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Rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas à luz da complexidade

Red social de apoyo a las personas de la tercera edad estomizadas a la luz de la complejidad

Resumos

OBJETIVO: Descrever a rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas representada por ecomapas das relações múltiplas de apoio, à luz do referencial da Complexidade. MÉTODOS: Estudo de caso realizado em um serviço de estomaterapia de um hospital universitário da região Sul do Brasil. Foram sujeitos quatro pessoas idosas estomizadas, três mulheres e um homem, entrevistados em ambiente domiciliar. RESULTADOS: Evidenciou-se a importância do suporte familiar, rede de amigos/vizinhos, serviço de estomaterapia com seus trabalhadores/estagiários de outros estomizados no cuidado às pessoas idosas estomizadas. Apesar da Unidade Básica de Saúde ser a porta de entrada ao atendimento do Sistema Único de Saúde, os sujeitos deste estudo buscaram no hospital a atenção as suas necessidades de saúde. CONCLUSÃO: A rede social de apoio mostra-se, por meio de relações e interações, inseridas no sistema social complexo. As relações de cuidado se fazem presentes nesta rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas e família.

Estomas cirúrgicos; Idoso; Assistência a idosos; Ostomia; Apoio social


OBJETIVO: Describir la red social de apoyo a las personas de la tercera edad estomizadas representada por ecomapas de las relaciones múltiples de apoyo, a la luz del referencial de la Complejidad. MÉTODOS: Se trata de un estudio de caso realizado en un servicio de estomaterapia de un hospital universitario de la región Sur del Brasil. Como sujetos participaron cuatro personas de la tercera edad estomizadas, de las cuales tres mujeres y un hombre, entrevistados en su ambiente domiciliario. RESULTADOS: Se evidenció la importancia del soporte familiar, red de amigos/vecinos, servicio de estomaterapia con sus trabajadores/practicantes de otros estomizados en el cuidado a las personas de la tercera edad estomizadas. A pesar de que la Unidad Básica de Salud sea la puerta de entrada a la atención del Sistema Único de Salud, los sujetos de este estudio buscaron en el hospital la atención a sus necesidades de salud. CONCLUSIÓN: La red social de apoyo se muestra, por medio de relaciones e interacciones, insertada en el sistema social complejo. Las relaciones de cuidado se hacen presentes en esta red social de apoyo a las personas de la tercera edad estomizadas y la familia.

Estomas quirúrgicos; Anciano; Asistencia a los ancianos; Ostomia; Apoyo social


OBJECTIVE: To describe the social network of support for stomized elderly people, represented by eco-maps of the multiple supporting relationships according to the Complexity referential. METHODS: Case study, carried out in a stomatherapy service at a university hospital in the Southern region of Brazil. Patients were four elderly stomized people, three women and one man, interviewed at their homes. RESULTS: The importance of family support, friend/neighbor network, stomatherapy service with its workers/interns of other stomized people in the care for elderly stomized people became evident. Although the Basic Health Unit is the entry door for the Single Health System service, the subjects of this study sought care for their health needs in the hospital itself. CONCLUSION: The social network of support reveals itself through relationships and interactions inserted in the complex social system. Care relationships are present in this social network of support to elderly stomized people and their families.

Surgical stomas; Aged; Old age assistance; Ostomy; Social support


ARTIGO ORIGINAL

Rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas à luz da complexidade* * Estudo desenvolvido em um serviço de estomaterapia de um hospital universitário da região Sul do Brasil, sendo parte da dissertação do Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande – FURG – Rio Grande (RS), Brasil.

Red social de apoyo a las personas de la tercera edad estomizadas a la luz de la complejidad

Edaiane Joana Lima BarrosI; Silvana Sidney Costa SantosII; Alacoque Lorenzini ErdmannIII

IMestre, Integrante do Grupo de Estudo e Pesquisa em Gerontogeriatria, Enfermagem/Saúde e Educação (GEP-GERON/CNPq) e do Grupo de Estudos da Complexidade (GEC/FURG/CNPq) - Rio Grande (RS), Brasil

IIDoutora, Professora da Graduação e do Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande – FURG – Rio Grande (RS), Brasil

IIIDoutora, Professora Titular da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC - Florianópolis (SC), Brasil

Autor Correspondente Autor Correspondente: Edaiane Joana Lima Barros R. Santa Catarina, 536 Rio Grande - RS – CEP. 96211-600 E-mail: edaiane_barros@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Descrever a rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas representada por ecomapas das relações múltiplas de apoio, à luz do referencial da Complexidade.

