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Marcelo Neves. Constituição e Direito na modernidade periférica: uma abordagem teórica e uma interpretação do caso brasileiro

Neves, Marcelo. Constituição e direito na modernidade periférica: uma abordagem teórica e uma interpretação do caso brasileiro. Costa, Antônio Luz. Moita, Edvaldo; Macedo, Agnes; Luhmann, Niklas. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2018. 444

Passados 26 anos da publicação original em alemão, a tese de doutorado de Marcelo Neves foi traduzida e publicada em língua portuguesa. A opção do autor em manter a redação original e o prefácio da edição alemã escrito por Niklas Luhmann, mesmo diante de tantas mudanças de cenário da sociedade mundial e do constitucionalismo no Brasil, foi acompanhada de um posfácio em que Neves passa em revista o próprio argumento da tese em consideração às críticas recebidas e às mudanças no panorama teórico e prático do constitucionalismo, além da presente crise constitucional no país.

A oportuna publicação da obra em português ocorre num momento particularmente interessante do contexto jurídico-político brasileiro, que tem testado a consistência do modelo constitucional de 1988 frente à crise econômica e consequente instabilidade política, mobilizando conceitos fundamentais para a compreensão mais ampla dos ciclos de desconstitucionalização que marcam a história constitucional do Brasil. A própria distinção clássica entre Constituições normativas, nominalistas e semânticas de Karl Loewenstein (1979LOEWENSTEIN, Karl. (1979), Teoría de la Constitución. Trad. Alfredo Gallego Anabitarte. Barcelona, Ariel. , pp. 216-222), que Neves submete à revisão, para sugerir o conceito de Constituição instrumentalista enquanto sujeição do direito ao domínio ocasional dos detentores do poder político, parece ganhar sentido se avaliada a realidade constitucional no Brasil dos últimos cinco anos.

A interdisciplinaridade entre a sociologia jurídica e a teoria constitucional que marca a pesquisa e a trajetória acadêmica do autor é manejada no livro de forma a questionar os limites dos conceitos de Constituição e positividade do direito na teoria sistêmica alinhada ao pensamento luhmanniano, a partir de uma percepção empiricamente fundada na observação das condições do desenvolvimento constitucional na chamada modernidade periférica, especialmente no Brasil. Essa talvez seja a principal característica inovadora da tese de Neves, cuja originalidade repercutiu no próprio reposicionamento da teoria dos sistemas de matriz luhmanniana frente aos problemas de inclusão e diferenciação funcional da sociedade mundial. A perspectiva da tese aponta para os problemas da recepção irrefletida de ideias e instituições jurídicas do “centro” pela “periferia” do capitalismo no Ocidente e identifica na profunda desigualdade entre os grupos sociais da modernidade periférica o núcleo da insuficiente autonomia do direito e sua “exploração” pela política.

A principal hipótese do livro está na apresentação de uma teoria constitucional apta a desenvolver categorias adequadas para descrever os sistemas constitucionais da modernidade periférica. Seguindo esse propósito, Neves aponta tanto para os limites teóricos e empíricos da teoria dos sistemas, quanto para o déficit explicativo da tradicional classificação das Constituições de Karl Loewenstein, ambas insuficientes ao alcance do conceito de Constituição nas experiências jurídicas dos países marcados pela “descolonização formal” sem soberania ou independência nacional nos termos da modernidade central, da qual derivam os problemas da discrepância entre modelos constitucionais democráticos textuais copiados do centro e as condições estruturais de sua realização na periferia (nominalismo); e o uso instrumental da forma constitucional por regimes autoritários a serviço dos donos do poder e do dinheiro (instrumentalismo), que fomentam a integração periférica desses países no plano da sociedade mundial.

O uso de conceitos altamente abstratos da teoria social na construção do argumento da tese ganha maior alcance explicativo quando apresentados por Neves sob uma reflexão filtrada empiricamente pela repercussão dos efeitos sociais das ideias mobilizadas. Essa é a razão pela qual o autor aponta as suas restrições à “racionalidade normativa” e privilegia o “agir racional-com-respeito-a-fins” do modelo habermasiano, quanto ao fundamento da legitimação do direito na modernidade, e acolhe a supercomplexidade e a abertura ao futuro que caracterizam o modelo da diferenciação sistêmica de Luhmann. Mas assim o faz para, em seguida, apresentar os seus limites, a partir das insuficiências do próprio modelo em contextos ainda mais complexos. Tal distinção é feita com base na observação da insuficiente capacidade operativa e funcional de processamento das estruturas latentes da realidade social.

Afastando-se tanto da teoria da modernização quanto da teoria do desenvolvimento (pp. 100 ss.), Neves questiona a capacidade explicativa da teoria sistêmica luhmanniana para descrever o direito e a Constituição na modernidade periférica , em razão da insuficiente positividade do direito nos países que a compõem (pp. 65 e 74). Adotando a opção metodológica da distinção “centro/periferia” ao tratar da sociedade mundial (p. 102), a tese pressupõe que na sociedade moderna altamente complexa a insuficiente diferenciação do sistema jurídico e positividade da Constituição resultam na instrumentalização do direito pela política e pela economia, bloqueando igualmente a positividade do direito.

