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A sociolingüística de Goffman e a comunicação mediada

Goffman's sociolinguistics and the mediated communication

Resumos

É bastante conhecida a influência da relação entre linguagem e sociedade na metodologia das ciências sociais, desde a análise das formas primitivas de classificação de Mauss e Durkheim até as teorias do discurso em Paul Ricoeur ou em Habermas. Menos populares são as perspectivas sociolingüísticas, que enfocam a relação entre as formas de falar e a vida social, com raízes no relativismo lingüístico de Sapir-Whorf, na concepção pragmática da linguagem de Wittgenstein e na teoria dos atos performativos de Austin. O objetivo deste texto é reconstruir algumas perspectivas sociolingüísticas na análise da comunicação mediada, com destaque para a teoria goffmaniana dos frames (quadros), artifícios que orientam a interpretação e constituem, ao mesmo tempo, condições necessárias para sua existência. Efetiva-se, finalmente, mediante o desenvolvimento de um estudo de caso, uma possibilidade de aplicação metodológica da teoria do frame na análise do correio eletrônico como forma de comunicação mediada por computador.

Análise da conversação; Goffman; Análise do quadro; Sociolingüística; Comunicação mediada por computador


The influence of the relationship between language and society on the methodology of the social sciences is well-known, beginning with the analyses of primitive forms of classification proposed by Mauss and Durkheim, and extending to the theories of discourse found in Ricoeur or Habermas. Less popular are sociolinguistic approaches that focus on the relation between forms of speech and social life, rooted in the linguistic relativism of Sapir-Whorf, Wittgenstein's linguistic pragmatics and Austin's Speech Act Theory. The aim of this article is to reconstruct a number of linguistic approaches to the analysis of mediated communication, highlighting Goffman's Frame Theory - artifices that frame interpretation and simultaneously comprise its necessary conditions for existence. The article closes with a case study, examining the possibility of applying Frame Theory to the analysis of e-mail as a form of computer-mediated communication.

Conversation Analysis; Goffman; Frame Analysis; Sociolinguistics; Computer-Mediated Communication


ARTIGOS

A sociolingüística de Goffman e a comunicação mediada* * Este artigo, em sua primeira versão, originou uma comunicação no Seminário Temático "A Constituição de Fronteiras nas Ciências Sociais: tensão e extensão no campo metodológico", no XXVIII Encontro Anual da Anpocs, em outubro de 2004.

Goffman's sociolinguistics and the mediated communication

Jordão Horta Nunes

RESUMO

É bastante conhecida a influência da relação entre linguagem e sociedade na metodologia das ciências sociais, desde a análise das formas primitivas de classificação de Mauss e Durkheim até as teorias do discurso em Paul Ricoeur ou em Habermas. Menos populares são as perspectivas sociolingüísticas, que enfocam a relação entre as formas de falar e a vida social, com raízes no relativismo lingüístico de Sapir-Whorf, na concepção pragmática da linguagem de Wittgenstein e na teoria dos atos performativos de Austin. O objetivo deste texto é reconstruir algumas perspectivas sociolingüísticas na análise da comunicação mediada, com destaque para a teoria goffmaniana dos frames (quadros), artifícios que orientam a interpretação e constituem, ao mesmo tempo, condições necessárias para sua existência. Efetiva-se, finalmente, mediante o desenvolvimento de um estudo de caso, uma possibilidade de aplicação metodológica da teoria do frame na análise do correio eletrônico como forma de comunicação mediada por computador.

Palavras-chave: Análise da conversação; Goffman; Análise do quadro; Sociolingüística; Comunicação mediada por computador.

ABSTRACT

The influence of the relationship between language and society on the methodology of the social sciences is well-known, beginning with the analyses of primitive forms of classification proposed by Mauss and Durkheim, and extending to the theories of discourse found in Ricoeur or Habermas. Less popular are sociolinguistic approaches that focus on the relation between forms of speech and social life, rooted in the linguistic relativism of Sapir-Whorf, Wittgenstein's linguistic pragmatics and Austin's Speech Act Theory. The aim of this article is to reconstruct a number of linguistic approaches to the analysis of mediated communication, highlighting Goffman's Frame Theory – artifices that frame interpretation and simultaneously comprise its necessary conditions for existence. The article closes with a case study, examining the possibility of applying Frame Theory to the analysis of e-mail as a form of computer-mediated communication.

Keywords: Conversation Analysis; Goffman; Frame Analysis; Sociolinguistics; Computer-Mediated Communication.

O termo "sociolingüística", aqui empregado como qualificativo, tem como referência um campo epistemológico mais amplo do que a lingüística e que abrange as ciências sociais. Uma perspectiva de investigação sociolingüística nas ciências sociais, no sentido abrangente que conferimos ao termo, englobaria uma "etnografia da comunicação", na acepção de Hymes (1974), mas também a teoria do código social de Basil Bernstein (1971-1975) ou o modelo de grade e grupo de Mary Douglas (1978), relacionando diferenças de códigos lingüísticos à estrutura social. De modo geral, as perspectivas sociolingüísticas tomam como base a relação entre as formas de falar em contextos sociais e a possibilidade de se sistematizar a variação que caracteriza e constitui a língua falada.

Pode-se dizer que a sociologia interpretativa, principalmente em vertentes como o interacionismo simbólico e a etnometodologia, fundadas na relação entre linguagem e pensamento em contextos de interação social na vida comum, requer, em nível técnico, algum apoio da sociolingüística na análise contextualizada de entrevistas (em suas mais variadas formas, inclusive na de grupos de discussão) ou de textos1 1 Emprego em todo o trabalho o termo "texto" no sentido atribuído por Umberto Eco (1991), como forma de comunicação, tanto por cadeias de enunciados ligados por vínculos de coerência, como por grupos de enunciados emitidos ao mesmo tempo com base em mais de um sistema semiótico. .

Os atos, os eventos e as situações de fala constituem o suporte empírico básico das perspectivas sociolingüísticas, que podem também ser consideradas desenvolvimentos de um modelo analógico ou metafórico da "sociedade como linguagem". Empregada como modelo, a análise sociolingüística dos eventos de fala pode orientar não somente a interpretação de conversação em cenários ou culturas diversas, mas também o próprio desenvolvimento de sistemas de comunicação mediada, de linguagens computacionais e até de uma lingüística computacional para o desenvolvimento de interações entre seres humanos e computadores (cf. Chapman, 1992), complementando as ciências da cognição e as teorias da comunicação e da informação.

Os sistemas de comunicação mediada, em que há uma interferência na veiculação da mensagem entre emissor e receptor, constituem nossa principal referência neste trabalho. Situações comunicativas como a de uma pessoa que traduz os proferimentos do emissor para o recipiente ou de uma pessoa que conversa com outra pelo telefone constituem exemplos de comunicação mediada. A análise de tal classe de situações, que se torna cada vez mais variada e numerosa com o desenvolvimento dos modernos sistemas de informação e telecomunicação, parece não requerer um modelo da conversação em situações de interação face-a-face. Contudo, tal impressão se desvanece se nos deslocarmos para a questão dos pressupostos e das condições que garantem qualquer tipo de comunicação ou de uso da linguagem. Ou seja, para compreender a linguagem comum parte-se de condições limites de proferimento, reconhecimento e intelecção de sinais de comunicação, como comunicação gestual entre surdos-mudos, comunicação "distorcida" entre afásicos etc. Analogamente, a análise de situações de comunicação mediada conduz à identificação de princípios e pressupostos básicos da comunicação em geral, fazendo emergir características que permanecem eclipsadas na conversação comum, pois fazem parte de uma reserva de conhecimento primária que já foi internalizada e cristalizada em atos rotineiros, de caráter quase ritualístico, como saudações, convites, apresentações em encontros, entre outros.

Esse artifício metodológico de trabalhar com as condições da percepção e da experiência de situações de conversação em seu limite, ou seja, até que não possam ser mais consideradas ou reconhecidas como atos comunicativos, não conduz a uma proliferação de modelos das formas de comunicação mediada, mas, por outro lado, reforça modelos metateóricos em nível mais abstrato, aperfeiçoando-os com a introdução de hipóteses auxiliares e novas teorias. É o que ocorre, por exemplo, quando analisamos redes de discussão ou a participação em blogs pela Internet, empregando a perspectiva sociolingüística de Goffman e sua análise das formas da conversação, elaborada numa época em que não existia a comunicação intermediada por computadores. Temos que recorrer necessariamente à "análise do quadro" (frame analysis), um modelo da organização da experiência e da percepção em nível mais elevado, que subsume a análise da conversação ou das formas de falar.

As abordagens interacionistas da comunicação mediada

Schegloff abarcava uma variada gama de atos de comunicação no que entendia por "conversação", que incluía não somente o bate-papo em situações informais, mas simples pedidos de ajuda, contatos profissionais, palestras, conferências em meios de comunicação, cochichos etc., assumindo o mesmo tipo de referência geral que Goffman adotava com o uso do termo "estado de conversa" (state of talk). Mesmo os "estados de conversa" transformados pela mediação de recursos técnicos, como o que abrange uma conversa por telefone, obedecem, geralmente, à regra básica. O início de uma conversa telefônica para falantes do inglês norte-americano é estruturado num modelo "chamada-réplica" (summons-response). Há uma regra de distribuição que vale para as primeiras respostas: quem atende sempre toma a palavra, embora as frases proferidas possam ser diferentes: "Alô?", "Pronto?", "5218777", "Alberto" etc. Há também seqüências características de "identificação-reconhecimento", de "saudação" e de "como vai você?" (how are you?), além de seqüências típicas de "fechamento" (closings) da conversação.

