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Duelos e intelectuais no Brasil (1886-1892)

Duels and intellectuals in the Brazil (1886-1892)

Resumo

Durante os anos finais do Império e o início da República, o duelo foi vivenciado como uma moda por um pequeno grupo de homens cultos e socialmente bem-colocados. A sua análise permite apreender as relações estabelecidas entre as classes sociais e o modo como recursos alternativos à esfera estatal, sobretudo no que se refere ao uso da violência privada, podiam ser mobilizados para resolver pendências pessoais. Embora potencialmente letal, o duelo serviu menos para reparar a honra supostamente ferida do que como um meio empregado para aumentar e assegurar a coesão do grupo mediante sua distinção social.

Palavras-chave:
Duelos; Intelectuais; Sociologia da Violência.

Abstract

During the final years of the Empire and the beginning of the Republic, dueling was experienced by a small group of educated and socially well-placed men as a fad. Its analysis allows us to apprehend the relations established between social classes and the way alternative resources to the state sphere, especially regarding the use of private violence, could be mobilized to solve personal disputes. Although potentially lethal, the duel served less to repair supposedly injured honor than as a means employed to increase and ensure group cohesion through social distinction.

Keywords:
Duels; Intellectuals; Sociology of Violence.

Quanto à violência, sou da família de Stendhal, que escrevia com o coração nas mãos: Mon seul défaut est de ne pas aimer le sang. Machado de Assis, A Semana, 24/03/1895Assis, Machado de. (1895), “A semana”. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 24/03., p. 1.

Introdução

Em 1853, em um dos primeiros dicionários de língua portuguesa voltado para a realidade brasileira, Brás Rubim definiu capanga, espoleta, jagunço e peito-largo como valentões que servem “de guarda-costas a algum fazendeiro ou senhor de engenho” (1853, p. 17). São, sem dúvida, personagens conhecidas na história da formação social do Brasil, como atestam os clássicos de Florestan Fernandes (2008)Fernandes, Florestan. (2008), A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. São Paulo, Globo., Sérgio Buarque de Holanda (1995)Holanda, Sérgio B. (1995), Raízes do Brasil. São Paulo, Companhia das Letras. e Victor Nunes Leal (2012)Leal, Victor Nunes. (2012), Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. São Paulo, Companhia das Letras.. Mas o que faz da definição acima particularmente interessante é o fato de que ela aponta para a existência da violência privada como fenômeno social. Mais especificamente, remete a um momento no qual o Estado parece não deter ainda, para falarmos como Weber, o “monopólio do uso legítimo da violência física” (2007, p. 56). A violência, como argumenta Michaud (1989)Michaud, Yves. (1989), A violência. São Paulo, Ática., é um problema sociológico que tem uma profunda relação com a sociedade e época em que se manifesta. Dentre as muitas formas de violência, o duelo constituiu um fenômeno único que permite apreender como alguns indivíduos pertencentes às classes dominantes interagiam entre si no que se refere à resolução de conflitos por meios potencialmente violentos e situados à margem da legalidade, em um período decisivo para formação do moderno Estado brasileiro, isto é, nos anos finais do Império e início da República.

Os duelos analisados neste artigo ocorreram entre os anos de 1886 e 1892, período que, para Misse (1999)Misse, Michel. (1999), Malandros, marginais e vagabundos: a acumulação social da violência no Rio de Janeiro. Tese (Doutorado em Ciências Humanas - Sociologia). Rio de Janeiro, Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro., assinala o início da normalização dos conflitos pessoais sob um maior controle estatal. Logo, ao analisarmos os duelos podemos, nas palavras de Gilberto Velho, apreender “as diferentes construções sociais da realidade” (1982Velho, Gilberto. (1982), “Violência e relações sociais: a questão da diferença”. Revista de Ciências Sociais, 12-13(1-2): 5-9, jan./dez., p. 8). Os duelistas eram homens (brancos) que detinham algum tipo de poder (militar, político, intelectual), podendo inclusive agir profissionalmente em nome do Estado como militares, políticos, burocratas, além de atuarem como jornalistas e escritores. Para mencionarmos alguns exemplos, em 1886, motivados pelo duelo entre os editores dos dois mais importantes jornais à época, O Paiz e Gazeta de Notícias, parlamentares debatiam se o duelo poderia ser considerado um crime, e em caso afirmativo, quais deveriam ser as penas1 1 Conforme crônica publicada no jornal Gazeta de Notícias, em 16/09/1886, p. 2. . Na sequência, houve uma verdadeira febre, conforme atestam os achados de Braga-Pinto (2018)Braga-Pinto, César. (2018), A violência das letras: amizades e inimizades na literatura brasileira (1888-1940). Rio de Janeiro, Eduerj.. O escritor Coelho Neto duelou com o jornalista Castro Soromenho; o também jornalista e escritor Pardal Mallet duelou, entre outros, com Olavo Bilac; este, por sua vez, duelou com Raul Pompeia. Até mesmo Artur Azevedo foi desafiado por Mallet, que também duelou com Germano Hasslocher.

À diferença do Sul do Brasil do início do século xix, onde os duelos eram motivados por vinganças, desavenças pessoais e familiares, disputas por terras e afronta à honra (militar), os duelos que tomaram a Corte por palco, já ao final da década de 1880, foram “pacíficos”, raramente terminando em ferimentos graves. Como seus predecessores, porém, tinham como agente causador a desonra. No resto, diferiam significativamente. O encontro era divulgado em jornais de grande circulação, envolvendo personalidades publicamente conhecidas, e ainda possuía a estranha particularidade de se restringir a um grupo de amigos que, antes ou depois da contenda, continuaram sendo amigos. Nesse meio, o duelo foi uma prática que oscilou entre o perigo e a jocosidade, entre a sutileza nos modos e a violência nua e crua. A existência de tal prática, porém, pressupunha a inexistência de um aparelho estatal consolidado? O que teria motivado intelectuais pacíficos a empregar meios potencialmente letais para resolver pendências pessoais? Em que consistia a alegada desonra? Por que a divulgação pormenorizada nos jornais? Teria a República contribuído para pôr fim aos duelos?

O objeto empírico utilizado para responder às questões acima, que consistem na nossa problemática, é composto por reportagens, crônicas e relatos dos e sobre os duelistas publicados nos principais jornais da época, além de relatos memorialísticos, necrológios e biografias. A análise documental priorizou fontes originais que, uma vez contrastadas com o referencial teórico, permitiram apreender o duelo como um fenômeno social relevante para a compreensão das interações entre grupos e classes tendo por base comportamentos violentos e extraoficiais em um momento de intensa ruptura política e institucional.

Violência, controle social, duelos

O uso legítimo da violência física constitui, para Norbert Elias (1997)Elias, Norbert. (1997), Os alemães: a luta pelo poder e a evolução do habitus nos séculos xix e xx. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor., uma condição fundamental para a pacificação de uma sociedade, embora possa ser também utilizado como uma “perigosa arma” a serviço dos grupos e classes que controlam o Estado. Nesse caso, a arbitrariedade daria lugar, nas palavras de Barrington Moore Jr., a uma “violação extrema da obrigação de manter a paz” (1987, p. 50). De fato, como argumenta Hannah Arendt (2015)Arendt, Hannah. (2015), Crises da República. São Paulo, Editora Perspectiva., poder e violência estão intimamente ligados. Enquanto fenômeno social, conforme Michaud (1989Michaud, Yves. (1989), A violência. São Paulo, Ática., p. 10), a violência pode ser caracterizada de duas formas: como elemento de força física e como transgressão à ordem normativa. No primeiro caso, o dano é corporal; no segundo, imaterial. O duelo é um tipo de comportamento violento que abrange ambos os aspectos. É causador de dano físico ao mesmo tempo em que infringe uma norma jurídica que o tipifica como crime (pelo menos desde o Código Penal de 1890). Márcia Costa é contunde ao afirmar que, no Brasil, o Estado “sempre exerceu a violência em nome da manutenção dos interesses privados dominantes” (1999Costa, Márcia R. (1999), “A violência urbana é particularidade da sociedade brasileira?”. São Paulo em perspectiva, 13(4): 3-12, set./dez., p. 7). Para a autora, historicamente as elites não apenas empregaram o aparato estatal em benefício próprio, como também desenvolveram uma série de usos paralelos da violência privada, seja para resolver conflitos inter ou intraclasses, seja para garantir sua segurança pessoal, familiar ou patrimonial. Por outro lado, como lembra Sérgio Adorno (1998Adorno, Sérgio. (1998), “Conflitualidade e violência: reflexões sobre a anomia na contemporaneidade”. Tempo Social, 10(1): 19-47, jan./jun., p. 41), nem as classes sociais se sujeitam da mesma forma aos estatutos legais, nem a “complexa problemática do controle social” se encerra no “domínio exclusivo dos aparelhos repressivos de Estado”.

Um bom exemplo desse raciocínio pode ser encontrado na questão agrária. Ao estudá-la, pode-se dizer que César Barreira chegou à conclusão de que os mesmos personagens citados por Brás Rubim continuam atuantes. Para o autor, nas “sociedades onde o espaço público e privado não tem fronteiras nítidas, como é o caso da brasileira, é muito difícil a modelação social de indivíduos ou grupos, principalmente de setores pertencentes à classe dominante”, uma vez que “tais setores possuem sólidas raízes fincadas em práticas violentas nas resoluções de conflitos interpessoais ou na manutenção do poder econômico e político” (Barreira, 2000Barreira, César. (2000), “Massacres: monopólios difusos da violência”. Revista Crítica de Ciências Sociais, 57-58: 169-186, nov., p. 170). A história sociopolítica brasileira estaria permeada por conflitos violentos que se estendem para além da legalidade, a tal ponto que se poderia falar de um “quadro de resoluções de conflitos fora do universo jurídico”, segundo a máxima da “justiça com as próprias mãos”, o que levou Barreira a concluir que, se outrora o emprego de milícias privadas pressupunha a fragilidade, ou mesmo a inexistência de um poder judicial, e se essa lógica já não mais se aplica, nem por isso o uso da violência, “por parte dos grandes proprietários de terra”, deixou de ser a “afirmação de um poder paralelo” (2000, p. 169). De fato, Wieviorka argumenta que a fórmula weberiana parece ter perdido espaço nas sociedades contemporâneas, embora reconheça como paradoxal o fato de que as “formas mais espetaculares da violência não correspondem necessariamente às situações de maior carência, debilidade ou ausência do Estado” (1997, p. 21).

