Acessibilidade / Reportar erro

Vírus em viagem. Fluxos turísticos globais e propagação pandêmica da Covid-191 1 Trabalho desenvolvido como membro integrado do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento (Cetrad-Utad), entidade financiada por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, i. p., no âmbito do projeto UIDB/04011/2020, e colaborador do Centro em Rede de Investigação em Antropologia (Cria), instituição financiada pela FCT no quadro do projeto UIDB/04038/2020.

Virus on the move: global tourist flows and the Covid-19 pandemic

Resumo

Na relação com a Covid-19, o turismo é referenciado sobretudo como uma esfera socioeconômica severamente afetada, não sendo dado o devido relevo ao seu papel enquanto componente do sistema de condições que desencadeou a pandemia. Perante esta situação, a análise desenvolvida é orientada pelo intuito de perceber como os processos de massificação turística e a abrangente rede de transporte aéreo que pressupõem, gerando conectividades, trânsitos e velocidade sistêmica, contribuíram para a súbita globalização do SARS-CoV-2. Para tal são mobilizados dados resultantes de um processo de pesquisa de teor documental em fontes mediáticas, fontes associadas a grandes instituições internacionais de natureza intergovernamental e fontes científicas. A partir desses dados é possível depreender-se que os contextos turísticos e as respectivas estruturas de mobilidade são o resultado de complexas assemblagens mais- do-que-humanas nas quais emergem condições sociais, ambientais e tecnológicas que funcionam como poderosos vetores estruturais de rápida difusão transnacional de biocontaminantes, responsáveis, em alguns casos, por cenários pandêmicos como aquele em que vivemos desde março de 2020.

Palavras-chave:
Fluxos turísticos; Transporte aéreo; Globalização viral; Covid-19

Abstract

In the relationship with Covid-19, tourism is mainly referred as a severely affected socio-economic sphere. Its role as a component of the system of conditions that triggered the pandemic is not given due prominence. In light of this situation, the analysis is guided by the aim of understanding how the tourism massification and the extensive air transport network that it requires, generating connectivity, transits and systemic speed, contributed to the sudden globalization of SARS-CoV-2. To this end, data are mobilised from documentary research in different sources: media, sources associated with intergovernmental international institutions, and scientific sources. From these data it is possible to deduce that tourist contexts and their mobility structures are the result of complex more-than-human assemblages in which social, environmental and technological conditions emerge, functioning as powerful structural vectors of rapid transnational diffusion of biocontaminants responsible, in some cases, for pandemic scenarios like the one we have been living in since March 2020.

Keywords:
Tourist flows; Air transport; Viral globalisation; Covid-19

Introdução

De 1950 para 2019, o volume anual de turistas internacionais aumentou exponencialmente de 25,3 milhões para 1,460 mil milhões (World Tourism Organization, WTO, 2021World Tourism Organization (2021), International tourism highlights, 2020 edition. Madri, WTO.). Ano após ano, essa progressão foi, de um modo geral, celebrada sob a aura do sucesso e com a expetativa de ter apenas o céu como limite. Apesar das politicamente corretas palavras da ordem sobre responsabilidade e sustentabilidade, o desígnio do crescimento desenfreado prevaleceu (Higgins-Desbiolles et al., 2019Higgins-Desbiolles, F.; Carnicelli, S.; Krolikowski, C.; Wijesinghe, G. & Boluk, K. (2019), “Degrowing tourism: rethinking tourism”. Journal of Sustainable Tourism , 27 (12): 1926-1944. ), não sendo prestada a devida atenção aos múltiplos riscos decorrentes da acentuada expansão global do turismo de massas. Alguns desses riscos situam-se na esfera da biossegurança e da saúde pública, com especial destaque para a dispersão de novas doenças infectocontagiosas (Hall, 2015Hall, C. M. (2015), “Tourism and biological exchange and invasions: a missing dimension in sustainable tourism?” Tourism Recreation Research, 40 (1): 81-94. ; Chen, Law e Zhang, 2021 Chen, S.; Law, R. & Zhang, M. (2021), “Review of research on tourism-related diseases”. Asia Pacific Journal of Tourism Research, 26 (1): 44-58. ). A Covid-19 é o exemplo mais recente e trágico de um risco epidemiológico há muito anunciado, que, entretanto, se concretizou. Na relação com esta pandemia, o turismo é apresentado como um dos setores mais severamente afetados (Organização das Nações Unidas - ONU, 2020Organização das Nações Unidas (2020), “Policy brief: Covid-19 and transforming tourism”. https://unsdg.un.org/sites/default/files/2020-08/sg_policy_brief_covid-19_ tourism_august_2020.pdf.
https://unsdg.un.org/sites/default/files...
; Sharma e Nicolau, 2020Sharma, A. & Nicolau, J. (2020), “An open market valuation of the effects of Covid-19 on the travel and tourism industry”. Annals of Tourism Research , 83: 10299.; Uğur e Akbıyık, 2020Uğur, N. & Akbiyik, A. (2020), “Impacts of Covid-19 on global tourism industry: a cross-regional comparison”. Tourism Management Perspectives, 36: 100744.). Ao mesmo tempo tende a secundarizar-se a precedência de um outro e ainda mais importante nexo de causalidade: o papel do turismo na súbita globalização do SARS-CoV-2 (Brito-Henriques, 2020Brito-Henriques, E. (2020), “Covid-19, turismo e sustentabilidade: tudo está interligado”. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, 55 (115): 205-210.; Iaquinto, 2020Iaquinto, B. (2020), “Tourist as vector: viral mobilities of Covid-19”. Dialogues in Human Geography, 10 (2): 174-177.).

Além das vítimas e dos impactos nos serviços de saúde, os efeitos econômicos negativos são um dos mais proeminentes tópicos de discussão em torno da Covid-19. Com este imediatismo materialista é relegada para segundo plano a necessária reflexão sobre a etiologia estrutural da doença. É bastante provável, por isso, o perigo do regresso ao business as usual e à velha normalidade da insustentabilidade, mal se ultrapasse a tempestade sanitária global (Hall, Scott e Gössling, 2020Hall, C. M.; Scott, D. & Gössling, S. (2020), “Pandemics, transformations and tourism: be careful what you wish for”. Tourism Geographies, 22 (3): 577-598. ; Ioannides e Gyimóthy, 2020Ioannides, D. & Gyimóthy, S. (2020), “The Covid-19 crisis as an opportunity for escaping the unsustainable global tourism path”. Tourism Geographies , 22 (3): 624-632.). Perante este cenário, procuro aqui olhar a montante e analisar o turismo (e as conectividades que o sustentam) como fenômeno relevante no complexo de causas de propagação inicial do SARS-CoV-2, ou seja, como uma esfera que, antes de sentir os graves efeitos da pandemia, contribuiu decisivamente para essa mesma pandemia. O principal intuito é perceber como os processos de massificação turística, em especial a quantidade, celeridade e capilaridade dos fluxos transnacionais de pessoas que pressupõem, configuram ecologias de risco epidemiológico e, no caso específico do novo coronavírus, constituíram poderosos vetores sociais de difusão viral à escala global (Iaquinto, 2020Iaquinto, B. (2020), “Tourist as vector: viral mobilities of Covid-19”. Dialogues in Human Geography, 10 (2): 174-177.). Neste exercício presto especial atenção à velocidade, em particular à que advém do transporte aéreo, como geradora de uma aceleração do tempo que comprime o espaço (Harvey, 1992Harvey, D. (1992), Condição pós-moderna. São Paulo, Edições Loyola.; Virilio, 2000Virilio, P. (2000), A velocidade de libertação. Lisboa, Relógio d’Água.) e densifica a rede de conexões globais, proporcionando circulações massivas e céleres, nomeadamente de pessoas e vírus.

A larga maioria dos dados que sustenta a análise resulta de um processo de pesquisa de teor documental em fontes mediáticas, fontes associadas a grandes instituições internacionais de natureza intergovernamental e fontes científicas. Nas primeiras recorri a jornais on-line de vários países, que consultei regularmente de janeiro de 2020 a junho de 2021, procurando sempre triangular os conteúdos de diferentes fontes jornalísticas para aferir a fiabilidade dos fatos noticiados. Nas segundas acedi sobretudo à chamada grey literature: relatórios, documentos de orientação política e/ou dados estatísticos de entidades de referência, como a Organização Mundial do Turismo (OMT), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a International Civil Aviation Organization (Icao). Por último, utilizei fontes científicas como repositórios de material empírico em segunda mão, coletado e sistematizado por terceiros seguindo procedimentos de investigação pertinentes. Os elementos recolhidos nestes três tipos de fontes foram organizados em torno de quatro grandes eixos temáticos: fluxos, tráfego aéreo e conectividade internacional; mobilidades turísticas; surtos de Covid-19 associados ao turismo; dispersão transnacional do SARS-CoV-2. Quase em simultâneo foi possível começar a estabelecer relações entre os diferentes elementos deste corpo de dados e a esboçar uma perspectiva integrada sobre a configuração dos trânsitos turísticos globais e a rápida constituição da pandemia de Covid-19.

Velocidade, conectividade e globalização microbiológica

Desde finais do século XVIII, com a industrialização, as atividades humanas têm sido, progressivamente, as grandes responsáveis pelos efeitos mais profundos e determinantes nos sistemas terrestres, dando origem ao que se considera ser já uma nova época geológica: o antropoceno (Crutzen, 2002Crutzen, P. (2002), “Geology of mankind: the Anthropocene”. Nature, 415: 23. ; Crutzen e Stoermer, 2000Crutzen, P. & Stoermer, E. (2000), “The Anthropocene”. Global Change Newsletter, 41: 17-18. ). A força desses impactos do homem tem-se acentuado de forma vertiginosa a partir de meados do século XX, com vincadas mudanças ecológicas e socioeconômicas globais que configuram um processo transversal de “grande aceleração”, marcado pela crescente celeridade e volume das atividades produtivas, dos transportes, das mobilidades e comunicações internacionais, bem como pelo consequente incremento do consumo de recursos, poluição, destruição de ecossistemas e desigualdades sociais (Steffen e Crutzen, 2007 Steffen, W.; Crutzen, P. & Mcneill, J. (2007), “The Anthropocene: are humans now overwhelming the great forces of Nature ?”. Ambio, 36 (8): 614-621.; McNeill e Engelke, 2016Mcneill, J. & Engelke, P. (2016), The great acceleration: an environmental history of the Anthropocene since 1945. Cambridge, Harvard University Press. ; Green, 2020Green, M. (2020), “Emerging diseases, re‐emerging histories”. Centaurus, 62: 234-247. ).