O modelo da "tomada da palavra", descrito pela alocação e transferência de turnos da conversação, de forma recursiva, permite a previsão de séries de oposições que possibilitam a coordenação organizada entre os interagentes. O mecanismo de "tomada da palavra" é estruturado, já que apresenta dimensão sintáxica e estruturante, pois exerce coerção sobre a ordem e a forma dos proferimentos na conversação. Essas características estruturais empiricamente manifestadas em conversas por telefone (ordem da distribuição, seqüências do tipo de chamada-resposta, seqüências de aberturas e fechamentos, entre outras) não se limitam a esse tipo de comunicação mediada, mas apresentam conseqüências em todos os tipos de interação. A análise conversacional é apenas uma instância da análise da interação social, pois as estruturas da conversação são sensíveis ao contexto da interação, emergem em momentos específicos e, ao mesmo tempo, constituem tais momentos. Poderíamos facilmente identificar exemplos de sentenças ou gestos vocais que seriam qualificados como "chamadas" em interações comunicativas contextualizadas, como, por exemplo, os termos de orientação ou tratamento (address terms), quando chamamos alguém pelo nome ou pela função que ocupa numa situação, ou ainda ao endereçarmos uma carta ou mensagem de e-mail. Podemos também prescindir de sinais lingüísticos e empregar sinais físicos, como assobios, olhares, gestos indicativos etc. Por outro lado, há expressões típicas que são empregadas como "respostas": "Sim", "Sou eu" ou o nome do emissor numa carta. Assim, o estudo de atos de comunicação assíncrona (como cartas), tecnologicamente mediada (telefone móvel ou fixo, dispositivos de comunicação instantânea mediada por computador) ou ainda assíncrona e tecnologicamente mediada (como e-mails, blogs e listas de discussão), evidencia características estruturais e constitutivas da interação de que não temos consciência ou para as quais não atentamos quando ocorrem.

As abordagens interacionistas (Goffman, 1974, 1981, 2000; Schegloff, 1968; Boden, 1990; Tannen, 1993; Jefferson et al., 1974) enfatizaram o papel formador e constitutivo da conversação nas trocas rituais e simbólicas e nos atos comunicativos da vida cotidiana, deslocando a atenção do foco restrito da forma das construções lingüísticas para elementos extralingüísticos como a estrutura e a ordem social. Ainda que Schegloff e Sacks sejam reconhecidos como fundadores da análise conversacional na vertente interacionista, é necessário enfatizar que o esquema conceitual básico a que recorreram provém dos ensaios escritos sobre a ordem interacional2 2 Tais trabalhos compõem os livros Encounters (1961), Behavior in public places (1963), Interaction ritual (1967), Strategic interaction (1970) e Relations in public (1971), com exceção de "Role distance", que faz parte de Encounters, mas está relacionado com o modelo dramatúrgico apresentado em A representação do eu na vida cotidiana (1996 [1959]). e da análise do quadro de Erving Goffman (1974), de quem foram alunos no início dos anos de 1960. A influência de Durkheim foi marcante na obra de Goffman desse período e evidencia-se quando o sociólogo canadense enfatiza, no artigo "On face-work: an analysis of ritual elements in social interaction" (cf. Goffman, 1967, pp. 5-46), a necessidade de preservação do equilíbrio ritual nas interações face-a-face. O indivíduo desenvolve, em sua vida social, um repertório de práticas para manter as aparências que constitui o "tato" social, o savoir faire. Goffman introduz o conceito de "troca" (interchange), que remete à seqüência de atos desde uma ameaça às aparências até o restabelecimento do equilíbrio no ritual da interação (Idem, p. 19). A divisão que Durkheim estabelecera entre rituais positivos (como homenagens e oferendas) e negativos (envolvendo interdições e proibições) influencia uma distinção entre trocas de apoio e trocas corretivas, processos sociais analisados em dois capítulos do livro Relations in public (1971). Embora suas considerações abarquem encontros imediatos como encontros mediados (cartas, documentos administrativos etc.), o significado das trocas torna-se mais claro em situações de co-presença imediata e, mais especificamente, na conversação. Apresento a seguir um exemplo de seqüência de abertura de conversação telefônica que viola a regra da distribuição e inclui uma estratégia de troca corretiva, inspirada nos exemplos hipotéticos de violação que Schegloff inseriu em seu artigo:

A: [Toque do aparelho] [chamada-réplica, com violação da regra

de que o atendente fala primeiro]

B: [Som de abertura da conexão –

intervalo de 3 segundos]

A: Alô. Carlos. Quem está falando? [identificação-reconhecimento, com

troca corretiva]

B: É o Alberto. Desculpa, cara, estava

ligado na Internet.

O participante B tarda a iniciar a conversação, quebrando a regra de distribuição. Incomodado, A também quebra a regra e é o primeiro a falar, mas demonstra que está fazendo algo anômalo por duas pistas de contextualização3 3 Pistas de contextualização ( contextualization cues) são todos os traços lingüísticos que contribuem para a sinalização de pressupostos contextuais (cf. Gumperz, 2002). Constituem os meios pelos quais os falantes sinalizam e os ouvintes interpretam qual atividade está acontecendo, como seu conteúdo deve ser compreendido e como cada proferimento se relaciona com os adjacentes (cf. Garcez e Ostermann, 2002). que são "marcadores" empíricos em sua fala: o proferimento em voz alta e o prolongamento da primeira sílaba da palavra "Alô"; e a identificação pelo nome sem ser solicitada, perfazendo, de forma elíptica, um turno "chamada-réplica". A frase seguinte dá início a uma seqüência "identificação-reconhecimento". Ao identificar-se, B completa a seqüência iniciada, acrescentando também uma desculpa para sua violação à regra de distribuição e restabelecendo, dessa forma, o equilíbrio ritual. Entretanto, ainda que a reparação de violações da regra de distribuição de tomadas da palavra em conversações telefônicas possa ser analogamente equiparada a estratégias corretivas de manutenção do equilíbrio ritual, no sentido goffmaniano, é necessário esclarecer como Goffman articula o modelo da ordem interacional com esquemas sociolingüísticos de interpretação. O próprio Schegloff, apesar de defender um conceito ampliado de "conversação", quase até o limite do próprio ato comunicativo em geral, não chega a considerar, como Goffman, a partir de Frame analysis (1974) e Forms of talk (1981), o modelo de compreensão da conversação como um dos possíveis casos de um modelo da compreensão da experiência e da percepção relacionados a um tipo de competência prática que é constitutiva da própria sociabilidade moderna.

A análise do frame como orientação metodológica

Frame analysis constitui a obra teoricamente mais ambiciosa de Goffman; sua proposta "é isolar algumas das estruturas (frameworks) básicas disponíveis em nossa sociedade para conferir sentido aos eventos e analisar as vulnerabilidades especiais a que esses quadros4 4 O conceito de frame ainda não encontra uma tradução consensual na sociologia brasileira, apesar de o termo "enquadre" já estar fixado no Brasil como tradução de frame na psicologia (cf. Ribeiro e Garcez, 2002, p. 107, nota). Prefiro empregar o termo "quadro", que evoca a proximidade com a técnica da fotografia e do cinema (enquadramento, framing, quadro da película, fotograma) e também, no vernáculo, incorpora o sentido de "estrutura", "moldura", "esqueleto" que o termo apresenta na língua inglesa. Além disso, "quadro" significa "referência", "perspectiva", sentidos fundamentais na sociologia interpretativa e, principalmente, nas escolas do interacionismo simbólico e da etnometodologia, tão caras a Goffman. de referência estão sujeitos" (1974, p. 10). O quadro (frame), para Goffman, é um artifício que seleciona, segundo as intenções e as perspectivas de um sujeito individual ou coletivo, aquilo que percebemos. O que interessa é a compreensão de que há sempre uma forma de organizar a percepção e a experiência, que se pode convencionalizar, assumindo padrões, mas que se atualiza, ou se efetiva, a cada instância em que são realizadas. Existe sempre uma ação subjacente ao quadro e que não é definida ou estruturada apenas pelo seu objeto, mas também por técnicas que são socialmente reconhecidas, ou seja, por um contexto de uso.

O conceito de frame permite uma nova interpretação de sua obra anterior e mais famosa, The presentation of self in everyday life (1959). A compreensão das interações sociais em analogia com o mundo do teatro e seus artifícios passa a ser considerada um dos possíveis quadros, que não só constrangem a interpretação, mas também constituem as próprias condições de sua existência: quadro da própria atividade, quadro cinematográfico, quadro do teatro, quadro da conversação etc. Em Frame analysis a característica distintiva do ser social é construir, engendrar, transformar, não somente o mundo material, sensível, mas também as condições que nos permitem criar, distinguir e avaliar. A teoria do frame é um modelo das diversas formas de "enquadrar" as atividades sociais, similar ao esquema interpretativo elaborado por Gilbert Ryle (1971) e Clifford Geertz (1978) para descrever níveis de interpretação sucessivos, com base na metáfora da "descrição densa", criada para denotar a multiplicidade de camadas de significado que podem ser construídas sucessivamente com base em qualquer tipo de ato físico que se deixa empregar e estruturar como ação social expressiva.

Os enquadramentos podem ser constituídos em diferentes profundidades, as diversas "lâminas" do quadro, segundo Goffman. Os limites em que a "realidade" toca o quadro constituem as "estruturas primárias", características culturais que incluem categorias compreensivas pelas quais percebemos os "mundos reais" de objetos físicos, da ação e de eventos humanos, elementos da cultura. Ao enquadrarmos, "definimos uma situação", organizando a experiência e a percepção em função do que ocorre ao redor de nós. Imaginemos, como ilustração, a descrição de uma tira (strip) ou faixa de atividade: uma pessoa que anda por uma rua movimentada é abordada por um desconhecido que começa a xingá-la, em voz alta, sem motivo aparente, atraindo a atenção dos demais transeuntes, que passam a formar uma roda em volta da cena, alguns gracejando, outros apenas observando, curiosos. A pessoa tolera os insultos até certo limite, quando, subitamente, ataca o desconhecido com socos e pontapés. A vítima dos gracejos, nessa "faixa" de atividade, só pode experimentar e descrever a ação a partir de um "quadro de atividade", pois ela se encontra constrangida, na situação descrita, pelo que ocorre em sua volta e por uma "reserva de conhecimento" que carrega por sua experiência social de vida e pelo contexto da situação, e que a torna "competente" para interpretar aquele ato como uma agressão, uma tentativa de expô-la publicamente ao ridículo. O ato foi interpretado a partir de uma estrutura primária da percepção. Contudo, pode ocorrer uma segunda lâmina no quadro se a atividade envolver uma performance, como no caso de uma brincadeira ou um "conto do vigário". O desconhecido, apesar de dirigir insultos verbais ao outro, o faz "sem ter motivação" para menosprezar, mas apenas para provocar a reação, como numa brincadeira de mau gosto. Esta segunda descrição já estaria no "quadro da performance". Poderíamos imaginar diversos outros níveis superiores de transformação sucessiva do quadro de atividades, como, por exemplo, uma câmera que filma a cena e uma emissora de TV que a transmite ao vivo num programa de entretenimento, como uma atração do tipo "pegadinha do Faustão". As interpretações dos telespectadores seriam, nesse caso, orientadas por outro frame, que transformaria o quadro de atividade primário, descrito atrás.