Para Michel Misse (1999)Misse, Michel. (1999), Malandros, marginais e vagabundos: a acumulação social da violência no Rio de Janeiro. Tese (Doutorado em Ciências Humanas - Sociologia). Rio de Janeiro, Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro., no Rio de Janeiro, por exemplo, a população de baixa renda possui uma “histórica desconfiança” em relação à polícia, e a sua marginalização acabou por gerar um fenômeno semelhante ao que Barreira identificou entre as classes dominantes, ou seja, a resolução de conflitos por vias extraoficiais: “assim como a ‘delação’ substitui a denúncia, no âmbito moral”, argumenta Misse, a “eficácia” da “justiça privada substitui os procedimentos racionais-legais, no âmbito da sensibilidade jurídica” (1999, p. 64-65). As classes populares, por vezes estigmatizadas como “classes perigosas”, não apenas estão mais sujeitas a sofrer os impactos diretos da violência, como também tendem, nesses casos, a não acionar o poder público devido à falta de informação, proteção e recursos financeiros. O que parece estar em jogo, portanto, é menos a concorrência com o monopólio estatal do que a existência de lacunas mais ou menos consentidas para o exercício da violência privada, uma vez que o seu emprego se faz presente tanto entre as diferentes classes e grupos como também no interior de um mesmo grupo.

O duelo se insere neste último caso. Embora possa ser considerada uma prática violenta, ele geralmente esteve associado às noções de elegância, nobreza, distinção. Conforme Norbert Elias (1994)Elias, Norbert. (1994), O processo civilizador: uma história dos costumes. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, v. 1., entre outras práticas cortesãs que seriam absorvidas pela burguesia ascendente do século xix, estava o duelo. Para que houvesse um, era fundamental o reconhecimento tácito acerca da legitimidade da honra ferida e da igualdade de condições. No seu estudo sobre Mozart, Elias (1995Elias, Norbert. (1995), Mozart, sociologia de um gênio. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor., p. 22) cita um exemplo interessante de como funcionavam os duelos tomando por base o caso de Voltaire. Segundo o sociólogo, Voltaire, que assim como Mozart situava-se no início desse processo de transição, teria desafiado um nobre “bem-nascido” para um duelo, no que este, se sentido insultado por ter sido desafiado por alguém de posição social inferior, “mandou um de seus lacaios dar-lhe uma surra na rua, como sinal de que encarava como uma arrogância o desafio por um burguês”.

O também sociólogo Gabriel Tarde dedicou uma parte considerável do seu Études pénales et sociales (1892) para a análise desse fenômeno. Para o eminente sociólogo, o duelo, ao lado do suicídio, deveria figurar dentre os temas da criminologia, já que seria uma forma de assassinato que pressupõe o agir premeditado. Tarde, testemunha ocular do fenômeno, via o duelo como um anacronismo na França de sua época. Embora não ignorasse o argumento de que o duelo servia para realçar posições sociais, questionava em que a honra ferida de um ministro ou deputado difere da honra ferida de um simples cidadão, a ponto de que somente os primeiros possam se valer do duelo. Evidentemente, o conceito de honra é relativo. Pode variar de uma sociedade para outra ou assumir diferentes significados em uma mesma sociedade, conforme a época ou a classe social. Ao analisar processos criminais do século xix, Vellasco (2017Vellasco, Ivan A. & Sutil, Séfora S. (2017), “Honra, litigiosidade e justiça: os crimes de honra na região de Formiga/Minas Gerais (1807-1875)”. Aedos, 9 (20): 276-295, ago., p. 278) chegou à conclusão de que também no Brasil a honra se manifesta conforme as posições sociais e que tem por intuito “demonstrar superioridade e preservar perante os demais uma posição social”. A honra visa o público e, como tal, demanda reconhecimento. É o que transparece no estudo de Thompson Flores e Arend. Segundo as autoras (2017Thompson Flores, Mariana F. C. & Arend, Jéssica F. (2017), “Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século xix - estudo de casos”. Aedos, 9 (20): 296-315, ago., p. 300), se o sentimento de honra ferida é intensificado pela presença de plateia, “na mesma medida, a restauração da honra ultrajada também precisa ser pública ou alcançar alguma publicidade para ser considerada efetiva”. Isso faz com que, independente da forma como ocorra a reparação, a “presença de terceiros” cumpra com a função de atestá-la e, consequentemente, manter ou restabelecer a ordem.

Concentradas nas noções de honra e de justiça junto às classes populares do Rio Grande do Sul do século xix, Thompson Flores e Arend (2017Thompson Flores, Mariana F. C. & Arend, Jéssica F. (2017), “Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século xix - estudo de casos”. Aedos, 9 (20): 296-315, ago., p. 303) defendem que também entre elas o duelo esteve presente. Porém, diferentemente das classes cultas, nesses casos os conflitos de honra tendem a assumir formas “mais espontâneas e violentas”, portanto em franca oposição às “regulamentações da elite”. Em contraste com Gabriel Tarde, Thompson Flores e Remedi (2019Thompson Flores, Mariana F. C. & Remedi, José M. R. (2019), “Território neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século xix às primeiras décadas do século xx”. História, 38: 1-25, jan./dez., p. 7), defendem que o século xix foi “auge da virilidade”, do “refinamento” e da “normatização dos duelos”. A prática se encontrava ressignificada. Para os autores (2019, p. 8), esse comportamento, que entende que a responsabilidade pela defesa da honra pertence à esfera do individual e do particular, “cuja resolução não se atribui a terceiros, mesmo que esse terceiro seja o Estado”, deve-se ao “triunfo do individualismo burguês”. Michel Misse, por sua vez, defende que a “construção da civilidade burguesa” e a “normalização do individualismo” deram-se “principalmente pela regulação da distância social entre os indivíduos, impedindo-a que diminuísse muito” (1999, p. 69).

De um lado, a racionalização do aparato estatal assegurava as distinções sociais, de outro, a própria racionalização requeria um maior controle estatal dos usos da violência. A rigor, o fenômeno não pode ser explicado unicamente pelo individualismo burguês, uma vez que os duelos, como mostram Elias (1994)Elias, Norbert. (1994), O processo civilizador: uma história dos costumes. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, v. 1. e Tarde (1892)Tarde, Gabriel. (1892), Études pénales et sociales. Paris, G. Masson Éditeur., tiveram seu auge junto à sociedade de Corte. Além disso, Vellasco (2017)Vellasco, Ivan A. & Sutil, Séfora S. (2017), “Honra, litigiosidade e justiça: os crimes de honra na região de Formiga/Minas Gerais (1807-1875)”. Aedos, 9 (20): 276-295, ago. entende que a modernização do aparato judicial brasileiro ao longo do século xix fez que o Estado passasse a intermediar cada vez mais as pendências de honra. Logo, o duelo e a constituição de um Estado burguês são incompatíveis. Esse fenômeno, no entanto, também cumpre com uma função que tem menos a ver com a violência em si do que com a forma como ela é empregada. Nesse caso poderíamos dizer, com Bourdieu (2010)Bourdieu, Pierre. (2010), As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário. São Paulo, Companhia das Letras., que diferentes atores viam no duelo uma estratégia que poderia ser mobilizada para conquistar ou consolidar posições em determinado campo (literário, político, militar etc.), razão pela qual o reconhecimento público é imprescindível, condição necessária para que se obtenha prestígio, isto é, capital específico entre os pares que compõem o campo. Talvez essa busca pela distinção através do uso galante da violência privada, dispensando a necessidade de um mediador como o Estado, seja o mais autêntico resquício de um passado nobre, no duplo sentido do termo, e socialmente hierarquizado.

O duelo não ficou restrito à Europa. Parker (2001)Parker, David. S. (2001), “Law, honor, and impunity in Spanish America: the debate over dueling, 1870-1920”. Law and History Review, 19 (2): 311-341. e Thompson Flores e Remedi (2019)Thompson Flores, Mariana F. C. & Remedi, José M. R. (2019), “Território neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século xix às primeiras décadas do século xx”. História, 38: 1-25, jan./dez. argumentam que ele também se fez presente na América Latina. Conforme estes últimos autores, na Argentina, no Brasil e no Uruguai, o auge dos duelos se deu entre o final do século xix e o início do século xx. Em termos comparados, pode-se dizer que enquanto na Argentina o “recurso ao duelo foi disseminado entre a elite”, conforme Thompson Flores e Arend (2017Thompson Flores, Mariana F. C. & Arend, Jéssica F. (2017), “Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século xix - estudo de casos”. Aedos, 9 (20): 296-315, ago., p. 298), no Brasil os casos de duelos “não alcançaram as dimensões verificadas nos países platinos vizinhos”. Os primeiros duelos de que se teve notícia no Brasil, de acordo com Braga-Pinto (2014)Braga-Pinto, César. (2014), “Journalists, capoeiras, and the duel in nineteenth-century Rio de Janeiro”. Hispanic American Historical Review, 99 (4): 581-614, nov./dec., surgiram não por acaso na porção meridional do país, ainda durante a primeira metade do século xix. Eram então raros, mesmo para uma província belicosa como o Rio Grande do Sul2 2 O Rio Grande do Sul foi palco de inúmeros conflitos armados, tais como a Guerra dos Sete Povos (1753-1756), a Guerra de 1801, a Guerra contra Artigas (1816-1820), a Guerra da Cisplatina (18251828) e a Guerra do Paraguai (1864-1870); em nível regional ou nacional pode-se citar ainda a Guerra dos Farrapos (1835-1835), a Revolução Federalista (1893-1895) e a Revolução de 1923. Para Cervo e Bueno (2011), Félix (1987) e Reckziegel (1999), o constante estado de beligerância influenciou profundamente sua formação social e cultural. .

De acordo com Remedi (2009Remedi, José M. R. (2009), “Intelectuais e honorabilidade: o papel dos duelos como forma de pertencimento ao campo social”. Métis, 8 (15): 167-184, jan./jun., p. 168), “mais que aceitação dos duelos”, os “intelectuais do século xix e do início do século xx eram assíduos nos confrontos de honra”. Embora repertorie uma série de duelos cometidos ao redor do mundo, cita, entre os nomes que compõe nosso objeto de estudo, apenas os casos Mallet-Bilac (1889) e Bilac-Pompeia (1892). Essa perspectiva, junto da afirmação de que “esses sujeitos” se “deixavam dominar pelo comportamento violento praticado pelo entorno social em que viviam” (p. 169), pode nos fazer crer, talvez equivocadamente, que os intelectuais brasileiros do período eram mais agressivos e violentos do que a análise crítica nos permite crer. Evidentemente, Remedi fundamenta suas constatações nos casos observados no Sul do Brasil, segundo a perspectiva de Thompson Flores e Arend (2017)Thompson Flores, Mariana F. C. & Arend, Jéssica F. (2017), “Noções de honra e justiça entre as classes populares da fronteira no Brasil meridional na segunda metade do século xix - estudo de casos”. Aedos, 9 (20): 296-315, ago. e Thompson Flores e Remedi (2019)Thompson Flores, Mariana F. C. & Remedi, José M. R. (2019), “Território neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século xix às primeiras décadas do século xx”. História, 38: 1-25, jan./dez..