Movido por um frenesim de novas tecnologias que reduzem barreiras, fricções e dispêndios de tempo, o mundo está cada vez mais rápido e interconectado, ao mesmo tempo que a velocidade, amplamente venerada, afirma a sua omnipresença na vida cotidiana (Virilio, 2000Virilio, P. (2000), A velocidade de libertação. Lisboa, Relógio d’Água.; Colvile, 2016Colvile, R. (2016), The great acceleration: how the world is getting faster, faster. Nova York, Bloomsbury.). No quadro dessa grande aceleração estrutural, os fluxos de pessoas, bens, serviços, capital e dados intensificam-se, gerando uma poderosa cinética sistêmica impulsionadora de redes transnacionais densamente intrincadas (Castells, 1996Castells, M. (1996), The rise of the network society. Oxford, Blackwell.; Holton, 2008Holton, R. (2008), Global networks. Basingstoke e Nova York, Palgrave Macmillan.). Fruto desses fluxos e dos seus impactos nos sistemas socioecológicos, ganham forma condições propícias à ocorrência de surtos epidêmicos. Faz sentido, por isso, lembrar uma ideia do período pasteuriano: “‘o micróbio não é nada; o terreno, tudo’. Nós humanos somos o terreno” (Green, 2020Green, M. (2020), “Emerging diseases, re‐emerging histories”. Centaurus, 62: 234-247. , p. 244)2 2 No original: “‘the microbe is nothing; the terrain, everything’. We humans are the terrain”. . Com efeito, somos nós, com as nossas tecnologias, atividades, estilos de vida e mobilidades, que suscitamos as possibilidades de transmissão de muitos micro-organismos e criamos as redes de fluxos através das quais se poderão propagar globalmente. Aliás, a (re)emergência de doenças infecciosas nos últimos cinquenta anos (Brown, Armelagos e Maes, 2011 Brown, P.; Armelagos, G. & Maes, K. (2011), “Humans in a world of microbes: the anthropology of infectious disease”. In: Singer, M.; Erickson, P. (eds.), A companion to medical anthropology. Malden, Wiley-Blackwell, pp. 253-270.) é um produto das profundas mudanças sociotécnicas que têm alterado as dinâmicas dos ecossistemas. Dentre os muitos fatores antropogênicos que podem originar processos de disseminação microbiológica em larga escala, destacam-se as redes globais de transporte e os respectivos padrões de viagem, nomeadamente o transporte aéreo e as mobilidades turísticas (Brown et al., 2016 Brown, A.; Ahmad, S.; Beck, C. & Nguyen-Van-Tam, J . (2016), “The roles of transportation and transportation hubs in the propagation of influenza and coronaviruses: a systematic review”. Journal of Travel Medicine, 23 (1): tav002. ; Iaquinto, 2020Iaquinto, B. (2020), “Tourist as vector: viral mobilities of Covid-19”. Dialogues in Human Geography, 10 (2): 174-177.; Gössling, Scott e Hall, 2021 Gössling, S.; Scott, D. & Hall, C. M. (2021), “Pandemics, tourism and global change: a rapid assessment of Covid-19”. Journal of Sustainable Tourism, 29 (1): 1-20.).

Graças aos extraordinários progressos nos transportes, a mobilidade humana registrou um incremento superior a mil vezes nos países mais prósperos desde o século xix (Tatem, 2014 Tatem, A. (2014), “Mapping population and pathogen movements”. International Health, 6 (1): 5-11.). O advento da aviação comercial a jato em meados do século XX foi determinante, reduzindo drasticamente o tempo das deslocações e ligando em algumas horas destinos longínquos, antes separados por dias ou semanas de viagem. Esse efeito de aceleração e a conectividade transnacional daí resultante foram assumindo maior expressão à medida que o transporte aéreo se expandiu por todo o globo, passou a ser economicamente acessível a grande parte das pessoas e se beneficiou de sucessivos avanços tecnológicos e organizacionais que o tornaram ainda mais rápido. No final da década de 1960 viajaram em voos comerciais cerca de 160 milhões de pessoas (Baker, 2015Baker, D. (2015), “Tourism and the health effects of infectious diseases: are there potential risks for tourists?”. International Journal of Safety and Security in Tourism/Hospitality, 1 (12): 1-17. ). Desde então, esse valor tem aumentado, em média, quase 9% ao ano, atingindo os 2,9 biliões de passageiros em 2012 (Baker, 2015Baker, D. (2015), “Tourism and the health effects of infectious diseases: are there potential risks for tourists?”. International Journal of Safety and Security in Tourism/Hospitality, 1 (12): 1-17. ) e os 4,4 biliões em 2019 (Icao, 2019aInternational Civil Aviation Organization (2019a), “Presentation of 2019 air transport statistical results”. https://www.icao.int/annual-report-2019/Documents/ arc_2019_Air %20Transport%20Statistics.pdf.
https://www.icao.int/annual-report-2019/...
). Imediatamente antes da Covid-19, o tráfego aéreo internacional ligava 4.041 cidades de quase todos os países do mundo, compondo uma densa teia de 31.537 rotas com quase 40 milhões de voos anuais (Icao, 2019bInternational Civil Aviation Organization (2019b), “New traffic flow 2019 OAG data”. https://gis.icao.int/gallery/trafficflow2019zoOMSimpop.pdf.
https://gis.icao.int/gallery/trafficflow...
). Neste emaranhado de ligações destacavam-se, inequivocamente, a América do Norte (sobretudo os Estados Unidos), a Europa e a Ásia Oriental (em particular a China), com mais aeroportos, volumes de tráfego superiores, rotas mais diversificadas e maior frequência de voos.

Os mapas aeronáuticos de 2019 são praticamente um fac-símile dos mapas relativos à propagação e incidência global dos contágios por SARS-CoV-2. Fazendo, justamente, a comparação entre o tráfego aéreo em dezembro de 2019 e a situação da Covid-19 em março de 2020, Castilho (2020Castilho, D. (2020), “Um vírus com DNA da globalização: o espectro da perversidade”. Espaço e Economia, 17: 1-7. ) salienta a sobreposição quase simétrica entre a circulação internacional de aviões e de vírus, concluindo que este último é um micro-organismo urbano, de redes e com o adn da globalização. Pode, portanto, depreender-se que a estrutura sociotécnica de mobilidade (maioritariamente turística) proporcionada pelo transporte aéreo teve um papel muito relevante na rapidez dos fluxos de contágio e na sua distribuição geográfica, em especial na fase mais inicial da pandemia (Cândido et al., 2020 Cândido, D. et al. (2020), “Routes for Covid-19 importation in Brazil”. Journal of Travel Medicine , 27 (3): 1-3. ; Lau et al., 2020Lau, H. et al. (2020), “The association between international and domestic air traffic and the coronavirus (Covid-19) outbreak”. Journal of Microbiology, Immunology and Infection, 53 (3): 467-472.; Pavli et al., 2020Pavli, A. et al. (2020), “In-flight transmission of Covid-19 on flights to Greece: an epidemiological analysis”. Travel Medicine and Infectious Disease , 38: 101882. ; Sokadjo e Atchadé, 2020Sokadjo, Y.; Atchadé, M. (2020), “The influence of passenger air traffic on the spread of Covid-19 in the world”. Transportation Research Interdisciplinary Perspectives, 8: 100213.). Esta constatação não vale somente para a Covid-19. Desde a década de 1970, os surtos de gripe aviária e suína, síndrome respiratória aguda (Sars), síndrome respiratória do Médio Oriente (Mers), dengue, zika, chikungunya, entre outros, têm deixado evidente o papel decisivo das viagens de avião, sobretudo entre grandes cidades, na disseminação de infecções (re)emergentes (Ali e Keil, 2008Ali, S. & Keil, R. (eds.). (2008), Networked disease: emerging infections in the global city. Chichester, Blackwell. ; Chen e Wilson, 2008 Chen, L. & Wilson, M. (2008), “The role of the traveler in emerging infections and magnitude of travel”. The Medical Clinics of North America, 92 (6): 1409-1432. ; Khan et al., 2009Khan, K. et al. (2009), “Spread of a novel influenza a (h1n1) virus via global airline transportation”. The New England Journal of Medicine, 361: 212-214. ; Brockmann e Helbing, 2013Brockmann, D. & Helbing, D. (2013), “The hidden geometry of complex, network-driven contagion phenomena”. Science, 342 (6164): 1337-1342. ; Tatem, 2014 Tatem, A. (2014), “Mapping population and pathogen movements”. International Health, 6 (1): 5-11.; Baker, 2015Baker, D. (2015), “Tourism and the health effects of infectious diseases: are there potential risks for tourists?”. International Journal of Safety and Security in Tourism/Hospitality, 1 (12): 1-17. ; Findlater e Bogoch, 2018Findlater, A. & Bogoch, I. (2018), “Human mobility and the global spread of infectious diseases: a focus on air travel”. Trends in Parasitology, 34 (9): 772-783.; Lupton, 2021Lupton, D. (2021), “Contextualising Covid-19: sociocultural perspectives on contagion”. In: Lupton, D. & Willis, K. (eds.). The Covid-19 crisis: social perspectives. Londres, Routledge, pp. 14-24.). Cabe lembrar aqui as reflexões de Virilio (2005Virilio, P. (2005), L’accident originel. Paris, Galilée.) sobre o “tempo acidental”, produzido pelos avanços tecnológicos, e as ideias de Beck (1999Beck, U. (1999), World risk society. Malden, Polity Press. ) sobre a emergência de uma world risk society, impulsionada por processos de modernização, globalização e individualização.

