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O conceito de posição social na sociologia do conhecimento

The concept of social location in the sociology of knowledge

Resumos

Os sociólogos do conhecimento tentam explicar as crenças dos agentes epistêmicos por meio da posição social destes no interior de uma hierarquia de relações de poder. O artigo propõe um modo alternativo de conceber a posição social dos agentes epistêmicos. Inspirado nas noções durkheimianas de integração social e de densidade social, o autor define a posição social de um agente com base na densidade de suas relações no interior de redes sociais. Para a sociologia do conhecimento científico em particular, são abordadas as relações sociais no interior de redes profissionais de cientistas. Em seguida, verifica-se a aplicabilidade desse conceito de posição social à sociologia do conhecimento em geral.

Sociologia do conhecimento; Sociologia da ciência; Epistemologia feminista; Durkheim


Sociologists of knowledge have attempted to explain the beliefs of epistemic agents in terms of their social location within a hierarchy of power relationships. This paper proposes an alternative way of conceiving the social location of epistemic agents. Drawing on the Durkheimian notions of social integration and social density, it will define an agent's social location in terms of the density of their relations within social networks. For the sociology of scientific knowledge in particular, it will focus on social relations within professional networks of scientists. Then the paper will address the applicability of the network concept of social location to the sociology of knowledge generally.

Sociology of knowledge; Sociology of science; Feminist epistemology; Durkheim


DOSSIÊ - FUNDAMENTOS DA SOCIOLOGIA

O conceito de posição social na sociologia do conhecimento

The concept of social location in the sociology of knowledge

Warren Schmaus

Professor de filosofia do Departamento de Humanidades do Instituto de Tecnologia de Illinois. É autor de Rethinking Durkheim and his tradition (2004), Durkheim's philosophy of science and the sociology of knowledge (1994) e organizador, com W. S. Pickering, de Emile Durkheim: critical assessments, 3ª série, vol. II (2001). E-mail: schmaus@itt.edu

RESUMO

Os sociólogos do conhecimento tentam explicar as crenças dos agentes epistêmicos por meio da posição social destes no interior de uma hierarquia de relações de poder. O artigo propõe um modo alternativo de conceber a posição social dos agentes epistêmicos. Inspirado nas noções durkheimianas de integração social e de densidade social, o autor define a posição social de um agente com base na densidade de suas relações no interior de redes sociais. Para a sociologia do conhecimento científico em particular, são abordadas as relações sociais no interior de redes profissionais de cientistas. Em seguida, verifica-se a aplicabilidade desse conceito de posição social à sociologia do conhecimento em geral.

Palavras-chave: Sociologia do conhecimento; Sociologia da ciência; Epistemologia feminista; Durkheim.

ABSTRACT

Sociologists of knowledge have attempted to explain the beliefs of epistemic agents in terms of their social location within a hierarchy of power relationships. This paper proposes an alternative way of conceiving the social location of epistemic agents. Drawing on the Durkheimian notions of social integration and social density, it will define an agent's social location in terms of the density of their relations within social networks. For the sociology of scientific knowledge in particular, it will focus on social relations within professional networks of scientists. Then the paper will address the applicability of the network concept of social location to the sociology of knowledge generally.

Keywords: Sociology of knowledge; Sociology of science; Feminist epistemology; Durkheim.

Desde a teoria da ideologia de Karl Marx, os sociólogos do conhecimento tentaram explicar as crenças dos agentes epistêmicos por meio da posição social destes no interior de uma hierarquia de relações de poder. Embora alguns teóricos, como Karl Mannheim, questionassem os detalhes desse programa explicativo, sua noção de posição social parece persistir na sociologia do conhecimento científico e na epistemologia de ponto de vista feminista. Propomos, neste artigo, um modo alternativo de conceber a posição social dos agentes epistêmicos. Inspirando-nos nas noções durkheimianas de integração social e de densidade social, definiremos a posição social de um agente tendo em vista a densidade de suas relações no interior de redes sociais. Para a sociologia do conhecimento científico em particular, enfocaremos as relações sociais no interior de redes profissionais de cientistas. Em seguida, trataremos da aplicabilidade deste conceito de posição social à sociologia do conhecimento em geral.

Há várias vantagens, para a sociologia do conhecimento científico, em trabalhar com essa noção alternativa de posição social. O crescimento do conhecimento depende da interação crítica entre os cientistas. Ao que parece, as oportunidades que um cientista tem de contribuir para a ciência depende de quão bem ele está integrado na comunidade científica. Os filósofos, desde John Stuart Mill e Helen Longino, argumentam que nosso conhecimento pode ser aprimorado ao enriquecermos as discussões com uma grande variedade de pontos de vista, incluindo aqueles dos que foram marginalizados na sociedade mais ampla por razões de gênero ou etnia. O conceito alternativo de posição social que propomos fornece um modo de medir o grau em que os membros desses grupos estão integrados ou marginalizados na comunidade científica, o que nos permitirá identificar quão bem seus pontos de vista estão sendo representados. Além disso, nosso conceito de posição social pode ser usado para testar as alegações sobre o grau em que os membros dos grupos considerados marginalizados na sociedade mais ampla são também marginalizados na ciência.