Duelos e intelectuais no Brasil

Entre os intelectuais brasileiros, o duelo só se tornaria uma moda no final do século xix, mais especificamente após o embate entre os editores dos jornais O Paiz e Gazeta de Notícias. Os embates não se resumiam aos duelistas, pois envolviam também padrinhos e, eventualmente, assistência médica. Seus incentivadores, opositores e praticantes eram jornalistas, escritores, burocratas, políticos, militares etc., portanto colegas não apenas de profissão, mas de geração. Porém, diferentemente das gerações analisadas por Sergio Miceli (1979)Miceli, Sergio. (1979), Intelectuais e classe dirigente no Brasil (1920-1945). São Paulo/Rio de Janeiro, Difel., Pécaut (1990)Pécaut, Daniel. (1990), Os intelectuais e a política no Brasil: entre o povo e a nação. São Paulo, Editora Ática. e Sevcenko (1999)Sevcenko, Nicolau. (1999), Literatura como missão: tensões e criação cultural na Primeira República. São Paulo, Brasiliense., situadas já no século xx, os intelectuais em questão transitavam entre diferentes campos, no sentido de Bourdieu (2010)Bourdieu, Pierre. (2010), As regras da arte: gênese e estrutura do campo literário. São Paulo, Companhia das Letras., uma vez que, de um lado, um mesmo indivíduo poderia ser jornalista e escritor (Olavo Bilac), escritor e burocrata (Raul Pompeia), político e diplomata (Assis Brasil); e, de outro, devido ao fato de que os próprios campos não passaram ainda pelo processo que Bourdieu chamou de “autonomização”, consequentemente fazendo com que suas fronteiras fossem indistintas para aqueles que neles circulavam. A coesão do grupo, segundo José Murilo de Carvalho, devia-se à sua formação educacional, o que fazia dessa elite uma “ilha de letrados num mar de analfabetos” (1996Carvalho, José M. (1996), A construção da Ordem: a elite política imperial e Teatro de Sombras: a política imperial. Rio de Janeiro, Editora ufrj, Relume-Dumará., p. 55).

Como notou Braga-Pinto (2014)Braga-Pinto, César. (2014), “Journalists, capoeiras, and the duel in nineteenth-century Rio de Janeiro”. Hispanic American Historical Review, 99 (4): 581-614, nov./dec., o duelo era a antítese das práticas violentas associadas às classes populares, condensadas na prática da capoeira. A simples nomeação dos envolvidos é o suficiente para que possamos identificar o duelo como uma prática distintiva. Em 20 de agosto de 1886, anunciava a Revista Ilustrada que, devido a uma “pendência de honra” ocorrida entre membros de “duas famílias respeitabilíssimas”, “bateram-se em duelo” os “nossos estimados colegas” João José dos Reis Júnior, proprietário de O Paiz, e o redator-chefe da Gazeta de Notícias, José Ferreira de Souza Araújo3 3 Editorial, 1886. . Tomaram parte “neste incidente altamente honroso para a dignidade da imprensa fluminense”, os “Srs. almirante barão de Jaceguai, capitão de mar e guerra Marques Guimarães, 1º tenente Delamari, e Fogliani, jornalista, como testemunhas; e o Dr. Pereira Guimarães, como médico”. Todos os pormenores do embate foram descritos como inspirados, “repetindo-se, pari-passu”, o duelo ocorrido, na França, entre o Ministro da Guerra e o Barão de Lareinty. A inspiração é legítima, prossegue a crônica, pois remete aos costumes cultivados pela civilização culta - a Europa, e em especial a França, são tomadas então como referência cultural -, sendo o manejo do florete ao mesmo tempo uma manifestação de virilidade e de elegância, tal como notou Norbert Elias (2008). Ao fim e ao cabo, e “apesar do eminente risco” de vida dos “nossos dois inestimáveis colegas”, “tudo correu bem”, “sendo a honra satisfeita” sem o “derramamento de sangue”.

Tabela 1
Duelos noticiados na imprensa (1886-1892)

O alegado ataque à honra parece se resumir à simples discordância política, não havendo insultos pessoais, blasfêmias ou ataques físicos prévios ao duelo. De fato, segundo Arthur Azevedo, sob o pseudônimo de Eloy, O herói, o motivo da honra ferida não foi mais do que um “um artigo” assinado pelo redator de O Paiz4 4 Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo), 1886. . Conforme Thompson Flores e Remedi (2019Thompson Flores, Mariana F. C. & Remedi, José M. R. (2019), “Território neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século xix às primeiras décadas do século xx”. História, 38: 1-25, jan./dez., p. 16), tendo em vista o gosto do público leitor, a imprensa noticiava com frequência casos envolvendo crimes e criminosos, seção que incluía também os duelos. No entanto, a notícia desse duelo e dos que se seguiram a ele tem, porém, uma tonalidade própria: sua divulgação possuía uma conotação pitoresca, exótica, que oscilava entre o romanesco anacrônico e o burlesco contemporâneo, como comprova o tom sutil e jocoso com que a crônica foi escrita. Por outro lado, e para além do seu estilo, o relato é permeado por uma interpretação valorativa que, se menciona apenas de passagem a violência, os riscos e o motivo do duelo, assinala reiterada e entusiasticamente que, por seu intermédio, homens respeitáveis se reuniram, sem outra mediação que não dos padrinhos, para resolver de forma honrosa suas pendências.

Naturalmente, o episódio repercutiu. A seção Diário das Câmaras, publicada na Gazeta de Notícias em 16 de setembro de 1886, dá uma noção dos impactos do duelo no meio político5 5 Diário das Câmaras, 1886. O relato contido nessa seção está conforme os Anais do Senado do Império do Brasil, Pedido de Informações, sessão de 15 de setembro de 1886, páginas 144-145. Nesse documento é informado que o presidente do Conselho, Sr. Barão de Cotegipe, declarou que as autoridades optaram por não apurar o duelo, uma vez que “não tiveram certeza dele”, embora alegue ter lido sobre o assunto nos jornais. Ao que parece, Cotegipe considerou o caso como irrelevante, o que gerou críticas por parte do Sr. Henrique d’Ávila, para quem o duelo era um crime, e não somente isso, mas, em sintonia com Arthur Azevedo, um crime ligado ao “abuso de liberdade de imprensa”. . O senador Viriato Medeiros se questionava se o ocorrido “é verdadeiro ou é mentira”, o que denota certo ceticismo para com a prática. Decide, no entanto, que o duelo deve ser verdadeiro, porquanto “não acredita que cavalheiros tão distintos fossem dar um espetáculo simplesmente para mostrar a este país e aos países estrangeiros que aqui também há duelos”. Levantada a questão da inspiração, Alfredo Taunay teria dito que o duelo “foi uma coisa séria” e que era respeitado nos “países estrangeiros”. A afirmação recebeu apoio de Afonso Celso, para quem “não há lei e é um mal que não esteja introduzido entre nós”. A opinião de Viriato Medeiros de que o duelo foi verdadeiro se embasava também no fato de que “distintos oficiais da marinha serviram de testemunhas a esse ato de barbárie”, e que “aqueles oficiais não se prestariam a uma farsa ridícula”. Dirigindo-se ao presidente do conselho, o Sr. Barão de Cotegipe, Medeiros indagou sobre as punições cabíveis. Que “pena merecem os oficiais que se defendem pela imprensa, e os que contra as leis expressas pelo país tomam parte em atos de barbárie ou de verdadeiro assassinato com premeditação? Isto deve ser punido ou não deve ser punido? E quais foram as medidas tomadas para punir esses oficiais?” Lembrado por Taunay de que o duelo era praticado no “mundo civilizado”, Medeiros responde que “não duvida que em outros países seja assim, mas suas leis aqui não regem; o orador não está na estranja, está no Brasil, onde há leis que proíbem o duelo”.

A dimensão social do fenômeno transparece na fala do Sr. Vieira da Silva, para quem “não há ninguém que deixe de aceitar um duelo. Para o Brasil basta a rasteira e o soco. O duelo é preferível à rasteira”. A punição legal é então debatida. Afonso Celso faz saber a todos que “a lei não proíbe”. Em resposta, Viriato Medeiros alega não saber como os jurisconsultos “admitem semelhantes coisas”, defendendo que “se as nossas leis admitissem o duelo, este país seria um país de bugres”. Para o parlamentar, o conceito de civilização recai na coibição de práticas violentas, incluindo o duelo. Proibindo-o, o Brasil se mostraria como um país civilizado. Afonso Celso, para quem não havia lei que o proibisse, via o duelo de forma semelhante a Arthur Azevedo, o que o levava a arguir que era “um mal que este costume não se tenha introduzido; seria um meio de evitar muitos escândalos”.

A reação de Medeiros é imediata. O orador lembra que “mesmo em muitos países civilizados não se admite duelo”, citando para tanto o exemplo da Inglaterra. O contraponto é dado por Taunay, que igualmente faz lembrar a existência do duelo em países ditos civilizados, ao lembrar que “ainda há pouco na Franca, o ministro da guerra bateu-se com um parlamentar”, caso que teria inspirado o duelo ocorrido entre os dois jornalistas. Viriato Medeiros requereu então “que pelo ministério da marinha seja o senado informado se já foram tomadas as medidas necessárias para serem punidos os oficiais da marinha nacional, que, contra as leis expressas do país”, embora não as cite, “tomaram parte como testemunhas de um duelo”. O apelo foi acatado pelo presidente, para quem o “duelo é proibido pelas nossas leis, e mesmo não sabe de nação alguma civilizada que não o proíba”. A discussão chegou a termo com Medeiros ressaltando que, mesmo em países civilizados, o duelo sempre foi punido, por vezes condenando à morte “pessoas altamente colocadas”, levando-o a concluir que “as autoridades fazem vistas grossas” ao fenômeno.