A estreita relação entre a conectividade aérea e as dinâmicas epidemiológicas tem sido alvo de um crescente interesse de investigação. Nos últimos anos destaca-se a pesquisa desenvolvida pela equipa de Dirk Brockmann, físico do Instituto de Biologia Teórica da Humboldt University (HU) e do Instituto Robert Koch (Berlim). Os seus trabalhos mostram-nos que a rede mundial de conexões aeroportuárias sobrepõe-se a qualquer outro fator (incluindo a distância física) em termos de influência na configuração de uma pandemia (Brockmann, 2018Brockmann, D. “Human mobility, networks and disease dynamics on a global scale”. In: Bunde, A.; Caro, J.; Kärger, J. & Vogl, G. (2018), (eds.), Diffusive spreading in nature, technology and society. Cham, Springer, pp. 375-396.; Brockmann e Helbing, 2013Brockmann, D. & Helbing, D. (2013), “The hidden geometry of complex, network-driven contagion phenomena”. Science, 342 (6164): 1337-1342. ). Por via da relativização da geografia e da adoção da referência da “distância efetiva”, calculada em função das ligações aéreas, a pesquisa liderada por Brockmann demonstra que os contágios seguem padrões concêntricos, reproduzindo a maior ou menor proximidade entre diferentes contextos ditada pela acessibilidade aérea. Permite, ainda, perceber que, afinal, os padrões pandêmicos não mudaram muito nos últimos quinhentos anos: continuam a ser concêntricos (pautados pela proximidade relativa, não quilométrica, dos lugares), embora agora a sua evolução registre, como é óbvio, um ritmo de progressão incomparavelmente maior.

O transporte aéreo massificado configura, intrinsecamente, condições propícias ao contágio, pois implica grandes concentrações de pessoas, espaços fechados e muitos desafios sanitários (v.g., filtragem do ar e limpeza nos aviões), gerando riscos acrescidos em termos de transmissão direta de agentes infecciosos e de transmissão indireta através de fômites (Chen e Wilson, 2008 Chen, L. & Wilson, M. (2008), “The role of the traveler in emerging infections and magnitude of travel”. The Medical Clinics of North America, 92 (6): 1409-1432. ; Brown et al., 2016 Brown, A.; Ahmad, S.; Beck, C. & Nguyen-Van-Tam, J . (2016), “The roles of transportation and transportation hubs in the propagation of influenza and coronaviruses: a systematic review”. Journal of Travel Medicine, 23 (1): tav002. ; Grout et al., 2017Grout, A.; Howard, N.; Coker, R. & Speakman, E. (2017), “Guidelines, law, and governance: disconnects in the global control of airline-associated infectious diseases”. The Lancet Infectious Diseases, 17 (4): e118-e122. ). Pode, ainda, facilitar a circulação de vetores infecciosos de arbovírus, como os mosquitos Aedes aegypti, Anopheles e Aedes albopictus (Kraemer et al., 2015Kraemer, M. et al. (2015), “The global distribution of the arbovirus vectors Aedes aegypti and Ae. Albopictus”. eLife, 4: e08347.; Wilson, 2020Wilson, M. (2020), “What goes on board aircraft? Passengers include Aedes, Anopheles, 2019-nCoV, Dengue, Salmonella, Zika, et al.”. Travel Medicine and Infectious Disease , 33: 101572.). Essas situações de risco epidemiológico suscitam ainda maior apreensão se considerarmos que o mercado da aviação civil é muito competitivo e encontra-se, em especial nas últimas duas décadas, bastante condicionado pela acentuada redução dos preços das viagens por parte das chamadas companhias aéreas low cost, o que poderá conduzir a uma menor disponibilidade financeira para investir em recursos e medidas de segurança sanitária.

Não só pelas condições materiais do próprio transporte, como também pela diversidade de itinerários dos muitos viajantes que se cruzam nos aeroportos e nos aviões, a estrutura aérea de mobilidade representa um poderoso macrovetor tecnológico de amplificação e aceleração de contágios (Brown et al., 2016 Brown, A.; Ahmad, S.; Beck, C. & Nguyen-Van-Tam, J . (2016), “The roles of transportation and transportation hubs in the propagation of influenza and coronaviruses: a systematic review”. Journal of Travel Medicine, 23 (1): tav002. ). Como destacam Findlater e Bogoch (2018Findlater, A. & Bogoch, I. (2018), “Human mobility and the global spread of infectious diseases: a focus on air travel”. Trends in Parasitology, 34 (9): 772-783., p. 772), “é agora possível para um viajante que se encontra infectado num determinado local da Terra viajar para qualquer outro ponto do planeta em apenas um-dois dias”3 3 No original: “it is now possible for a traveler harboring an infection in one location on earth to travel to virtually any other point on the planet in only 1-2 days”. . A descrição que se segue, referente ao que pode ter sido o paciente zero de Covid-19 na França, é ilustrativa dessa compressão do tempo dos processos de contágio e do papel decisivo dos transportes aéreos:

Um estudo de cientistas franceses sugere que o coronavírus já circulava no país no final de dezembro [2019], depois de ter sido diagnosticado, a posteriori, um paciente que havia sido internado no hospital em 27 de dezembro, quase um mês antes de a França confirmar os seus primeiros casos. […] Hammar disse que, quando adoeceu no ano passado, com tosse seca, fadiga e febre, pensou que tinha gripe. Nesse momento, os médicos não puderam diagnosticar o coronavírus. “Fiquei surpreso”, disse ele depois de os médicos lhe dizerem, meses mais tarde, que havia sido infectado pelo Covid-19. Agora está totalmente recuperado e ressalva que não viajou para o exterior nos meses anteriores à doença, e que não sabe onde poderia ter sido infectado. A sua esposa trabalha numa loja perto de um aeroporto de Paris e frequentemente entra em contato com viajantes estrangeiros (El Mundo, 2020El Mundo (2020), “El caso de Covid-19 detectado en Francia a finales de diciembre podría dar nuevas pistas sobre el origen de la pandemia”. http://www.elmundo.es/ciencia-salud/salud/2020/05/05/5eb19dcefc6c8314388b4610.html.
http://www.elmundo.es/ciencia-salud/salu...
)4 4 No original: “Un estudio de científicos franceses sugiere que el coronavirus ya circulaba en el país a finales de diciembre [2019], después de haber diagnosticado a posteriori a un paciente que ingresó en un hospital el 27 de diciembre, casi un mes antes de que Francia confirmara sus primeros casos.[…] Hammar ha dicho que cuando cayó enfermo el año pasado [2019] con tos seca, fatiga y fiebre, pensó que tenía gripe. Los médicos en ese momento no pudieron diagnosticar el coronavirus. “Me sorprendió”, ha señalado después de que los médicos le dijeran meses más tarde que había sido contagiado de Covid-19. Ahora está totalmente recuperado y señala que no viajó al extranjero los meses antes de caer enfermo, y que no sabe dónde pudo haberse infectado. Su esposa, señala, que ella trabaja en un comercio minorista cerca de un aeropuerto de París y que con frecuencia entra en contacto con viajeros extranjeros”. .

Mesmo já numa fase mais avançada da pandemia e após a adoção de diversas medidas restritivas tendo em vista mitigar a disseminação do vírus, o transporte aéreo continuou a ser responsável por infeções, como aconteceu, por exemplo, nos dois casos seguintes: (i) um voo para a Irlanda em meados de 2020 desencadeou um surto com 59 infectados (13 contágios diretos e 46 indiretos), embora o avião transportasse apenas 49 pessoas (17% da sua lotação) (Murphy et al., 2020Murphy, N. et al. (2020), “A large national outbreak of Covid-19 linked to air travel, Ireland, summer 2020”. Eurosurveillance, 25 (42): 2001624. ); (ii) em setembro de 2020, um voo de 18 horas de Dubai para a Nova Zelândia originou pelo menos quatro contágios a bordo, apesar de o número de passageiros ter sido limitado a cerca de um quarto da capacidade máxima de transporte (Swadi et al., 2021Swadi, T. et al. (2021), “Genomic evidence of in-flight transmission of SARS-CoV-2 despite predeparture testing”. Emerging Infectious Diseases, 27 (3): 687-693.).