MÉTODOS: Estudo de caso realizado em um serviço de estomaterapia de um hospital universitário da região Sul do Brasil. Foram sujeitos quatro pessoas idosas estomizadas, três mulheres e um homem, entrevistados em ambiente domiciliar.

RESULTADOS: Evidenciou-se a importância do suporte familiar, rede de amigos/vizinhos, serviço de estomaterapia com seus trabalhadores/estagiários de outros estomizados no cuidado às pessoas idosas estomizadas. Apesar da Unidade Básica de Saúde ser a porta de entrada ao atendimento do Sistema Único de Saúde, os sujeitos deste estudo buscaram no hospital a atenção as suas necessidades de saúde.

CONCLUSÃO: A rede social de apoio mostra-se, por meio de relações e interações, inseridas no sistema social complexo. As relações de cuidado se fazem presentes nesta rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas e família.

Descritores: Estomas cirúrgicos; Idoso; Assistência a idosos; Ostomia/enfermagem; Apoio social

RESUMEN

OBJETIVO: Describir la red social de apoyo a las personas de la tercera edad estomizadas representada por ecomapas de las relaciones múltiples de apoyo, a la luz del referencial de la Complejidad.

MÉTODOS: Se trata de un estudio de caso realizado en un servicio de estomaterapia de un hospital universitario de la región Sur del Brasil. Como sujetos participaron cuatro personas de la tercera edad estomizadas, de las cuales tres mujeres y un hombre, entrevistados en su ambiente domiciliario.

RESULTADOS: Se evidenció la importancia del soporte familiar, red de amigos/vecinos, servicio de estomaterapia con sus trabajadores/practicantes de otros estomizados en el cuidado a las personas de la tercera edad estomizadas. A pesar de que la Unidad Básica de Salud sea la puerta de entrada a la atención del Sistema Único de Salud, los sujetos de este estudio buscaron en el hospital la atención a sus necesidades de salud.

CONCLUSIÓN: La red social de apoyo se muestra, por medio de relaciones e interacciones, insertada en el sistema social complejo. Las relaciones de cuidado se hacen presentes en esta red social de apoyo a las personas de la tercera edad estomizadas y la familia.

Descriptores: Estomas quirúrgicos; Anciano; Asistencia a los ancianos; Ostomia/enfermería; Apoyo social

INTRODUÇÃO

A estomia pode representar uma limitação aos projetos de vida das pessoas, principalmente quando estas estão idosas. Após a estomização as pessoas são estimuladas a manter um controle rigoroso no seu estilo de vida, além da vigilância constante sobre os sinais e sintomas e do re-aparecimento de células tumorais e de quadros infecciosos, mediante educação e acompanhamento de saúde periódicos.

O estoma é uma abertura cirúrgica no abdômen, onde dejetos são expelidos quando a função normal do intestino ou da bexiga é interrompida. Existem três tipos básicos de estomias: ileostomia, que é a abertura oriunda do intestino delgado - porção do íleo; colostomia, abertura oriunda do intestino grosso cólon; ambas dão passagem às fezes; urostomia, que é a abertura que dá passagem à urina. O estomizado usa uma bolsa coletora que adere ao abdômen, a fim de proteger a pele e coletar os dejetos(1).

A pessoa idosa com estomia, permanente ou temporária, apresenta-se com muitas dúvidas quanto às condições de saúde e com seus medos internos que a tornam resistente às orientações. Ela acredita que, com suas fragilidades subentendidas pela idade, não é capaz de romper com este quadro de inconformidade e possibilitar uma nova forma de ser mais saudável, apesar da estomia.

A estomização traz incerteza à pessoa idosa, por conta das mudanças que ocorrem em seu corpo e das novas responsabilidades surgidas com a manutenção da estomia. A bolsa coletora surge como um dos elementos essenciais para essa pessoa idosa, passando a representar a extensão do próprio corpo, permitindo a materialização da vivência do corpo alterado e a percepção do sofrimento do estomizado. A bolsa e a estomia são partes que compõem o cuidar físico desempenhado pelo/a enfermeiro/a, passando a experiência de sua utilização como estratégia educativa(1).

A vida atualmente direciona a possibilidade de refletir sobre a necessidade de se adotar novos comportamentos e posturas, que são influenciados pelo modo de pensar. Assim, os pensamentos determinam as práticas que se estabelecem e se desenvolvem nas sociedades. Com freqüência, a urgência e as rápidas mudanças nas diversas áreas do saber indicam que a aprendizagem dos seres humanos ocorre em toda parte e em todos os tempos(2).