A comunicação mediada por artefatos tecnológicos, como telefone fixo ou celular, rádio, TV, computador, intercomunicador etc., envolve necessariamente, no mínimo, uma transformação de quadro, se considerarmos a conversação como um quadro primário de atividade. Contudo, pode-se indagar se cada nova forma de comunicação tecnologicamente mediada vem a constituir um novo quadro ou representa apenas a transformação de um quadro primário. Essa é uma questão que cabe à sociolingüística analisar, pois deve-se recorrer às situações de uso, ao contexto sociocultural, ou seja, a outros fatores além do contexto lingüístico, ainda que se pressuponha que a própria forma de falar derive desses fatores.

A teoria do quadro evidencia uma crítica ao modelo clássico que analisa a comunicação tendo como suporte uma teoria da informação para o exame das formas de comunicação mediada. Em tal modelo cada participante é visto como uma agência que recebe informações de um emissor (questões, ordens, declarações, pedidos) e as responde, tomando como base os fatos vistos sob a sua perspectiva e armazenados na mente. Num programa de entrevistas há uma pessoa que responde as perguntas proferidas por um apresentador, embora as questões sejam, em geral, preparadas por uma equipe que o assessora previamente. A maior parte das vezes o entrevistado não faz perguntas, o que evidencia uma assimetria no discurso entre os participantes, que seria estranha numa conversação comum. Contudo, a principal discrepância em relação ao quadro da conversação como atividade primária é que o diálogo é dirigido a uma audiência, no estúdio, e aos telespectadores. Com certeza, o quadro da TV envolve também uma transformação do quadro teatral, estruturado a partir de uma distinção básica entre audiência e performance. A despeito dos novos papéis e funcionalidades envolvidos, a análise de atos comunicativos no quadro da TV revela características da própria conversação comum que não percebemos, pois não são requeridas ou não se tornam manifestas nas situações de uso comum da linguagem entre dois falantes. As instâncias de comunicação mediada conduziram, heuristicamente, ao desenvolvimento de modelos, como a análise do quadro de Goffman, que explicam a variedade, a adequabilidade e as modificações nas formas de comunicação.

As transformações em quadros são de dois tipos: modulações (keeyings) ou fabricações (fabrications). Realizamos uma modulação no quadro quando "organizamos a experiência em termos de outro domínio (universo de significado sustentado por uma atividade) da experiência vivida, conhecendo apenas o que está envolvido, ou quando criamos outros domínios para nós mesmos ou ainda subvertemos a credibilidade de um domínio para outros" (Nunes, 2005, pp. 158-159). As modulações5 5 Goffman faz aqui uma analogia entre as transformações em quadros da percepção e as mudanças de tonalidade na música. compreendem um conjunto de convenções que fixam sinais para indicar o princípio e o término das atividades transformadas. No caso de um estúdio de televisão, por exemplo, há um sinal sonoro ou luminoso que é acionado para indicar que, a partir desse momento, a cena focalizada pela câmera está "no ar" e o quadro de atividades se transforma em quadro da TV.

As fabricações partem, assim como as modulações, de algo que já tenha adquirido significado em termos de estruturas primárias de organização da percepção. Contudo, nas fabricações há um esforço intencional de manipulação, por um ou mais indivíduos, de forma que pelo menos um dos outros seja induzido a uma falsa crença sobre o que está acontecendo (cf. Goffman, 1974, p. 83). As fabricações podem ser "benignas" quando não há prejuízo dos interesses das pessoas envolvidas, como em brincadeiras (truques, mágicas, "pregar peças"), treinamento dissimulado em estágios, simulações para testar eficiência de serviços etc. Podem ser também "exploradoras", quando se viola claramente os interesses privados de uma parte da comunidade participante. Os "contos-do-vigário", tipos de logros e embustes baseados em dramatizações, são variantes sociais muito conhecidas desses mecanismos e foram objeto de análises por Goffman desde seus escritos sobre a ordem interacional.

As modulações e as fabricações são elementos estruturais de um modelo das transformações nos quadros. Entretanto, há níveis internos na própria organização da atividade que devem ser teoricamente contemplados, como os graus de envolvimento e de abrangência cognitiva, a multiplicidade do self e a distinção entre os que possuem ou não informações relevantes numa determinada situação. Na teoria do quadro de Goffman, o self como falante divide-se em quatro entidades diferentes: responsável, estrategista, animador e figura (cf. Goffman, 1974, p. 5). Numa conversação normal, o próprio falante pode incorporar as quatro entidades, embora em muitos casos não o faça. Tomemos o caso de uma modulação bastante simples, como a de um turno de conversação entre duas pessoas em que uma delas se refere a uma declaração feita por um político, empregando o seguinte enunciado, formalizado a seguir.

A: É um absurdo! O prefeito disse: "Vou acabar com o passe-idoso!" [em tom de falsete].

A: "C disse que p".

O participante A não é o autor, ou o "responsável", por p, mas simplesmente profere a sentença em lugar de C, "animando-a". Se p fosse animada por D, E ou F, ocorreriam outras modulações. Além disso, A atua ao realizar um tipo de performance, utilizando seu aparato gestual ou vocal e um elemento de criatividade, para "modular" p e gerar outras transformações, criando "figuras", que podem variar em função dos recursos expressivos empregados (arremedo, imitação etc.) e das situações de uso. Teríamos uma modulação bastante diferente se A, em vista de possíveis simpatizantes de C, empregasse o mesmo enunciado, mas em tom sério e com menor ênfase. Agiria, dessa forma, como "estrategista". Evidentemente, são as transformações sofridas pelo quadro da conversação quando modulado em outros quadros, como o do rádio ou o da TV, que nos fazem compreender melhor o que ocorre em formas diferentes de falar. No caso de noticiários pela TV, os apresentadores (animadores) não são responsáveis pela autoria dos textos que lêem, mas apenas por sua expressão. Há uma equipe de produção que se encarrega dos cenários, da ordem dos enunciados veiculados, dos recursos técnicos, agindo como um estrategista que produz as figuras, nesse caso as "imagens falantes" que aparecem no vídeo, com o emprego de uma forma de falar que limita ou exclui o uso de interjeições ou recursos expressivos, assim como sotaques e maneirismos regionais. A despeito de se apresentarem como "fiéis aos fatos", os noticiários de TV envolvem não somente modulações, mas também fabricações benignas e exploradoras.

O modelo do quadro permite que consideremos uma conversa telefônica não mais como "um desvio da norma" que rege a interação falada presencial, mas como uma modulação do quadro da conversação, enfatizando que a "norma" do "enquadramento" é a mutabilidade, tanto em nível do agente (self múltiplo) como em nível da estrutura (modulações, fabricações, quebras de quadro). Se aplicarmos o novo modelo à análise da conversação telefônica, complementando o modelo da "tomada de palavra" (turn-taking), veremos que há um aprimoramento na compreensão desse tipo de comunicação intermediada em relação ao enfoque restrito do modelo emissor-mensagem-recipiente. É plausível conceber vários tipos de situações em que o falante não é o responsável nem o estrategista, mas limita-se a animar a fala e as intenções de outros. Entretanto, a conversa telefônica ainda conserva pelo menos uma característica da estrutura primária da percepção que é comum a ambos os quadros, o requisito da disponibilidade de um falante e um ouvinte que sejam reconhecidos como tais numa situação de fala6 6 O "requisito de disponibilidade", como elemento do quadro de atividade primária da conversação, provavelmente se inspira numa condição cuja análise Goffman considerava indispensável nos estudos sociolingüísticos: a "situação social", definida como "um ambiente que proporciona possibilidades mútuas de monitoramento, qualquer lugar em que um indivíduo se encontra acessível aos sentidos nus de todos os outros que estão 'presentes', e para quem os outros indivíduos são acessíveis de forma semelhante" (2002a, p. 17). . Segundo Schlegoff (1968, p. 1093), as próprias seqüências alinham os papéis de falante e ouvinte, fornecendo uma prova de que o ouvinte está (ou não) disponível e de sua competência interpretativa e lingüística para manter a conversação em seu contexto específico. Os turnos seqüenciais possibilitam uma "entrada coordenada" na atividade, e essa coordenação entre os dois participantes deve continuar em todo o decorrer de uma conversação bem-sucedida. Alguns turnos típicos de abertura em outras línguas exibem mais enfaticamente o requisito da disponibilidade, pois envolvem atos de fala cuja réplica satisfaz de imediato o requisito da disponibilidade de um falante:

[Portugal] [Espanha]

A: Está lá? A: ¿Dígame?

B: Maria! O Carlos já chegou? B: ¡Hola! ¿Está Alonso?

A conversação telefônica mantém, assim, o requisito da disponibilidade, ainda que substitua a troca e o esquadrinhamento de olhares por estratégias orientadoras manifestadas por seqüências lingüísticas. Contudo, a análise dos turnos e de mecanismos de "tomada da palavra" não permite a análise de fenômenos de manipulação da identidade possíveis pelo fato de o "animador" da réplica estar fora do campo visual de quem faz a chamada. Em outras palavras, não permite que consideremos outros elementos que fazem parte de situações típicas da conversa telefônica em uso, mas que não se expressam no contexto lingüístico dos turnos que é tomado como base empírica.