A resolução de uma pendência via duelo pressupõe, no mínimo, o mútuo reconhecimento entre os indivíduos e a presença de testemunhas alternativas aos órgãos oficiais de mediação. Nesse caso, a resolução da pendência é uma questão de honra. Por outro lado, Wieviorka (1997Wieviorka, Michel. (1997), “O novo paradigma da violência”. Tempo Social, 9(1): 5-41, jan./jun., p. 13) argumenta que, para que haja um conflito - portanto algo não necessariamente ligado à honra - passível de ser resolvido mediante a intervenção de meios legais, primeiro é preciso que existam atores; segundo, é necessário um problema que os interligue; e, por fim, que tenham possibilidades de se opor entre si sem incorrer na destruição do adversário. O ponto-chave do debate parlamentar é justamente a legalidade do duelo, o que parece contestar a afirmação de Thompson Flores e Remedi, para quem “tanto no Brasil quanto em Portugal, o duelo sempre foi tipificado como crime, ou seja, proibido” (2019, p. 9-10)6 6 Opinião semelhante, e igualmente contrastante, pode ser encontrada no longo e contemporâneo comentário de Oscar de Morais, quando de sua análise do Código Penal de 1890. Ver Brasil, 2004, p. 634-640. . Seria legítimo, porque praticado em países considerados civilizados e por pessoas respeitáveis, ou seria uma prática bárbara, que poderia não apenas corromper os costumes, mas desafiar o poder do Estado? O envolvimento de indivíduos vinculados à marinha parece ter sido um agravante entre os opositores, porém, a participação de nobres parece ter sido um atenuante. No entanto, convém não perder de vista que mesmo entre os nobres, como é o caso do Barão de Cotegipe, o duelo foi duramente recriminado. A divergência parlamentar pode, com efeito, ser enquadrada em uma fase anterior à criminalização do duelo, como comprova o fato de que o fenômeno era debatido de um ponto de vista moral.

O crime, de acordo com Misse (1999Misse, Michel. (1999), Malandros, marginais e vagabundos: a acumulação social da violência no Rio de Janeiro. Tese (Doutorado em Ciências Humanas - Sociologia). Rio de Janeiro, Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro., p. 68), é um acontecimento social, mas a incriminação recai sobre os indivíduos, portanto, considerar o duelo como um crime pressupõe que o caso seja interpretado como uma transgressão à lei, o que está para além da transgressão moral, e que, como tal, seja elevado à “esfera do dispositivo estatal de criminação”, responsável pelo início da apuração legal do crime. De certa forma, embora parta de uma perspectiva pós-moderna, Santos também reconhece que o fenômeno da “violência difusa consiste em um processo social diverso do crime, anterior ao crime ou ainda não codificado como crime no Código Penal” (2004Santos, José V. T., (2004), “Violências e dilemas do controle social nas sociedades da ‘modernidade tardia’”. São Paulo em perspectiva, 18(1): 3-12, jan./mar., p. 3). O debate acima deixa entrever que, como argumenta Misse (2010Misse, Michel. (2010), “Crime, sujeito e sujeição criminal: aspectos de uma contribuição analítica sobre a categoria ‘bandido’”. Lua Nova, 79: 15-38, jan./abr., p. 22), o crime é “definido primeiramente no plano das moralidades” hegemônicas, “cuja vitória será inscrita posteriormente nos códigos jurídicos”, motivo pelo qual uma vez assim tipificado, resta pouca ou nenhuma margem para sua justificação moral.

Os incentivadores

A crônica que trata do duelo de 1886 é taxativa: “o duelo não se justifica, impõe-se”7 7 Editorial, 1886. . A divergência de opiniões não se restringia aos parlamentares. Entre os intelectuais, as opiniões eram as mais diversas. Ao comentar o episódio, Arthur Azevedo afirmou em crônica de 31 de agosto de 18868 8 Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo), 1886. , com o estilo que lhe era próprio, que a “história registrará também a data do primeiro duelo a sério, havido no Brasil entre homens da imprensa”. Azevedo, também ele jornalista e escritor, era de opinião favorável ao duelo. “Tenho ouvido a algumas pessoas ridicularizar levianamente o encontro dos dois jornalistas; eu, por mim, declaro que tenho este duelo, como todos os duelos, em conta de coisa séria”, o que o leva a rogar “que se introduza na nossa imprensa” o “costume geralmente adotado em todos os países onde a civilização penetrou a jorros mais largos que no Brasil”. Os seus motivos diziam respeito menos ao duelo do que aos atritos na imprensa. Para ele, o duelo era uma espécie de responsabilização extraliterária pelos desatinos cometidos nas letras. “Por via de regra, ficam sem solução as questões que todos os dias se suscitam na nossa imprensa; estabelecido o duelo, haverá sem dúvida mais prudência da parte dos agressores e mais para a desafronta dos agredidos”. Em sua opinião, o “duelo é, sem dúvida, mais decente que a rasteira, a cabeçada e o petropolis”, ou seja, o embate se dá às claras entre os ofendidos, sem artimanhas veladas (rasteira), sem embates contínuos na imprensa (cabeçadas), e sem a intervenção de membros da Corte, senão do próprio Imperador (daí o “Petrópolis”).

Pardal Mallet, além de praticante, foi outro grande incentivador do duelo no Brasil. Segundo ele, em crônica de 21 de julho de 18889 9 Mallet, Pardal. 1888a. , não era possível condenar o duelo unicamente pelo “fato de sua origem bárbara”, uma vez que “tal é a ascendência de todas as instituições”. O duelo, por se tratar de uma luta, “conserva integralmente a honorabilidade de cada adversário”, bem como permite que “possam mais tarde apertar-se as mãos ou que o sobrevivente acompanhe o prestígio funério do morto”. A “sociedade há de preferir sempre o homem que reage àquele que vai se queixar à polícia. E, entre aqueles que reagem, ao que joga capoeira no meio da rua, ela prefere ainda o que expõe o peito à lâmina ou à bala do adversário”. Manifestação elitista, não surpreende quais sejam suas inspirações: “há uma bela poesia cheia de respeito à humanidade na memória desses fidalgos franceses que se batiam à morte, mas, cortesmente, de chapéu na mão”. Mallet não estava sozinho, conforme se depreende da crônica publicada na Gazeta de Notícias, em 19 de dezembro de 189010 10 Cousas do Dia, 1890. . Nela se lê que a reparação pelo duelo “exige do ofensor mais alguma coisa do que pode impor-lhe um tribunal de honra: exige-lhe a coragem de se colocar na frente da ponta de uma espada ou do cano de uma pistola”, coragem essa “muito mais apreciável do que a de suportar a sentença de um tribunal, a cuja execução ninguém o obriga”. A dimensão social do fenômeno aparece claramente quando se afirma que “isto de honra é, além de um caso de consciência, um caso de temperamento, e também de educação e de meio social”.

Não é diferente a opinião de Emanuel Carneiro, publicada em 5 de março de 1891 como resposta a um tal “Sr. Mello”, que o teria acusado de não conhecer os ritos do duelo11 11 Carneiro, 1891. . Carneiro faz observar ao seu opositor, com grifos seus, que “é inútil dizer duelo de homens cultos, porque nem os operários nem os taverneiros, nem os carroceiros se batem em duelo”. “É o mesmo”, prossegue, “que se um médico ou um advogado fosse inscrever-se para um concurso de amanuense do correio, e lhe negassem a inscrição: ‘o senhor não pode, sabe muito, é doutor’”. O argumento de Carneiro se faz presente também em uma crônica assinada alguns dias mais tarde por Thomas Grimm, um pseudônimo coletivo, segundo Braga-Pinto (2018)Braga-Pinto, César. (2018), A violência das letras: amizades e inimizades na literatura brasileira (1888-1940). Rio de Janeiro, Eduerj.12 12 Grimm, 1891. . Ao que tudo indica, o texto é uma tradução da publicação originalmente efetuada no francês Petit Journal. Nele, são destacadas as diferenças entre ingleses e franceses, sendo que os primeiros desclassificam o duelo, enquanto que os últimos fazem dele uma distinção galante. Segundo a crônica, “em matéria de duelo o uso e a moda são mais fortes que a lei, ou para melhor dizer, são a própria lei”, assertiva reforçada pelos grifos originais do autor quando destaca que “em parte alguma esta verdade tem mais razão de ser do que na França, onde o duelo é uma moda […] o duelista é um beligerante particular, e não um guerreiro”.

Para os seus incentivadores, o duelo consistia em uma forma de violência privada de que homens respeitáveis podiam lançar mão para resolver suas pendências, e a própria resolução teria como resultado, afora a extinção da pendência, o aumento do prestígio dos duelistas. Estava, portanto, moralmente autorizado. De fato, como afirmam Thompson Flores e Remedi, os duelos “eram práticas de desagravo reservadas às elites” (2019, p. 2). A busca pelo reconhecimento entre os pares constitui uma das principais dimensões simbólicas do duelo. A violência distintiva, à moda dos fidalgos, diferia da violência das classes populares. No entanto, havia como que uma hierarquia velada que estabelecia que, apesar do estigma, a capoeira era ainda preferível ao ato queixar-se à polícia. O homem, especialmente homem distinto, faz-se reconhecido por si mesmo, dispensa intermediários - o que significa que eles existem, e existem precisamente como representantes do Estado, daí as forças policiais e os tribunais. Extraoficial, o duelo dependia única e exclusivamente do reconhecimento mútuo entre os praticantes, mas também da certeza que não seriam incriminados ao praticá-lo ou, uma vez obrigados a prestar contas, não seriam estigmatizados como contraventores ou criminosos, tal como se enquadravam os capoeiristas.

Os opositores

Porque violento e potencialmente letal, o duelo despertou a preocupação de alguns parlamentares que temiam que a prática pudesse influenciar o que se chamava de os costumes nacionais, tornando-se assim um problema social, a exemplo do que era, aos olhos da classe dirigente, a capoeira, a prostituição e o alcoolismo entre as classes populares. Ainda no início da moda, Raul Pompeia foi um dos seus críticos mais contundentes. Tomou posição contrária quando do duelo entre os seus amigos Pardal Mallet e Germano Hasslocher, conforme atesta a crônica publicada em 9 de dezembro de 188813 13 A crônica encontra-se na compilação publicada em 1996. A cautela a citar essa edição se deve a algumas imprecisões, talvez de editoração: de um lado, as crônicas selecionadas não correspondem à sua versão original, já que algumas foram reduzidas a menos de um terço; de outro, há erros relacionados às datas de publicação. Por exemplo, a crônica publicada entre as páginas 30-31 é referenciada pela data de 19 de agosto de 1888, embora a versão correta seja 16 de setembro de 1888 (Jornal Diário de Minas/mg). . O “duelo, para mim, é magnífico em uma vistosa estampa de romance ilustrado. Fora disso, considero uma brutalidade absurda e repugnante”. O seu raciocínio parece estar de acordo com o de Gabriel Tarde, para quem o duelo era essencialmente uma combinação medieval de atos de honra e distinção com as “brutais elegâncias da cavalaria” (1892, p. 39). De acordo com o cronista, não é possível compreender o ato de duelar sem considerar também “o risco de morte” inerente à prática, e “ainda menos se compreende, com as ideias atuais da luta pela vida e do requinte complicado dos combates da civilização”, como alguém pode “decidir” pela “supressão do adversário”. Para Pompeia, o duelo nada mais é senão o “assassinato” do “argumento honesto de uma boa razão com um sofisma sangrento do espadachim”.

