretos de violência física (lembremos que, a despeito de diferenças nacionais, freqüentemente são as pessoas "de baixo" que sofrem o maior número de violências), mas ela caracteriza sobretudo uma situação social na qual o ator é pouco integrado aos sistemas de regulação impessoais, abstratos, onde ele está mergulhado em relações fortemente personalizadas. As relações com os outros se tornam então tanto mais pesadas quanto mais são inevitáveis. Mas sobretudo tanto mais pesadas quanto mais o indivíduo experimenta, por meio delas, a prova cotidiana de sua desvalorização pessoal.

A segunda concerne mais ao conjunto dos processos sociais, por meio de conflitos latentes, no vazio e opacos, pelos quais um grupo social acaba por ser caracterizado enquanto população socialmente de risco, ou candidata à exclusão social. Limitemo-nos apenas ao exemplo do emprego e ao caso da França. Sabe-se que para além de suas determinantes econômicas, o emprego é um produto social complexo, originado igualmente de arbitragens mais ou menos intensas entre os objetivos e os atores sociais. O fato de que os sindicatos não estejam em condições de questionar as relações sociais que estruturam esse tipo de relações econômicas não impede, longe disso, a constituição de grupos sociais como alvos preferidos do desemprego por opção ou por ausência de opção. No final desses "conflitos", trata-se sempre, de um modo ou de outro, por diferentes vias e estratégias, de fazer com que uma categoria particular de trabalhadores, que são os indivíduos com pouca qualificação, os jovens, os trabalhadores imigrantes, as mulheres, as pessoas mais velhas suportem certos riscos do emprego e do desemprego. Como afirma Dênis Olivennes, o desemprego, antes de ser um problema, é uma solução (cf. Olivennes, 1996). O desemprego ou instabilidade do emprego resultam de uma arbitragem das relações de produção, originado de conflitos multiformes que opõem não somente assalariados e empregadores, mas também, de maneira horizontal, os diferentes grupos de assalariados. Não se trata de reduzi-los a essa única dimensão, mas de insistir sobre o caráter estruturado das relações estabelecidas entre os assalariados, os empregadores e o Estado. Ora, o ator individual tem uma tendência excessiva para perceber apenas em seu nível de estratégia o que é, antes de tudo, o duplo resultado de uma decisão econômica e de uma decisão social, onde a "vulnerabilidade" e a "empregabilidade" são definidas coletivamente, pelo menos por falta, na ocasião das negociações ou de consensos estabelecidos entre os diferentes grupos sociais num nível macro-social. Diante dos riscos do desemprego, os diferentes grupos sociais tendem a fechar-se sobre si mesmos, a controlar a entrada de novos, e sempre sem conseguir chegar a estabelecer verdadeiros monopólios, a levantar verdadeiros "muros" protetores. Na França, a estratégia teve um certo sucesso, já que no momento os desempregados não operam, senão fracamente, como "batalhão de reserva": por meio de suas representações sindicais, os assalariados, graças às despesas de recrutamento, formação e licenciamento, tornam elevados os custos de rotação da mão de obra e acabam assim por preservar a continuidade de seu emprego. O resultado é a formação de um grupo social definido por uma forte insegurança sócio-econômica. Situação tanto mais perniciosa quanto, pelo estabelecimento de todo um sistema de auxílios à reinserção social, obriga-se o indivíduo a interiorizar seu desemprego transformando-o em problemas relacionais e subjetivos. Evidentemente, não há passagem direta da precarização à violência, mas quando essa situação se torna insustentável para o indivíduo, às vezes na seqüência de uma série de arranjos institucionais sem futuro, a violência pode ser efetivamente uma tentação no fim do caminho. Em outras palavras, a "violência" aparece às vezes como uma "resposta", num nível baixo e freqüentemente muito pouco eficaz, dada pelo ator a situações sociais submetidas a processos de negociação, freqüentemente opacos, que o ameaçam.