Enfatizamos primeiro o conceito de posição social na sociologia do conhecimento científico, antes de tratarmos da sociologia do conhecimento em geral, porque a sociologia do conhecimento científico tem a vantagem relativa de apresentar redes sociais bem circunscritas. Embora os cientistas individuais possam pertencer a redes de amigos, parentes, vizinhos etc., são as redes de colegas profissionais que têm o principal impacto sobre o pensamento científico. O mesmo pode ser verdade, em algum grau, para outras profissões, como a medicina, o direito ou a arquitetura. Em princípio, a noção de posição em redes sociais deveria ser explanatória também para o conhecimento comum. Mas a tarefa é aí mais difícil, na medida em que os indivíduos são parte de muitas redes que podem afetar o seu pensamento. Por essa razão, é aconselhável começar com a tarefa relativamente mais fácil de investigar o papel das redes profissionais na constituição do discurso científico.

A tradição da sociologia do conhecimento

Conforme Mannheim (1936; 1952), a sociologia do conhecimento, que estuda a determinação existencial do conhecimento, origina-se na teoria da ideologia de Marx. Nesta, a chamada "base" econômica da sociedade, que consiste nos modos e nas relações de produção econômica, "determina" uma "superestrutura" de crenças ideológicas, de natureza legal, política, religiosa etc. Para Marx, haveria diferenças de pensamento irreconciliáveis entre a burguesia e o proletariado em razão das diferentes posições econômicas que essas classes ocupam na sociedade. No famoso prefácio à Contribuição à crítica da economia política, ele afirma que "não é a consciência do homem que determina a existência, mas a existência social que determina (bestimmt ) a consciência" (Marx, 1859). Marx não quis dizer "determina" em um sentido causal ou mecânico. A palavra alemã bestimmt significa decidir, definir, estabelecer limites ou fronteiras ou, ainda, fixar algo, como o preço ou o tempo. Ao que parece, Marx quis dizer que as condições sociais e econômicas escolhem ou selecionam, mais do que causam, certas formas de pensamento. Em sua abordagem da luta entre a burguesia e o proletariado, ele não afirmou que ser membro da burguesia causa o anseio de substituir trabalhadores por máquinas, mas que isso era do seu interesse pois manteria a competitividade dos negócios; os burgueses que não agissem de acordo com o seu interesse de classe não seriam capazes de permanecer na burguesia. Em outras palavras, Marx deu uma explicação funcional e não causal das crenças ideológicas, argumentando que essas crenças têm a função de manter a posição social dos que as endossam.

Para Mannheim, a sociologia do conhecimento de Marx se caracteriza por uma "desmascaradora mudança de mentalidade". Desmascarar uma ideia não é refutá-la ou negar sua verdade, mas identificar sua função extrateórica, isto é, os interesses sociais e econômicos a que ela serve e, assim, solapar sua eficácia prática. Porém, segundo Mannheim, as ideias ou as crenças de uma pessoa não dependem de sua existência social isoladamente, mas são partes interdependentes de toda uma superestrutura ou visão de mundo. A sociologia do conhecimento estuda a determinação existencial dessa visão de mundo total, desmascarando não ideias isoladas, mas ideologias inteiras. Mannheim também se referiu a essas visões de mundo como estilos de pensamento, pontos de vista ou postulados relativos ao mundo.

Ian Hacking (1999) aponta que muito da sociologia do conhecimento e da literatura do construcionismo social em geral continuam a ser caracterizadas por essa desmascaradora mudança de mentalidade. Por exemplo, o autodenominado Programa Forte na Sociologia do Conhecimento Científico recorre aos interesses econômicos e sociais dos cientistas para explicar suas posições teóricas e metodológicas. Hacking cita dois livros de Donald Mackenzie, membro do Programa Forte ao lado de David Bloor, Barry Barnes e Steven Shapin. O primeiro livro, Statistics in Britain, 1865-1930: the social construction of scientific knowledge, mostra de que maneira a estatística foi desenvolvida como parte de um programa de pesquisa em eugenia que servia a certos interesses de classe na Grã-Bretanha (cf. Mackenzie, 1981). O segundo, Inventing accuracy: an historical sociology of nuclear missile guidance, expõe como a precisão dos mísseis foi obtida para servir aos interesses dos que queriam vender mais mísseis aos governos (cf. Mackenzie, 1990). Hacking (1999, pp. 55-57) identifica um modelo explicativo similar fora da sociologia do conhecimento científico, como na obra de Philip Jenkin, Using murder: the social construction of serial homicide (1994), que afirma que a noção de serial killers beneficiou certos interesses ao desviar a atenção pública dos problemas urbanos e da necessidade do controle de armas.

A sociologia do conhecimento não se contenta em oferecer descrições ou explicações de quem sustenta quais visões e por quê. Na tentativa de solapar a eficácia de certas ideias desmascarando os interesses a que servem, ela tem implicações normativas. Muitas vezes, a sociologia do conhecimento explicita suas posições normativas, emitindo juízos sobre quem está em melhor posição para conhecer certas coisas. Isso se aplica à teoria da ideologia de Marx e a uma corrente mais recente, a epistemologia de ponto de vista feminista.