Raul Pompeia tornaria a se opor ao duelo alguns meses mais tarde, dessa vez devido ao embate entre os seus amigos Pardal Mallet e Olavo Bilac. Em crônica de 29 de setembro de 1889 deixa mais uma vez entrever o seu desapontamento com o conflito entre “um jornalista e um poeta, jornalista também”14 14 Pompeia, 1889. . “Pela profissão dos adversários”, diz ele, “vê-se que apesar do esforço de alguns para introduzir nos costumes nacionais este exotismo de capa e espada, o duelo ainda não conseguiu fazer carreira fora da roda em que teve aceitação”. Para o escritor, o duelo “não somente está adstrito à fração da sociedade que iniciou aqui a sua prática, como, entre os seus próprios introdutores, vai perdendo opinião”. Sendo o duelo uma prática bárbara e irracional, para Pompeia, ao praticá-lo, seus colegas de profissão e de geração consequentemente estigmatizavam a classe a que pertenciam e o grupo que formavam.

Contemporâneo de Pompeia, Augusto Britto também se opôs ao duelo em crônica de 15 de outubro de 189015 15 Britto, 1890. . Para Britto, o duelo era uma monstruosidade, uma “prática estabelecida entre gente bárbara” que se resume a um “sistema demasiadamente revoltante contra a boa razão”. O seu argumento, próximo ao de Gabriel Tarde, se pretende mais lógico do que aquele dos que incentivavam o duelo. “Punir o criminoso, cometendo outro crime talvez maior”, ou seja, “o de arrancar a vida humana”, faz com que se questione: afinal, “onde é que a morte evapora a desonra?” Britto desacredita que as pendências de honra devam ser lavadas com sangue. O “duelo dá azo a que o criminoso proclame-se de triunfador, e bem assim, a que o inocente se transforme em criminoso; sendo que tudo o mais provará, nunca, porém, em matéria de honra”. Como o parlamentar Viriato Medeiros, considera que a legalização do duelo seria algo irracional e inútil: “irracional por que deixa tanto o inocente quanto o culpado expostos à pena última; e inútil por que jamais poderá declarar quem teve razão ou quem teve crime, nem tampouco qual dos contendores teve honra ou não a teve”.

Outra personalidade de renome que se destacou como grande opositor dos duelos foi “Sr. promotor público, o Dr. Viveiros de Castro”, o mais “feroz oponente do duelo”, segundo expressão de Braga-Pinto (2014Braga-Pinto, César. (2014), “Journalists, capoeiras, and the duel in nineteenth-century Rio de Janeiro”. Hispanic American Historical Review, 99 (4): 581-614, nov./dec., p. 608). Em crônica de 8 de março de 1891, publicada na Gazeta de Notícias, noticiava-se que, findo o duelo Assis Brasil-Hygino, Viveiros de Castro entrou “com seu pedido de licença aos presidentes do senado e da câmara para denunciar aqueles representantes do país, e mais os seus padrinhos, como incursos nos artigos tais e tais do código penal”16 16 Crônica da Semana, 1891. . A julgar pela crônica, a atuação do promotor foi bem acolhida pela opinião pública ao pôr em prática o novo Código Penal de 1890. Como se pode perceber, entre os opositores do duelo, predominava o entendimento de que este era uma prática violenta que em nada agregava à resolução das pendências ditas de honra, sendo não apenas um barbarismo letal, mas um inibidor da racionalidade individual. Uma resolução verdadeiramente honrosa impediria que um delito pudesse ser punido com outro, segundo a prática da “justiça com as próprias mãos”, daí a necessidade da intermediação do Estado, que cumpria, segundo o princípio de Wieviorka, com a função básica de impedir a destruição do adversário. Moralmente tipificado como crime, o duelo deveria ser então duramente incriminado e recriminado, como de fato o é legalmente por Viveiros de Castro.

Os praticantes

Em crônica de 14 de outubro de 188817 17 Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo) 1888a. Ao comentar sobre o caso no Senado, o Sr. Cândido de Oliveira ouviu de um de seus pares que “a isto se responde com riso”, deixando entrever o grau de seriedade com que eram tratados os duelos. Ver Anais do Senado do Império, sessão de 13 de outubro de 1888, Reclamações, p. 178-179. , Arthur Azevedo novamente dedicou-se à análise do duelo. Tratava-se, dessa vez, do embate “entre o Sr. senador Cândido de Oliveira e o Sr. Alexandre D’Atri, agente de colonização”. Ao noticiá-lo, vaticinava que caso “se realizar o encontro, e houver sangue, embora pouco, os duelos ficarão para sempre fixados nos nossos costumes, e perderão a camada de ridículo que os envolve”. Assertiva importante, pois não nega a distinção dos envolvidos, pelo contrário, se vale dela para validar uma prática tida por excêntrica. Com sua característica bonachona, prescreve que “no Brasil as coisas tomam sempre um caráter sério desde que haja um senador envolvido nelas”, e “desde que o duelo entre no rol das coisas sérias, haverá o maior cuidado em evitá-lo, provindo daí bons elementos para a moralidade do parlamento e da imprensa”, segundo o argumento já conhecido. Azevedo não nega que “à primeira vista parece absurdo confiar à sorte das armas e aos caprichos do acaso a resolução das pendências de honra, e é muito comum ver o ofendido morto ou ferido pelo ofensor”, o que não o impede afirmar que “esse é, infelizmente, o único meio de reprimir a imoderação de linguagem que caracteriza o nosso meio jornalístico e parlamentar”. O duelo cumpriria uma função regulatória: “desde que se arriscasse a pele nessas contendas, não seriam elas tão numerosas nem tão ignóbeis”.

É preciso contextualizar a questão da liberdade de imprensa. José Murilo de Carvalho afirma que o “Império foi o período da história brasileira em que a imprensa foi mais livre” (1996Carvalho, José M. (1996), A construção da Ordem: a elite política imperial e Teatro de Sombras: a política imperial. Rio de Janeiro, Editora ufrj, Relume-Dumará., p. 46), opinião que é corroborada por Luciana Fagundes que, embasada nos arquivos do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro - ihgb, afirma ser possível caracterizar a monarquia como “época de paz, união e, principalmente, de liberdade de expressão” (2016, p. 48), segundo a comparação com os primeiros governos republicanos. Compreende-se, assim, o posicionamento de Azevedo como favorável não tanto ao duelo, mas antes ao papel que este desempenharia no meio jornalístico. Com efeito, alguns meses depois do caso narrado, o tema novamente voltava à baila.

No editorial da Gazeta da Tarde, de 4 de dezembro de 1888, anunciava-se outro duelo, dessa vez entre o “nosso colega” Germano Hasslocher e o “também jornalista” Pardal Mallet18 18 Editorial, 1888. . Após classificá-lo positivamente como algo corriqueiro em outros países, sobretudo na França, é informado que “foram testemunhas por parte do nosso companheiro de redação o Dr. Gregório de Almeida, redator do Diário de Notícias e o nosso colega e amigo Antônio Azeredo e testemunhas do Dr. Pardal Mallet os Srs. Dr. Luiz Murat e Coelho Neto, também jornalistas”. Por aí se vê o quanto a prática era restrita a um mesmo grupo. Após informar os fatos com minúcias, o que leva a crer que a notícia de um duelo continuasse a despertar a atenção dos leitores, a narrativa concentra-se em pormenorizar o desfecho do embate: “no terceiro assalto, foi ferido no braço direito o nosso colega: julgou-se que estava salva a honra dos dois combatentes, que portaram-se galhardamente, colocando a coragem acima da inabilidade no manejo das armas, e deu-se por findo o encontro”. Nas entrelinhas, o exotismo de uma prática levada a cabo por indivíduos que sequer dominavam o manejo das armas, mas que buscavam nela, ou melhor, através dela, ressaltar sua galhardia.

Alguns dias depois, novamente os jornais noticiavam um duelo que se formava entre dois de seus incentivadores, Pardal Mallet e Arthur Azevedo. O embate não chegou a ocorrer, todavia é interessante que o analisemos. Em crônica de 29 de dezembro de 1888, Azevedo alegava que a notícia não passava de um boato, que “é mentira”, e que não foi “convidado nem aquiesci”19 19 Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo), 1888b. . Azevedo alegou ainda que a “mofina que aludi está assinada pelo Sr. Pardal Mallet, e contém, realmente, injúrias difíceis de roer; nenhum esforço, entretanto, posso tirar”. Os insultos de Mallet foram feitos alguns dias antes da crônica de Azevedo, mas só foram publicados, “por falta de espaço”, no dia seguinte, portanto em 30 de dezembro de 188820 20 Mallet, 1888b. . A origem da desavença teria sido uma questão literária qualquer, da qual Mallet se sentira insatisfeito. Soma-se a isso uma suposta crítica de Azevedo ao seu romance O Lar. Mallet chamou Azevedo de “mesquinho”, “tacanho”, “pulha”, alguém que “tem a coragem dos covardes, investindo manhosamente contra quem está distraído”. Mas vai além, e afirma que o “Sr. Arthur Azevedo”, “homem que já tem a epiderme coriácea pelo hábito de receber o insulto”, seria um “capoeira literário que converteu a pena em navalha, e que de quando em vez faz um sarilho na imprensa para não perder a ciência da cabeçada”, frisando ainda que o mesmo “quer, entretanto, gingar comigo”, o que o leva a asseverar que “esse procedimento de chocar odiosinhos e de fazer emboscadas - procedimento próprio de um homem de mau caráter - quem o tem é o Sr. Arthur Azevedo”.

Bastou substituir o duelo pela capoeira e a espada pela navalha para fazer da associação um estigma. A recusa de Azevedo é significativa, mas não mais do que o fato de que, ao longo de sua crônica, indiretamente desacredita o duelo ao classificar como infundados os motivos que levaram Mallet a alegar que sua honra fora ferida. Azevedo, então com 33 anos, atribui o desafio aos excessos da juventude de Mallet, que recém completara seus 24, deixando transparecer que, se incentivou a prática como função regulatória, nem por isso a tinha verdadeiramente “no rol das coisas sérias”. Ademais, a atitude de Mallet lembra a crítica de Raul Pompeia, pois deixa transparecer que o duelo estava restrito aos que se esforçavam por introduzi-lo nos “costumes nacionais”. Ademais, se a juventude teve seu quinhão de influência na personalidade de Mallet, outro fato que deve ser levado em consideração é que o rapaz, que nasceu na belicosa província do Rio Grande do Sul, era filho e neto de militares. De fato, a forma como procedia em relação ao duelo era conhecida, o que lhe rendeu uma dedicatória de Magalhães Castro, que compusera uma polca intitulada A duelista, conforme consta no jornal Cidade do Rio, de 29 de janeiro de 188921 21 Editorial, 1889a. “Entrou-nos hoje pelo escritório adentro alegre, buliçosa, saracoteando a Duelista. Não vão pensar agora que se trata de algum espadachim. A Duelista é pura e simplesmente uma polca deliciosa, que o seu autor, o Sr. Magalhães Castro ofereceu ao nosso colega de redação Dr. Pardal Mallet. A polca é editada pela casa A. Fertim de Vasconcellos & Cia., da rua do Carmo n. 25. Agradecendo a delicadeza da oferta, sentimo-nos ainda mais penhorados pela lembrança da dedicatória”. .