A opção do nosso autor acolhe expressamente o argumento de que na atual sociedade mundial orientada primariamente pela economia, o direito e a política permanecem sujeitos a uma diferenciação de tipo segmentária nos níveis regional e local, de acordo com a heterogeneidade estrutural da sociedade. De tal situação, resulta a diferente capacidade sistêmica entre os países do centro e da periferia em processar a complexidade dos conflitos que demandam a estabilização de expectativas ou respostas coletivamente vinculantes.

O direito e a política entre sobreintegrados e subintegrados

Ponto importante da análise empreendida sobre a história constitucional do Brasil é a rejeição à identificação de uma “pureza conceitual” na alternância entre Constituições nominalistas e instrumentalistas (p. 161). O autor nega a tentação, comum entre os juristas, de associar um texto constitucional específico a um modelo de normatividade descrito pela dogmática como típico. O foco na experiência brasileira para afirmar a existência de rígidos limites à extensão da autopoiese do direito em termos luhmannianos, contudo, não é alimentado pelas tradicionais explicações antropológico-culturalistas que se consolidaram a partir das obras dos chamados “intérpretes do Brasil”1 1 . Para uma explicação do próprio Neves sobre o seu distanciamento dessa perspectiva, ver: Neves (2015a, pp. 5-27): o autor elabora uma resposta à leitura de Souza, 2013 , que aproxima a obra de Neves e a própria teoria sistêmica de Luhmann a uma leitura culturalista e conservadora da reprodução social no Brasil. . Uma leitura que aponta na obra de Neves traços conservadores e eurocentristas comumente indicados também na teoria dos sistemas de Luhmann2 2 . Nesse sentido, as leituras recentes de Souza (2013) , em linha oposta à identificada anteriormente em Souza (2000 , pp. 196 e 268) e Gonçalves (2013) . . E embora o trabalho de Neves não seja declaradamente filiado à teoria pós-colonial3 3 . Para um registro da diferença entre o pensamento de Neves e o pós-colonialismo, ver Dantas (2016 , p. 15). Sem desprezar as diversas leituras que o conceito de pós-colonialismo adquire nas ciências sociais, aqui essa corrente é designada a partir do pensamento social latino-americano desenvolvido por Walter Mignolo. Para uma comparação entre as perspectivas de Mignolo e Souza, ver Ferreira e Simim (2017 , pp. 79-93). , a tese traz elementos muito próximos à leitura pós-colonial da história das instituições no país, aproximando-os da conjuntura de exclusão e desigualdade para em seguida criticar a própria noção do primado da diferenciação funcional como preferência por inclusão e o funcionamento autopoiético dos sistemas sociais no paradigma luhmanniano.

Essas evidências estão presentes, por exemplo, quando o autor critica a teoria da modernização (pp. 100 e 212), e indica que a adoção do constitucionalismo liberal na periferia do capitalismo importou numa descolonização formal e não foi seguida da independência ou soberania nacionais “no sentido dos países centrais” (p. 125); afirma as raízes coloniais do coronelismo e das relações de parentela (p. 250) como prática tradicional, mas avalia a insuficiente autonomia da política e do direito como subordinação ao código da economia (ter/não ter); aponta que o fracasso da transposição da forma constitucional do centro para a periferia é evidenciado a partir da heterogeneidade estrutural e da marginalização das massas que marcam primariamente a desigualdade econômica, e “não em virtude da presença de padrões tradicionais de comportamento” (pp. 131, 218, 258, 275); observa que as distorções da institucionalização dos direitos fundamentais, divisão dos poderes e das eleições políticas respondem a “fórmulas de reconciliação” mais amplas, que têm o objetivo de manter ou ampliar privilégios dos grupos sobreintegrados que podem dispor da Constituição (pp. 134, 220, 255, 274, 278), o que alimenta uma relação parasitária entre o direito e a política; registra a prática intervencionista dos Estados Unidos sobre o processo político no Brasil como instrumento da manutenção do status quo da constelação de poderes, da divisão internacional do trabalho e da economia entre o centro e a periferia (pp. 197 e 256); e a própria identificação da modernização periférica como integração subordinada do país na sociedade mundial (p. 105).