Por essas reflexões percebe-se a estomia na pessoa idosa como uma situação envolvida pela complexidade. Compreende-se a Complexidade como uma maneira de entender o mundo, integrando as relações de co-existência entre os seres vivos e não vivos, integrando conceitos de ordem e desordem, uno e diverso, estabilidade e mudança e, principalmente, a noção de incerteza(3).

A complexidade direciona ao pensamento complexo, que é aquele que une e busca as relações necessárias e interdependentes de todos os aspectos da vida humana, integrando os diferentes modos de pensar. É um pensamento que considera todas as influências recebidas, sejam internas ou externas e ainda enfrenta a incerteza(4).

A Complexidade envolve alguns princípios como o dialógico, o recorrente e o hologramático que se constituem em um conjunto interligado, proporcionando uma visão integral do ser humano e do todo que o cerca.

O princípio dialógico une dois princípios ou noções que deviam excluir-se reciprocamente, mas são indissociáveis em uma mesma realidade, permitindo assumir racionalmente a inseparabilidade de noções contraditórias para conceber um mesmo fenômeno complexo(5).

O princípio recorrente ou recursivo é o que rompe com o princípio da determinação linear: a causa age sobre o efeito, e o efeito sobre a causa, promovendo processos em circuitos, envolvendo tanto a percepção como o pensamento(5).

O princípio hologramático põe em evidência o aparente paradoxo das organizações complexas, em que não apenas a parte está no todo, mas o todo está inscrito na parte(5).

Cuidar da pessoa idosa estomizada não é tarefa fácil para os trabalhadores da saúde e nem para os familiares, pois é necessário prepará-los para ajudar os estomizados para o convívio com a estomia por toda vida(6).

O ser humano formado por unidades complexas e multidimensionais é, ao mesmo tempo, biológico, psíquico, social, afetivo e racional(5). Esse ser humano complexo representa a pessoa idosa estomizada, seus familiares e também o enfermeiro. Assim, cada ser humano contém, de modo hologramático, o todo do qual faz parte e que ao mesmo tempo, faz parte dele.

O enfermeiro necessita reconhecer o impacto da presença do câncer e da posterior estomização na pessoa idosa, por meio de algumas estratégias de cuidados como: realização de orientações acerca do processo de adaptação e uso da bolsa coletora; cuidado com a estomia e com a alimentação adequada, além de encaminhamento e estímulo para a participação de um grupo de apoio, que possa ajudar os estomizados a conviverem com esta nova situação, que passa a integrar o todo que compõe o processo de viver da pessoa idosa.

Cabe aos enfermeiros compreender o ser humano em sua totalidade, a fim de que o seu todo possa ser envolvido pluralmente, mesmo que a soma de suas partes isoladas seja diferente, implicando em conexões complexas do ser cuidado(3).

Estimular a pessoa idosa estomizada ao bem-estar e incentivar a família e a sociedade às reformulações de percepções relacionadas à velhice, como preconceitos e estigmas, são ações que contribuem para a mudança no cuidado dessa pessoa idosa, produzindo melhoria na qualidade de vida e contribuindo para o aumento da sua auto-estima.

Para tanto, mostra-se necessária a existência de rede social organizada, incluindo família, vizinhos, serviço de estomaterapia e seus trabalhadores, outros estomizados, outros serviços de saúde, sendo o objetivo deste estudo descrever a rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas, representada por ecomapas das relações múltiplas de apoio, à luz do referencial da Complexidade.

MÉTODOS

Trata-se de pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso realizada primeiro em serviço de estomaterapia de hospital universitário da região Sul do Brasil; depois, no ambiente domiciliar/familiar da pessoa idosa estomizada.

Fizeram parte do estudo três mulheres e um homem, cadastrados no serviço de estomaterapia com idade de 60 anos ou mais; de ambos os sexos; estomização permanente/temporária; originada por acidente/doença; orientados e em condições de interação e principalmente que concordaram que os dados fossem coletados em domicílio e por meio da entrevista gravada, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Esses critérios de inclusão foram os direcionadores para essa amostra intencional. As pessoas idosas escolheram nomes fictícios: Margarida, Violeta, Rosa e Lírio. Assim, resguardou-se identificação quanto às informações colhidas.

Quanto às questões éticas, foi solicitado o consentimento da instituição. O projeto de pesquisa teve parecer favorável com número 010/2007, do Comitê de Pesquisa da Associação de Caridade Santa Casa do Rio Grande, atendendo às solicitações da Resolução n.º 196/96.