A obra de Goffman tem sido referendada, nos últimos dez anos, em análises de diversos tipos recentes de "comunicação mediada por computador" (CMC), alguns já clássicos (e-mail, listas de discussão, homepages), outros emergentes, como os diversos tipos de comunicação instantânea (chats, messengers, Orkut etc.) e os diários na web (blogs). Ainda que nenhuma dessas novas modalidades de comunicação existisse na época do lançamento de Frame analysis e Forms of talk, é interessante notar que dois dos principais modelos goffmanianos, a dramaturgia e a análise do quadro, comparecem em boa parte dessas análises, originando aplicações interessantes e incorporação de novos elementos, mas também gerando críticas e reformulações estruturais. Hugh Miller (1995), em um dos primeiros estudos nessa linha, analisou a questão da construção (e transformação) do self e da identidade nas homepages, ao propor, com base numa amostra não-sistemática de homepages pessoais na Internet, uma tipologia de apresentação do self nessa forma de CMC. Embora as formas de CMC não sejam, evidentemente, instâncias de interação em co-presença como as que Goffman descrevia, concordo com Miller em sua afirmação de que o "self eletrônico" apresentado na homepage deriva da interação face-a-face ou, pelo menos, da interação por e-mail. Goffman fazia, desde The presentation of self, uma distinção entre o que é conscientemente apresentado (given) e o que é apenas "emitido" (given off), ou apresentado sem a consciência dos sujeitos numa interação social: é preciso levar em conta o que as pessoas dizem nos encontros, mas também o que elas não dizem. Essa precaução vale também no caso das novas formas de CMC, embora a competência comunicativa para realizá-la ainda não esteja socialmente estabelecida, como no caso de formas mais tradicionais de comunicação – reuniões sociais, cartas e até telefonemas.

Convém destacar que as apropriações favoráveis às abordagens interacionistas inspiradas por Goffman à análise de formas emergentes de CMC, como listas de discussão (cf. McWilliams, 2001; Máximo, 2002), chats (cf. Sannicolas, 1997) e blogs (cf. Walker, 2003), enfrentam posições contrárias como a de Chandler (1998), que considera errônea a comparação das homepages com a interação face-a-face ou com dispositivos de CMC síncronos como chats: "a natureza assíncrona das apresentações do self em homepages pessoais as torna mais comparáveis a formas textuais (como cartas – e até a formas mais privadas, como diários) do que à interação de fala (como em conversações face-a-face ou por telefone)". Contudo, nota-se que a argumentação de Chandler se manifesta principalmente como uma crítica à comparação do processo assíncrono de construção de homepages com atos performáticos, lingüísticos ou paralingüísticos, que caracterizam a comunicação presencial ou alguns tipos de comunicação mediada. O modelo do quadro não é a principal referência de Miller ou Chandler, mas sim a questão da manipulação realizada (ou não) pelos autores (que são também animadores e responsáveis) na apresentação (ou construção) do self (ou selves) em homepages. Penso que a sociolingüística de Goffman, considerada desde os escritos sobre a ordem interacional os estudos Frame analysis e Forms of talk, nos permite escapar desse dualismo, pois o núcleo central é a própria transformação de quadros.

E-mail como forma de CMC: a análise do quadro em estudo de caso

A análise sociolingüística da CMC traz dificuldades técnicas consideráveis, em especial em função de problemas no reconhecimento da identidade dos participantes, da efemeridade das mensagens, da delimitação de um corpus em função da abrangência da rede, de problemas éticos no monitoramento do fluxo de informações, principalmente no caso de modalidades síncronas como chats. Tais problemas fazem com que, em direção contrária à "ilimitada" capacidade de expansão que se costuma atribuir à web, a pesquisa sociointeracionista da CMC consista preponderantemente de estudos de caso: banco de dados de um servidor de listas de discussões, organizado por temática; conteúdo de um diretório ou do banco de dados de um servidor de homepages pessoais; banco de mensagens de e-mail cotidianas numa comunidade de prática no período de trabalho, numa empresa ou instituição; monitoramento (passivo, ativo ou ambos) de um blog ou um grupo de chat durante um intervalo de tempo. Queremos finalizar este breve estudo que investe na possibilidade de empregar metodologicamente a análise do quadro de Goffman na análise da comunicação mediada, que inclui a CMC, acrescentando alguns resultados de uma pesquisa sobre uma classe específica de mensagens de e-mail em programas de pós-graduação: os pedidos de informação endereçados às secretarias dos cursos e suas réplicas. A proposta não contém, com certeza, a pretensão de verificar empiricamente a viabilidade metodológica de se aplicar a análise do frame na forma específica de comunicação mediada por computador que conhecemos por e-mail ou correio eletrônico, mas sim ilustrar uma possível aplicação do esquema goffmaniano num estudo de caso delimitado. O objetivo da apresentação dos resultados obtidos à crítica da comunidade científica, a exemplo de outros pesquisadores nos últimos dez anos, é o aprimoramento das técnicas e dos esquemas conceituais na área emergente da pesquisa sociológica e antropológica da CMC.

O corpus é composto de conjuntos de mensagens de e-mail obtidos em dois programas de pós-graduação na Universidade Federal de Goiás: o de Sociologia e o de História. Os terminais que contêm os dados são operados exclusiva ou preponderantemente pelos secretários e coordenadores dos respectivos cursos. Foram realizadas operações sucessivas de filtragem para a seleção das mensagens recebidas que contêm pedidos de informação sobre os cursos, em diversos aspectos (geral, processo de seleção, regulamento, notas, administração e outros), bem como as correspondentes respostas enviadas, quando foi o caso. As informações básicas sobre os dados considerados encontram-se na Tabela 1.

Algumas informações básicas são necessárias para que se possa caracterizar as condições de obtenção dos dados. Os dois cursos são oferecidos pela Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia da UFG: o curso de História foi criado em 1972, em nível de mestrado, e passou a incluir o doutorado no início de 2004; o curso de Sociologia existe desde agosto de 1999 em nível de mestrado. As secretarias dos cursos funcionam no mesmo prédio, mas em salas diferentes, sem comunicação direta. Os funcionários responsáveis pelas secretarias, bem como as coordenadorias de ambos os cursos e o corpo discente, não sabiam da realização da pesquisa durante todo o período em que as mensagens foram recebidas e enviadas. Foram selecionadas apenas as mensagens solicitando informações gerais sobre o curso ou específicas sobre assuntos como processo de seleção, linhas de pesquisa, corpo docente etc., acompanhadas de suas réplicas e turnos de comunicação subseqüentes, quando foi o caso7 7 Coordenei, no período entre 2003 e 2004, um dos cursos mencionados, o de Sociologia. Contudo, desde que decidi utilizar tal classe de mensagens como dados, deixei de responder a eventuais pedidos de informação, o que não veio a alterar a rotina da administração, já que essa tarefa, no programa mencionado, é normalmente desempenhada pelo secretário do curso. . Foram excluídas mensagens de cunho administrativo, de âmbito interno ou externo, como pedidos de declarações, solicitações de passagens e diárias, comunicações entre a pró-reitoria ou agências de fomento e as respectivas coordenações de cursos. Os coordenadores que atuavam nos períodos de emissão e recepção das mensagens foram esclarecidos dos objetivos da pesquisa e, após seu consentimento, foi realizada a filtragem das mensagens nos próprios terminais de micros ocupados na administração. Os arquivos com as mensagens selecionadas foram gravados em CDs. O material foi interpretado e codificado, gerando uma base de dados. Cabe informar que outros programas de pós-graduação foram consultados sobre a possibilidade de colaborar com o fornecimento desse tipo de informações, mas não foi possível a utilização dos dados, principalmente em razão do curto período de tempo de captação de mensagens, nesses casos. Em geral, quando contas de e-mail particulares são usadas como endereços eletrônicos de secretarias de programas, as mensagens recebidas tornam-se muito numerosas e, por isso, são excluídas em menor espaço de tempo8 8 Esse tipo de limitação diminuiu recentemente, com a popularização dos servidores de e-mail gratuitos de grande capacidade de armazenamento, hoje muito empregados inclusive em nível institucional/administrativo. . Essa prática põe em risco a confiabilidade da informação e, principalmente, inviabiliza o processo de filtragem para selecionar os pedidos de informações dirigidos de forma específica às secretarias.

A escolha das solicitações de informações como classe de mensagens a ser analisada requer uma justificação. Sabemos que é crescente o uso de dispositivos de comunicação instantânea (messengers) nos ambientes de trabalho, a ponto de suscitar, em algumas instituições, certo controle em seu uso pelos funcionários. Por outro lado, a maior abrangência do acesso na forma de CMC, como grupos de bate-papo eletrônico (chats) e blogs, por diversos segmentos sociais, tem levado essas formas de comunicação a interessantes articulações com meios de comunicação mediada tradicionais, como a televisão. Hoje em dia os jornais, em suas versões on-line, complementam o papel que o telefone e, mais recentemente, o celular já ocupavam, permitindo a interação com a "audiência" de ouvintes, telespectadores ou internautas. Assim, torna-se razoável esperar que o uso da linguagem truncada, de expressões "telegráficas" e quase cifradas, o uso de apelidos e a manipulação da identidade, recursos em geral presentes na CMC síncrona, venham a influir nas expressões empregadas em outros meios de comunicação, incluindo o e-mail. Os pedidos de informação, por outro lado, figuram entre os serviços pioneiros disponíveis na Internet, quando a rede ainda não comportava interface gráfica e os serviços resumiam-se a correio eletrônico, listas de discussão pela Bitnet e alguns aplicativos usando o protocolo Telnet no sistema operacional DOS. No início dos anos de 1990 já era possível encontrar listas de réplicas a pedidos de informações agrupadas e indexadas em função dos tipos de solicitações mais freqüentes. Depois, com o surgimento da web e a popularização da linguagem de hipertexto, o serviço praticamente generalizou-se em consultas on-line, tanto para procedimentos técnicos como para fins institucionais: são as chamadas FAQs (frequently answered questions), tipos de questões respondidas com maior freqüência. Assim, com base nas duas considerações anteriores, tomou-se como uma hipótese inicial que os enunciados de "chamadas" que solicitem informações se aproximem, no limite, de expressões usadas no quadro da comunicação com recursos de comunicação instantânea e que as "réplicas" pelos secretários e coordenadores tomem a forma sintética e objetiva, quase "protocolar". Prevê-se, em ambos os casos, negligência com a performance na construção de uma imagem ou identidade tão valorizada nas interações presenciais.