Mas talvez a principal evidência presente na construção do argumento de Neves (p. 258) que o afasta do paradigma culturalista de descrição da sociabilidade e da reprodução do direito e da política no Brasil esteja na sua explícita crítica à deslocada apropriação da tese weberiana do patrimonialismo por parte da narrativa das ciências sociais no país, em especial da tese de Raymundo Faoro. Em sentido contrário à descrição de autores4 4 . Holanda, [1936] 2013, pp. 145-146; Faoro, [1958] 1977, pp. 733 ss. que integram as correntes mais expressivas da sociologia no país durante o século XX – focadas na reprodução das relações entre o público e o privado como práticas tradicionais do “patrimonialismo” –, a resposta de Neves para o problema da particularização da Administração Pública no Brasil aponta para as categorias de sobreintegração e subintegração. É da manutenção da exclusão dos subintegrados que se alimenta a estrutura de privilégios de que gozam os sobreintegrados, o que por sua vez retroalimenta um círculo vicioso de instrumentalização do direito pela política, e de cooptação da política por grupos econômicos que se beneficiam dos frágeis mecanismos de legitimação do Estado Democrático de Direito.

É nesse sentido que a obra de Neves se afasta sobremaneira do que Souza (2013)SOUZA, Jessé. (2013), “Niklas Luhmann, Marcelo Neves e o ‘culturalismo cibernético’ da moderna teoria sistêmica”. In: DUTRA, Roberto & BACHUR, João Paulo (orgs.). Dossiê Niklas Luhmann. Belo Horizonte, Editora UFMG. denominou de “culturalismo cibernético”. Aliás, a indicação da desigualdade estrutural, que é constitutiva da relação entre sobreintegrados e subintegrados, e o seu reflexo no desempenho hipertrófico da função simbólica da Constituição apresentam-se em diversos textos e distintos momentos da trajetória de Neves (1994a, pp. 153 ss.; 1994b, pp. 253-276; 1995, pp. 21-23 e 1996, pp. 321-330), inclusive na articulação da crítica às concepções sobre a positividade da reprodução do direito de Luhmann e Teubner ( Neves, 2004NEVES, Marcelo. (2004), “E se faltar o décimo segundo camelo? Do direito expropriador ao direito invadido”. In: ARNAUD, André-Jean & LOPES JR., Dalmir (orgs.). Niklas Luhmann: do sistema social à sociologia jurídica. Rio de Janeiro, Lumen Juris, pp. 145-173. , pp. 160-161 e 168), e ainda em resposta ao próprio Souza (Neves, 2015a, nota de rodapé n. 6; e posfácio da obra aqui analisada pp. 378-389).

É a partir do argumento da profunda desigualdade de direitos e deveres entre sobreintegrados e subintegrados que Neves apresenta rigorosos limites à tese luhmanniana da autonomia do direito na sociedade mundial. No mesmo sentido, em atenção à experiência constitucional brasileira, também aponta para a impossibilidade do cumprimento da prestação que o sistema social demanda do direito. E o faz trazendo exemplos das disfunções do sistema jurídico para a solução de conflitos através do procedimento judicial (pp. 233-239) e da manutenção da exclusão dos grupos subintegrados pela instrumentalização do direito (pp. 239-244).

Pensando o direito e a Constituição desde a periferia da sociedade mundial

A insuficiência da prestação específica do direito à política é tratada na obra por meio da observação de diversos problemas: da regulação jurídica do procedimento eleitoral (pp. 247-257); da particularização da administração pública pela sua hiperpolitização – com a qual se articulam os corporativismos mais diversos (pp. 257-260); da sobreposição expansiva do Executivo que impede uma configuração funcional da divisão de poderes (pp. 260-262); e, por fim – o argumento mais abrangente –, da desarticulada interpenetração entre o direito e a política que se reflete na consideração de que “a política (em sentido amplo) desenvolve-se amplamente sem consideração pelo seu ambiente jurídico, e o sistema jurídico, por seu lado, não observa adequadamente seu ambiente político” (p. 263). Para o autor, tal quadro impediria a tensão constitutiva entre os sistemas político e jurídico, destruindo as chances de aprendizado social que a experiência constitucional poderia proporcionar.

É no campo das contingências específicas de observação do direito sobre si – a partir da teoria sistêmica, mas também contra o diagnóstico de Luhmann – que se move a construção do pensamento de Neves ao descrever a estrutura sobre a qual operam a Constituição e o direito no Brasil. O autor toma em consideração o argumento de Luhmann de que, no direito, a autorreferência elementar ou de base implica a produção e a reprodução da comunicação jurídica exclusivamente sob o código lícito/ilícito.

Assim, a legalidade assume caráter constitutivo da redundância funcional, capaz de afirmar a consistência da autonomia do direito frente à elevada variação do ambiente (p. 268). Porém, não se trata aqui da legalidade no sentido mais tradicional do positivismo, mas da dinâmica observada na “circularidade entre legiferação e concretização jurídica” (p. 270), e cuja generalização implica a inclusão de toda a população no âmbito do próprio sistema jurídico – exigindo a “institucionalização dos mecanismos constitucionais característicos do Estado de bem-estar” (p. 271), como compreende Luhmann (1993LUHMANN, Niklas. (1993), Teoría política en el Estado de Bienestar. Madri, Alianza. , p. 47).