Na coleta dos dados verificaram-se, por meio das fichas cadastrais das pessoas idosas estomizadas do serviço de estomaterapia, os dados de identificação, telefone e endereço residencial; estabeleceu-se, por contato telefônico, um diálogo breve, porém anunciado antes, durante uma das reuniões do grupo de estomaterapia, informando-os da pesquisa e da possibilidade de participação; marcou-se dia e hora conveniente à rotina da pessoa idosa/família; efetuou-se a ida ao domicílio, com a finalidade de realizar a entrevista gravada.

O guia de entrevista continha como tópicos centrais questões que direcionaram a elaboração do ecomapa: rede de suporte, serviço de estomaterapia freqüentado, importância de outros estomizados, comunidade e sociedade. A entrevista foi realizada por uma das pesquisadoras do estudo, que participou de algumas reuniões do grupo de estomaterapia para promover a ambientação com os pesquisados e/ou seus familiares.

Utilizando os dados coletados e por meio dos tópicos centrais da entrevista, elaborou-se o ecomapa que é a representação da visão geral da situação familiar que retrata as relações importantes de educação ou aquelas oprimidas por conflitos entre a família e a sociedade. Demonstra o fluxo ou a falta de recursos e as privações. Delineia a natureza da interface dos recursos a serem buscados e mobilizados para os conflitos. Além disso, contribui para aumento da percepção do/a enfermeiro/a sobre a família, bem como as interações desta com os sistemas mais amplos(7).

O ecomapa é a apresentação das relações por um diagrama, tendo como principal valor o impacto visual. Por meio do ecomapa é possível avaliar os apoios e suportes disponíveis e sua utilização pelo estomizado, possibilitando uma visão geral. O estomizado é mostrado no centro do círculo como parte de um todo e os elementos de ligação são representados por círculos externos. As linhas indicam o tipo de conexão. As linhas contínuas significam ligações fortes; as linhas pontilhadas mostram as ligações frágeis; as linhas com barras denotam aspectos estressantes; a ausência de linha representa falta de conexão(8).

Pelo ecomapa ocorre a visualização gráfica dos resultados da pesquisa, enriquece-se e complementa-se a análise, pois mostra as relações de apoio e suporte utilizados. Com isso, tal instrumento utilizado na avaliação da rede social, facilitará o entendimento de seu funcionamento, a partir de seus aspectos sociais, emocionais e de saúde, identificando-se, dessa forma, suas potencialidades e dificuldades(9).

RESULTADOS

Apresentados pelos ecomapas dos idosos do estudo.

DISCUSSÃO

A discussão fundamenta-se na análise dos quatro ecomapas apresentados, trazendo contribuições de autores que partilhem das experiências vividas pelas pessoas idosas estomizadas.

No ecomapa de Margarida verifica-se que o fluxo de ligação entre ela e seus familiares apresenta linhas com barras, símbolo de situação estressante, justificada pela distância que a separa da família.

Nesse grupo familiar destacam-se três pessoas: filho de 45 anos, que mora com ela, trabalha à tarde, deixando-a sozinha. Uma nora e neto de dez anos que a acompanham diariamente, suprindo suas necessidades e possibilitando um ambiente agradável, estabelecendo assim um fluxo contínuo e forte. Esses dois familiares moram em um bairro próximo, o que facilita a aproximação.

O ecomapa representa uma visão global da situação familiar, retratando suas relações de educação, presença ou ausência de conflitos e seu fluxo ou falta de recursos quanto interface família/sociedade(7).

Margarida recebe visitas de seus amigos e vizinhos, principalmente crianças e pessoas idosas. É um sinal de afeto e respeito, evidenciado no ecomapa, através de ligações fortes; por conta de suas dificuldades de saúde, não consegue sair para retribuir as visitas, o que é denotado por ligações frágeis, pontilhadas.

Nessa perspectiva dialógica, o indivíduo não vive para sobreviver; sobrevive para viver; ou seja, vive para viver. A partir disso, viver significa poesia, viver de afetividade e de racionalidade, ou seja, assumindo plenamente o destino humano(10).

O serviço de estomaterapia oferece a educação e todo recurso no cuidado do ser estomizado, independente de faixa etária. Estimula seus participantes para participar dos eventos mensais, o que, no ecomapa, é marcado por uma ligação forte em relação à Margarida, mas, no movimento inverso, trata-se de uma ligação frágil, pela dificuldade dela se deslocar até o serviço.