Mallet não só foi um duelista praticante como também serviu de padrinho para seus amigos. É o que aconteceu, por exemplo, no caso do duelo ocorrido entre o escritor Coelho Neto e o redator e jornalista Castro Soromenho, segundo notícia publicada pela Gazeta de Notícias em 28 de maio de 188922 22 Editorial, 1889b. . Igualmente ocorrido em uma ilha à época deserta, a Ilha de Paquetá, os motivos se repetem: houve “entre os dois cavalheiros uma questão, em resultado da qual houve frases que o Sr. Soromenho julgou ofensivas à sua honra”. Em vista disso, os “Srs. Filinto de Almeida e Germano Hasslocher foram por eles encarregados de pedir a retratação dessas frases, ou uma reparação pelas armas”. Coelho Neto, por sua vez, nomeou como seus padrinhos os “Srs. Pardal Mallet e Manuel Carneiro”. O duelo não pôde ser evitado, uma vez havia certo entusiasmo por parte dos ofendidos, e talvez ainda mais por parte dos padrinhos. “Foi resolvido que o duelo seria à epée de combat, que terminaria ao primeiro sangue, e que a sorte designaria o padrinho que devia dirigir o combate. Coube a sorte ao Sr. Pardal Mallet”. “Trocados diversos golpes, o Sr. Coelho Neto recebeu um ferimento na região superior do esterno”, isto é, no peito, o que fez com que prontamente os padrinhos dessem “por terminado o combate, conforme o convencionado”, e assistido pelos “médicos os Drs. Monat e Leal da Cunha”. O duelo foi também noticiado, em reportagem do mesmo dia, n’O Paiz23 23 Editorial, 1889c. . Consta que o florete fora “corajosamente” manejado “por ambos os contendores”, e que o “assalto durou cerca de 10 minutos”, mas não é dito nada acerca dos motivos que levaram ao duelo, salvo que eram desconhecidos.

O relato está em sintonia com Thompson Flores e Remedi (2019Thompson Flores, Mariana F. C. & Remedi, José M. R. (2019), “Território neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século xix às primeiras décadas do século xx”. História, 38: 1-25, jan./dez., p 13), para quem os duelos não se destinavam a matar ou ferir os oponentes, mas tão somente a se impor como um ritual de desagravo, embora distinto da pura e simples vingança. Logo, era comum que a reparação se desse ao “primeiro sangue”, o que obviamente não diminui o risco de ferimentos graves. Realmente, a pendência parecia não ser grave, a julgar pela ausência declarada dos motivos e pela relativa facilidade com a qual a honra foi reparada. Esse raciocínio é reforçado pelo próprio Castro Soromenho que dali a alguns meses, em 31 de agosto de 1889, publicava uma edição do Archivo Comtemporaneo em que não poupava elogios a Coelho Neto, Francisco de Paula Ney e Pardal Mallet. Contudo, poucos dias depois da contenda, os jornais anunciavam um novo duelo, desta vez a entre Olavo Bilac e Pardal Mallet.

Ao contrário dos duelos anteriores, houve nesse alguns contratempos, como se pode inferir pelo editorial da Cidade do Rio, de 24 de setembro de 188924 24 Editorial, 1889d. . O primeiro incidente diz respeito aos padrinhos. Os que foram escolhidos pela primeira vez desistiram de atuar no combate devido à perseguição da polícia. Novos padrinhos foram arranjados, mas como a repressão policial não arrefeceu, os contendores acharam por bem bater-se a sós. Três tópicos sobressaem desse caso: primeiro, o entusiasmo, quase obsessão, pela prática do duelo; segundo, a proximidade dos envolvidos, homens de mesma classe e condição, além de bons amigos; por fim, a repressão policial. Sobre esta última questão, cabe destacar que, se o debate parlamentar de 1886 não chegou a um consenso acerca da tipificação do duelo como crime, o que só viria a ocorrer com o Código Penal republicano, a perseguição policial denota que havia um entendimento prévio de que a prática poderia ser enquadrada, senão como crime, como ato ilegal (nesse caso, a respeitabilidade dos praticantes não seria um atenuante).

A causa do duelo foi uma suposta ofensa cometida por Bilac, o que bastou para que Mallet o desafiasse para “uma reparação pelas armas”. Mallet teve como testemunhas primárias os “Srs. Henrique Stepple e Coelho Neto”, enquanto que Bilac requisitou a assistência dos “Srs. José do Patrocínio e Emílio Rouéde”, ficando acertado que os beligerantes se dariam por “satisfeitos e desafrontados ao primeiro sangue”. Contudo, segundo uma narração digna de Arthur Azevedo, o duelo não ocorreu naquela ocasião, porquanto “durante toda a noite de terça-feira e toda a manhã de quarta-feira, foram, contendores e padrinhos, seguidos pela polícia”. Como os primeiros padrinhos desistiram, foram substituídos pelos “Srs. Orozimbo Muniz Barreto e José Augusto Vinhaes”, em favor de Mallet, e os “Srs. Castro Soromenho e Emanuel Carneiro”, em favor de Bilac. No final, o imbróglio se resolveu rapidamente e sem padrinhos. “Bateram-se sem camisa, com o peito inteiramente descoberto. O combate demorou 4 segundos. O Sr. Pardal Mallet recebeu um ferimento no lado esquerdo do ventre”. Estava encerrada a pendência. Mas esse não seria o último duelo de Bilac. Alguns anos depois, em 1892, bateu-se também com Raul Pompeia.

Antes, porém, outro duelo ganhou as estampas da imprensa finissecular. Trata-se do duelo entre Joaquim Francisco de Assis Brasil e José Higyno Duarte Pereira. A trama foi criticada por Emmanuel Carneiro em crônica de 1º de março de 189125 25 Carneiro, 1891a. . A crítica se deve às expectativas frustradas do cronista, para quem as testemunhas “procederam mal”, pois estavam em desacordo com o que supõe ser os ritos do duelo. “Doente e aflito, como estou, abeiro-me a custo à mesa de trabalho do meu quarto, para escrever esta crítica do incidente, que tanto me interessa, e enviar ao mesmo tempo os meus cumprimentos e os meus aplausos”, porquanto “eu trabalho pela introdução do duelo”. Ao contrário dos duelos anteriores, este teria sido efetuado por meio de armas de fogo26 26 As estatísticas analisadas por Gabriel Tarde (1892, p. 54) para a Europa demonstram que parte significativa dos duelos usava armas brancas ao invés de armas de fogo. Por exemplo, dos 269 duelos registrados na Itália em 1888, apenas 15 utilizaram armas de fogo, contra 254 que optaram pelo sabre ou espada. . A notícia é comprovada pela Gazeta de Notícias, que publicaria alguns dias depois, em 8 de março de 1891, uma nova versão dos fatos27 27 Crônica da Semana, 1891. . O texto realça que o duelo ofereceu “uma pequena diversão aos espíritos dos frequentadores da rua do Ouvidor”, e também que Assis Brasil era um bom atirador, ao passo que o seu adversário mal sabia manusear a arma. Para Gabriel Tarde (1892Tarde, Gabriel. (1892), Études pénales et sociales. Paris, G. Masson Éditeur., p. 77), contemporâneo dos fatos, casos desta natureza, nos quais há um descompasso entre os beligerantes, eram metade-suicídio, metade-assassinato.

O último embate anunciado entre os membros desse grupo de intelectuais foi o duelo Bilac-Pompeia. O motivo da desavença é já conhecido: insultos publicados na imprensa. Esse duelo, no entanto, foi diferente dos anteriores em vários aspectos. A começar que o verdadeiro motivo da desavença entre aqueles que antes da República foram bons amigos é de ordem política. Pompeia era florianista, Bilac um contumaz crítico de Floriano. As ofensas tinham como origem não mais as picuinhas, como aquelas observadas entre Mallet e Azevedo, mas posicionamentos e atuações profissionais efetivas junto à burocracia estatal. Basta dizer que ao contrário dos casos anteriores, quando momentos após o combate os duelistas confraternizavam como bons amigos, Pompeia nunca mais procurou Bilac (segundo algumas fontes da época, o seu suicídio teria relação direta com seus posicionamentos políticos, radicalmente afetados com a virada governamental de Prudente de Morais, que trouxe Bilac e seu grupo de volta aos bastidores do governo).

Ana Silva (2002)Silva, Ana Carolina F. (2002), “Entre a pena e a espada. Literatura e política no governo de Floriano Peixoto: uma análise do jornal O Combate (1892)”. Cadernos ael, Campinas, 9 (16-17): 137-178, jan./dez., que explorou o episódio com propriedade, tem toda a razão ao afirmar que aquilo que começou com desavenças políticas foi, pouco a pouco, transformado em desavenças pessoais. O auge dos desentendimentos, e consequentemente a causa do duelo, diz respeito ao comentário que Olavo Bilac direcionou a Raul Pompeia no final de sua crônica publicada em O combate, no dia 8 de março de 189228 28 Pierrot (Pseud. de Olavo Bilac), 1892. . Mas antes de analisar o seu conteúdo, convém salientar uma interessante observação de Silva (2002Silva, Ana Carolina F. (2002), “Entre a pena e a espada. Literatura e política no governo de Floriano Peixoto: uma análise do jornal O Combate (1892)”. Cadernos ael, Campinas, 9 (16-17): 137-178, jan./dez., p. 141). Segundo a autora, a publicação dessa crônica possivelmente resulta de um mal-entendido: “os biógrafos e memorialistas”, diz ela, são “unânimes” quanto ao fato de que naquela “edição de O Combate, o texto da série teria sido escrito por Oscar Rosas” a pedido do próprio Olavo Bilac, ou seja, não teria sido Bilac o autor. Contudo, verdade ou não, a assinatura da crônica permanece sob o pseudônimo Pierrot, usado por Bilac. Conforme Silva (2002Silva, Ana Carolina F. (2002), “Entre a pena e a espada. Literatura e política no governo de Floriano Peixoto: uma análise do jornal O Combate (1892)”. Cadernos ael, Campinas, 9 (16-17): 137-178, jan./dez., p. 142), Pompeia teria salientado que esse fato não isentaria Bilac da responsabilidade assumida, como secretário do jornal, de lê-la antes de sua publicação. Bilac, por sua vez, teria procurado Pompeia para desculpar-se, mas foi ignorado. Daí a opção de Pompeia por responder da mesma forma, ou seja, em crônica publicada no Jornal do Commercio, no dia 15 de março de 189229 29 Y. (Pseud. de Raul Pompeia), 1892. .