Para esses grupos sociais a violência tem então sempre uma dupla face. De um lado, ela remete a uma ação por demais material num universo pobre de informações, de outro, ela aparece como uma conseqüência longínqua, e sem mediação socialmente visível, dos efeitos de uma ação "informacionalizada" opaca sobre sua vivência material. Situação que deveria fazer refletir, para além dos fenômenos de violência strito sensu, sobre as próprias fontes do sentimento de segurança na modernidade. Com efeito, em certos domínios, e contrariamente ao que se pode pensar intuitivamente, quanto mais se está ao abrigo do recurso subjetivo e direto a outro, mais se experimenta a segurança, mais, em todo caso, tende a se difundir uma confiança nos sistemas peritos (cf. Luhmann, [1968] 1979). Inversamente, quanto mais nossa segurança depender pouco de sistemas peritos e se apoiar sobre relações personalizadas, mais nosso sentimento de insegurança aumenta. Desse ponto de vista, uma distinção pode e deve ser feita entre a insegurança e o perigo. Se em situações de exclusão social o elo subjetivo só aumenta o sentimento de insegurança, face ao perigo o elo subjetivo, ao contrário, inspira segurança. Ora, o problema da camadas abastadas é justamente de serem protegidas da insegurança por mecanismos objetivos impessoais e de serem socorridas, quase imediatamente, quando o perigo material as atinge, por meio de relações altamente personalizadas (por exemplo, os diversos sistemas de assistência, os cartões de crédito). Inversamente, os meios desfavorecidos se caracterizam pelo fato de serem pouco protegidos por mecanismos impessoais face à insegurança, e de serem raramente auxiliados quando sobrevém o perigo (aliás, muito mais freqüentemente do que os grupos abastados) por uma assistência personalizada (basta, por exemplo, pensar na lentidão com a qual a polícia intervém nos bairros desfavorecidos)14 14 Aliás, esta relação invertida explica uma parte (uma parte somente, mas de qualquer modo uma parte) do estado da opinião dos diversos grupos sociais da polícia. O caso por excelência é a relação do automobilista: quando ele circula normalmente, não quer ver a polícia, mas desde que há um incidente, ele quer vê-la imediatamente; ora, esta relação é exatamente a mesma que é apresentada pelos grupos abastados face aos diversos mecanismos de segurança e de perigo sociais. . Mas essas situações diferentes não dão lugar apenas a experiências diversas de realidade e de insegurança. Elas estão também na base de imperativos morais socialmente contrastados.

Violência e autocontrole

Em um dos grandes discursos sobre a modernidade, o principal elemento de integração social é a interiorização pelos indivíduos de disposições normativas de ação. A sociedade repousa sobre a partilha de valores, que se tornaram normas, transformadas por sua vez em personalidade. Sabe-se que nessa corrente de pensamento, de um modo ou de outro, a violência é sempre remetida a um problema de socialização, em todo caso, pelo menos ao recurso pelo ator a um meio legítimo de ação. No fundo, importa pouco aos nossos propósitos atuais que o fracasso da socialização seja diagnosticado no nível dos valores, das normas ou da personalidade. O ator violento é sempre alguém que não foi corretamente socializado. Seja, como é o caso na ocasião de uma crise de valores, que a sociedade transmita grandes princípios de ação contraditórios entre si; seja, e fala-se então de uma crise de normas, que os mecanismos tradicionais de socialização (escola, família...) tenham dificuldades, por causa de transformações internas, para produzir motivações institucionais necessárias junto aos indivíduos; seja ainda no nível da personalidade, que os indivíduos estejam submetidos a pulsões que não conseguem dominar15 15 Os desenvolvimentos críticos propostos por muitos autores em torno da agressividade humana se inserem nesta representação, seja de uma maneira mais institucional, como em Parsons, seja de uma maneira mais crítica, como em Marcuse (cf. Parsons, [1947] 1964; Marcuse, [1967] 1968). .