O avião é, indiscutivelmente, um dos grandes aceleradores dos processos epidemiológicos. A “velocidade viral” é um produto das “infraestruturas de conexão”, como os transportes, sendo que se expressa em função do número de infeções ao longo do tempo e inscreve-se na própria ontogenia do vírus: maior velocidade equivale a mutações mais frequentes (Nguyen, 2017 Nguyen, V.-K. (2017), “Viral speed: infrastructure, connectivity, ontogeny; or, notes on the molecular epidemiology of epidemics”. Cultural Anthropology, 32 (1): 28-34.). Considerando a progressão temporal dos contágios e as estimativas de muitos milhares de mutações genéticas, o SARS-CoV-2 pode ser considerado um vírus veloz. No período de pouco mais de um mês após a sua sinalização, já circulava de forma significativa em vários países europeus e logo depois nos Estados Unidos. No dia 11 de março de 2020, a OMS declarava a situação de pandemia e no dia 25 de março, além do continente europeu, mais de 150 países um pouco por todo o mundo já registravam casos da doença (ECDC, 2020European Centre For Disease Prevention and Control (2020), “Timeline of ECDC’s response to Covid-19”. https://www.ecdc.europa.eu/en/covid-19/timeline-ecdc-response.
https://www.ecdc.europa.eu/en/covid-19/t...
). Essa rápida expansão microbiológica é mais uma das múltiplas manifestações das dinâmicas de globalização (Fidler, 2004Fidler, D. (2004), Sars: governance and the globalization of disease. Nova York, Palgrave Macmillan. ; Wolf, 2015Wolf, M. (2015), “Is there really such a thing as ‘one health’? Thinking about a more than human world from the perspective of cultural anthropology”. Social Science & Medicine, 129: 5-11.; Arrizabalaga, 2016 Arrizabalaga, J. (2016), “The global threat of (re)emerging diseases: contesting the adequacy of biomedical discourse and practice”. In: Davis, J. & Gonzalez, A. (eds.). To fix or to heal: patient care, public health, and the limits of biomedicine. Nova York, New York University Press, pp. 177-207.; Lupton, 2021Lupton, D. (2021), “Contextualising Covid-19: sociocultural perspectives on contagion”. In: Lupton, D. & Willis, K. (eds.). The Covid-19 crisis: social perspectives. Londres, Routledge, pp. 14-24.), constituindo uma networked disease (Ali e Keil, 2008Ali, S. & Keil, R. (eds.). (2008), Networked disease: emerging infections in the global city. Chichester, Blackwell. ) ou, nas palavras de Richardson (2020Richardson, E. (2020), “Pandemicity, Covid-19 and the limits of public health ‘science’”. BMJ Global Health, 5: e002571. ), uma “pandemicidade”: a conexão da humanidade através do contágio.

O turismo e a rápida disseminação mundial do SARS-CoV-2

As densas redes de conectividade e a velocidade de trânsito proporcionadas pela aviação comercial constituem as principais condições tecnológicas da crescente expansão geográfica e massificação do turismo, tornando-o no tipo de mobilidade global de pessoas com maior expressão. Considerando o total mundial de chegadas internacionais ao longo de 2019, 55% de pessoas referiram o “lazer, recreação e férias” como justificação da viagem, e 28% identificaram razões de saúde (incluindo-se aqui o turismo de saúde), motivos de natureza religiosa (turismo religioso) e a visita a amigos e familiares (turismo VFR), sendo o avião o principal meio de transporte usado por 59% desses viajantes (WTO, 2021World Tourism Organization (2021), International tourism highlights, 2020 edition. Madri, WTO.). Por via dessas mobilidades transnacionais, tem vindo a ganhar forma um global tourism ecumene (Antonescu e Stock, 2014Antonescu, A. & Stock, M. (2014), “Reconstructing the globalisation of tourism: a geo-historical perspective”. Annals of Tourism Research, 45C (1): 77-88. ) - pontuado por frequentes situações de saturação dos destinos (over-tourism) (Koens, Postma e Papp, 2018Koens, K.; Postma, A. & Papp, B. (2018), “Is overtourism overused? Understanding the impact of tourism in a city context”. Sustainability, 10 (12): 2-15.; Milano, Cheer e Novelli, 2019Milano, C.; Cheer, J. & Novelli, M. (eds.) (2019), Overtourism: excesses, discontents and measures in travel and tourism. Wallingford e Boston, Cabi. ) -, de que resultam riscos de diversa ordem para os turistas e os respectivos contextos de origem e de destino, nomeadamente em termos de biossegurança e saúde pública (Gössling, 2002Gössling, S. (2002), “Global environmental consequences of tourism”. Global Environmental Change, 12 (4): 283-302.; Richter, 2003Richter, L. (2003), “International tourism and its global public health consequences”. Journal of Travel Research , 41 (4): 340-347. ; Wilson, 2003Wilson, M. (2003), “The traveller and emerging infections: sentinel, courier, transmitter”. Journal of Applied Microbiology, 94: 1S-11S.; Hall e Baird, 2013Hall, C. M. & Baird, T. (2013), “Ecotourism, biological invasions and biosecurity”. In: Ballantyne, R.; Packer, J. (eds.), International handbook on ecotourism. Cheltenham e Northampton, Edward Elgar, pp. 66-77.; Hall, 2019 Hall, C. M. (2019), “Biological invasion, biosecurity, tourism, and globalization”. In: Dallen, T. (ed.), Handbook of globalisation and tourism. Cheltenham e Northampton, Edward Elgar, pp. 114-125.). Dependendo dos lugares visitados, das atividades aí realizadas, das condições de alojamento, dos tipos de transporte utilizados e de muitas outras variáveis, o turismo “tem o potencial para se tornar um dos mais destacados vetores de biocontaminantes na Terra” (Hall, 2019 Hall, C. M. (2019), “Biological invasion, biosecurity, tourism, and globalization”. In: Dallen, T. (ed.), Handbook of globalisation and tourism. Cheltenham e Northampton, Edward Elgar, pp. 114-125., p. 114)5 5 No original: “has the potential to become one of the most salient vectors of bio-contaminants on Earth”. .

Além de o corpo dos turistas funcionar como potencial veículo de intercâmbios biológicos, os transportes, a bagagem, o calçado e vestuário, os alimentos, entre outros elementos materiais, podem também constituir-se como influentes meios de dispersão geográfica de agentes bióticos entre as áreas de proveniência, de trânsito e de destino dos fluxos turísticos (Hall, 2019 Hall, C. M. (2019), “Biological invasion, biosecurity, tourism, and globalization”. In: Dallen, T. (ed.), Handbook of globalisation and tourism. Cheltenham e Northampton, Edward Elgar, pp. 114-125.; Melly e Hanrahan, 2021 Melly, D.; Hanrahan, J. (2021), “Tourism biosecurity risk management and planning: an international comparative analysis and implications for Ireland”. Tourism Review, 76 (1): 88-102. ). A par dessa responsabilidade direta por via do movimento de pessoas e bens, a contribuição do turismo para a difusão de agentes bióticos faz-se ainda de forma indireta, pois as atividades turísticas tendem a implicar a dependência de sistemas industriais de produção de alimentos - propícios a surtos de doenças zoonóticas (Graham et al., 2008Graham, J. et al. (2008), “The animal-human interface and infectious disease in industrial food animal production: rethinking biosecurity and biocontainment”. Public Health Reports, 123 (3): 282-299.) -, a invasão de habitats de vida selvagem e a emissão de poluentes responsáveis por alterações climáticas que disturbam os ecossistemas (Gössling, Scott e Hall, 2021 Gössling, S.; Scott, D. & Hall, C. M. (2021), “Pandemics, tourism and global change: a rapid assessment of Covid-19”. Journal of Sustainable Tourism, 29 (1): 1-20.).

No que diz especificamente respeito ao papel mais imediato do turismo na propagação de doenças infectocontagiosas (re)emergentes, é bastante consensual a perspectiva de que “os viajantes podem desempenhar um papel relevante na importação de doenças infecciosas emergentes e assumir-se como disseminadores de grandes epidemias” (Sabin et al., 2020Sabin, N. et al. (2020), “Implications of human activities for (re)emerging infectious diseases, including Covid-19”. Journal of Physiological Anthropology, 39 (29): 2-12., p. 2)6 6 No original: “travelers could play a role in importing eids [Emerging infectious diseases] and could be a carrier of major epidemics”. . Basta termos em conta os últimos vinte anos para identificarmos vários casos, ainda antes da Covid-19, em que fica patente o estreito nexo de causalidade entre as viagens e atividades de natureza turística e a ocorrência de surtos de distintas doenças: Sars, chikungunya, tuberculose, gripe, doenças meningocócicas, norovírus e Mers, entre outras (Khan et al., 2010Khan, K. et al. (2010), “Global public health implications of a mass gathering in Mecca, Saudi Arabia during the midst of an influenza pandemic”. Journal of Travel Medicine , 17 (2): 75-81.; Findlater e Bogoch, 2018Findlater, A. & Bogoch, I. (2018), “Human mobility and the global spread of infectious diseases: a focus on air travel”. Trends in Parasitology, 34 (9): 772-783.; Sabin et al., 2020Sabin, N. et al. (2020), “Implications of human activities for (re)emerging infectious diseases, including Covid-19”. Journal of Physiological Anthropology, 39 (29): 2-12.). É de destacar que, já no século XXI, além da pandemia de Covid-19 houve dois surtos epidêmicos também causados por coronavírus: o de Sars, em 2002-2003, e o de Mers, com início em 2012 e ainda não completamente erradicado. Muito em particular no caso da Sars, as pessoas em viagem foram as primeiras infectadas e acabariam por se tornar as grandes responsáveis pela propagação mundial dos contágios (Wilder-Smith, 2006Wilder-Smith, A. (2006), “The severe acute respiratory syndrome: impact on travel and tourism”. Travel Medicine and Infectious Disease , 4 (2): 53-60.).

Tendo em conta agora a (muito) rápida difusão global do SARS-CoV-2, fica evidente, mais uma vez, a relevância do turismo como poderoso impulsionador de cadeias de transmissão viral. Com base em dados recolhidos sobre fluxos turísticos e cenários epidemiológicos em mais de noventa países, Farzanegan et al. (2021 Farzanegan, M.; Gholipour, H.; Feizi, M.; Nunkoo, R. & Andargoli, A. (2021), “International tourism and outbreak of coronavirus (Covid-19): a cross-country analysis”. Journal of Travel Research, 60 (3): 687-692.) estimaram que o aumento de 1% no acolhimento e na emissão de turistas implica um acréscimo de 1,2% e 1,4% de infeções e mortes por Covid-19, concluindo que existe uma forte associação entre os sucessivos recordes de crescimento do turismo internacional até ao início de 2020 e a situação pandêmica que foi ganhando forma a partir dessa altura. Com efeito, é bastante frequente a distribuição espacial da infecção na sua fase inicial, bem como os primeiros casos oficiais de Covid-19, de morte pela doença e/ou de novas mutações do vírus remeterem para as mobilidades turísticas.