Para Neves, no entanto, no caso brasileiro a autorreferência de base no direito é bloqueada pelos ciclos de desconstitucionalização que alternam nominalismo e instrumentalismo constitucionais e, assim, submetem o sistema jurídico a subsequentes rompimentos de legalidade. Esse fenômeno estaria presente tanto na constante intervenção da política no direito, que transforma em retórica vazia os princípios constitucionais, quanto na moralização circunstancial da comunicação jurídica, que se serve de formas mistas de autoritarismo e particularismo de setores privilegiados como mecanismo de manutenção da exclusão. Logo, o que se observa, na expressão de Neves, não é “a persistência de modelos tradicionais de conduta” (p. 275), mas um vácuo de sentido sobre a legalidade, já que a exclusão da massa de subintegrados impediria a formação de um horizonte comum sobre o agir e o vivenciar das formas jurídicas.

Sobre a reflexividade , que significa a referência de um processo a si mesmo em nível sistêmico mediante o mesmo código binário, Neves considera que a Constituição desempenha uma função específica. Isso porque ao estabelecer a hierarquia normativa, a organização dos poderes e o processo legislativo, inclusive de sua própria reforma, a Constituição se compreenderia como a “instância reflexiva mais abrangente do direito positivo” (p. 281), e a constitucionalidade como manifestação central da reflexividade do sistema jurídico. Nesse ponto, a tese extrai da experiência constitucional no Brasil alguns exemplos da interferência do Executivo sobre a normatização e instituições incumbidas do controle de constitucionalidade (pp. 285-296) e, reafirmando as insuficiências da função e da prestação do direito em tal quadro, conclui que a generalização do código “lícito/ilícito” é também bloqueada pela inviabilização da constitucionalidade enquanto instância máxima de reflexividade do direito (p. 297).

Por fim, Neves revisa o conceito de reflexão da teoria sistêmica, cujo significado Luhmann atribui à referência recursiva abrangente do sistema ao próprio sistema como um todo – problematizando inclusive a sua identidade. A tese (pp. 301-302 e 307) recorre à noção sistêmica de reflexão para observar o direito a partir de uma distinção de dois níveis: a teoria do direito e a dogmática jurídica . Novamente aqui, Neves recorre ao déficit de positividade do direito como fator impeditivo de uma reflexão adequada do direito a si mesmo, pois “legalidade e constitucionalidade são imprescindíveis para o desenvolvimento da dogmática e da teoria do direito como instâncias de reflexão do sistema jurídico” (pp. 301-302). E acrescenta que a reflexão sobre o direito, seja em nível dogmático ou teórico, não se reflete na prática jurídica, já que “constelações de interesses obstruem uma interdependência consistente de decisões” (p. 302), admitindo, contudo, que uma “orientação por consequências” não seria uma exclusividade brasileira. Mas que à falta de consistência jurídica adequada, em nível dogmático ou teórico, as variáveis particularistas frequentemente se impõem sobre uma “prática universalista de decisão”.

É ainda nesse ponto que Neves formula uma crítica substancial e pouco comum entre os juristas no Brasil, que se dirige tanto à construção teórica quanto aos problemas de operação do direito, e que segue muito atual. Ao exemplificar o uso seletivo da legalidade contra a Constituição na expulsão de moradores das favelas sob o fundamento de violação ao direito de propriedade – a despeito da garantia constitucional da moradia e dos direitos sociais –, a tese expõe a contradição do formalismo legalista ao qual recorrem juízes e tribunais que reafirmam uma estrutura de dominação dos sobreintegrados diametralmente oposta ao universalismo dos direitos previstos no texto constitucional. Tal crítica igualmente desvela o abismo de sentido de práticas formalistas, bacharelescas e colonizadas tão recorrentes entre os juristas no país. Para Neves, tais características presentes na retórica vazia e distante da realidade dos juristas evidenciariam antes uma espécie de “escapismo em relação à prática jurídica que não é consistentemente definida em termos de dogmática jurídica e teoria do direito” (pp. 306-307).

A conclusão da tese articula os problemas de reflexão no sistema jurídico com a questão da legitimação do direito. O emprego da concepção luhmanniana de legitimação é adotado por Neves como referência, ainda que com o acréscimo de um pressuposto: o da inclusão (p. 310). Orientando-se por tal parâmetro de legitimação e diante do quadro apresentado na tese, a conclusão aponta congruentemente para a incapacidade de autolegitimação do direito e da Constituição no país, em virtude da sua insuficiente positividade e dos graves problemas de seu funcionamento como sistema social.

A ausente legitimação do direito é também registrada, segundo Neves, sob o signo das Constituições nominalistas (1824, 1891, 1934, 1946 e 1988), já que, também sob a vigência destas, a experiência constitucional no país foi marcada pela desconfiguração do processo de concretização de direitos, e nem a legalidade nem a constitucionalidade foram capazes de se institucionalizar “com suas consequências universalistas e includentes”, de modo que “o jogo político desenvolve-se acima e à margem da Constituição, faltando, portanto, interpenetração entre direito e política” (p. 312). Ante a profundidade e gravidade dos problemas de legitimação descritos, a tese conclui em seu último parágrafo que apenas uma reversão do quadro de exclusão dominante e massiva, mediante a afirmação da inclusão, poderia proporcionar, no Brasil, o adequado funcionamento do direito e da Constituição vistos a partir do agir e vivenciar da população (p. 313).