A epistemologia de perspectiva feminista e a sociologia do conhecimento

A epistemologia de perspectiva feminista tem diferentes significados para diferentes autores, dependendo das respostas a questões diversas, como saber se as diferenças entre homens e mulheres são "essenciais" ou socialmente construídas. Seja qual for a resposta a essa questão, as várias versões da epistemologia feminista compartilham duas alegações relacionadas: a tese do conhecimento situado e a tese da posição privilegiada.

Segundo a tese do conhecimento situado, o que sabemos ou experimentamos depende de nossa posição social. De acordo com Alison Wylie, a posição social de um sujeito é definida, ao menos em parte, por sua posição em uma hierarquia social, mas também por outras condições econômicas, sociais e culturais.

O que experimentamos e compreendemos, as diferentes forças e suscetibilidades que desenvolvemos como agentes epistêmicos, é sistematicamente moldado por nossa posição no interior de sistemas hierarquicamente estruturados em relações de poder, pelas condições materiais de nossas vidas, pelas relações de produção e reprodução, que formam nossas interações sociais, e pelos recursos conceituais que empregamos para interpretar e representar essas relações (Wylie, 2007, p. 574).

A tese da posição privilegiada afirma que algumas posições sociais são privilegiadas no sentido de que, a partir delas, é mais provável que se produza conhecimento verdadeiro ou confiável. Segundo Sandra Harding (1986, p. 26) e Kathleen Lennon (2004, p. 1017), essa tese tem raízes em Hegel e Marx: para o primeiro, o escravo beneficiava-se dessa posição privilegiada em relação a seu senhor; para o último, o proletariado ocupa uma posição epistemologicamente privilegiada em relação à burguesia. A teoria feminista sustenta que essa posição privilegiada cabe às mulheres, especialmente as feministas.

A tese da posição privilegiada parece pressupor um modelo baconiano de conhecimento empírico, em que a objetividade do conhecimento depende de livrar a mente individual de qualquer viés, ou "ídolos", como Bacon os chamava, para observar os fatos. Na teoria da ideologia de Marx, os indivíduos que ocupam posições de poder parecem estar sujeitos a mais distorções que interferem na obtenção de conhecimento objetivo do que os que são social e economicamente marginalizados. Isso porque a burguesia só vê as coisas através do véu de uma ideologia que possibilita seu status social e econômico superior. Os membros do proletariado são sobrecarregados por menos distorções ideológicas do que a burguesia e, assim, desfrutam de uma posição epistemologicamente privilegiada. Da mesma forma, para algumas teóricas feministas, a mente dos homens pode ser turvada pela ideologia que lhes garante o poder sobre as mulheres e outros grupos definidos por gênero.

A teoria da ideologia de Marx é, ironicamente, associológica, pois pressupõe que a objetividade do conhecimento depende da relativa ausência de viés nos produtores individuais de conhecimento. Mas os que consideram o conhecimento como um produto social argumentam que a objetividade resulta muito mais da eliminação de distorções, preconceitos e idiossincrasias individuais, por meio da interação crítica entre grupos de pessoas, do que do empenho de cada indivíduo para livrar sua mente de preconceitos. Longino (2002), por exemplo, argumenta que a objetividade e a confiabilidade na ciência são garantidas pelo exame coletivo das ideias propostas e não pela experiência individual livre de viés. Quanto mais pessoas diferentes e com experiências e pontos de vista variados contribuírem para a discussão crítica, mais objetivo será o resultado. Os indivíduos socialmente marginalizados devem ser ouvidos na produção coletiva de conhecimento por razões epistemológicas e não apenas éticas. O argumento não pressupõe que os membros de grupos marginalizados veem as coisas com mais clareza. Kathleen Lennon (2004, p. 2017) lembra que mesmo os membros de grupos marginalizados têm preconceitos que, como os do grupo dominante, devem ser submetidos à crítica.

Nem todos os marxistas consideram que o proletariado desfruta, automaticamente, de uma posição epistemológica privilegiada. Não é óbvio ao proletário que ele está sendo oprimido e é possível que ele sucumba à ideologia que contribui para mantê-lo em uma posição social inferior. Da mesma forma, muitos teóricos feministas não afirmam que uma mulher, apenas por ser mulher, desfruta de um privilégio epistemológico. Harding (2007, p. 51), por exemplo, argumenta que o ponto de vista feminista é algo que exige esforço para ser alcançado. A mulher só descobre a opressão de que é vítima discutindo com outras e analisando sua situação pessoal. Wylie (2003, p. 28) considera que não se pode afirmar sem mais que aqueles que defendem a standpoint theory (teoria do ponto de vista) como uma epistemologia endossem o que ela chama de "tese do privilégio automático". Além disso, não se pode, segundo a mesma autora, tomar a experiência individual dos membros dos grupos oprimidos como algo "básico" - e para isso Wylie se inspira no argumento de Joan Scott (1991, p. 777), pelo qual atribuir um caráter "básico" àquele tipo de experiência impediria a investigação de como as experiências individuais são estruturadas por condições sociais (cf. Wylie, 2007, p. 572).