Ao aglomerarem de forma compacta grandes quantidades de pessoas de diferentes proveniências pressupondo uma estreita partilha de espaços, infraestruturas e elementos materiais, os cenários de turismo internacional fomentaram múltiplos surtos de Covid-19 e a rápida disseminação global da infecção. Destacam-se, desde logo, três contextos em que as mobilidades turísticas estiveram, intrinsecamente, associadas às mobilidades virais e à expansão geográfica das cadeias de contágios, sobretudo desde janeiro de 2020 até à generalização das restrições de viagem: as estâncias de esqui, os cruzeiros marítimos e as turiperegrinações (turismo religioso).

Nas estâncias de esqui ocorreram grandes surtos de Covid-19, não só em 2020 como também na temporada de 2021, com destaque para o contexto alpino e a América do Norte. A situação mais problemática ocorreu nos primeiros meses de 2020, nos Alpes, muito em particular em Ischgl (Paznaun, Tirol austríaco). Entre final de fevereiro e início de março de 2020 foi palco de um dos maiores eventos globais de superdisseminação do SARS-CoV-2, quer pelo número de infecções, quer pela multinacionalidade dos contágios e pelo fato de terem acontecido na fase inicial da pandemia (Correa-Martínez et al., 2020Correa-Martínez, C. et al. (2020), “A pandemic in times of global tourism: superspreading and exportation of Covid-19 cases from a ski area in Austria”. Journal of Clinical Microbiology, 58(6): e00588. ; Kreidl et al., 2020Kreidl, P. et al. (2020), “Emergence of coronavirus disease 2019 (Covid-19) in Austria”. Wiener Klinische Wochenschrift, 132 (21): 645-652.). Mais de 6 mil pessoas de cerca de meia centena de nações poderão ter sido contagiadas em Ischgl e transportado o vírus para os respectivos países (The Guardian, 2020The Guardian (2020), “‘Everyone was drenched in the virus’: was this Austrian ski resort a Covid-19 ground zero?”. https://www.theguardian.com/world/2020/sep/05/everyone-was-drenched-in-the-virus-was-this-austrian-ski-resort-a-covid-19-ground-zero.
https://www.theguardian.com/world/2020/s...
). O contágio foi de tal modo exponencial que, de acordo com um estudo serológico da Universidade de Medicina de Innsbruck, em finais de abril de 2020 mais de 42% dos habitantes locais já possuíam anticorpos para o vírus (Medizinische Universität Innsbruck News, 2020Medizinische Universität Innsbruck News (2020), “Ischgl-Studie. 42,4 prozent sind antikörper-positiv”. https://www.i-med.ac.at/mypoint/news/746359.html.
https://www.i-med.ac.at/mypoint/news/746...
).

Também ainda numa fase inicial da pandemia, os cruzeiros marítimos foram responsáveis por mais de duas dezenas de surtos de Covid-19, confirmando evidências científicas anteriores sobre as grandes embarcações turísticas como microcosmos flutuantes de espaços confinados propícios à propagação epidemiológica de vírus e bactérias (Baraniuk, 2020Baraniuk, C. (2020), “What the Diamond Princess taught the world about covid-19”. BMJ, 369 (m1632). ; Dalton, Katelaris e Wilson, 2020Wilson, M. (2020), “What goes on board aircraft? Passengers include Aedes, Anopheles, 2019-nCoV, Dengue, Salmonella, Zika, et al.”. Travel Medicine and Infectious Disease , 33: 101572.; Paula e Herédia, 2020Paula, Â. & Herédia, V. (2020), “Covid-19 and cruise ships: a drama announced”. Études Caribéennes, 47, 15 dez.). Os dois surtos mais relevantes e amplamente mediatizados ocorreram nos cruzeiros Diamond Princess e Ruby Princess. O primeiro ficou sob quarentena no porto de Yokohama e registrou, logo no início de fevereiro de 2020, o então maior foco de contágio por SARS-CoV-2 fora da China, com 712 casos de infecção (Plucinski et al., 2021Plucinski, M. et al. (2021), “Coronavirus disease 2019 (Covid-19) in Americans aboard the Diamond Princess cruise ship”. Clinical Infectious Diseases , 72 (10): e448-e457. ). Já em meados de março de 2020, o Ruby Princess foi autorizado a desembarcar os passageiros, sem testagem, no porto de Sydney. Passado pouco tempo, começaram a ser identificados casos de Covid-19 relacionados com o navio na maioria dos estados australianos, concluindo-se que originou 665 contágios e contribuiu de forma considerável para a dispersão nacional da epidemia (Quigley et al., 2021Quigley, A.; Nguyen, P. Y.; Stone, H.; Lim, S. & Macintyre, C. R. (2021), “Cruise ship travel and the spread of Covid-19: Australia as a case study”. International Journal of Travel Medicine and Global Health, 9 (1): 10-18. ).

As turiperegrinações também têm estado associadas a surtos transnacionais de infecção bastante significativos. No Paquistão, a Raiwind Tableeghi Ijtema (11 a 15 de março de 2020) reuniu cerca de 250 mil pessoas de oitenta países, levando à exportação de contágios para múltiplos destinos (Mubarak e Zin, 2020Mubarak, N. & Zin, C. S. (2020), “Religious tourism and mass religious gatherings - the potential link in the spread of Covid-19. Current perspective and future implications”. Travel Medicine and Infectious Disease, 36: 101786. ). Praticamente na mesma altura, uma congregação em Nizamuddin (Nova Deli, Índia) e eventos religiosos em Singapura, Taiwan, Irã e Coreia do Sul tiveram, de igual modo, repercussões epidemiológicas muito relevantes (Mat et al., 2020 Mat, N. C.; Edinur, H.; Razab, M. & Safuan, S. (2020), “A single mass gathering resulted in massive transmission of Covid-19 infections in Malaysia with further international spread”. Journal of Travel Medicine , 27 (3): 1-9. ; Hsu et al., 2021Hsu, C. Y. et al. (2021), “Preparedness for containing Covid-19 outbreak in mass religious gathering with non-pharmaceutical interventions (NPIS)”. Journal of the Formosan Medical Association, 120: S57-S68.). Perante esses exemplos, a Arábia Saudita decidiu suspender a Umrah e restringir o acesso à Hajj, duas peregrinações que movimentam milhões de fiéis de quase todo o mundo (Hoang et al., 2020Hoang, V.-T.; Gautret, P.; Memish, Z. & Al-Tawfiq, J. (2020), “Hajj and Umrah mass gatherings and Covid-19 infection”. Current Tropical Medicine Reports, 7: 133-140. ). Opção distinta foi seguida pelo governo indiano, que não impôs limitações tão pronunciadas à celebração de 2021 do Kumbh Mela (1º a 30 de abril), um evento religioso hindu realizado aproximadamente a cada três anos e que constitui a maior reunião religiosa mundial. Em 2021, apesar das circunstâncias, participaram na peregrinação cerca de 10 milhões de pessoas, e só nas 48 horas entre 12 e 14 de abril - dias dos dois primeiros banhos reais (Shahi Snan) de purificação no rio Ganges - foram diagnosticados mais de mil casos de Covid-19 (Hindustan Times News, 2021Hindustan Times News (2021), “Over 1.000 test positive for Covid-19 at Kumbh Mela in 48 hours”. https://www.hindustantimes.com/india-news/over-1-000-test-positive-for-covid-19-at-india-s-religious-festival-kumbh-101618395394758.html.
https://www.hindustantimes.com/india-new...
).

Se o turismo internacional contribuiu decisivamente, em particular ao início da pandemia, para a rápida mobilidade do SARS-CoV-2 entre países mais ou menos distantes e o consequente alastramento global da infecção, o turismo interno impeliu de forma considerável a multiplicação das redes de contágio regionais e nacionais. Ainda antes de a infecção se difundir internacionalmente, os fluxos turísticos internos entre o epicentro da epidemia, Wuhan, e as grandes metrópoles chinesas foram um dos principais veículos da dispersão do vírus (Shi e Liu, 2021Shi, Q. & Liu, T. (2020), “Should internal migrants be held accountable for spreading Covid-19?”. Environment and Planning A: Economy and Space, 52 (4): 695-697.). O turismo doméstico na China é de uma magnitude incomparável, sendo que, em 2019, foram registradas cerca de 6 bilhões de viagens internas (China Daily, 2021China Daily (2021), “Report: China to see increased domestic tourism in 2021”. https://www.chinadailyhk.com/article/158413.
https://www.chinadailyhk.com/article/158...
). Os sete dias de feriado (semana dourada) associados à celebração do dia nacional (1º de outubro) constituem um dos momentos do ano em que se gera maior volume de fluxos turísticos internos, e a província de Hubei, onde se localiza Wuhan, é um dos mais destacados contextos de acolhimento desses fluxos (Knight et al., 2020Knight, D.; Xiong, L.; Lan, W. & Gong, J. (2020), “Impact of Covid-19: research note on tourism and hospitality sectors in the epicenter of Wuhan and Hubei Province, China”. International Journal of Contemporary Hospitality Management, 32 (12): 3705-3719.).