Os softwares de correio eletrônico apresentam uma estrutura básica já padronizada, independentemente de sua marca ou versão9 9 Tal estrutura também se manifesta nas interfaces de softwares on-line em provedores de webmail, como Hotmail, Gmail e outros. . Uma rápida inspeção de seus itens estruturais mostra que estão envolvidos mais elementos do que os existentes no esquema básico "emissor-mensagem-recipiente". Na interface visual disponível ao usuário para criar uma mensagem, encontram-se as seguintes opções de endereçamento:

  • De: equivale ao "emissor", no esquema tradicional. O programa disponibiliza aqui, numa caixa de listagem, todas as contas de e-mail cadastradas no aplicativo, que podem ser de uma mesma pessoa, utilizando diversos provedores, ou de pessoas diferentes. Assim, o usuário torna-se responsável por sua mensagem, caso o endereço coincida ou se refira a seu nome completo, mas também pode animar mensagens com o emprego de outros endereços cadastrados, fazendo-se passar por outra pessoa, bastando, para reforçar essa "fabricação", escrever o nome do dono do endereço no corpo da mensagem, à guisa de assinatura. Assim, a própria interface dos aplicativos de e-mail permite que se manifestem, em virtude de sua própria estrutura e de seus comandos, as quatro entidades do

    self como falante que Goffman identificava em sua sociolingüística. Revelam-se muitas variantes de realização da função de estrategista. No caso da entrada

    De, por exemplo, o usuário pode escolher, convenientemente, qual endereço empregar, o da universidade, para assuntos de pesquisa e trabalho, e o de um provedor gratuito ou particular, para assuntos privados. É preciso lembrar que o cadastramento de contas em aplicativos de e-mail distingue o "carimbo", nome que é exibido na interface do aplicativo, da própria designação do endereço, que inclui um nome do usuário (

    login), que identifica por meios eletrônicos o usuário da conta. Temos, portanto, uma modulação a cada cadastramento de conta de e-mail no aplicativo.

  • Para: remete ao endereço do receptor ou destinatário da mensagem. Multiplica-se aqui a possibilidade de realizar diversos tipos de modulações ou fabricações, pois designar um endereço eletrônico implica reconhecer, implicitamente, a capacidade de "transformações do quadro" que podem ser feitas por seu intermédio. Ao empregarmos o próprio "catálogo de endereços" para escolher um remetente, estamos "incorporando" as transformações que fizemos para acoplar uma identidade ao endereço eletrônico selecionado, realizadas por nós ou pelo próprio destinatário. Pode-se, por exemplo, cadastrar o endereço da universidade e designá-lo como "carimbo" com a palavra "Trabalho", por ser o termo que bem designa, do ponto de vista subjetivo, a relação do usuário com a universidade. Por outro lado, o secretário do programa pode utilizar o endereço de e-mail a que tem direito na universidade e associá-lo, na

    homepage da universidade, ao "carimbo" da secretaria do programa. Quem dirigir mensagens à secretaria, por meio do

    link da

    homepage, estará também carregando para seu catálogo de endereços, "incorporando" a atribuição "subjetiva" que o próprio secretário vinculou a seu e-mail particular. Pode-se também remeter uma mensagem a vários destinatários por meio da entrada

    Para, mas também da entrada

    Cc (cópia carbono), permitindo, assim, que os recipientes saibam para quem foi endereçada a mensagem.

  • Cco (cópia carbono oculta): esta entrada permite também o envio de cópias a outros destinatários, embora deixe ocultos os endereços de destino das cópias. Este recurso permite a realização de estratégias de seleção, como, por exemplo, ao enviar a mesma mensagem para muitas pessoas (pelo uso de

    Cc) e ocultar de apenas alguns destinatários os e-mails de quem receberá outras cópias (usando

    Cco). Portanto, o usuário que emprega a entrada

    Cco está sempre atuando como

    animador e

    estrategista, e pode enviar

    figuras diferentes, como anúncios comerciais difundidos por

    spam (nesse tipo de uso o animador não é necessariamente o responsável pela figura), mas também mensagens em ambientes de trabalho, que devem ser vistas por um grupo e dissimuladas em outro. Ao empregar essas múltiplas combinações de papéis do

    self, o usuário está engendrando fabricações benignas ou exploradoras, de acordo com as intenções e os contextos considerados.

As opções de endereçamento, assim como a data (de envio ou de recebimento), constituem dados presentes em qualquer mensagem enviada ou recebida pelos aplicativos de e-mail. A figura em geral contém um enunciado escrito, acompanhado ou não de imagens, sons, animações e arquivos anexos dos mais diversos tipos. Quanto à comunicação da mensagem, existem quatro comandos básicos: "enviar", "responder ao remetente", "responder a todos" e "encaminhar". Tais opções operacionais derivam da forma de comunicação em que surgiram as listas de discussão, muito populares na Bitnet. Embora a inscrição numa lista seja pública, o direcionamento da mensagem é controlado pelo animador (usuário), que a dirige apenas a uma pessoa (como numa interação falada com apenas dois participantes) ou a todos os inscritos na lista, conferindo, dessa forma, um âmbito privado ou público à figura (mensagem). Um usuário pode também encaminhar uma mensagem que recebeu a um ou mais inscritos na linha de destinatários, o que transforma a intenção original do emissor e confere, por exemplo, um caráter público a uma mensagem dirigida em âmbito particular. O comando de "encaminhar" nos e-mails proporciona à Internet um poder disseminador muito grande, o que produz um quadro de "fofoca" transformado.

O esquema goffmaniano do formato estrutural (framework) da produção (self múltiplo com quatro entidades: responsável, animador, estrategista e figura) e do formato estrutural da participação (modulações e transformações do quadro) apresenta-se bastante frutífero na interpretação do quadro (frame) do e-mail na CMC. A própria interface do aplicativo "incorpora" a possibilidade de efetivação das diversas entidades do self, efetuada na performance do animador, definindo seu nível de participação e sua "identidade" no ato da comunicação. Antes de passarmos propriamente à análise das figuras, é conveniente explorar um pouco mais a interpretação dos comandos básicos de transmissão de mensagens recorrendo à análise do frame. Ao observar os encontros e reuniões sociais, Goffman salienta que, nessas ocasiões, há interlocutores "direcionados" e "não-interessados", bem como uma "comunicação dominante" e várias "comunicações subordinadas". Num grupo de colegas que conversa durante um coquetel de abertura de congresso científico, por exemplo, posso dirigir a palavra a um amigo e sustentar, por algum tempo, uma "comunicação dominante" com ele, enquanto, a meu redor, ocorrem diversas "comunicações subordinadas", desde que o assunto tratado seja concernente a temas de interesse comum a todos. Se nossa conversa derivar para um tema de interesse restrito, um assunto particular, a tendência é que os colegas ao redor procurem outros grupos, pois nossa comunicação se tornou marginal em relação ao que poderia ser compartilhado por todos. A alteração estrutural no ambiente de conversação pode ser diferente, gerando um apagamento das comunicações subordinadas, com a atenção dos demais participantes do grupo voltada para a nossa conversa, a exemplo do que ocorre em programas de entrevistas no frame da televisão, quando a platéia e a audiência assistem, impassíveis, à interação falada entre animador e entrevistado (cf. Goffman, 2002b, p. 120). Quando emprego uma comunicação subordinada em reuniões sociais, posso cochichar para que a conversa não seja ouvida por todos ao redor, dissimulando um conteúdo que não seria bem recebido por todos os participantes. É a forma mais simples de realização de um "conluio" nas interações faladas, o ocultamento de uma "faixa" de atos de fala10 10 O conluio pode ocorrer também "pela simulação de que as palavras não ouvidas pelos excluídos são inócuas, ou pelo uso de palavras abusivas, ostensivamente dirigidas a todos os participantes, mas cujo significado adicional só será entendido por alguns" (Goffman, 2002b, p. 121). numa situação interativa em que ocorre uma comunicação dominante.

Para interpretar essas alterações na estrutura de organização e de percepção em reuniões sociais, e incorporá-las em sua análise das transformações nos quadros (frames), Goffman elabora o seu modelo analógico-metafórico do "estúdio", em que a relação entre atividades no quadro e fora do quadro é explicada em analogia com as funções de edição11 11 O termo edição é empregado no sentido técnico (utilizado em rádio, televisão, cinema, fonografia ou informática) de seleção e combinação do material gravado. num estúdio: os recursos do estúdio de som funcionam como domínios analógicos em relação aos termos sintáticos da interação. As falas subordinadas são análogas a trilhas (tracks) secundárias numa gravação. Quando principia um turno de comunicação dominante, equivalente a um destaque no volume de um canal (fade-in), que logo é sucedido por outros, ocorre um fade-out nos canais remanescentes, até que se estabeleça um equilíbrio. De forma geral, uma trilha principal, dominante, sempre está associada a uma trilha secundária, de desatenção, e ambas são tocadas simultaneamente. Há também uma trilha de sinais direcionais, que é análoga ao conjunto de sinais metacomunicativos12 12 O conceito de sinais metacomunicativos provém dos estudos etológicos de Gregory Bateson (2002): são mensagens, explícitas ou não, que ajudam o recipiente a compreender as intenções no quadro ( frame). Sinais metacomunicativos ou canais de fundo podem também cumprir uma função estratégica, funcionando como códigos. Uma piscada, como no exemplo utilizado por Ryle e Geertz, constitui um exemplo de sinal metacomunicativo, quando indica, por exemplo, um conluio numa situação. , excluídos do conteúdo da atividade, mas que a regulam, articulando e qualificando seus principais componentes e fases (cf. Goffman, 1974, p. 210). É possível identificar essas trilhas direcionais, pois sempre há "marcadores" ou pistas que as indicam. Sinais de aspas, por exemplo, no quadro da linguagem escrita, indicam que o trecho demarcado está em nível metalingüístico, o que introduz "vozes" de outros quadros da percepção.