Apesar dessas diferenças, todas essas concepções partilham um postulado comum, que é o de uma estreita relação entre a natureza da autoridade moral produzida pela interiorização das normas e o autocontrole ao qual chegam os indivíduos na estrutura de sua personalidade. Durante muito tempo, e na representação tradicional que a sociologia se forjou desse processo, as duas problemáticas permaneceram indissociáveis. Os sujeitos livres, por meio da interiorização das normas, tornavam-se sujeitos morais aceitando livremente realizar os valores da sociedade. A coação externa das normas, graças à socialização, tornava-se um critério autônomo de ação para o sujeito, que não a experimentava mais como alguma coisa exterior a si mesmo, mas, ao contrário, como resultado de motivações internas. Essa forte imbricação entre a interiorização das normas na personalidade e os valores institucionalizados na sociedade permitia, se não eliminar, pelo menos reduzir bastante qualquer recurso à violência. E pouco importa que a socialização tenha sido interpretada como um pré-requisito para o exercício da autonomia individual ou como introjeção dos modelos que asseguram a subordinação do indivíduo e a reprodução da sociedade. Em todos os casos, esse modelo de socialização se prolongava, pelo menos implicitamente, num modelo normativo do sujeito, definido por sua capacidade de agir face ao mundo exterior de maneira autônoma e como senhor de si mesmo. No fundo, a noção "moral" chave não era senão o autocontrole, devendo o indivíduo corretamente socializado ser capaz de agir de maneira autônoma, de se controlar a partir de sua interioridade, de ser capaz, em suas versões mais heróicas, de guardar seu "sangue frio" mesmo quando o mundo exterior se desfaz. A violência, mais uma vez, não era senão a expressão de um fracasso pessoal.

Mas essa representação do indivíduo moderno, de forte carga normativa, repousava sobre uma profunda ambigüidade (cf. Martuccelli, 1998). Na verdade, o problema procede em parte da ambigüidade fundadora do antigo modelo normativo. Face ao modelo do indivíduo comunitário, pretensamente em fusão com o todo social, se destacaria um indivíduo moderno, capaz de se autogovernar a partir de seu interior. Na prática, essa ficção subjetiva e moral de fato só existiu na medida em que o indivíduo se encontrava realmente muito inserido em redes sociais espessas. O paradoxo nunca foi tão bem expresso quanto nas duas representações morais do sujeito presentes em Emile Durkheim. Se, de um lado, especialmente em seus trabalhos sobre a escola, ele não cessa de construir a idéia moral de um indivíduo autogovernado pela interiorização de normas (cf. Durkheim, 1922, [ 1925] 1992), de outro lado ninguém melhor do que ele soube demonstrar a que ponto o sujeito só se domina a si mesmo na medida em que é controlado pelo exterior, como é possível concluir a partir de seu estudo sobre o suicídio (cf. Durkheim, [1897] 1995). É essa tensão por muito tempo oculta se que torna agora evidente. Na medida em que os laços sociais se transformaram profundamente, o indivíduo se encontra, em todo lugar e sempre, no próprio momento em que se considera que ele é senhor e mestre de si mesmo16 16 Para uma representação deste imperativo na modernidade, (cf. d´Iribane. 1996). , particularmente desprovido para realizar essa exigência.

Hoje em dia, provavelmente, o modelo do indivíduo autogovernado a partir do interior ainda pode ser uma referência apenas para as pessoas situadas no alto da pirâmide social, ou super-identificadas com sua atividade profissional e muito fortemente inseridas em redes sociais, pois, na prática, elas se encontram controladas pelo grande número de círculos sociais aos quais pertencem.