Alguns teóricos do ponto de vista, como Donna Haraway, Patricia Hill Collins e Sara Ruddick, rejeitam inteiramente a noção de uma posição social privilegiada (cf. Heckman, 1997, pp. 346, 351-352 e 358). Cassandra Pinnick (1994, p. 653) aponta que não há nenhuma evidência empírica na sociologia do conhecimento científico que apoie a tese do privilégio, isto é, que mostre que os pesquisadores marginalizados produzem resultados mais confiáveis. Para Lennon (2003, pp. 256-257), não se trata de afirmar que as posições sociais marginais são epistemologicamente privilegiadas, mas que o envolvimento com os que ocupam essas posições introduzirá pontos de vista que terão um impacto na visão dos que não estão em posições marginais. Da mesma forma, Wylie (2003, p. 33) sustenta que as experiências peculiares a uma posição marginalizada podem levar os membros dos grupos excluídos a questionar certos pressupostos endossados pelos que estão no poder e a considerar hipóteses, pontos de vista ou linhas de investigação alternativas.

Mas, mesmo que aceitemos apenas a tese do conhecimento situado, ainda resta o problema de definir e medir os graus de marginalização. Há uma fronteira entre os que são marginalizados e os que não são ou somos todos, em algum grau, marginalizados? Todas as mulheres ou membros de minorias étnicas são igualmente marginalizados, qualquer que seja seu status socioeconômico? Barack e Michelle Obama são marginalizados? Sem uma forma clara de definir a noção de posição social, é difícil testar a tese do conhecimento situado. Marx pressupôs uma hierarquia linear simples de relações de poder. Mas, na sociedade contemporânea, a posição social pode ser afetada por fatores como gênero, raça, etnia, religião, orientação sexual, riqueza, nível de escolaridade, estado civil - fatores que nem sempre variam juntos. Mannheim já dizia que não há algo como um estilo de pensamento burguês ou proletário. Segundo ele, haveria diferentes posições sociais no interior do proletariado, e os estilos de pensamento associados com cada posição estariam em um constante estado de fluxo. Embora os teóricos do ponto de vista feminista possam rejeitar a hierarquia linear simples dos marxistas, a ideia de uma hierarquia de relações de poder persiste na noção de um centro de poder circundado por uma periferia de grupos oprimidos. Mas como medir e então comparar as distâncias dos grupos oprimidos em relação ao centro?

Além disso, mesmo que tenhamos uma definição clara dos graus de marginalização, a tese tradicional feminista do conhecimento situado só considera um dos dois modos em que a posição social pode afetar a potencial contribuição de um sujeito ao conhecimento científico. A tese do conhecimento situado afirma simplesmente que a posição social de um indivíduo fornece uma perspectiva particular ou um conjunto de experiências próprias a essa posição. Mas a posição social também influencia as oportunidades de interação crítica com os outros, interação que leva à avaliação das pretensões de conhecimento. Essa segunda tese é de especial interesse para nós, pois estamos interessados na atenção que é dada a pontos de vista alternativos. Na sociologia do conhecimento científico, a posição de um cientista individual em uma rede social de relações profissionais pode ajudar a entender a existência dessas oportunidades - ou a falta delas.

Redes sociais, integração e marginalização

As oportunidades que um cientista tem de participar do exame crítico de ideias na comunidade científica dependem de quão bem ele está integrado nela. Nesse ponto utilizarei o conceito durkheimiano de integração social. Em O suicídio (1897), Durkheim distinguiu a integração, ligada à densidade das relações sociais de um indivíduo, da regulação, ligada às relações econômicas. Os solteiros que cometem suicídio podem sofrer de integração social insuficiente, ao passo que suicídios cometidos durante crises econômicas podem indicar uma regulação insuficiente. As relações sociais são aquelas governadas pelas normas de uma instituição social cooperativa ou mesmo voluntária, como um clube ou uma igreja, enquanto as relações econômicas podem ser governadas pela lei ou pela força. Durkheim introduziu sua noção de densidade social em obras anteriores - A divisão do trabalho social ([1897]* * A data entre colchetes refere-se à edição original da obra. Ela é indicada na primeira vez que a obra é citada. Nas demais, indica-se somente a edição utilizada pelo autor (N. E.) 1902, pp. 241-243) e As regras do método sociológico (1895, pp. 138-139). Nelas, distinguiu o que chamou de volume social - isto é, o mero número de indivíduos - da densidade social ou moral, vinculada à quantidade de relações sociais entre os indivíduos. O número de relações sociais pode aumentar com o volume social ou população total, com a migração das áreas rurais para as urbanas ou com desenvolvimentos tecnológicos nos meios de comunicação e transporte.