No quadro de uma lista de discussão, é comum a conversação ser iniciada por uma pergunta dirigida a todos. As respostas se sucedem, para todos, pelo menos em seu núcleo central. Conversas ou contatos secundários começam a aparecer, com trocas de mensagens entre algum participante da trilha dominante e outros que estavam apenas "observando", ou seja, eram participantes passivos da lista, lendo as mensagens. Contudo, tais mensagens subordinadas são enviadas diretamente aos remetentes, e não a todos, o que impede sua visualização na seqüência de turnos dominantes. Há uma trilha de orientação em metassinais, correspondente às instruções em código na linguagem de programação empregada para o processamento de mensagens e de seus parâmetros no aplicativo. O sistema operacional em modo interativo e gráfico (do tipo Windows ou Linux) torna possível a utilização desse código orientador mediante um sistema de signos gráficos.

As mensagens de pedidos de ajuda de nosso banco de dados foram interpretadas e classificadas com base nas categorias e seus respectivos valores como mostramos a seguir.

1) Ano de emissão, identificação do programa, existência de réplica

2) Réplica

Indica se a mensagem obteve resposta ou não.

3) Posição no turno

"Chamada", "resposta", "segunda chamada" ou "conclusão". Toda chamada após um primeiro turno chamada-resposta sempre é designada como "segunda chamada", independentemente de quantos turnos ocorreram antes. "Conclusões" são tipos de mensagens, a exemplo de agradecimentos, que fecham a conversação e não obtêm réplicas.

4) Cortesia ("sim" ou "não")

O uso de cortesia na mensagem é caracterizado por um certo cuidado com as normas gramaticais, ordem visual na apresentação do enunciado, obediência a regras tacitamente aceitas no quadro de interações face-a-face ou de cartas escritas, como chamadas e respostas, saudações e agradecimentos etc.

5) Tipos de apresentação da chamada

a) "Sem performance": quando o usuário não se preocupa em produzir uma imagem ou impressão, construindo uma identidade, expondo um motivo ou justificando sua solicitação de informações, como no Exemplo 1.

EXEMPLO 1 – MENSAGEM n. 19913 13 Procuramos conservar, nos exemplos apresentados, o formato visual de apresentação da mensagem, na medida do possível.

De: xxxxxxx Para: mestsociologia@fchf.ufg.br

Assunto: Mestrado

Gostaria de saber maiores informações sobre mestrado na área de sociologia.

Obrigado,

L.

Apesar de constar um nome abaixo do texto da mensagem, não há como considerar, nesse caso, uma performance no sentido de demonstrar uma identidade, pois o endereço de procedência não corresponde ao nome ou cognome que é apresentado na mensagem. Há, pelo contrário, um ato de comunicação indicando um contexto em que a verdadeira identidade não importa, como no quadro dos chats.

b) "Identidade": quando se escreve o nome e o sobrenome no texto da mensagem. Embora sempre haja um tipo de identidade relacionado ao endereço eletrônico (ou seu "apelido" colocado após o sinal De), esta forma de designação não será considerada uma característica da identidade, pois muitas pessoas podem utilizar um terminal e empregar as configurações de e-mail presentes.

c) "Currículo": quando há, além de algum sinal de identidade, informações sobre atividade profissional, cargo, tipo de formação ou qualquer tipo de informação ligada à posição social (Exemplo 2).

EXEMPLO 2 – MENSAGEM n. 62:

De: jpc Para: mestsociologia@fchf.ufg.br

Assunto: Seleção para mestrado

Sou estudante da Universidade Federal de Viçosa – MG, e pretendo realizar mestrado em Sociologia nesta universidade, para tanto necessito saber quando será aberto o edital de seleção para os interessados, e se há possibilidade de adquirir o edital da seleção de 2002.

Gostaria de saber também qual a linha de pesquisa dentro do processo social rural enfocada pelo curso, para dar maior embasamento à minha proposta de trabalho.

Grato pela colaboração

J. P. C.

d) "Justificativa": quando há, além de algum sinal de identidade, uma tentativa de justificar o pedido, seja pela apresentação de um motivo ou pela elaboração de uma narrativa (Exemplo 3).

EXEMPLO 3 – MENSAGEM n. 99:

De: a.l. Para: mestsociologia@fchf.ufg.br

Assunto: Información

Señores Universidade Gerais de Goias:

Soy socióloga egresada de la Universidad de Chile y estoy interesada en realizar el postgrado en Sociología e Antropología que ustedes imparten en su establecimiento. Pretendo realizar dicho curso el año 2005, para lo cual quisiera saber cuáles son los requisitos que debo cumplir para realizar los trámites de postulación desde Chile. Durante el 2004 estaré realizando un curso de portugués en el Centro de Estudios Brasileños en Santiago y realizando los trámites para la beca CAPES. Espero su respuesta y, si es posible, más información sobre el postgrado.

De antemano muchas gracias

A. L. L.

e) "Intimidade": se há evidência ou conotação no texto de que já houve algum tipo de contato prévio entre o solicitante e o secretário ou coordenador (Exemplo 4).

EXEMPLO 4 – MENSAGEM n. 179:

E aí, sofredor rubro-negro!!!!

Conforme te adiantei, segue aí o edital com a bibliografia e as instruções... se vc pegar firme e se manter com o anteprojeto na linha de pesquisa do mestrado, tenho certeza que sua chance de passar é grande.

Abraço,

E.

6) Tipos de apresentação da réplica

a) "Atendimento protocolar": quando há simplesmente o atendimento da solicitação (Exemplo 5).

EXEMPLO 5 – MENSAGEM n. 225

De: M. R. Para: F.V.

Assunto: mestrado em história

Anexar: Folder 2004.doc (305KB)

Original Message

From: F. V.

To: xxxxx@fchf.ufg.br

Sent: Tuesday, July 15, 2003 3:36 PM

Subject: Fwd: mestrado em história

Gostaria se possível informações sobre o mestrado em História para 2004. Endereço da instituição, valor, documentos necessários, enfim um edital para uma possível inscrição.

Atenciosamente,

F. (Juiz de Fora – MG)

O Exemplo 5 representa o tipo extremo de ato performático na resposta de um pedido. Não há nenhum texto ou mensagem, mas apenas um arquivo anexo contendo a informação requerida. Evidentemente, este não é o tipo de resposta padrão e a maioria das réplicas contém um texto econômico, com pouco envolvimento, na forma protocolar (Exemplo 6).

EXEMPLO 6 – MENSAGEM n. 198

Prezado F.,

O próximo processo seletivo será para 2004. As inscrições acontecerão na primeira quinzena de outubro e a seleção no mês de novembro de 2003.

Caso queira, consulte o folder da seleção passada www.fchf.ufg.br/historia/index.html.

Obrigado.

M. R.

b) "Atendimento diferenciado": quando há, além do atendimento, sinais de deferência, empatia, envolvimento, argumentação, esclarecimento, na resposta (Exemplo 7).

EXEMPLO 7

Cara P.,

Peço muitas desculpas porque tivemos um problema em nosso correio eletrônico e a sua mensagem ficou perdida e somente hoje pude vê-la. Mas aí vão as informações.

Fizemos uma seleção para aluno regular, em caráter excepcional, no mês de agosto de 2002, porque tínhamos vagas disponíveis. Não realizamos seleção para aluno especial em agosto, mas aceitamos alunos de outros mestrados. Em janeiro de 2003 realizaremos a seleção para aluno regular e aí uma seleção para aluno especial e também aceitaremos matrícula de alunos de outros mestrados. O nosso edital está no site da prppg.

As aulas deverão se iniciar em março e aí lhe enviaremos as disciplinas e horários.

Lamento muito não ter podido lhe fornecer a informação na época certa.

Atenciosamente

D. D. S.

Coordenadora

7) Transformações no quadro

Procurou-se identificar as modulações e fabricações presentes. Manifestou-se apenas uma forma de modulação nas mensagens do banco de dados, presente, por exemplo, na Mensagem n. 225 (Exemplo 5). Consiste em substituir o meio em que o ato de pedir uma informação é realizado (mensagem escrita e apresentada na tela do monitor) por outro meio na réplica, um arquivo de texto que necessita ser aberto por outro aplicativo, um processador de texto. Outras figuras desse tipo de modulação seriam possíveis, embora não tenham ocorrido no corpus analisado, como os arquivos de apresentação (pps), muito empregados hoje tanto para fins de treinamento ou publicidade, como para comentários jocosos e brincadeiras sobre notícias recentes, comumente trocados por internautas no ciberespaço. Antecedentes dessa forma "modulada" de comunicação em quadros primários de interação encontram-se, por exemplo, nos bilhetes trocados entre alunos numa sala de aula, em resposta a solicitações feitas em voz baixa, em conformidade com a ordem interacional nesse tipo de contexto. Quanto às fabricações identificadas, decorrem de alterações na construção e na percepção da identidade resultantes do emprego do recurso de "Encaminhar" e do emprego de abreviaturas e cognomes em endereços de contas ou em "carimbos" empregados nas opções de endereçamento (Exemplo 8).