Nesse contexto de mutação geral de nossas representações do indivíduo, a violência exprime às vezes à sua maneira o conflito entre essas duas realidades. De um lado, a idéia de que o indivíduo deve se controlar a partir do interior, dominar-se a si mesmo, ser senhor de si: a idéia da interiorização das normas, do indivíduo intra-determinado, no qual efetivamente a informação domina a energia; no qual se considera que os códigos morais reprimem a energia pulsional. De outro lado, a constatação, mas que na verdade nunca é expressa nesses termos, do fato que os indivíduos são doravante controlados a partir do exterior, e menos pelo olhar do outro17 17 O indivíduo hetero-determinado de Riesman não é, neste sentido, senão a imagem paroxística do antigo modelo, tanto nele a informação exterior prima sobre todo cuidado energético interior (cf. Riesman, [1950] 1964). do que por redes materiais de coação que eles possuem ou são capazes de construir; lá, onde, de fato, a coação material tem primazia sobre a informação.

Estabelece-se uma oposição entre um modelo normativo que afirma o autocontrole enquanto valor maior da ética individual e a realidade prática dos sujeitos que não estabilizam sua identidade, chegando a uma forma de autocontrole apenas quando conseguem inserir-se em redes sociais. Uma linha divisória separa então, mais uma vez muito esquematicamente, dois grupos sociais. De um lado há todos aqueles que chegam a recriar ou conservar uma rede suficientemente densa de restrições sociais em tomo de si (familiares, afetivas, profissionais associativas), e que podem ainda, com toda má fé, continuar a se pensar como indivíduo que se autogoverna a partir de seu interior. Do outro lado, há todos os que, definidos pela raridade ou fragilidade de suas redes sociais, até mesmo por sua "desfiliação" (cf. Castel, 1995), encontram-se realmente confrontados com a obrigação prática de se autogovernar a partir do interior.

Pois bem. Como conseqüência do prolongamento da juventude e da escolarização, os jovens freqüentemente se encontram no último caso. E assim que a violência, principalmente a de uma parte de adolescentes e de jovens, desenvolvendo-se além disto no seio de universos institucionais, pode ser interpretada como o resultado de um conflito que opõe um modelo normativo que insiste sobre o fato de que os indivíduos devem ainda e sempre se autogovernar a partir do interior, e a realidade dos indivíduos que, cada vez mais, na prática são determinados pelo exterior. Seja que não possuam redes sociais suficientemente coibidoras (como o é principalmente o trabalho), seja que se encontrem sob a coação real quase exclusiva das redes constituídas por outros jovens. Nos dois casos, o dilema da juventude é tanto mais fortalecido quanto mais lhe faltam justamente redes mais ou menos "invisíveis" de coação e de implicação prática no mundo, que lhe permitiriam se auto-conceber, mas sempre de maneira artificial, como se estivesse se governando a partir do interior. Mais ainda, pode-se fazer da sobre-inserção cultural no grupo de pares e da sub-inserção social em outras redes materiais o fundamento de todos os perigos de desvios presentes na juventude. Em outras palavras, o mundo dos jovens de periferia é ao mesmo tempo definido por um sentimento de "irrealidade" (seu mundo é "de mentira") e pela ausência de um conjunto de coações sociais "materiais" que lhes permitisse se autogerir. Não há déficit de informação ou de conflito entre duas redes de valores, mas uma distância entre a fraca materialidade da coação social legítima, portanto "real" de seu universo, e um modelo normativo de indivíduo segundo o qual eles devem chegar a ser, no maior vazio, senhores de si mesmos.

Na ausência de redes reais sobre as quais se apoiar, o recurso ao autocontrole moral aparece como uma forma de dominação social. Digamos de uma maneira simples, por falta de espaço: quanto mais elevada for a posição de um indivíduo na sociedade, mais ele se encontra praticamente controlado a partir do exterior, mais ele se auto-concebe como se autogovernando a partir do interior. Inversamente, quanto mais baixa for a sua posição social, mais ele é constrangido praticamente a se controlar a partir de seu interior, e só pode demonstrar a sua impossibilidade de chegar a esse autocontrole. Compreender-se-á que a este eixo maior de diferenciação acrescentam-se outros, principalmente de gênero e de idade. Em todos os casos, a experiência é tanto mais difícil quanto mais a obrigação de se autogovernar a partir do interior não se apóie sobre nenhum correlato material no mundo. O recurso à violência por parte dos jovens pode provir assim da enorme tensão que experimentam entre dois extremos: eles são ao mesmo tempo os principais destinatários do discurso moral do autocontrole e, na prática, são um grupo social particularmente exposto à ausência de diversificação de redes sociais que os comprometa dentro da sociedade. Em suma, a pretensa "imprevisibilidade" moral ou o "enervamento" dos jovens freqüentemente não é nada mais do que a manifestação do conflito entre um modelo normativo desconectado dos fatos e sua fraca filiação social.