Na Europa, o impacto epidemiológico do turismo doméstico (e do turismo de proximidade, entre países vizinhos) foi especialmente relevante em fevereiro de 2020, um mês em que ocorrem férias escolares e são realizadas várias atividades de turismo e lazer (v.g., carnaval, esqui, feiras e festivais gastronômicos), que acabariam por funcionar como eventos de superdisseminação do coronavírus. Considerando em específico o contexto germânico, Plümper e Neumayer (2020Plümper, T. & Neumayer, E. (2020), “The Covid-19 pandemic predominantly hits poor neighborhoods, or does it? Evidence from Germany”. medRxiv. https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.05.18.20105395v1.full.pdf.
https://www.medrxiv.org/content/10.1101/...
) assinalam que, depois da entrada do vírus no país, a sua subsequente propagação foi alavancada por diversos eventos de natureza turística, tais como: o carnaval de Gangelt (distrito de Heinsberg), o festival de cerveja em Mitterteich (distrito de Tirschenreuth) e o festival de vinhos em Bretzfeld (distrito de Hohenlohekreise). Mesmo dois meses após a realização dos eventos em causa, esses três distritos eram os que registravam o maior número de infecções por 100 mil habitantes a nível nacional. De um modo geral, a incidência inicial da Covid-19 na Alemanha mostrava um nítido contraste entre o oeste e o este e, principalmente, entre o norte e o sul do país. Para a maior prevalência epidemiológica no oeste terá contribuído o fato de a região ter uma maior presença de católicos, entre os quais as atividades festivas responsáveis pela disseminação do vírus, como o carnaval, são mais populares e turistificadas (McMahon, 1999McMahon, F. (1999), “‘Playing with play’: Germany’s Carnival as esthetic nonsense”. In: Reifel, R. (ed.). Play & culture studies: play contexts revisited. Stamford, Ablex, pp. 177-187.; Schmid, 2020Schmid, S. (2020), Swabian-Alemannic Carnival in German society today., dissertação de mestrado, Universidade de Roterdã, Roterdã 2020. https://thesis.eur.nl/pub/56218/.
https://thesis.eur.nl/pub/56218...
); enquanto que a maior prevalência no sul do país se explicaria pela proximidade e facilidade de acesso às estâncias de esqui da Áustria e do norte da Itália (Plümper e Neumayer, 2020Plümper, T. & Neumayer, E. (2020), “The Covid-19 pandemic predominantly hits poor neighborhoods, or does it? Evidence from Germany”. medRxiv. https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.05.18.20105395v1.full.pdf.
https://www.medrxiv.org/content/10.1101/...
), proeminentes focos de contágio nos primeiros meses de 2020.

Fora da Europa, e já muito mais adiante no ano de 2020, sucedeu algo relativamente similar nos Estados Unidos com a repercussão de um dos maiores encontros motards do mundo (Sturgis Motorcycle Rally, Dakota do Sul, 7 a 16 de agosto) na expansão nacional da pandemia. A concentração ascendeu a cerca de 462 mil participantes provenientes de todo o país e, apesar da dimensão do aglomerado, os procedimentos sanitários básicos foram consideravelmente negligenciados (Carter et al., 2021 Carter, R. et al. (2021), “Widespread SARS-CoV-2 transmission among attendees at a large motorcycle rally and their contacts, 30 us Jurisdictions, August-September, 2020”. Clinical Infectious Diseases, 73 (S1): S106-S109.). O vocalista dos Smash Mouth, uma das bandas que atuaram no evento, parece mesmo ter desvalorizado a situação pandêmica e a necessidade de prevenção do contágio, celebrando a fruição incondicionalmente hedonista do momento: “Agora estamos aqui todos juntos esta noite. E estamos sendo humanos mais uma vez. Que se foda essa merda da Covid” (Rolling Stone, 2020Rolling Stone (2020), “‘Freedom-loving people’: behind the scenes at that controversial Smash Mouth show in South Dakota”. https://www.rollingstone.com/music/music-news/sturgis-covid-19-biker-fest-smash-mouth-1043040/.
https://www.rollingstone.com/music/music...
)7 7 No original: “Now we’re all here together tonight. And we’re being human once again. Fuck that Covid shit”. . Pouco tempo depois, começaram a ser notificadas infecções entre as pessoas que estiveram em Sturgis. A estimativa é a de que aí tenham sido desencadeadas redes de contágio responsáveis por 115.283 a 266.796 casos de Covid-19 de 2 de agosto a 2 de setembro, o que equivale a de 8,2% a 19% do total de 1,4 milhões de novos casos registrados nos Estados Unidos no mesmo período (Dave, McNichols e Sabia, 2021 Dave, D.; McNichols, D. & Sabia, J. (2021), “The contagion externality of a superspreading event: the Sturgis Motorcycle Rally and Covid-19”. Southern Economic Journal, 87: 769-807.).

Os diversos exemplos que vêm sendo discutidos mostram de forma nítida que o turismo de massas, independentemente das suas escalas, tipologias e configurações específicas, pressupõe uma grande densidade de trânsitos e de convivências, sendo que “as mobilidades fazem-se com a encapsulação dos corpos em espaços fechados móveis - aviões, autocarros, cruzeiros etc. - e os fluxos convergem e comprimem-se ao passar através de nós - aeroportos, hotéis, centros de congressos, museus etc. - que estimulam interações e contactos de humanos entre si e com diversas formas de materialidades” (Brito-Henriques, 2020Brito-Henriques, E. (2020), “Covid-19, turismo e sustentabilidade: tudo está interligado”. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, 55 (115): 205-210., p. 207). É justamente dessa intensa compressão de fluxos que resultam as condições físicas mais imediatas que fazem do turismo um fenômeno indissociável do sistema de causalidades que impulsionou a pandemia de Covid-19.

Considerações finais

À semelhança da generalidade dos vírus, o SARS-CoV-2 não é biologicamente viável por si só e nada faz para contrariar o seu estado quase inerte. Somos nós, humanos, que lhe asseguramos, inadvertidamente, a possibilidade de existência como entidade viva. Hospedamo-lo nas nossas células, proporcionando-lhe o meio para a realização de funções vitais (v.g., reprodução), e, muito para lá dessa escala microbiológica, temos sido responsáveis pela progressiva instauração sistêmica global de condições sociais, ambientais e tecnológicas que facilitaram a sua rápida propagação na esfera da ecologia mais imediata da espécie humana. À semelhança de outras doenças globais do passado, a Covid-19 é um produto do seu tempo, evidenciando uma estreita sincronização com as características mais marcantes e o funcionamento do atual sistema-mundo (Green, 2020Green, M. (2020), “Emerging diseases, re‐emerging histories”. Centaurus, 62: 234-247. ). A densa malha de conexões socioespaciais e a cada vez maior velocidade e capacidade de trânsitos diversos são destacadas tendências estruturantes da atualidade e foram preponderantes no modo extraordinariamente expedito de globalização do vírus. Sem essas condições, a pandemia, a existir, teria tido uma configuração substancialmente distinta, desde logo em termos de magnitude e rapidez de progressão.

Os volumosos fluxos turísticos mundiais e a abrangente rede de transporte aéreo que pressupõem constituem uma marca paradigmática da crescente conectividade, trânsito e velocidade em que vivemos. À boleia dessas condições de fluidez, especialmente acentuadas no chamado Norte Global, o SARS-CoV-2 galgou distâncias e num par de meses disseminou-se de forma pandêmica. A estrutura reticular de mobilidade aérea e o turismo internacional foram, com efeito, influentes vetores sociotécnicos no processo de difusão repentina do vírus à escala planetária. No imediato, tal ficou a dever-se ao fato de propiciarem contextos de risco epidemiológico, resultantes da formação de grandes aglomerados transnacionais de pessoas, partilhando muitos espaços fechados e elementos materiais, e que, numa questão de dias/semanas, percorrem distâncias de milhares de quilômetros e contactam de forma mais ou menos próxima com centenas de outras pessoas entre os contextos de origem, de trânsito (sobretudo aeroportuário) e de destino turístico. Além desses nexos de causalidade mais imediatos e evidentes, explorados com maior detalhe ao longo do texto, é ainda de considerar a responsabilidade do transporte aéreo e do turismo na produção de impactos nos ecossistemas que acabam por criar condições propícias à emergência de zoonoses como a Covid-19.

Os contextos turísticos e as redes de transportes a eles associadas são o resultado de assemblagens sociomateriais, mais do que humanas, nas quais interagem múltiplos atores (v.g., humanos, não humanos, tecnologia, instituições, recursos naturais) de forma tendencialmente contingencial, contribuindo para a geração de vitalidades imprevistas que colocam sérios riscos em termos de biossegurança e podem mesmo desencadear cenários de biocontaminação epidêmica (Hall, 2015Hall, C. M. (2015), “Tourism and biological exchange and invasions: a missing dimension in sustainable tourism?” Tourism Recreation Research, 40 (1): 81-94. , 2019; Brito-Henriques, 2020Brito-Henriques, E. (2020), “Covid-19, turismo e sustentabilidade: tudo está interligado”. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, 55 (115): 205-210.; Lupton, 2021Lupton, D. (2021), “Contextualising Covid-19: sociocultural perspectives on contagion”. In: Lupton, D. & Willis, K. (eds.). The Covid-19 crisis: social perspectives. Londres, Routledge, pp. 14-24.). No caso específico do SARS-CoV-2 e da pandemia a que deu origem, as assemblagens em torno do turismo de massas e do avião ajudaram, como diriam os pasteurianos, a produzir o “terreno” que representa “tudo” para uma entidade patogênica que, por si só, é “nada” (Green, 2020Green, M. (2020), “Emerging diseases, re‐emerging histories”. Centaurus, 62: 234-247. ). Convirá nunca esquecer que somos protagonistas centrais desse terreno, até porque vivemos num período de emergência de novas e velhas doenças infecciosas. É fundamental, por isso, inibir potenciais condições favoráveis à proliferação de agentes patogênicos e, ao mesmo tempo - atendendo, por exemplo, à facilidade de globalização da Covid-19 - construir dispositivos político-sanitários de monitorização e controle epidemiológico mais integrados no plano transnacional e com maior capacidade de formulação de respostas expeditas facilmente exequíveis.