EXEMPLO 8 – MENSAGEM n. 24

De: F. Para: mestsociologia@fchf.ufg.br

Assunto: Fw: pré-projeto

Original Message

From: Expedição

To: xxxxxx@fchf.ufg.br

Sent: Thursday, September 11, 2003 11:23 AM

Subject: Pré-projeto

Prezado Professor

Estou preparando pré-projeto para seleção/admissão nesta instituição, para o curso de mestrado em Sociologia, na disciplina Desenvolvimento Regional, com o tema "O Desenvolvimento da Ind. Farmacêutica na Cidade de Anápolis", e gostaria de obter informações sobre a viabilidade do desenvolvimento do tema, tais como a elaboração do pré-projeto, período de inscrições, o idioma espanhol é aceito? E tudo o mais relacionado a este assunto.

Conto com vossa atenção e esforço nesta minha empreitada.

Desde já agradeço.

A. C. A.

E-mail: xxxxx@vitapan.com.br

xxxxx@terra.com.br

fone: xxxxxxxxx e xxxxxxxxxx

O envolvimento e a expectativa em relação à mensagem apresentada modificam-se sensivelmente quando há intermediação de outra pessoa ou entidade em seu encaminhamento. No ambiente administrativo, denotam deferência ou urgência na obtenção de uma resposta. Porém, no contexto específico das coordenações de pós-graduação, em que há maior rotatividade de funcionários e coordenadores, o emprego de tal recurso em geral está relacionado com associações não atualizadas entre "carimbos" na homepage ou em folders do programa e endereços eletrônicos de ex-coordenadores ou ex-funcionários.

EXEMPLO 9 – MENSAGEM n. 275

De: H.F.R. Para: mestsociologia@fchf.ufg.br

Assunto: Mestrado

Sou bacharel em direito, professor no ensino médio e gostaria de obter maiores informações sobre o mestrado.

Gostaria de saber se há a possibilidade de estar cursando disciplinas como aluno especial neste curso.

Aguardo resposta.

Obrigado.

W. M. S.

Não se trata aqui de uma fabricação devido ao encaminhamento feito por outra pessoa de mensagem da qual não foi autor, mas de falta de concordância entre a identificação no "carimbo" da interface no aplicativo e a "assinatura" no final da mensagem. Tal transformação é muito comum no quadro do e-mail, pois o uso de PCs é compartilhado em algum grau, tanto no ambiente de trabalho como no contexto doméstico. Contudo, a mensagem apresentada está associada a outros e o exemplo deve ser mais explorado, pois revela peculiaridades do contexto da coordenação de programas de pós-graduação. A Mensagem n. 202 (não reproduzida aqui) indica que a mensagem anterior, com o mesmo tipo de fabricação de identidade, foi também remetida à secretaria do programa de História. Além disso, o "carimbo" presente na mensagem anterior aparece em outra enviada ao programa de Sociologia, com outro texto e agora ostentando uma "assinatura" correspondente (Exemplo 10).

EXEMPLO 10 – MENSAGEM n. 110

De: H.F.R. Para: mestsociologia@fchf.ufg.br

Assunto: Mestrado

Sou farmacêutico, especialista em Homeopatia e professor universitário. Como é um sonho meu ser mestre, e continuar na área acadêmica, sinto que há uma afinidade muito grande entre este curso e a Farmácia, considero que se pode fazer muita pesquisa nova e interessante entre essas áreas.

Gostaria de obter mais e melhores informações sobre este mestrado.

Obrigado.

H.

As três mensagens comentadas, emitidas com base numa única conta de e-mail, à qual foram associados nomes e atributos de identidade diferentes (provavelmente correspondentes a pessoas diferentes), evidenciam fabricações que podem ter sido aplicadas uma após a outra na busca de informações em outros programas epistemologicamente "afins" às áreas de formação dos animadores. O artifício ilustra a busca pela pós-graduação como forma de ascensão profissional, muitas vezes desvinculada de uma pretensão à formação acadêmica.

Feita a caracterização dos códigos empregados para a análise do corpus inspirada na teoria goffmaniana do frame, podemos comentar alguns dados. A comparação entre os resultados dos dois programas, no que se refere à razão entre chamadas e réplicas, conduziria a erros, pois há fatores que não foram considerados e poderiam inviabilizar comparações desse tipo, como a ausência temporária de funcionários em razão de greves ou a possibilidade de receber e responder tais mensagens utilizando outros computadores, até de fora do espaço do campus.

O pequeno número de segundas chamadas e conclusões leva-nos a considerar que, no caso de solicitação de informações, o esquema "chamada-resposta" estrutura a maior parte dos turnos e são raros os casos em que há envolvimento capaz de sustentar a sucessividade de um maior número de turnos. Contudo, é importante ressaltar que, dentre as 183 chamadas (incluindo duas conclusões e sete segundas chamadas) e 92 réplicas registradas, foi possível concatenar 148 mensagens em 74 turnos "chamada-réplica", e não obtivemos, no banco de dados que foi possível coletar, réplicas ou chamadas correspondentes às 35 mensagens restantes. Portanto, as nossas conclusões mais importantes tomarão como suporte empírico o conjunto de 74 turnos que permitem estabelecer correlações entre chamadas e réplicas.

Embora quase 17% das mensagens recebidas que solicitam informações (chamadas) evidenciem um descuido com a apresentação da imagem e da identidade, e se distanciem das regras básicas que regem situações de interação presencial, na maioria dos casos a apresentação mais cuidadosa do self prevalece. Os resultados que indicam o predomínio do cuidado com as normas gramaticais e o respeito às regras formais da interação falada (saudações, agradecimentos etc.), que incorporamos na categoria "cortesia", abalam a hipótese inicial de que mensagens do tipo que privilegiamos seriam apresentadas no estilo dos enunciados expressos em sessões de chats ou sistemas de comunicação instantânea. Considerando agora os 74 turnos articulados, embora o formato protocolar seja predominante nas réplicas (78,4%) em relação ao tipo de atendimento diferenciado e individualizante (21,6%), que denota maior envolvimento e deferência, pode-se notar que a forma de apresentação das réplicas está diretamente relacionada com a forma de apresentação das chamadas, quando consideradas em seus respectivos turnos (Tabela 4).

É significativo que, dos dezesseis casos de atendimento diferenciado encontrados nos turnos, nenhum ocorra quando as mensagens evidenciam desatenção à performance do self, enquanto onze se manifestem quando há marcadores de posição ou função social e tentativas de argumentar ou justificar a solicitação. Como as duas variáveis foram mensuradas ordinalmente14 14 Eis os valores atribuídos às categorias: a) variável "Tipo de apresentação na chamada": "sem performance" = 1; "identificação" = 2; "currículo" = 3; "tentativa de justificar o pedido" = 4; b) variável "Tipo de apresentação na réplica": "atendimento protocolar" = 1; "atendimento diferenciado" = 2. e o coeficiente r de Pearson calculado foi de 0,312 para á = 0,007, pode-se considerar que há uma associação positiva moderada entre a forma de apresentação da chamada e o tipo de apresentação na chamada, ainda que a segunda variável não tenha sido mensurada numa escala adequada para a avaliação da força de associação.

Considerações finais

Os resultados obtidos parecem afastar a viabilidade de considerarmos o correio eletrônico como uma forma de comunicar muito diferente de cartas ou bilhetes, ou até de interações comunicativas em encontros e reuniões sociais, pelo menos no que se refere a estratégias de apresentação do self, medidas corretivas e afirmativas para estabelecer um equilíbrio na interação. Contudo, pode-se também dizer que isso vale apenas para turnos de atividades ritualizadas, como pedidos de desculpas, introduções e epílogos em conversas (ou cartas), saudações e até pedidos de informações, a classe de mensagens que se privilegiou neste estudo. A análise do frame desloca o enfoque ecológico-naturalístico (com antecedentes em Bateson) e normativista (inspirado em Durkheim) para a valorização das formas de organização da experiência e da percepção, mas também das "estruturas da expectativa" (Tannen, 1993, pp. 20-21), ou seja, o conhecimento da experiência anterior e da relação entre os objetos no mundo e essa experiência "primária". As estruturas da expectativa estão relacionadas com a compreensão da linguagem e constituem a própria condição de possibilidade das interpretações que realizamos, fornecendo esquemas que nos permitem também prever relações com novos fatos ou elementos, além de interpretar a situação presente. Tais esquemas de conhecimento tornam possível a coerência entre as diversas lâminas de um frame, ou seja, que consigamos elaborar e interpretar mensagens de e-mail. Quando colocamos o nome, como assinaturas, no final de uma mensagem de e-mail, reafirmamos, no quadro do correio eletrônico, elementos de uma estrutura de expectativas em relação a aberturas e conclusões de encontros, cartas, narrativas ou demais figuras de outros quadros primários ou modulações. Há elementos da própria estrutura de apresentação dos aplicativos de e-mail que permitem a reafirmação da estrutura de participação no quadro da conversação, como o requisito da coerência e articulação na sucessividade de turnos. É o caso, por exemplo, do recurso de replicar ao remetente, em que a opção "Assunto" na tela passa a exibir um prefixo "Re:" antecedendo o valor do "Assunto" na mensagem anteriormente recebida. Tal pista de contextualização nos faz antecipar o conteúdo e a forma da mensagem a ser enviada, reorientados pela "faixa de atividade" a que o assunto esteja relacionado.