O sentido da violência deve ser procurado menos no interior da subjetividade do ator, e mais a partir do referencial das redes sociais e das coações materiais legítimas onde o indivíduo está colocado. A violência nesse quadro é sempre o outro nome para designar a desigualdade na falta de ligação social.

***

A violência na modernidade pode ser interpretada, em algumas de suas linhas maiores, no interior desse quadro geral de reflexão. Para terminar, lembremos as três grandes problemáticas que retiveram nossa atenção. Em primeiro lugar, deve-se constatar dois fenômenos um pouco diversos, mas cuja coincidência dá uma acuidade toda particular à violência. De uma parte a deslegitimação crescente das práticas violentas, que doravante não possuem mais nenhuma significação positiva no seio das sociedades modernas. De outra, se o aumento da consciência dos perigos e dos riscos possíveis no mundo moderno pode enraizar-se e prolongar-se na estética da violência proposta pela mídia, ele se refere antes de tudo, e de maneira substancial, à vontade do projeto moderno de domínio crescente do ambiente e à consciência de seus limites. É a conjunção desses fenômenos diversos que dá conta num primeiro momento das atitudes face à violência.

Em segundo lugar, as reações face às práticas violentas devem ser relacionadas com a própria condição moderna, onde se impõe tendencialmente uma representação, descritivamente limitada e normativamente orientada, de um universo social cindido entre as situações fortemente definidas por sua dose de "informação" incorporada e contextos caracterizados pelo primado de elementos "físicos" e "energéticos". Aparecem então múltiplas clivagens entre o "real" e o "material". O primeiro não se confunde com o segundo, sem que todavia seja possível dizer, de uma vez por todas, e em todas as circunstâncias, onde e como traçar a linha de demarcação. O próprio da sociedade moderna é exatamente que essa fronteira seja ela mesma profundamente aleatória. De onde decorre a única concepção geral legítima da ação social, que se define por compromissos imaginários mais ou menos aceitáveis com o "real". De onde decorre também, precisamente, que a violência não seja senão uma forma, socialmente ilegítima, de compromissos entre essas duas ordens. De onde enfim se conclui que essas situações explicam vivências e atitudes muito opostas face à violência, em função do grau de domínio simbólico e distinção social usufruídos por diversos atores.

Em terceiro lugar, e como conseqüência da representação precedente, deve-se interpretar um certo número de tensões inscritas "sobre" os indivíduos pelas instituições. Na representação que tende a se tornar dominante na modernidade, o primado quase exclusivo da informação tende a reforçar um modelo institucional que preconiza a existência de indivíduos autônomos, senhores de si mesmos, e capazes, graças à sua correta interiorização das normas, de se autocontrolar. Ora, esse modelo, cuja realidade histórica pode ser seriamente questionada, se encontra doravante, como conseqüência de diversos processos de desinstitucionalização, muito afastado dos fatos. Tornando-se então uma injunção institucional desconectada de práticas reais, ele se traduz por toda uma série de experiências sociais, vividas todavia às vezes como fracassos pessoais, e podendo dar origem a implosões destrutivas do ator sobre si mesmo ou a processos explosivos de violência.