O constitucionalismo periférico no Brasil em perspectiva

Por sua vez, o posfácio incorporado à edição brasileira divide-se em três seções. A primeira responde a algumas críticas feitas à época e a outras mais recentes, dirigidas ao argumento da tese; a segunda analisa a repercussão da tese no reposicionamento da teoria dos sistemas de Luhmann; e, por fim, a terceira avalia a atualidade e o significado do argumento diante das mudanças pelas quais passou o Brasil desde a publicação original da obra, em 1992.

Contra o primeiro grupo de críticos5 5 . O texto cita expressamente Aldo Mascareño e Roberto Dutra. , Neves defende que sua tese adota uma abordagem construtivista segundo o paradigma sistêmico (p. 369), e que a distinção centro/periferia utilizada na obra para descrever a sociedade mundial se referencia mais nos “tipos ideais” weberianos do que na cristalização de um essencialismo do qual resulta um conceito absoluto de periferia contraposto negativamente ao de centro . A seu favor, apresenta a própria distinção luhmanniana da diferenciação por segmentação político-jurídica territorial dos Estados modernos (Neves 2015b, pp. 113 ss.) e acrescenta que o uso do termo modernidade periférica não pode ser tomado de modo teleológico, nem tampouco carrega valoração negativa em relação ao centro. A diferença centro/periferia, segundo Neves, incorpora uma descrição das diversas assimetrias estruturais da sociedade mundial sem negar-lhes a contingência em que estão circunscritas.

Afastando-se tanto do conceito de “modernidades múltiplas” de Eisenstadt quanto da noção de “sistema-mundo” de Wallerstein, a modernidade periférica descrita por Neves reconhece a alta fragmentação da sociedade mundial, mas não deixa de apontar para o fato de que a experiência colonial e pós-colonial deixou profundas assimetrias entre os países. E que essas marcas seguem presentes tanto do ponto de vista estrutural (econômico) quanto semântico (circulação de ideias) com a afirmação em nível global do capitalismo, razão pela qual entende que a distinção centro/periferia ainda é “analiticamente frutífera” (p. 376) para observar os processos de inclusão e exclusão na sociedade mundial.

Referindo a outra crítica que lhe foi dirigida mais recentemente, a de que sua obra estaria revestida por um “racismo mal disfarçado de culturalismo”, tal qual afirmou Souza (2013)SOUZA, Jessé. (2013), “Niklas Luhmann, Marcelo Neves e o ‘culturalismo cibernético’ da moderna teoria sistêmica”. In: DUTRA, Roberto & BACHUR, João Paulo (orgs.). Dossiê Niklas Luhmann. Belo Horizonte, Editora UFMG. , Neves retoma algumas das passagens da tese em que são negadas as noções de “singularidade” brasileira que estariam presentes na narrativa culturalista e conservadora do processo de modernização do Brasil (p. 379). Entre os fundamentos da resposta, já tratados neste texto, Neves atribui a seu crítico, Souza, o recurso ao culturalismo de matriz freyriana apontado no argumento da “baixa estima da ralé” presente na personalidade dos oprimidos e do “sadomasoquismo” identificado no opressor enquanto traços da permanência de uma sociedade escravocrata.

Também em contraponto a Souza, o posfácio reivindica que o binômio tradição/modernidade é apreendido criticamente segundo as contingências próprias de seu tempo, e em virtude disso a periferia é descrita sob o signo de hipermoderna em relação ao centro, já que mais complexas e contingentes. E ainda em destaque à assimetria estrutural da sociedade mundial, diversas vezes mencionada no posfácio, Neves relaciona a distinção entre centro e periferia aos processos coloniais, neocoloniais e pós-coloniais de que resultaram a exclusão massiva na periferia e o enriquecimento do centro, de onde se exportaram os ideais constitucionais de liberdade e igualdade.

Quanto à repercussão da tese sobre a teoria luhmanniana da diferenciação funcional, Neves (p. 391) articula sua crítica ao primado da diferenciação funcional considerando que, na maior parte da sociedade mundial, a exclusão se impõe. Essa distinção marca um reposicionamento de Luhmann, que a partir de então passa a segmentar zonas de inclusão e exclusão na sociedade, distinguindo integração e inclusão , sendo esta referente à “chance da consideração social de pessoas” ( Luhmann, 2007LUHMANN, Niklas. (2007), La sociedad de la sociedad. México, Herder. , p. 492).