Referências Bibliográficas

  • Ali, S. & Keil, R. (eds.). (2008), Networked disease: emerging infections in the global city Chichester, Blackwell.
  • Antonescu, A. & Stock, M. (2014), “Reconstructing the globalisation of tourism: a geo-historical perspective”. Annals of Tourism Research, 45C (1): 77-88.
  • Arrizabalaga, J. (2016), “The global threat of (re)emerging diseases: contesting the adequacy of biomedical discourse and practice”. In: Davis, J. & Gonzalez, A. (eds.). To fix or to heal: patient care, public health, and the limits of biomedicine Nova York, New York University Press, pp. 177-207.
  • Baker, D. (2015), “Tourism and the health effects of infectious diseases: are there potential risks for tourists?”. International Journal of Safety and Security in Tourism/Hospitality, 1 (12): 1-17.
  • Baraniuk, C. (2020), “What the Diamond Princess taught the world about covid-19”. BMJ, 369 (m1632).
  • Beck, U. (1999), World risk society Malden, Polity Press.
  • Brito-Henriques, E. (2020), “Covid-19, turismo e sustentabilidade: tudo está interligado”. Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia, 55 (115): 205-210.
  • Brockmann, D. “Human mobility, networks and disease dynamics on a global scale”. In: Bunde, A.; Caro, J.; Kärger, J. & Vogl, G. (2018), (eds.), Diffusive spreading in nature, technology and society Cham, Springer, pp. 375-396.
  • Brockmann, D. & Helbing, D. (2013), “The hidden geometry of complex, network-driven contagion phenomena”. Science, 342 (6164): 1337-1342.
  • Brown, A.; Ahmad, S.; Beck, C. & Nguyen-Van-Tam, J . (2016), “The roles of transportation and transportation hubs in the propagation of influenza and coronaviruses: a systematic review”. Journal of Travel Medicine, 23 (1): tav002.
  • Brown, P.; Armelagos, G. & Maes, K. (2011), “Humans in a world of microbes: the anthropology of infectious disease”. In: Singer, M.; Erickson, P. (eds.), A companion to medical anthropology Malden, Wiley-Blackwell, pp. 253-270.
  • Cândido, D. et al (2020), “Routes for Covid-19 importation in Brazil”. Journal of Travel Medicine , 27 (3): 1-3.
  • Carter, R. et al (2021), “Widespread SARS-CoV-2 transmission among attendees at a large motorcycle rally and their contacts, 30 us Jurisdictions, August-September, 2020”. Clinical Infectious Diseases, 73 (S1): S106-S109.
  • Castells, M. (1996), The rise of the network society Oxford, Blackwell.
  • Castilho, D. (2020), “Um vírus com DNA da globalização: o espectro da perversidade”. Espaço e Economia, 17: 1-7.
  • Chen, L. & Wilson, M. (2008), “The role of the traveler in emerging infections and magnitude of travel”. The Medical Clinics of North America, 92 (6): 1409-1432.
  • Chen, S.; Law, R. & Zhang, M. (2021), “Review of research on tourism-related diseases”. Asia Pacific Journal of Tourism Research, 26 (1): 44-58.
  • China Daily (2021), “Report: China to see increased domestic tourism in 2021”. https://www.chinadailyhk.com/article/158413
    » https://www.chinadailyhk.com/article/158413
  • Colvile, R. (2016), The great acceleration: how the world is getting faster, faster Nova York, Bloomsbury.
  • Correa-Martínez, C. et al (2020), “A pandemic in times of global tourism: superspreading and exportation of Covid-19 cases from a ski area in Austria”. Journal of Clinical Microbiology, 58(6): e00588.
  • Crutzen, P. (2002), “Geology of mankind: the Anthropocene”. Nature, 415: 23.
  • Crutzen, P. & Stoermer, E. (2000), “The Anthropocene”. Global Change Newsletter, 41: 17-18.
  • Dalton, C.; Katelaris, A. & Wilson, N. (2020), “Open with care: minimising Covid-19 superspreading settings in Australia”. SSRN, 12 jun.: 1-12.
  • Dave, D.; McNichols, D. & Sabia, J. (2021), “The contagion externality of a superspreading event: the Sturgis Motorcycle Rally and Covid-19”. Southern Economic Journal, 87: 769-807.
  • El Mundo (2020), “El caso de Covid-19 detectado en Francia a finales de diciembre podría dar nuevas pistas sobre el origen de la pandemia”. http://www.elmundo.es/ciencia-salud/salud/2020/05/05/5eb19dcefc6c8314388b4610.html
    » http://www.elmundo.es/ciencia-salud/salud/2020/05/05/5eb19dcefc6c8314388b4610.html
  • European Centre For Disease Prevention and Control (2020), “Timeline of ECDC’s response to Covid-19”. https://www.ecdc.europa.eu/en/covid-19/timeline-ecdc-response
    » https://www.ecdc.europa.eu/en/covid-19/timeline-ecdc-response
  • Farzanegan, M.; Gholipour, H.; Feizi, M.; Nunkoo, R. & Andargoli, A. (2021), “International tourism and outbreak of coronavirus (Covid-19): a cross-country analysis”. Journal of Travel Research, 60 (3): 687-692.
  • Fidler, D. (2004), Sars: governance and the globalization of disease Nova York, Palgrave Macmillan.
  • Findlater, A. & Bogoch, I. (2018), “Human mobility and the global spread of infectious diseases: a focus on air travel”. Trends in Parasitology, 34 (9): 772-783.
  • Gössling, S. (2002), “Global environmental consequences of tourism”. Global Environmental Change, 12 (4): 283-302.
  • Gössling, S.; Scott, D. & Hall, C. M. (2021), “Pandemics, tourism and global change: a rapid assessment of Covid-19”. Journal of Sustainable Tourism, 29 (1): 1-20.
  • Graham, J. et al (2008), “The animal-human interface and infectious disease in industrial food animal production: rethinking biosecurity and biocontainment”. Public Health Reports, 123 (3): 282-299.
  • Green, M. (2020), “Emerging diseases, re‐emerging histories”. Centaurus, 62: 234-247.
  • Grout, A.; Howard, N.; Coker, R. & Speakman, E. (2017), “Guidelines, law, and governance: disconnects in the global control of airline-associated infectious diseases”. The Lancet Infectious Diseases, 17 (4): e118-e122.
  • Hall, C. M. (2019), “Biological invasion, biosecurity, tourism, and globalization”. In: Dallen, T. (ed.), Handbook of globalisation and tourism Cheltenham e Northampton, Edward Elgar, pp. 114-125.
  • Hall, C. M. (2015), “Tourism and biological exchange and invasions: a missing dimension in sustainable tourism?” Tourism Recreation Research, 40 (1): 81-94.
  • Hall, C. M. & Baird, T. (2013), “Ecotourism, biological invasions and biosecurity”. In: Ballantyne, R.; Packer, J. (eds.), International handbook on ecotourism Cheltenham e Northampton, Edward Elgar, pp. 66-77.
  • Hall, C. M.; Scott, D. & Gössling, S. (2020), “Pandemics, transformations and tourism: be careful what you wish for”. Tourism Geographies, 22 (3): 577-598.
  • Harvey, D. (1992), Condição pós-moderna São Paulo, Edições Loyola.
  • Higgins-Desbiolles, F.; Carnicelli, S.; Krolikowski, C.; Wijesinghe, G. & Boluk, K. (2019), “Degrowing tourism: rethinking tourism”. Journal of Sustainable Tourism , 27 (12): 1926-1944.
  • Hindustan Times News (2021), “Over 1.000 test positive for Covid-19 at Kumbh Mela in 48 hours”. https://www.hindustantimes.com/india-news/over-1-000-test-positive-for-covid-19-at-india-s-religious-festival-kumbh-101618395394758.html
    » https://www.hindustantimes.com/india-news/over-1-000-test-positive-for-covid-19-at-india-s-religious-festival-kumbh-101618395394758.html
  • Hoang, V.-T.; Gautret, P.; Memish, Z. & Al-Tawfiq, J. (2020), “Hajj and Umrah mass gatherings and Covid-19 infection”. Current Tropical Medicine Reports, 7: 133-140.
  • Holton, R. (2008), Global networks Basingstoke e Nova York, Palgrave Macmillan.
  • Hsu, C. Y. et al (2021), “Preparedness for containing Covid-19 outbreak in mass religious gathering with non-pharmaceutical interventions (NPIS)”. Journal of the Formosan Medical Association, 120: S57-S68.
  • Iaquinto, B. (2020), “Tourist as vector: viral mobilities of Covid-19”. Dialogues in Human Geography, 10 (2): 174-177.
  • International Civil Aviation Organization (2019a), “Presentation of 2019 air transport statistical results”. https://www.icao.int/annual-report-2019/Documents/ arc_2019_Air %20Transport%20Statistics.pdf
    » https://www.icao.int/annual-report-2019/Documents/ arc_2019_Air %20Transport%20Statistics.pdf
  • International Civil Aviation Organization (2019b), “New traffic flow 2019 OAG data”. https://gis.icao.int/gallery/trafficflow2019zoOMSimpop.pdf
    » https://gis.icao.int/gallery/trafficflow2019zoOMSimpop.pdf
  • Ioannides, D. & Gyimóthy, S. (2020), “The Covid-19 crisis as an opportunity for escaping the unsustainable global tourism path”. Tourism Geographies , 22 (3): 624-632.
  • Khan, K. et al (2009), “Spread of a novel influenza a (h1n1) virus via global airline transportation”. The New England Journal of Medicine, 361: 212-214.
  • Khan, K. et al (2010), “Global public health implications of a mass gathering in Mecca, Saudi Arabia during the midst of an influenza pandemic”. Journal of Travel Medicine , 17 (2): 75-81.
  • Knight, D.; Xiong, L.; Lan, W. & Gong, J. (2020), “Impact of Covid-19: research note on tourism and hospitality sectors in the epicenter of Wuhan and Hubei Province, China”. International Journal of Contemporary Hospitality Management, 32 (12): 3705-3719.
  • Koens, K.; Postma, A. & Papp, B. (2018), “Is overtourism overused? Understanding the impact of tourism in a city context”. Sustainability, 10 (12): 2-15.
  • Kraemer, M. et al (2015), “The global distribution of the arbovirus vectors Aedes aegypti and Ae. Albopictus”. eLife, 4: e08347.