Nas “Lembranças da Semana, folhetim d’O Jornal do Commercio”, diz Pierrot, “bem estão merecendo da nossa crônica uma menção especial”. Essa atenção devia-se ao fato de que o “autor das Lembranças é um empregado do governo, professor de Mitologia da Escola de Belas Artes”, cargo este que explicaria o viés governista de Pompeia. Esse “moço bem podia ganhar e ingerir o seu ordenado completamente, sem rebaixamentos de caráter e sem alusões indignas”, mas “ele, entretanto, prefere comer esse pão que o diabo amassou repassando-o pela manteiga do servilismo e da adulação”. Percebe-se que o teor das críticas atinge a honra de Raul Pompeia (“rebaixamento de caráter”, “alusões indignas”, “servilismo”, “adulação”), e não mais apenas suas posições políticas. As críticas, no entanto, não cessariam aí: Pompeia “é muito pretensioso quando pensa que, incensando o marechal Deodoro, o arrasta para as bandas florianistas, onde a desonra impera”. Mas isso “talvez não seja pretensão, talvez seja amolecimento cerebral”, afinal, “Raul Pompeia masturba-se e gosta de, a altas horas da noite numa cama fresca, à meia luz de veilleuse mortiça, recordar, amoroso e sensual, todas as lealdades30 30 Na publicação original está escrito “lealdades” e não “beldades”, conforme consta no texto de Silva (2002). que viu durante o seu dia, contando em seguida as tábuas do teto, onde elas vaporosamente valsam”.

As críticas são contundentes. Mas o que causou o maior incômodo em Pompeia - e possivelmente nos leitores da época - foi a causa do “amolecimento cerebral”, ou seja, o fato de Pompeia masturbar-se. Embora um assunto como este possa parecer hoje normal, no século xix a masturbação era tida como um desvio patológico. Afora o ato em si, sugere ainda o cronista que não seria saudável que mulher alguma se aproximasse de Pompeia, dado seu comportamento libidinoso. Ora, no seu conjunto, o teor dessas poucas linhas é suficiente para causar, no mínimo, um sério embaraço tanto para o acusador quando para o acusado. Pompeia responderia da mesma forma, dedicando algumas poucas linhas igualmente no final de sua crônica, publicada no dia 15 de março de 1892. De acordo com Pompeia, “pode-se lançar à conta dos fatos da semana a agressão que sofreu nominalmente o obscuro autor destas crônicas” por “parte dos escritores prováveis ou certos da seção especial dos desaforos, de um dos diários desta cidade”. É assim que Pompeia visa transmitir a noção de insignificância e amadorismo do seu detrator, afinal, não se sabe se ele é um escritor (“escritor provável”), embora sugira que não seja, dado que um escritor não se prestaria a assinar uma “seção de desaforos”. “Fato mínimo”, prossegue, pois este “só não foi personalíssimo porque foi um caso de imprensa, e por isso apenas é lembrado em fim de crônica”.

O ápice de sua narrativa se dá então quando reflete sobre a possibilidade de uma resposta “à altura”. “Quanto a responder…”, diz ele, “haveria mister voltar contra os agressores a mesma arma fácil da afronta, de que se servirão, assacar um doesto bem forte, dizer, por exemplo, detidamente” - e aqui Pompeia desfere sua crítica mais contundente - “que o ataque foi bem digno de uns tipos, alheados do respeito humano, licenciados, marcados, sagrados - para tudo - pelo estigma preliminar do Incesto”. Pompeia se referia ao fato de que Olavo Bilac não tinha filhos e sequer tinha interesse em tê-los, pois já era o responsável pela educação de seu sobrinho tal como se seu filho fosse, daí a alusão ao incesto. Apesar da gravidade das afrontas, ainda não se cogitava a ideia de um duelo. Ana Silva (2002Silva, Ana Carolina F. (2002), “Entre a pena e a espada. Literatura e política no governo de Floriano Peixoto: uma análise do jornal O Combate (1892)”. Cadernos ael, Campinas, 9 (16-17): 137-178, jan./dez., p. 142), pautada na leitura de alguns biógrafos e memorialistas, afirma que após a publicação das crônicas houve acidentalmente um encontro entre os escritores na “confeitaria Cailteau”, ocasião em que ambos “se atracaram aos safanões e se esbofetearam, sendo apartados graças às várias investidas dos colegas que se encontravam no local”.

A agressão foi uma sequência (e consequência) daquilo que não poderia ser ex-presso através das crônicas, ou pelo menos não sem antes comprometer o prestígio dos escritores. O ato seguinte, naturalmente, foi duelo31 31 De acordo com Silva (2002, p. 142-143), pautada em Rodrigo Octávio, a ideia do duelo partira não de Bilac, mas curiosamente do próprio Pompeia (o que é confirmado por Viveiros de Castro). José Broca (1961, p. 4) também confirma essa versão. Não esqueçamos que Pompeia desprezava os duelos, o que demonstra sua fúria. . Em resumo, o embate teve por padrinhos Pedro Rabello e João Andrea, em favor de Pompeia, e Jesuíno de Carvalho e o capitão Carvalho como padrinhos de Bilac. Entre as tratativas e o desfecho daquilo que Arthur Azevedo chamou de “duelo gorado”, houve episódios no mínimo curiosos32 32 Azevedo, 1892. . É o caso, por exemplo, da escalada no muro da casa dos irmãos Bernadelli, que não estavam em sua casa na ocasião. No derradeiro momento, julgando ser o caso de extrema seriedade devido ao real perigo de morte, os padrinhos convenceram Bilac e Pompeia a fazer as pazes. O atrito, no entanto, não mais desapareceria.

Se a honra ferida pode levar agredido e agressor a colocarem a vida em risco, é pouco provável que terminado o embate os beligerantes voltem a ser amigos. Entretanto, não é o que se aplica a maior parte dos casos analisados pela simples razão de que o duelo não abalou os laços de amizade. Inclusive, somos tentados a crer que muitos duelos só ocorreram porque os envolvidos estavam entre amigos. A coesão era tamanha que Pardal Mallet sentia-se autorizado a exprimir uma dimensão claramente familiar ao grupo de intelectuais a que pertencia, como fica visível em crônica de 10 de julho de 1890, na qual afirma que “fomos - o Bilac, o Pompeia, o Neto, o Guimarães, o Alcindo e eu, quase todos da mesma idade, nascido entre os anos de 63 e 65, reunidos pela convivência acadêmica”, além de estarem “bastante certos para aceitar a camaradagem dos veteranos - Luiz Murat, Paula Ney, Aluísio Azevedo, Emílio Rouéde e Arthur Azevedo, bastante fortes para fazer de todo este pessoal uma só família”33 33 Mallet, 1890. . Conforme Mallet, “nós fomos um grupo principalmente solidário pela amizade”, e “nunca faltamos ao apelo do interesse coletivo, nunca deixamos de ser - um por todos e todos por um”. Sem dúvida, a conhecida máxima dos mosqueteiros de Dumas resume o ideal do duelo ao mesmo tempo em que nomeia os duelistas.

A avaliação de Mallet é confirmada por Valentim Magalhães, quando este es-creveu seu necrológico, publicado em 16 de fevereiro de 189534 34 Magalhães, 1895. . De acordo com Magalhães, Mallet fazia parte do ciclo de amizades que compreendia Guimarães Passos, José do Patrocínio, Luiz Murat, Paula Ney, Olavo Bilac, Raul Pompeia e “outros fulgurantes rapazes da boemia dourada do Rio”. Magalhães fornece ainda uma importante interpretação do fenômeno quando rememora o duelo ocorrido entre Mallet e Bilac. Escreve o cronista que não sabia por qual “futilidade chegaram à contingência dolorosa de baterem-se”, no entanto, o “que sei é que na véspera do duelo o Bilac foi na casa do Mallet com os floretes, passou com ele a noite a tomar conhaque e a fumar cigarros na maior cordialidade”; chegada a aurora, “foram para o quintal, puseram-se nus da cinta para cima e bateram-se, sem testemunhas, com armas que nenhum deles conhecia”. Ferido Mallet, tão logo “Bilac viu o sangue no peito do seu querido amigo atirou-se a ele chorando, levou para a cama e saiu, como um doido, em cabelo, a procura de um médico. O ferimento foi leve”.

Considerações finais

Considerar o duelo uma prática criminosa pressupõe, conforme pondera Misse (2010Misse, Michel. (2010), “Crime, sujeito e sujeição criminal: aspectos de uma contribuição analítica sobre a categoria ‘bandido’”. Lua Nova, 79: 15-38, jan./abr., p. 24), que ele tenha chances objetivas de ser criminado e que os atores envolvidos estejam conscientes de que poderão ser submetidos a um “processo de incriminação”. Naturalmente, para que tal processo ocorra, deve existir o que Misse (2010Misse, Michel. (2010), “Crime, sujeito e sujeição criminal: aspectos de uma contribuição analítica sobre a categoria ‘bandido’”. Lua Nova, 79: 15-38, jan./abr., p. 22) chama de “pauta classificatória”, a exemplo dos Códigos Penais, que é “anterior e exterior ao evento”. A classificação de um indivíduo ou sua transgressão conforme preconiza, por exemplo, o Código Penal, constitui um “complexo processo de interpretação baseado também em poderes de definição da situação” (2010, p. 22-23). O Código Penal de 1890, portanto um código republicano, constituiu um importante marco contra a prática do duelo, conforme defende Braga-Pinto (2018)Braga-Pinto, César. (2018), A violência das letras: amizades e inimizades na literatura brasileira (1888-1940). Rio de Janeiro, Eduerj.. No entanto, para Thompson Flores e Remedi (2019Thompson Flores, Mariana F. C. & Remedi, José M. R. (2019), “Território neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século xix às primeiras décadas do século xx”. História, 38: 1-25, jan./dez., p. 10), também é igualmente verdadeiro que o referido código assegurou a distinção social dos praticantes por meio da cuidadosa redação que objetivava “descrever as circunstâncias distintivas que configuram um duelo”, resguardando-as a “uma determinada camada social apta a lançar mão daqueles recursos”, consequentemente os diferenciando dos “conflitos comuns de outras ordens para os quais as penas seriam pesadas”.