Luhmann reconhece que o profundo grau de exclusão testa os limites da diferenciação funcional nos diversos sistemas parciais e levanta a tese de que, em tais situações, a metadiferença inclusão/exclusão assume o papel de mediatizar a operação dos códigos próprios de cada um dos sistemas parciais (Luhmann, 2007, p. 501; Luhmann, 2013LUHMANN, Niklas. (2013), “Inclusão e exclusão”. Tradução de Stefan Fornos Klein. In: BACHUR, João Paulo & DUTRA, Roberto (orgs.). Dossiê Niklas Luhmann. Belo Horizonte, Editora UFMG. ), citando expressamente a tese de Neves com referência ao funcionamento do direito no Brasil. Porém, nega que essa condição implique a eliminação total da autopoiesis do direito , afirmando que, antes disso, seria o caso da significativa insegurança de expectativas que passariam a orientar-se também segundo outros fatores sociais.

A negativa de Luhmann ao rejeitar o primado da diferenciação funcional, ainda que cogite a existência de um metacódigo inclusão/exclusão para descrever a sociedade mundial, é destacada por Neves no posfácio (p. 394), que vê como contraditória a manutenção da posição de Luhmann. A esse respeito, cabe ainda salientar que o próprio Luhmann, embora não tenha aprofundado suficientemente tal ponto, levanta a hipótese de que a gravidade do quadro de exclusão na sociedade mundial estaria dando origem a um novo sistema funcional ( Luhmann, 2007LUHMANN, Niklas. (2007), La sociedad de la sociedad. México, Herder. , p. 502), que teria como função a promoção da seguridade social e do desenvolvimento.

Ainda que faltem elementos para avaliar com maior rigor a hipótese de um sistema funcional encarregado dos problemas de exclusão na sociedade mundial – inclusive porque Luhmann não os apresenta na sua obra tardia –, nota-se que a proposta teórica poderia ser contraditória à suposição inicial da prevalência do metacódigo inclusão/exclusão como espécie de metadistinção para observar e descrever a sociedade mundial; mas teria como efeito a salvaguarda do primado da diferenciação funcional nos termos defendidos pelo próprio Luhmann, sem contraditar a tese de Neves de que a diferenciação funcional em sua forma original na teoria sistêmica teria se realizado apenas em alguns países da modernidade central.

Por sua vez, o último ponto do posfácio e do livro analisa as transformações das condições sociais com impacto político-jurídico no país desde a publicação do original (1992) e questiona se o simbolismo teria sido substituído por um quadro de degradação constitucional , ante a ruptura do modelo constitucional de 1988 sob a aparente legalidade procedimental do impeachment de Dilma Rousseff.

Ao apontar diversos indicadores sociais, Neves avalia como insuficientes os avanços do constitucionalismo democrático, com reconhecido impacto na ampliação dos direitos fundamentais, no câmbio do simbolismo constitucional prevalecente no país. Destacando a significativa redução da exclusão social nos mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Neves registra, por outro lado, a manutenção do alto grau de desigualdade típico dos países de constitucionalismo periférico.

De fato, os efeitos da exclusão permanecem refletidos nas práticas institucionais dos poderes. É nesse sentido que Neves critica parte da doutrina constitucional do pós-19886 6 . São citados os trabalhos de Virgílio Afonso da Silva, Luís Roberto Barroso, Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto. que teria se equivocado ao equalizar a judicialização da política como processo mais abrangente de juridificação da Constituição, sem considerar, contudo, a politização do Judiciário (p. 407). A judicialização privilegiaria os mesmos grupos sobreintegrados, não repercutindo decisivamente sobre a exclusão. Segundo o autor, no caso, a “articulação da linguagem constitucional pelo Judiciário não afeta de maneira fundamental as relações e práticas anticonstitucionais, mas antes forja crenças e movimentos políticos em torno do figurino constitucional” (p. 408).

Ao final do posfácio, Neves lança considerações sobre como os processos de desjuridificação da política e da desconstitucionalização do direito abriram margem para a atuação judicial fora da Constituição, em especial a partir do impeachment de Rousseff. Com referência a Palma (2018)PALMA, Maurício. (maio/ago. 2018), “As coalizões do ‘presidencialismo de coalizão’ no Brasil: a gênese legislativa na experiência constitucional de 1988”. Revista de Direito Brasileira. São Paulo, 8 (20): 408-428. , o posfácio chama atenção para o déficit reflexivo que estaria na base conceitual do chamado presidencialismo de coalizão ao destacar que, no Brasil, o regime presidencialista pós-1988 teria se constituído em grande medida de forma extrainstitucional , cujo funcionamento se caracteriza por práticas extorsivas na relação entre o Executivo e o Congresso. Tal modelo, que privilegia a interferência particularista na política através da concessão de benefícios mútuos, não satisfaz a exigência de um programa mínimo sobre o qual se poderia falar em coalizão .