Podemos elaborar noções similares para subcomunidades no interior da sociedade. Assim, para a sociologia do conhecimento científico, o número de cientistas trabalhando em um campo corresponderia à noção de volume social. A densidade social de comunidades de pesquisadores depende de fatores como o tamanho do campo, o local de trabalho, a frequência dos encontros profissionais organizados, o número de revistas, a disponibilidade de recursos on-line e vários tipos de contatos informais. A linguagem também é importante. Para a integração de uma ampla comunidade científica, os cientistas comunicam-se em línguas não nativas, como o latim, no século xvii, ou o inglês, atualmente.

Distinguir as relações sociais das econômicas, como fez Durkheim, não é negar que algumas relações possam ter aspectos tanto morais como econômicos. Em um típico laboratório universitário, por exemplo, os estudantes, pós-graduandos e pós-doutorandos, dependem dos cientistas seniores para seus ganhos e avanço na carreira, e estes contam com aqueles para realizar muito da pesquisa com a qual se comprometeram. Em um laboratório que funciona bem, no entanto, essas relações não são só econômicas, mas também morais. Os cientistas juniores esperam formação e orientação dos seniores, e estes confiam em que aqueles realizarão os experimentos com cuidado e relatarão os resultados de forma honesta. Embora possa haver um aspecto econômico nas relações entre as duas categorias de cientistas, essas relações são diferentes das relações de um cientista com, digamos, os vendedores de tubos de ensaio ou compostos químicos. Estas são relações puramente econômicas, governadas por regulações que não são peculiares à ciência.

As relações sociais que interessam à sociologia do conhecimento científico são as relações profissionais entre os cientistas em seu trabalho, governadas por normas que prescrevem o relato honesto dos dados, a confiança na honestidade do trabalho alheio e a ajuda a cientistas novos em início de carreira. É possível que um cientista participe de densas redes de relações pessoais e não esteja bem integrado na comunidade científica. O grau de integração de um cientista na comunidade de pesquisadores não depende apenas do número de cientistas com quem ele tem relações profissionais, mas também da qualidade ou força dessas relações. Isso depende de fatores como a frequência de contato pessoal com outros cientistas, a duração dos contatos e a extensão das críticas recebidas. Importa também com quem são mantidas essas relações: discutir sua pesquisa com o membro de uma faculdade de uma universidade importante para a pesquisa pode ser mais valioso do que uma discussão similar com alguém em uma obscura faculdade de artes liberais. Da mesma forma, as críticas recebidas de um colega que está atualizado com a literatura da área pode ser mais útil do que os comentários de alguém que não está. É claro que, de um campo a outro, varia a rapidez com que o conhecimento da literatura se torna datado. A rede de relações profissionais também importa, como aponta K. B. Wray (2007, p. 97), para o acesso aos trabalhos mais recentes e ainda inéditos de outros cientistas. James D. Watson intuiu bem a importância das redes sociais na ciência quando, ainda na qualidade de jovem pós-doutorando, deixou o laboratório Herman Kalckar, em Copenhague, onde se sentia ignorado, e mudou-se para o Cavendish Laboratory, na Universidade de Cambridge, onde estabeleceu uma relação de trabalho com Francis Crick e pôde interagir com muitos outros cientistas no próprio laboratório e no King's College de Londres (cf. Watson, 1969).

É claro que o número e a qualidade das relações profissionais não são simplesmente uma função da sociabilidade pessoal do cientista. Um cientista em uma universidade de prestígio, qualquer que seja seu nível de "habilidade" com as pessoas, pode pertencer a uma rica rede de relações sociais profissionais, da qual participam os orientandos que passaram por seu laboratório e que estabeleceram carreiras bem-sucedidas e outros cientistas seniores com quem ele pode ter trabalhado no passado. Isso não quer dizer que suas inclinações psicológicas e seus atributos pessoais sejam inteiramente irrelevantes, mas que a densidade das relações sociais mantidas por um indivíduo também depende de fatores sociais, culturais e institucionais, nem todos redutíveis a propriedades dos indivíduos.

Assim, se as mulheres cientistas forem de fato menos integradas do que os homens na comunidade científica, não é pela falta de habilidades sociais. A razão pode estar nas diferentes expectativas culturais em relação a homens e mulheres, na persistência de atitudes misóginas, especialmente por parte dos que ocupam posições de poder, e na tensão entre o relógio biológico e o tempo de profissão. De fato, em virtude dos desafios vinculados ao gênero que as mulheres enfrentam, elas muitas vezes abandonam inteiramente a ciência. Mas, se os cientistas homens pressupõem que as mulheres provavelmente abandonarão o campo, eles podem ser menos propensos a investir tempo e recurso no desenvolvimento de relações profissionais com elas (cf. Pattatucci, pp. 3-4). Uma vez que atualmente os homens dominam a profissão, as mulheres terão maior dificuldade em obter retorno crítico às suas pesquisas (cf. Gaines, 1998, pp. 74-75), o que desencorajará outras mulheres a seguir carreiras científicas. A situação é exacerbada pelas tensões sexuais, com problemas que vão do assédio sexual à incapacidade de separar os vínculos profissionais dos pessoais, o que leva os cientistas homens a evitar suas colegas mulheres.