Recebido para publicação em fevereiro/1999

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  • Veblen, T. (1970) Théorie de la classe de loisir. 1a edição 1899. Paris, Gallimard.
  • 1
    Com efeito, e para citar apenas algumas, além das análises comparativas e históricas, as práticas violentas podem ser apresentadas sob a forma de níveis de ação. de problemáticas, de tipos, de atores, de paradigmas, de causalidade... Além disto, todas as nossas reflexões possuem, como pano de fundo, a situação francesa contemporânea.
  • 2
    Uma afirmação plausível, mas provavelmente indemonstrável de maneira exaustiva - basta fazer variar a definição de "violência" ou ampliar ou reduzir os períodos examinados para prová-la ou invalidá-la (cf. Chesnais, 1981).
  • 3
    Para uma versão extrema desta dialética, (cf. Sartre, [1960] 1985. p. 802 ss).
  • 4
    Duas versões muito diferentes destes processos encontramos em Sorel [1908] (1981) e Fanon (1961).
  • 5
    Para um balanço crítico (cf. Inciardi, 1980).
  • 6
    No que diz respeito à França, cf. o dossiê do IHESI,
    Les cahiers de la sécurité intérieure, 20, 2, 1995.
  • 7
    J. Baudrillard já assinalava isto nos inícios dos anos 70 (cf. Baudrillard, 1985, p. 33-35).
  • *
    A data entre colchetes refere-se sempre à edição original da obra. Ela é indicada na 1a vez que a obra é citada. Nas demais, indica-se somente a edição utilizada pelo autor (nota do Editor).
  • 8
    Notamos contudo que o próprio Parsons leve uma tendência a se desviar para uma concepção que atribuía à informação cm sentido amplo um papel unilateralmente determinante na evolução das sociedades.
  • 9
    No sentido inverso, esta é provavelmente a conclusão a ser tirada da evolução dissimulada identificável há trinta anos, para além da variação dos atores e do caráter bastante aleatório de uma interpretação deste tipo, no personagem James Bond. Num mundo da energia, ainda amplamente industrial, ele era definido sobretudo pela posse de engenhos "técnicos" de alto grau de informação. No mundo da informação de hoje, ele é, de maneira sutil mas crescente, definido seja por suas capacidades "energéticas", físicas, seja por capacidades "humanas" de reflexão.
  • 10
    A constatação foi feita muitas vezes por diversos autores e para diferentes períodos e sociedades. Entre outros, Elias (1985); Veblen [1899] (1970); Bourdieu, (1979).
  • 11
    Para uma apresentação destas evoluções ao longo do século XX, cf. Haesler (1995).
  • 12
    Nos Estados Unidos, por exemplo, os guardas particulares, em 1990, representavam 2,6% da população ativa total (cf. Reich, [1991] 1993).
  • 13
    Aliás, desde sempre, isto foi próprio da definição de ator dominado - basta pensar na imagem de Caliban em
    A tempestade, de William Shakespeare (cf. Fernandez Retamar, 1973).
  • 14
    Aliás, esta relação invertida explica uma parte (uma parte somente, mas de qualquer modo uma parte) do estado da opinião dos diversos grupos sociais da polícia. O caso por excelência é a relação do automobilista: quando ele circula normalmente, não quer ver a polícia, mas desde que há um incidente, ele quer vê-la imediatamente; ora, esta relação é exatamente a mesma que é apresentada pelos grupos abastados face aos diversos mecanismos de segurança e de perigo sociais.
  • 15
    Os desenvolvimentos críticos propostos por muitos autores em torno da agressividade humana se inserem nesta representação, seja de uma maneira mais institucional, como em Parsons, seja de uma maneira mais crítica, como em Marcuse (cf. Parsons, [1947] 1964; Marcuse, [1967] 1968).
  • 16
    Para uma representação deste imperativo na modernidade, (cf. d´Iribane. 1996).
  • 17
    O indivíduo hetero-determinado de Riesman não é, neste sentido, senão a imagem paroxística do antigo modelo, tanto nele a informação exterior prima sobre todo cuidado energético interior (cf. Riesman, [1950] 1964).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Maio 1999

    Histórico

    • Recebido
      Fev 1999
    Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, 05508-010, São Paulo - SP, Brasil - São Paulo - SP - Brazil
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