Como exemplo desse arranjo, Neves qualifica o impeachment de Rousseff como um “equivalente funcional” de um golpe de Estado levado a efeito sob o apoio midiático e a colaboração, quando não a abstinência (no caso do STF), do aparato judicial. Em suas palavras, teria o Judiciário assumido instrumentalmente a diferença schmittiana “amigo/inimigo” (p. 413) em favor de setores políticos de elites tradicionais que não mais conseguiam impor seu domínio através do procedimento eleitoral. Paradoxalmente, em nome do tão propalado “combate à corrupção”, o quadro de corrupção sistêmica teria se expandido a nível tal que, além da própria ruptura do modelo simbólico de 1988, o atual cenário político-social no país indicaria a tendência à degradação constitucional , caracterizada pela radicalização da repressão policial contra movimentos sociais e minorias, e pelo desmonte das instituições e políticas públicas inclusivas nas áreas da saúde, educação e previdência, de forma a manter os privilégios dos sobreintegrados e aprofundar o quadro de exclusão dos subintegrados.

Lançar o olhar sobre a precisão dos argumentos da tese de Marcelo Neves após vinte e seis anos da sua publicação dá ao observador a vantagem de avaliar quais dos seus diagnósticos sobre a teoria dos sistemas e o constitucionalismo no Brasil se confirmaram. Por outro lado, exige de quem observa a abstenção em projetar ideias não apresentadas no trabalho, para analisar a sua adequação ou ressonância no debate constitucional e o aprendizado democrático no país durante o período.

A tese marca, de fato, um reposicionamento conceitual da diferenciação funcional na teoria sistêmica, como reconhece o próprio Luhmann no prefácio do livro, e em outros escritos em que o faz de modo menos evidente – mas com as nuances que o argumento de Neves implicou na teoria sistêmica ( Ribeiro, 2013RIBEIRO, Pedro Henrique. (out. 2013), “Luhmann ‘fora do lugar’? Como a ‘condição periférica’ da América Latina impulsionou deslocamentos na teoria dos sistemas”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 83 (28): 105-123. , pp. 105-123). Resulta igualmente claro que a crítica de Neves ao “provincianismo empírico” de Luhmann e à tese do primado da diferenciação funcional – a despeito da exclusão – contribuiu sobremaneira para a construção de uma teoria crítica dos sistemas, que vem se consolidando como um relevante campo de alargamento das fronteiras do pensamento luhmanniano, ainda quando se contrapõe ou indica limites a algumas das principais teses sistêmicas.

Quanto às conclusões de Neves, que à época apontava para o nominalismo da Constituição de 1988, cujo caráter simbólico funcionaria para ocultar a insinceridade dos donos do poder, o atual cenário político-jurídico do país parece dar razão ao argumento da tese. Se no início da vigência da Constituição apontava-se a crítica de que indicar o simbolismo do texto seria uma atitude conservadora – quando a missão dos constitucionalistas era a de ‘efetivar’ o texto e ‘dar concretude’ aos direitos de uma Constituição dirigente sob o signo da sua força normativa –, trinta anos depois se observa que a discrepância entre o texto e a realidade sociopolítica do país constituiu-se em um dos fundamentos para a instrumentalização da Constituição por agentes do sistema político e do Judiciário.

Tal quadro não só mostra a contradição do discurso neoconstitucionalista, desde sempre edificado sobre frágeis fundamentos, mas também evidencia que um certo cinismo constitucional esteve presente entre alguns de seus defensores, que logo passaram à defesa de teses conservadoras e frontalmente inconstitucionais, assim que investidos de poder para tanto7 7 . A título de exemplo, o voto do ministro Roberto Barroso, outrora defensor da “doutrina brasileira da efetividade” e da “dogmática constitucional transformadora”, no HC 152.752/PR quando se posicionou de forma diametralmente oposta ao direito fundamental à presunção de inocência invertendo o sentido da disposição do inciso LVII do art. 5° da Constituição em nome da “efetividade da justiça criminal”. No mesmo sentido, o ministro Edson Fachin que, inspirado em Alexy, destacou o conteúdo normativo do princípio da dignidade da pessoa humana, cuja “dimensão axiológica permite afirmar uma prevalência prima facie do valor dignidade a determinar toda concretização normativa” ( Fachin e Pianovski, 2008 ), mas ao votar no mesmo HC 152.752/PR, que questionava a violação à presunção de inocência, adotou a posição formalista de que caberia ao Plenário do STF rever o entendimento registrando que “mesmo sob a perspectiva dos direitos fundamentais, não verifico alteração no panorama jurídico que autorize considerar o ato coator como revelador de ilegalidade ou abuso de poder”, em decisão que contraria seus próprios escritos e o texto constitucional. . Ou seja, diante de um cenário como o atual, em que determinados interesses orientados pelo poder ou dinheiro se impõem a despeito de direitos fundamentais, o discurso garantista de juristas autodeclarados liberais ou progressistas assume seu caráter gatopardista ao preservar a secular relação de domínio entre sobreintegrados e subintegrados.