Seria possível argumentar que, se a qualidade das relações profissionais do cientista depende, ao menos em parte, das posições ocupadas pelos colegas com quem ele se relaciona, então a qualidade dessas relações é constituída, ao menos indiretamente, pela hierarquia das relações de poder na sociedade mais ampla. Uma premissa adicional no argumento diria que os cientistas das principais universidades terão maior possibilidade de receber fundos de pesquisa dos centros de poder da sociedade, como o Departamento de Defesa dos Estados Unidos ou a indústria farmacêutica. Mas a conexão entre relações de poder na sociedade e status no interior da comunidade científica não é simples nem direta. Nos Estados Unidos, os cientistas não consideram pesquisa criativa a mera aplicação dos protocolos estabelecidos pela administração federal para testar novas drogas. Da mesma forma, na engenharia, os contratos de pesquisa com a indústria são muitas vezes menosprezados como simples testes e não como pesquisas genuínas, ainda que tais contratos agradem reitores e diretores pelos recursos que trazem à universidade. O status de um cientista na comunidade científica não reflete apenas a riqueza e o poder das suas fontes de recursos, mas é fortemente influenciado por normas internas à comunidade.

Há outra razão pela qual as relações profissionais não refletem, de forma simples, as hierarquias sociais na sociedade. A posição do cientista na rede de relações pode mudar com o tempo, à medida que avança na carreira, encontra novos cientistas ou mude de campo. Por outro lado, a posição nas hierarquias de classe, gênero e raça é menos fluida. Para um teórico do ponto de vista, como Nancy Hartsock, a posição de um cientista na hierarquia de poder não necessariamente muda com a percepção de que ele é membro de um grupo oprimido.

A qualidade das relações profissionais do cientista depende ainda das normas que as governam. Uma rede social marcada pelo autoritarismo, ainda que densa, é menos propensa a gerar conhecimento confiável do que uma mais democrática. As relações autoritárias são de qualidade inferior às governadas por ideais democráticos. É nesse sentido que Longino sustenta que as comunidades científicas só produzem conhecimento na medida em que certas condições ideais são satisfeitas. Estas incluem: (1) canais para a crítica pública; (2) consideração da crítica, isto é, teorias, hipóteses e outras ideias mudam com o tempo em resposta à crítica; (3) padrões públicos para a crítica e a avaliação das pretensões de conhecimento; (4) uma "igualdade moderada" pela autoridade intelectual, isto é, uma igualdade qualificada pelas diferenças em habilidades intelectuais, formação educacional e assim por diante (cf. Longino, 2002, pp. 128-131). Críticos como Miriam Solomon e Alan Richardson (2005, p. 215) afirmam que há pouco apoio empírico para o quarto ideal, que, acrescentam eles, desempenhou um pequeno papel na revolução científica, em que os principais sujeitos tinham uma formação similar. Seria possível replicar, é claro, que se trata de um ideal e não de uma condição necessária para o crescimento do conhecimento e, além disso, na medida em que esse ideal é realizado hoje, que os cientistas podem desfrutar de relações de qualidade superior às que prevaleciam entre eles nos séculos passados.

Mas não nos interessa tanto aqui defender a análise particular de Longino sobre os tipos de ideais democráticos que governam a ciência, e sim argumentar que quanto mais esse conjunto de ideais - ou algo similar a ele - é realizado em uma comunidade científica, mais socialmente integrada essa comunidade será. Um durkheimiano poderia dizer que uma rede autoritária está mais próxima de ser regulada do que integrada. A integração social está ligada a relações no interior de uma instituição cooperativa e governada por normas. Ainda que Durkheim não tenha dado a devida atenção a esse ponto, pertencer a tal instituição e seguir suas regras é em grande parte voluntário. Há uma diferença entre orientar voluntariamente a própria ação de acordo com as normas de uma instituição e ser comandado a se conformar a ela pelos que estão em posições de poder. Essa última situação é menos favorável à crítica do saber predominante ou à geração de novas ideias. Mantidas as demais condições, é de se esperar que a pesquisa produzida por cientistas que se beneficiam de relações sociais em maior quantidade e de melhor qualidade será mais confiável do que o trabalho dos que estão menos integrados na comunidade científica. Se há algo como uma noção de posição privilegiada na sociologia do conhecimento científico, trata-se daquela que se refere às oportunidades de interação com outros cientistas e não à experiência livre de viés.

Entretanto, Kevin Zollman relata o resultado, aparentemente paradoxal, de que redes mais densas e integradas produzem resultados menos confiáveis, embora o consenso seja atingido nelas mais rapidamente do que em redes menos densas. Ao explicar a relação inversa entre rapidez e confiabilidade, afirma que em redes menos conectadas a informação ruim, assim como a boa, é relativamente contida e não se dissemina rapidamente (cf. Zollman, 2007, p. 583). Sua análise, porém, depende do pressuposto de que as redes funcionam apenas para a transferência de informação e considera somente a quantidade e não a qualidade das relações. Em uma rede menos conectada, a informação ruim pode ser separada de forma segura, mas isso apenas sugere que ela é menos exposta à crítica.