A organização e a estrutura dos aplicativos de e-mail não são, portanto, "virtuais", pois têm como base transformações em frames que fazem parte de nossa vida social. Mais do que isso, instrumentalizam as performances de identidade e as definições de situações que realizamos por intermédio do uso da linguagem, num quadro de produção que permite a atuação de múltiplos selves. Em outras palavras, a estrutura do aplicativo que se manifesta visivelmente na tela mediante um arranjo de ícones e comandos reproduz transformações que ocorrem em quadros de lâminas mais externas, mas também gera transformações organizacionais e perceptivas no quadro das atividades de uma forma de CMC como o e-mail. Sofisticado, o modelo do frame integra as atividades lingüístico-comunicativas e a estrutura que as integra. Contudo, assim como o modelo da "tomada de palavra" no nível técnico da análise conversacional, o frame exige um par de atributos do qual deriva sua força heurística e metodológica, mas que também responde por sua limitação na interpretação de determinados fenômenos ou relações: sucessividade e coordenação. No quadro da conversação, os enunciados se sucedem de forma coordenada e sua interpretação consiste em "revelar" os nexos da coordenação na sucessividade e descrever as medidas de apoio e corretivas empregadas na manutenção desse tipo de coordenação: a forma pela qual a chamada segue a réplica; as estratégias para a performance da identificação em relação ao tipo de reconhecimento esperado. Tais princípios são também exigidos nos modelos causalistas em geral, nas ciências sociais, em que se procura demonstrar relações de causalidade entre fenômenos num estado social A e num estado social posterior B em função de valores de condições e propriedades em cada estado. No campo da sociolingüística interacional, trata-se de articular a sucessividade de turnos a formas de cooperação coordenada em situações de interação social e explicar os casos em que essa articulação não ocorre ou é perturbada. Porém, o modelo é limitado no caso de atividades (ou turnos) que ocorrem simultaneamente, como no caso de formas de CMC instantânea.

O uso dos dispositivos de CMC instantânea em geral ocorre ao mesmo tempo que outra atividade. A janela do messenger costuma ficar aberta nos monitores em ambientes de trabalho, a despeito das tentativas do controle administrativo de não permitir isso. O usuário está envolvido, por exemplo, em digitar um ofício e, ao notar o visor do messenger piscando, passa a alternar sua atenção ao ler o teor das mensagens recebidas e digitar, no estilo truncado peculiar a essa forma de comunicação, suas réplicas. Não há, contudo, como afirmar qual das atividades envolvidas é "anterior" ou "primária", em relação à outra. As formas emergentes de comunicação parecem exigir como estrutura primária um quadro de mais de uma atividade, embora ainda não tenhamos padronizado esquemas para a organização ou a "cooperação coordenada" nesses focos múltiplos de atividades. Possivelmente o uso de celulares tenha importante papel nessa transformação nos quadros da comunicação mediada, pois passamos a "naturalizar" as atividades e as comunicações simultâneas a ponto de não considerar, como fazia Goffman, o tipo de envolvimento nas reuniões focalizadas como "primário" em relação a formas subordinadas de comunicação (cf. Goffman, 1963, pp. 13-30). Até as empresas encarregadas da telefonia fixa passaram a oferecer serviços do tipo "teleconferência", que nada mais são do que artifícios para que possamos "distribuir" diferentemente os turnos da conversação, pelo uso de uma tecla do aparelho para comutar duas "trilhas" de sinal telefônico e transformar conversas que seriam simultâneas em turnos seqüenciais conforme o frame da conversa por telefone tradicional, o que libera ao usuário (desde que ele tenha competência e habilidade suficientes) o poder de administrar e "fabricar" o grau de envolvimento, não decepcionando qualquer dos dois interlocutores e atendendo, ao mesmo tempo, duas ligações. De qualquer forma, ainda que se reconheça, como Scollon et al. (1999) e Jones (2002), a necessidade de aprimorar o modelo do frame para trabalhar com formas emergentes da CMC, em especial aquelas sincrônicas, pode-se também considerar que a própria análise do frame fornece, numa extensão, o modelo metafórico do "estúdio" que ainda não foi totalmente explorado. Tal modelo traz uma interpretação satisfatória à conjunção de atividades, como trilhas de áudio que são ressaltadas ou camufladas mediante estratégias de mixagem. Contudo, aqueles fiéis à concepção original de Goffman devem enfrentar uma dificuldade cuja solução pertence ao domínio empírico, pois a "polifocalidade" (Scollon et al., 1999) de atividades no contexto do uso de chats e messengers, por exemplo, constitui a lâmina mais externa do frame. Seria possível dizer, por exemplo, na linha de Scollon, que os jovens das sociedades urbanas contemporâneas já prestavam atenção em mais de uma coisa ao mesmo tempo, já exerciam atividades simultâneas comumente, antes do surgimento das formas de comunicação emergentes. Assim, o fenômeno da "polivocalidade" seria explicado por uma transformação de uma estrutura primária de atividades já presente, num estado social anterior, em situações de interação presencial. Contudo, adota-se aqui uma posição mais cautelosa, deixando ainda em dúvida a possibilidade de se considerar positivamente a análise do frame como viável na interpretação da CMC síncrona. Sustenta-se, por outro lado, a eficácia do modelo na análise do correio eletrônico e das listas de discussão, além de outras possíveis formas de CMC predominantemente assíncronas, pois as estruturas primárias que estão em suas origens, os quadros da conversação e da comunicação escrita endereçada (que tem a carta como figura mais utilizada) compartilham com os quadros emergentes do e-mail ou das listas de discussão os requisitos fundamentais da sucessividade e da cooperação coordenada.

Texto recebido em 14/8/2006 e aprovado em 3/3/2007.

Jordão Horta Nunes é professor do Departamento de Ciências Sociais, na Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia da Universidade Federal de Goiás. E-mail: jordão@fchf.ufg.br.

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  • *
    Este artigo, em sua primeira versão, originou uma comunicação no Seminário Temático "A Constituição de Fronteiras nas Ciências Sociais: tensão e extensão no campo metodológico", no XXVIII Encontro Anual da Anpocs, em outubro de 2004.
  • 1
    Emprego em todo o trabalho o termo "texto" no sentido atribuído por Umberto Eco (1991), como forma de comunicação, tanto por cadeias de enunciados ligados por vínculos de coerência, como por grupos de enunciados emitidos ao mesmo tempo com base em mais de um sistema semiótico.
  • 2
    Tais trabalhos compõem os livros
    Encounters (1961),
    Behavior in public places (1963),
    Interaction ritual (1967),
    Strategic interaction (1970) e
    Relations in public (1971), com exceção de "Role distance", que faz parte de
    Encounters, mas está relacionado com o modelo dramatúrgico apresentado em
    A representação do eu na vida cotidiana (1996 [1959]).
  • 3
    Pistas de contextualização (
    contextualization cues) são todos os traços lingüísticos que contribuem para a sinalização de pressupostos contextuais (cf. Gumperz, 2002). Constituem os meios pelos quais os falantes sinalizam e os ouvintes interpretam qual atividade está acontecendo, como seu conteúdo deve ser compreendido e como cada proferimento se relaciona com os adjacentes (cf. Garcez e Ostermann, 2002).
  • 4
    O conceito de
    frame ainda não encontra uma tradução consensual na sociologia brasileira, apesar de o termo "enquadre" já estar fixado no Brasil como tradução de
    frame na psicologia (cf. Ribeiro e Garcez, 2002, p. 107, nota). Prefiro empregar o termo "quadro", que evoca a proximidade com a técnica da fotografia e do cinema (enquadramento,
    framing, quadro da película, fotograma) e também, no vernáculo, incorpora o sentido de "estrutura", "moldura", "esqueleto" que o termo apresenta na língua inglesa. Além disso, "quadro" significa "referência", "perspectiva", sentidos fundamentais na sociologia interpretativa e, principalmente, nas escolas do interacionismo simbólico e da etnometodologia, tão caras a Goffman.
  • 5
    Goffman faz aqui uma analogia entre as transformações em quadros da percepção e as mudanças de tonalidade na música.
  • 6
    O "requisito de disponibilidade", como elemento do quadro de atividade primária da conversação, provavelmente se inspira numa condição cuja análise Goffman considerava indispensável nos estudos sociolingüísticos: a "situação social", definida como "um ambiente que proporciona possibilidades mútuas de monitoramento, qualquer lugar em que um indivíduo se encontra acessível aos sentidos nus de todos os outros que estão 'presentes', e para quem os outros indivíduos são acessíveis de forma semelhante" (2002a, p. 17).
  • 7
    Coordenei, no período entre 2003 e 2004, um dos cursos mencionados, o de Sociologia. Contudo, desde que decidi utilizar tal classe de mensagens como dados, deixei de responder a eventuais pedidos de informação, o que não veio a alterar a rotina da administração, já que essa tarefa, no programa mencionado, é normalmente desempenhada pelo secretário do curso.
  • 8
    Esse tipo de limitação diminuiu recentemente, com a popularização dos servidores de e-mail gratuitos de grande capacidade de armazenamento, hoje muito empregados inclusive em nível institucional/administrativo.
  • 9
    Tal estrutura também se manifesta nas interfaces de
    softwares on-line em provedores de
    webmail, como Hotmail, Gmail e outros.
  • 10
    O conluio pode ocorrer também "pela simulação de que as palavras não ouvidas pelos excluídos são inócuas, ou pelo uso de palavras abusivas, ostensivamente dirigidas a todos os participantes, mas cujo significado adicional só será entendido por alguns" (Goffman, 2002b, p. 121).
  • 11
    O termo edição é empregado no sentido técnico (utilizado em rádio, televisão, cinema, fonografia ou informática) de seleção e combinação do material gravado.
  • 12
    O conceito de sinais metacomunicativos provém dos estudos etológicos de Gregory Bateson (2002): são mensagens, explícitas ou não, que ajudam o recipiente a compreender as intenções no quadro (
    frame). Sinais metacomunicativos ou canais de fundo podem também cumprir uma função estratégica, funcionando como códigos. Uma piscada, como no exemplo utilizado por Ryle e Geertz, constitui um exemplo de sinal metacomunicativo, quando indica, por exemplo, um conluio numa situação.
  • 13
    Procuramos conservar, nos exemplos apresentados, o formato visual de apresentação da mensagem, na medida do possível.
  • 14
    Eis os valores atribuídos às categorias: a) variável "Tipo de apresentação na chamada": "sem
    performance" = 1; "identificação" = 2; "currículo" = 3; "tentativa de justificar o pedido" = 4; b) variável "Tipo de apresentação na réplica": "atendimento protocolar" = 1; "atendimento diferenciado" = 2.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      Nov 2007

    Histórico

    • Recebido
      14 Ago 2006
    • Aceito
      03 Mar 2007
    Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, 05508-010, São Paulo - SP, Brasil - São Paulo - SP - Brazil
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