A incriminação, que é também um processo social, se manifesta na forma como o Código Penal de 1890 foi constituído35 35 Brasil, Código Penal de 1890, título x, capítulo vi, integralmente dedicado ao duelo. . De um lado, se tipificou como crime o duelo, por outro, assegurou que o mesmo não fosse classificado como uma contravenção qualquer. A distinção social estava assegurada. Mas não menos importante é o fato de que, se o duelo constituiu uma forma extraoficial de manejar a violência privada para resolver conflitos no interior de um grupo seleto, e se uma das características desse fenômeno consistia não apenas em assegurar certo prestígio a seus praticantes, como também sua oposição a manifestações semelhantes entre as classes populares, o primeiro Código Penal republicano consolidou na interpretação oficial a moral hegemônica: de acordo com Misse, (1999, p. 184), o novo código teria transformado a “prática da capoeira de simples contravenção em crime, agravado se existir formação de grupo ou malta”. Uma vez mais, a distinção social estava assegurada.

Em mais de uma ocasião o duelo esteve associado ao universo dos costumes tidos por galantes, distintos, nobres. Talvez o fato de que o Brasil fosse uma monarquia em que conviviam nobres de diferente hierarquia, por mais que essa fosse apenas nominal, tenha de alguma forma contribuído para que o duelo se tornasse uma moda. Porém, como toda moda é passageira, também o duelo foi esquecido após a Proclamação da República, período histórico que coincidiu com o envelhecimento natural dessa geração de intelectuais (sem falar nos efeitos ocasionados pelas mortes abruptas de Pardal Mallet, em 1894, e Raul Pompeia, em 1895). Evidentemente, a República não significou seu imediato desaparecimento, como atestam os achados de Thompson Flores e Remedi (2019)Thompson Flores, Mariana F. C. & Remedi, José M. R. (2019), “Território neutro: soberanias justapostas e duelos de honra às margens dos estados nacionais sul-americanos de meados do século xix às primeiras décadas do século xx”. História, 38: 1-25, jan./dez.. Mas certamente desempenhou um papel decisivo no que se refere à tipificação do duelo como um crime, demonstrando com isso o interesse de assegurar ao Estado o monopólio dos usos legítimos da força física.

  • 1
    Conforme crônica publicada no jornal Gazeta de Notícias, em 16/09/1886, p. 2.
  • 2
    O Rio Grande do Sul foi palco de inúmeros conflitos armados, tais como a Guerra dos Sete Povos (1753-1756), a Guerra de 1801, a Guerra contra Artigas (1816-1820), a Guerra da Cisplatina (18251828) e a Guerra do Paraguai (1864-1870); em nível regional ou nacional pode-se citar ainda a Guerra dos Farrapos (1835-1835), a Revolução Federalista (1893-1895) e a Revolução de 1923. Para Cervo e Bueno (2011)Cervo, Amado L. & Bueno, Clodoaldo. (2011), História da política exterior do Brasil. Brasília, Editora UnB., Félix (1987)Félix, Loiva O. (1987), Coronelismo, Borgismo e cooptação política. Porto Alegre, Mercado Aberto. e Reckziegel (1999)Reckziegel, Ana L. G. (1999), A diplomacia marginal: vinculações entre o Rio Grande do Sul e Uruguai (1893-1904). Passo Fundo, upf Editora., o constante estado de beligerância influenciou profundamente sua formação social e cultural.
  • 3
    Editorial, 1886Editorial. (1886), “Duelo”. Revista Ilustrada, Rio de Janeiro, 20/08, p. 3..
  • 4
    Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo), 1886Eloy, O Herói. (Pseud. A. Azevedo) (1886), “Croniqueta”. A Estação, Rio de Janeiro, 31/08, p. 64..
  • 5
    Diário das Câmaras, 1886Diário das Câmaras. (1886), Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 16/09, p. 2.. O relato contido nessa seção está conforme os Anais do Senado do Império do Brasil, Pedido de Informações, sessão de 15 de setembro de 1886, páginas 144-145. Nesse documento é informado que o presidente do Conselho, Sr. Barão de Cotegipe, declarou que as autoridades optaram por não apurar o duelo, uma vez que “não tiveram certeza dele”, embora alegue ter lido sobre o assunto nos jornais. Ao que parece, Cotegipe considerou o caso como irrelevante, o que gerou críticas por parte do Sr. Henrique d’Ávila, para quem o duelo era um crime, e não somente isso, mas, em sintonia com Arthur Azevedo, um crime ligado ao “abuso de liberdade de imprensa”.
  • 6
    Opinião semelhante, e igualmente contrastante, pode ser encontrada no longo e contemporâneo comentário de Oscar de Morais, quando de sua análise do Código Penal de 1890. Ver Brasil, 2004Brasil. (2004), Código Penal da República dos Estados Unidos do Brasil, 1890. Introdução e comentários de Oscar de M. Soares. Ed. fac-similar. Brasília, Senado Federal/stj., p. 634-640.
  • 7
    Editorial, 1886.
  • 8
    Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo), 1886.
  • 9
    Mallet, Pardal. 1888aMallet, Pardal. (1888a), “Duelo”. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 21/07, p. 1..
  • 10
    Cousas do Dia, 1890Cousas do Dia. (1890), Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 19/12, p. 1..
  • 11
    Carneiro, 1891Carneiro, E. (1891b), “Duelo: resposta”. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 05/03..
  • 12
    Grimm, 1891Grimm, Thomas. (1891), “Duelo na nossa época”. Gazeta da Tarde, rj, 23/03, p. 2..
  • 13
    A crônica encontra-se na compilação publicada em 1996. A cautela a citar essa edição se deve a algumas imprecisões, talvez de editoração: de um lado, as crônicas selecionadas não correspondem à sua versão original, já que algumas foram reduzidas a menos de um terço; de outro, há erros relacionados às datas de publicação. Por exemplo, a crônica publicada entre as páginas 30-31 é referenciada pela data de 19 de agosto de 1888, embora a versão correta seja 16 de setembro de 1888 (Jornal Diário de Minas/mg).
  • 14
    Pompeia, 1889Pompeia, Raul. (1889), “A vida na Corte”. Diário de Minas, Juiz de Fora, 29/09, p. 2-3..
  • 15
    Britto, 1890Britto, Augusto. (1890), “O duelo”. A Estação, Rio de Janeiro, 15/10, p. 84..
  • 16
    Crônica da Semana, 1891Crônica da Semana. (1891), Gazeta de Notícias, Rio de janeiro, 08/03, p. 1..
  • 17
    Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo) 1888aEloy, O Herói. (1888a), “De palanque”. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 14/10, p. 1.. Ao comentar sobre o caso no Senado, o Sr. Cândido de Oliveira ouviu de um de seus pares que “a isto se responde com riso”, deixando entrever o grau de seriedade com que eram tratados os duelos. Ver Anais do Senado do Império, sessão de 13 de outubro de 1888, Reclamações, p. 178-179.
  • 18
    Editorial, 1888Editorial. (1888), “Duelo”. Gazeta da Tarde, Rio de janeiro, 04/12, p. 1..
  • 19
    Eloy, O Herói. (Pseud. de Arthur Azevedo), 1888bEloy, O Herói. (1888b), “De palanque”. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 29/12, p. 1..
  • 20
    Mallet, 1888bMallet, Pardal. (1888b), “Alto lá!” Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 30/12, p. 3..
  • 21
    Editorial, 1889aEditorial. (1889a), Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 29/01, p. 1.. “Entrou-nos hoje pelo escritório adentro alegre, buliçosa, saracoteando a Duelista. Não vão pensar agora que se trata de algum espadachim. A Duelista é pura e simplesmente uma polca deliciosa, que o seu autor, o Sr. Magalhães Castro ofereceu ao nosso colega de redação Dr. Pardal Mallet. A polca é editada pela casa A. Fertim de Vasconcellos & Cia., da rua do Carmo n. 25. Agradecendo a delicadeza da oferta, sentimo-nos ainda mais penhorados pela lembrança da dedicatória”.
  • 22
    Editorial, 1889bEditorial. (1889b), Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 28/05, p. 1..
  • 23
    Editorial, 1889cEditorial. (1889c), “Duelo”. O Paiz, Rio de Janeiro, 28/05, p. 1..
  • 24
    Editorial, 1889dEditorial. (1889d), “Duelo”. Cidade do Rio, Rio de Janeiro, 24/09, p. 1..
  • 25
    Carneiro, 1891aCarneiro, E. (1891a), “Duelo Assis-Hygino”. Diário de Notícias, Rio de Janeiro, 01/03, p. 2..
  • 26
    As estatísticas analisadas por Gabriel Tarde (1892Tarde, Gabriel. (1892), Études pénales et sociales. Paris, G. Masson Éditeur., p. 54) para a Europa demonstram que parte significativa dos duelos usava armas brancas ao invés de armas de fogo. Por exemplo, dos 269 duelos registrados na Itália em 1888, apenas 15 utilizaram armas de fogo, contra 254 que optaram pelo sabre ou espada.
  • 27
    Crônica da Semana, 1891.
  • 28
    Pierrot (Pseud. de Olavo Bilac), 1892Pierrot (Pseud. Olavo Bilac). (1892), “Vida Fluminense”. O Combate, Rio de Janeiro, 08/03, p. 1..
  • 29
    Y. (Pseud. de Raul Pompeia), 1892Y. (Pseud. Raul Pompeia). (1892), “Lembranças da Semana”. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, 15/03, p. 1..
  • 30
    Na publicação original está escrito “lealdades” e não “beldades”, conforme consta no texto de Silva (2002)Silva, Ana Carolina F. (2002), “Entre a pena e a espada. Literatura e política no governo de Floriano Peixoto: uma análise do jornal O Combate (1892)”. Cadernos ael, Campinas, 9 (16-17): 137-178, jan./dez..
  • 31
    De acordo com Silva (2002Silva, Ana Carolina F. (2002), “Entre a pena e a espada. Literatura e política no governo de Floriano Peixoto: uma análise do jornal O Combate (1892)”. Cadernos ael, Campinas, 9 (16-17): 137-178, jan./dez., p. 142-143), pautada em Rodrigo Octávio, a ideia do duelo partira não de Bilac, mas curiosamente do próprio Pompeia (o que é confirmado por Viveiros de Castro). José Broca (1961Broca, José B. (1961), “Duelos de escritores: Pardal Mallet foi o que mais número travou”. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20/08., p. 4) também confirma essa versão. Não esqueçamos que Pompeia desprezava os duelos, o que demonstra sua fúria.
  • 32
    Azevedo, 1892Azevedo, Arthur. (1892), “Cartas fluminenses”. O Pharol, Juiz de Fora, 27/03, p. 1..
  • 33
    Mallet, 1890Mallet, Pardal. (1890), “Um que parte”. Gazeta de Notícias, Rio de janeiro, 10/07, p. 1..
  • 34
    Magalhães, 1895Magalhães, Valentim. (1895), “Pardal Mallet”. A semana, Rio de Janeiro, 16/02, p. 19..
  • 35
    Brasil, Código Penal de 1890, título x, capítulo vi, integralmente dedicado ao duelo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    14 Dez 2021
  • Aceito
    04 Jul 2022
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