  • Kreidl, P. et al (2020), “Emergence of coronavirus disease 2019 (Covid-19) in Austria”. Wiener Klinische Wochenschrift, 132 (21): 645-652.
  • Lau, H. et al (2020), “The association between international and domestic air traffic and the coronavirus (Covid-19) outbreak”. Journal of Microbiology, Immunology and Infection, 53 (3): 467-472.
  • Lupton, D. (2021), “Contextualising Covid-19: sociocultural perspectives on contagion”. In: Lupton, D. & Willis, K. (eds.). The Covid-19 crisis: social perspectives Londres, Routledge, pp. 14-24.
  • Mat, N. C.; Edinur, H.; Razab, M. & Safuan, S. (2020), “A single mass gathering resulted in massive transmission of Covid-19 infections in Malaysia with further international spread”. Journal of Travel Medicine , 27 (3): 1-9.
  • McMahon, F. (1999), “‘Playing with play’: Germany’s Carnival as esthetic nonsense”. In: Reifel, R. (ed.). Play & culture studies: play contexts revisited Stamford, Ablex, pp. 177-187.
  • Mcneill, J. & Engelke, P. (2016), The great acceleration: an environmental history of the Anthropocene since 1945 Cambridge, Harvard University Press.
  • Medizinische Universität Innsbruck News (2020), “Ischgl-Studie. 42,4 prozent sind antikörper-positiv”. https://www.i-med.ac.at/mypoint/news/746359.html
    » https://www.i-med.ac.at/mypoint/news/746359.html
  • Melly, D.; Hanrahan, J. (2021), “Tourism biosecurity risk management and planning: an international comparative analysis and implications for Ireland”. Tourism Review, 76 (1): 88-102.
  • Milano, C.; Cheer, J. & Novelli, M. (eds.) (2019), Overtourism: excesses, discontents and measures in travel and tourism Wallingford e Boston, Cabi.
  • Mubarak, N. & Zin, C. S. (2020), “Religious tourism and mass religious gatherings - the potential link in the spread of Covid-19. Current perspective and future implications”. Travel Medicine and Infectious Disease, 36: 101786.
  • Murphy, N. et al (2020), “A large national outbreak of Covid-19 linked to air travel, Ireland, summer 2020”. Eurosurveillance, 25 (42): 2001624.
  • Nguyen, V.-K. (2017), “Viral speed: infrastructure, connectivity, ontogeny; or, notes on the molecular epidemiology of epidemics”. Cultural Anthropology, 32 (1): 28-34.
  • Organização das Nações Unidas (2020), “Policy brief: Covid-19 and transforming tourism”. https://unsdg.un.org/sites/default/files/2020-08/sg_policy_brief_covid-19_ tourism_august_2020.pdf
    » https://unsdg.un.org/sites/default/files/2020-08/sg_policy_brief_covid-19_ tourism_august_2020.pdf
  • Paula, Â. & Herédia, V. (2020), “Covid-19 and cruise ships: a drama announced”. Études Caribéennes, 47, 15 dez.
  • Pavli, A. et al (2020), “In-flight transmission of Covid-19 on flights to Greece: an epidemiological analysis”. Travel Medicine and Infectious Disease , 38: 101882.
  • Plucinski, M. et al (2021), “Coronavirus disease 2019 (Covid-19) in Americans aboard the Diamond Princess cruise ship”. Clinical Infectious Diseases , 72 (10): e448-e457.
  • Plümper, T. & Neumayer, E. (2020), “The Covid-19 pandemic predominantly hits poor neighborhoods, or does it? Evidence from Germany”. medRxiv https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.05.18.20105395v1.full.pdf
    » https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.05.18.20105395v1.full.pdf
  • Quigley, A.; Nguyen, P. Y.; Stone, H.; Lim, S. & Macintyre, C. R. (2021), “Cruise ship travel and the spread of Covid-19: Australia as a case study”. International Journal of Travel Medicine and Global Health, 9 (1): 10-18.
  • Richardson, E. (2020), “Pandemicity, Covid-19 and the limits of public health ‘science’”. BMJ Global Health, 5: e002571.
  • Richter, L. (2003), “International tourism and its global public health consequences”. Journal of Travel Research , 41 (4): 340-347.
  • Rolling Stone (2020), “‘Freedom-loving people’: behind the scenes at that controversial Smash Mouth show in South Dakota”. https://www.rollingstone.com/music/music-news/sturgis-covid-19-biker-fest-smash-mouth-1043040/.
    » https://www.rollingstone.com/music/music-news/sturgis-covid-19-biker-fest-smash-mouth-1043040
  • Sabin, N. et al (2020), “Implications of human activities for (re)emerging infectious diseases, including Covid-19”. Journal of Physiological Anthropology, 39 (29): 2-12.
  • Schmid, S. (2020), Swabian-Alemannic Carnival in German society today, dissertação de mestrado, Universidade de Roterdã, Roterdã 2020. https://thesis.eur.nl/pub/56218/.
    » https://thesis.eur.nl/pub/56218
  • Sharma, A. & Nicolau, J. (2020), “An open market valuation of the effects of Covid-19 on the travel and tourism industry”. Annals of Tourism Research , 83: 10299.
  • Shi, Q. & Liu, T. (2020), “Should internal migrants be held accountable for spreading Covid-19?”. Environment and Planning A: Economy and Space, 52 (4): 695-697.
  • Sokadjo, Y.; Atchadé, M. (2020), “The influence of passenger air traffic on the spread of Covid-19 in the world”. Transportation Research Interdisciplinary Perspectives, 8: 100213.
  • Steffen, W.; Crutzen, P. & Mcneill, J. (2007), “The Anthropocene: are humans now overwhelming the great forces of Nature ?”. Ambio, 36 (8): 614-621.
  • Swadi, T. et al (2021), “Genomic evidence of in-flight transmission of SARS-CoV-2 despite predeparture testing”. Emerging Infectious Diseases, 27 (3): 687-693.
  • Tatem, A. (2014), “Mapping population and pathogen movements”. International Health, 6 (1): 5-11.
  • The Guardian (2020), “‘Everyone was drenched in the virus’: was this Austrian ski resort a Covid-19 ground zero?”. https://www.theguardian.com/world/2020/sep/05/everyone-was-drenched-in-the-virus-was-this-austrian-ski-resort-a-covid-19-ground-zero
    » https://www.theguardian.com/world/2020/sep/05/everyone-was-drenched-in-the-virus-was-this-austrian-ski-resort-a-covid-19-ground-zero
  • Uğur, N. & Akbiyik, A. (2020), “Impacts of Covid-19 on global tourism industry: a cross-regional comparison”. Tourism Management Perspectives, 36: 100744.
  • Virilio, P. (2000), A velocidade de libertação Lisboa, Relógio d’Água.
  • Virilio, P. (2005), L’accident originel Paris, Galilée.
  • Wilder-Smith, A. (2006), “The severe acute respiratory syndrome: impact on travel and tourism”. Travel Medicine and Infectious Disease , 4 (2): 53-60.
  • Wilson, M. (2003), “The traveller and emerging infections: sentinel, courier, transmitter”. Journal of Applied Microbiology, 94: 1S-11S.
  • Wilson, M. (2020), “What goes on board aircraft? Passengers include Aedes, Anopheles, 2019-nCoV, Dengue, Salmonella, Zika, et al”. Travel Medicine and Infectious Disease , 33: 101572.
  • Wolf, M. (2015), “Is there really such a thing as ‘one health’? Thinking about a more than human world from the perspective of cultural anthropology”. Social Science & Medicine, 129: 5-11.
  • World Tourism Organization (2021), International tourism highlights, 2020 edition Madri, WTO.
  • 1
    Trabalho desenvolvido como membro integrado do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento (Cetrad-Utad), entidade financiada por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, i. p., no âmbito do projeto UIDB/04011/2020, e colaborador do Centro em Rede de Investigação em Antropologia (Cria), instituição financiada pela FCT no quadro do projeto UIDB/04038/2020.
  • 2
    No original: “‘the microbe is nothing; the terrain, everything’. We humans are the terrain”.
  • 3
    No original: “it is now possible for a traveler harboring an infection in one location on earth to travel to virtually any other point on the planet in only 1-2 days”.
  • 4
    No original: “Un estudio de científicos franceses sugiere que el coronavirus ya circulaba en el país a finales de diciembre [2019], después de haber diagnosticado a posteriori a un paciente que ingresó en un hospital el 27 de diciembre, casi un mes antes de que Francia confirmara sus primeros casos.[…] Hammar ha dicho que cuando cayó enfermo el año pasado [2019] con tos seca, fatiga y fiebre, pensó que tenía gripe. Los médicos en ese momento no pudieron diagnosticar el coronavirus. “Me sorprendió”, ha señalado después de que los médicos le dijeran meses más tarde que había sido contagiado de Covid-19. Ahora está totalmente recuperado y señala que no viajó al extranjero los meses antes de caer enfermo, y que no sabe dónde pudo haberse infectado. Su esposa, señala, que ella trabaja en un comercio minorista cerca de un aeropuerto de París y que con frecuencia entra en contacto con viajeros extranjeros”.
  • 5
    No original: “has the potential to become one of the most salient vectors of bio-contaminants on Earth”.
  • 6
    No original: “travelers could play a role in importing eids [Emerging infectious diseases] and could be a carrier of major epidemics”.
  • 7
    No original: “Now we’re all here together tonight. And we’re being human once again. Fuck that Covid shit”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Set 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    10 Nov 2021
  • Aceito
    26 Maio 2022
Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, 05508-010, São Paulo - SP, Brasil - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: temposoc@edu.usp.br