A noção de integração social fornece um modo de definir a marginalidade que pode explicar como os cientistas marginalizados não são capazes de fazer muitas contribuições ao crescimento do conhecimento. É a própria marginalidade que explica isso, se por marginalidade entendermos menos integração na rede de cientistas, menos colegas a quem recorrer em busca de críticas e a maior probabilidade de ter suas contribuições ignoradas. Ao definirmos a marginalização pela falta de integração, podemos medir o grau em que membros de grupos étnicos ou de gênero são marginalizados ou integrados na comunidade científica e comparar as médias e as distribuições para diferentes grupos. Por exemplo, podemos muito bem descobrir que, ainda que o grau médio de integração seja mais elevado para os homens do que para as mulheres, há algumas mulheres que são menos marginalizadas do que alguns homens. Talvez possamos descobrir também que há uma gama maior de integração entre os homens do que entre as mulheres, ou que as mulheres estão mais concentradas em torno da média de seu grupo, ou, ainda, que os homossexuais são menos marginalizados nas ciências do que na sociedade. Não estou sugerindo que tais especulações sejam verdadeiras, mas que não é possível abordar a questão de sua verdade se pressupusermos que o nível de integração ou marginalização de um cientista na comunidade científica reflita simplesmente sua posição social na hierarquia de relações de poder na sociedade.

Por fim, as noções de volume e densidade social podem ser usadas também para caracterizar o que acontece quando uma sociedade restringe a participação de seus cientistas na livre discussão de ideias com seus pares, sejam estes estrangeiros ou não. Isso ocorreu com os biólogos soviéticos na era stalinista, que deviam se conformar com o lysenkoismo e não podiam manter contato com os geneticistas ocidentais. Os biólogos soviéticos viram-se assim marginalizados em relação à comunidade científica mundial, mantendo menos relações profissionais com os colegas do campo do que antes. A qualidade de suas relações profissionais, mesmo com outros cientistas soviéticos, também foi atingida, uma vez que se restringiu entre eles o exercício da crítica. Como resultado, os soviéticos perderam os estágios iniciais da revolução na genética molecular iniciada por Watson e Crick.

Evidência empírica

A seção anterior foi especulativa. A melhor razão para adotar um conceito de posição social definido por meio de redes sociais e da densidade social seria a de que esse conceito faz parte de proposições cuja verdade pode ser mostrada. Mas talvez não seja possível apresentar evidência direta para a afirmação de que é mais provável que os cientistas bem integrados na comunidade científica produzam resultados confiáveis ou que possuam alguma outra virtude epistêmica. Essas afirmações contêm conceitos avaliativos e, assim, qualquer suposta evidência de que essas virtudes são promovidas sob certas condições sempre estará sujeita a juízos de valor críticos sobre o grau em que essas virtudes foram de fato realizadas. Mas podemos fornecer evidência indireta para tais alegações, substituindo os conceitos epistêmicos normativos - como verdade, confiabilidade ou adequação empírica - por medidas relativamente menos problemáticas, como o número de publicações.

Podemos pressupor que o grau em que um cientista se empenha em pesquisa colaborativa é um indicador de seu grau de integração na comunidade científica. Wray (2002, p. 157) salienta a pesquisa sociológica empírica que mostra uma conexão entre colaboração e produtividade na ciência, pelo menos do modo como esta é medida pelo número de publicações. Diana Crane (1972, p. 50), por exemplo, ao pesquisar matemáticos e sociólogos rurais, concluiu que os cientistas mais produtivos tinham mais relações com outros cientistas em sua área de pesquisa do que os cientistas menos produtivos. O nível de produtividade das comunidades científicas, assim como o dos cientistas individuais, varia com a densidade das relações sociais. Crane (Idem, p. 25) comparou os matemáticos e os sociólogos rurais com pesquisadores de duas outras áreas da matemática e das ciências sociais em que o nível de comunicação interpessoal era baixo e descobriu que a taxa de crescimento das publicações também era baixa. Wray (2002, pp. 157-158) aponta ainda que Joseph Bem-David e Lydia Aran (1991) descobriram que, entre os médicos pesquisadores israelenses que fizeram pós-doutorado no exterior, os mais produtivos eram os que continuavam a se comunicar frequentemente com os cientistas que haviam conhecido fora de Israel. Há também alguma evidência apontando que os cientistas bem integrados na comunidade científica não apenas produzem mais pesquisas, mas pesquisas de melhor qualidade, se pudermos tomar o prêmio Nobel como indicador de qualidade. De todo modo, Harriett Zuckerman (1977) descobriu que os laureados com o prêmio Nobel tendem a colaborar com mais frequência do que os não laureados (Idem, p. 152).