É fato que a experiência constitucional no Brasil sob a vigência da Constituição de 1988 ampliou o grau de participação popular nas deliberações estatais e viabilizou a redução da exclusão que ainda existe no país, como reconhecido por Neves. Pode-se afirmar hoje, com mais segurança do que em 1988, que a Constituição abriu diversas possibilidades de aprendizado democrático ao aperfeiçoar o procedimento eleitoral e ampliar os canais de exercício dos direitos. Mas talvez o principal questionamento do atual momento constitucional, com o qual a tese se confrontava quando concluída, nos leve a perguntar sobre o sentido da reflexão da sociedade sobre sua Constituição diante dos limites de tal experiência num país cuja estrutura social tão excludente segue distribuindo de modo tão desigual o acesso a direitos e o cumprimento de deveres.

Referências Bibliográficas

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Notas

  • 1
    . Para uma explicação do próprio Neves sobre o seu distanciamento dessa perspectiva, ver: Neves (2015a, pp. 5-27): o autor elabora uma resposta à leitura de Souza, 2013SOUZA, Jessé. (2013), “Niklas Luhmann, Marcelo Neves e o ‘culturalismo cibernético’ da moderna teoria sistêmica”. In: DUTRA, Roberto & BACHUR, João Paulo (orgs.). Dossiê Niklas Luhmann. Belo Horizonte, Editora UFMG. , que aproxima a obra de Neves e a própria teoria sistêmica de Luhmann a uma leitura culturalista e conservadora da reprodução social no Brasil.
  • 2
    . Nesse sentido, as leituras recentes de Souza (2013)SOUZA, Jessé. (2013), “Niklas Luhmann, Marcelo Neves e o ‘culturalismo cibernético’ da moderna teoria sistêmica”. In: DUTRA, Roberto & BACHUR, João Paulo (orgs.). Dossiê Niklas Luhmann. Belo Horizonte, Editora UFMG. , em linha oposta à identificada anteriormente em Souza (2000SOUZA, Jessé. (2000), A modernização seletiva: uma reinterpretação do dilema brasileiro. Brasília, Editora da Universidade de Brasília. , pp. 196 e 268) e Gonçalves (2013)GONÇALVES, Guilherme Leite. (2013), “Pós-colonialismo e teoria dos sistemas: notas para uma agenda de pesquisa sobre o direito”. In: DUTRA, Roberto Torres & BACHUR, João Paulo (orgs.). Dossiê Niklas Luhmann. Belo Horizonte, Editora UFMG. .
  • 3
    . Para um registro da diferença entre o pensamento de Neves e o pós-colonialismo, ver Dantas (2016DANTAS, Maria Eduarda. (2016), Constitucionalismo periférico e teoria dos sistemas sociais: por uma interpretação pós-colonial da tese da constitucionalização simbólica. Brasília, dissertação de mestrado em Ciência Política, Universidade de Brasília. , p. 15). Sem desprezar as diversas leituras que o conceito de pós-colonialismo adquire nas ciências sociais, aqui essa corrente é designada a partir do pensamento social latino-americano desenvolvido por Walter Mignolo. Para uma comparação entre as perspectivas de Mignolo e Souza, ver Ferreira e Simim (2017FERREIRA, Daniel & SIMIM, Thiago. (2017), “Brasil: entre la modernidad alternativa y la alternativa a la modernidad”. Íconos: Revista de Ciencias Sociales, 57: 79-93. , pp. 79-93).
  • 4
    . Holanda, [1936] 2013, pp. 145-146; Faoro, [1958] 1977, pp. 733 ss.
  • 5
    . O texto cita expressamente Aldo Mascareño e Roberto Dutra.
  • 6
    . São citados os trabalhos de Virgílio Afonso da Silva, Luís Roberto Barroso, Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto.
  • 7
    . A título de exemplo, o voto do ministro Roberto Barroso, outrora defensor da “doutrina brasileira da efetividade” e da “dogmática constitucional transformadora”, no HC 152.752/PR quando se posicionou de forma diametralmente oposta ao direito fundamental à presunção de inocência invertendo o sentido da disposição do inciso LVII do art. 5° da Constituição em nome da “efetividade da justiça criminal”. No mesmo sentido, o ministro Edson Fachin que, inspirado em Alexy, destacou o conteúdo normativo do princípio da dignidade da pessoa humana, cuja “dimensão axiológica permite afirmar uma prevalência prima facie do valor dignidade a determinar toda concretização normativa” ( Fachin e Pianovski, 2008FACHIN, Luiz Edson & PIANOVSKI, Carlos Eduardo. (2008), “A dignidade da pessoa humana no direito contemporâneo: uma contribuição à crítica da raiz dogmática do neopositivismo constitucionalista”. Revista Trimestral de Direito Civil, 35 (9): 101-119. ), mas ao votar no mesmo HC 152.752/PR, que questionava a violação à presunção de inocência, adotou a posição formalista de que caberia ao Plenário do STF rever o entendimento registrando que “mesmo sob a perspectiva dos direitos fundamentais, não verifico alteração no panorama jurídico que autorize considerar o ato coator como revelador de ilegalidade ou abuso de poder”, em decisão que contraria seus próprios escritos e o texto constitucional.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    6 Set 2018
  • Aceito
    22 Jan 2020
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