Se, como argumenta Wray, os cientistas empenhados em trabalho colaborativo são mais produtivos, então os que são menos inclinados à colaboração provavelmente serão menos bem-sucedidos em um meio acadêmico competitivo. Ainda segundo Wray (Idem, p. 159), isso é tanto mais verdade quanto mais a pesquisa depende de financiamento. Quanto às mulheres, porém, as atitudes de gênero na sociedade explicam, ao menos em parte, por que as cientistas tendem a formar menos relações de trabalho cooperativas. Kristina Rollin indica que Gerhard Sonnert e Gerald Horton descobriram, em seu estudo sobre as diferenças de gênero nas carreiras científicas, que as mulheres, após os anos de pós-doutorado, "tiveram menos acesso à colaboração universitária" do que os homens (Rollin, 2002, p. 109). Parte do problema está no fato de que as mulheres encontram menos mulheres em seu campo com as quais colaborar. Em relação à colaboração entre mulheres e homens, Sonnert e Holton (1995, pp. 136-137) identificam ao menos dois problemas: (1) as atitudes dos homens em relação às mulheres, especialmente a competência científica que tendem a atribuir a elas; (2) o justificado temor das mulheres de ter seu trabalho apropriado de forma indevida por um colega homem que as trata como parceiros menores. Mas quanto menos as cientistas mulheres colaborarem, menos bem-sucedidas serão e mais difícil será para que outras mulheres encontrem colegas de seu sexo com quem colaborar.

As mulheres podem ser menos integradas na comunidade científica também de outras maneiras. Muitas vezes, elas precisam fazer um esforço extra para encontrar colegas que avaliem as suas pesquisas de forma simpática e crítica. Laura Gaines, ao refletir sobre sua própria experiência como estudante trabalhando sob a orientação de uma pesquisadora em um laboratório do U. S. National Institute of Health, dirigido por um homem, relata que esse diretor não auxiliava sua mentora e "não se importava em entender sua pesquisa, nem dirigia questões críticas a ela, a não ser quando precisou dar uma palestra sobre o material com o qual ela trabalhava" (Gaines, 1998, p. 74). A pesquisadora relata ainda como sua mentora teve que sair do laboratório e formar sua própria rede de colegas para progredir na pesquisa. Como no caso da pesquisa em colaboração, nesse caso são as atitudes de gênero que dificultam a integração das mulheres na comunidade científica e impedem, portanto, que deem mais contribuições ao conhecimento.

Conclusão

Ao explicar como alguns cientistas estão mais bem posicionados do que outros para fazer contribuições ao conhecimento, a noção de posição social, definida por meio das relações entre os cientistas, pode se revelar mais útil do que uma noção de posição social definida nos termos de uma hierarquia de relações de poder na sociedade. É certo que o grau médio de integração ou marginalização na comunidade científica para os vários grupos sociais pode se dever, em grande parte, às características da sociedade mais ampla, envolvendo, por exemplo, as atitudes em relação a membros desses grupos. Mas, para explicar a potencial contribuição de um indivíduo à ciência, é preciso considerar seu nível individual de integração social na comunidade científica.

A noção de integração social dá algum conteúdo às alegações de que os membros de grupos étnicos e de gênero são marginalizados na ciência tanto quanto na sociedade mais ampla. Para testar as afirmações segundo as quais os que são marginalizados na sociedade são marginalizados também na ciência, é preciso encontrar uma maneira de medir a marginalização na ciência que seja independente daquela usada para medir a marginalização na sociedade. Tentamos caracterizar a marginalização na comunidade científica como o oposto da integração e propusemos que ela pode ser medida pela densidade e pela força das relações profissionais de um cientista.

A generalização dessa abordagem para a sociologia do conhecimento, ao aplicá-la a outras profissões, pode ser relativamente direta, embora a ciência tenda a ser mais isolada das correntes vigentes na sociedade do que outras profissões. No direito, por exemplo, é preciso considerar as relações dos advogados com pessoas que estão nos negócios ou na política e não só com outros advogados. A generalização dessa noção de posição social para a sociologia do conhecimento comum seria mais difícil, em razão do número de diferentes redes a que as pessoas pertencem. Mas a noção de densidade social pode ser de alguma ajuda também nesse caso. Somos mais integrados em algumas redes do que em outras. A família, por exemplo, exerce inicialmente uma poderosa influência no pensamento da criança, mas conforme esta cresce e passa mais tempo com outras crianças fora do círculo familiar, seus grupos de pares desempenharão um papel maior. Pode-se objetar que não só as relações pessoais, mas também os meios de comunicação formam o que se passa por conhecimento comum. Na medida em que os meios de comunicação são controlados por grupos dominantes na sociedade, estes afetarão o que as pessoas pensam. Mas como os meios de interação digital estão absorvendo cada vez mais a atenção dos indivíduos, um conceito de posição social definido nos termos de redes de relações pessoais pode se revelar cada vez mais útil à sociologia do conhecimento.

Texto enviado em 30/1/2014 e aprovado em 27/2/2014.

Tradução do inglês de Alexandre Braga Massella

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    A data entre colchetes refere-se à edição original da obra. Ela é indicada na primeira vez que a obra é citada. Nas demais, indica-se somente a edição utilizada pelo autor (N. E.)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jan 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 2014

    Histórico

    • Aceito
      27 Fev 2014
    • Recebido
      30 Jan 2014
    Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, 05508-010, São Paulo - SP, Brasil - São Paulo - SP - Brazil
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