Com os outros estomizados, a relação de Margarida é marcada por ligações fortes porque, no início, quando freqüentava o serviço, o contato com os demais participantes ajudou-a a entender que não está sozinha. Ela não compartilha mais desse convívio, situação denotada pela ausência de linhas, em decorrência de sua dificuldade em caminhar e do gasto financeiro que a utilização do táxi lhe traz. É possível perceber, por meio do depoimento de Margarida, o motivo que dificulta a sua participação no serviço e por isso faz-se necessário que ela recorra a ajuda do filho:

"Eu pouco vou. Faz um ano. Meu filho é quem vai lá. Eu tenho dificuldade para caminhar, sinto dor de barriga, o estoma incomoda, tenho que ir de carro e minhas saídas ficam caras".

Torna-se importante que a pessoa idosa estomizada participe de um trabalho de grupo sistemático, pois ela passa a vislumbrar um novo olhar acerca de seu processo saúde-doença, produzindo novas interpretações e promovendo meios de assegurar seu bem-estar, por meio da identificação das mesmas e/ou outras dificuldades em outros seres humanos estomizados(10).

Um processo de identificação com o outro comporta a projeção de sujeito a sujeito, destacando a intersubjetividade, como em um círculo, a partir das interações que os indivíduos humanos produzem na sociedade. À medida que a sociedade emerge, produz a humanidade desses indivíduos(5), denotando a recursividade como movimento contínuo.

E com os serviços de saúde como a Unidade Básica de Saúde (UBS), o ecomapa é marcado pela ausência de linhas, porque Margarida prefere freqüentar o hospital, pela proximidade de sua casa, também por comodidade e segurança de ser atendida adequadamente.

No ecomapa de Rosa observam-se ligações fortes entre ela e sua família, vizinhos e amigos. Essa convenção de fluxo também ocorre entre uma de suas filhas e o serviço de estomaterapia, pois é esta que vai ao serviço arrecadar as bolsas de karaya para uso da mãe.

Sua família, composta pelo marido, que a cuida, cinco filhos, uma filha mora com ela e outra lhe dá mais suporte, oito netos e seis sobrinhos articulam com Rosa uma relação forte, representada por um fluxo contínuo e uniforme, pois todos se preocupam com seu estado de saúde e a apóiam conforme suas necessidades.

Durante o processo de interação enfermeiro pessoa idosa/familiares, os membros da família podem ter participação ativa no cuidado da pessoa idosa, isso, melhor visualizado por meio do ecomapa. Esse momento torna-se importante estratégia de fornecimento de informações pelo enfermeiro à família e no desenvolvimento do cuidado direcionado à pessoa idosa estomizada(7), para que os familiares aprendam como proceder no domicílio.

A relação de Rosa com o serviço de estomaterapia é marcada por ligações com barras, denotando estresse, dado que ela não tem conseguido participar das atividades propostas pelo serviço, devido a suas limitações. Por outro lado, a relação mostra-se dialógica quando é denotada por ligações fortes, por estimulá-la para o autocuidado.

O ser humano é singular e múltiplo por envolver um universo complexo em sua essência, abrange um conjunto de autonomias individuais, de suas participações na comunidade e possuir o sentimento de pertencer à espécie humana(11).

A ligação de Rosa com os outros estomizados, participantes do serviço de estomaterapia, é expressa por linhas pontilhadas, denotando ligação frágil, visto que ela participou da reunião uma vez, porém desde então, tem boa impressão. Por não poder ir ao serviço de estomaterapia, surgem fatores que dificultam a troca, acerca de sua condição de pessoa idosa estomizada. O mesmo ocorre entre ela e seus amigos/vizinhos, por preferir ficar em casa e não gostar de visitá-los, devido a suas limitações, o que é evidenciado em seu depoimento:

"Depois dessas cirurgias eu não atino nada. É só cama e dormindo. Vem uma visitinha, converso e logo deito. E com isso tenho que estar em casa".

Também se verifica ausência de relação entre Rosa e os demais serviços de saúde e vice-versa, visto que prefere o hospital pela presença do serviço de estomaterapia e facilidade da consulta com o especialista desejado.

No ecomapa de Violeta verifica-se que sua família é composta por quatro filhos, dois são seus vizinhos, sete netos e dois bisnetos, que moram em Porto Alegre. Observa-se um fluxo contínuo de contato, sendo um estímulo ao autocuidado, considerando sua estomia e, com isso, promovendo qualidade de vida, pois a família é uma rede de apoio importante no seu dia-a-dia.

A família constitui uma unidade ligada, sendo o lar um refúgio protetor, mesmo quando seus membros dispersam-se, permanecem inseridos numa rede de solidariedade(11).

Foi possível perceber que as ligações fortes e contínuas foram estabelecidas por Violeta entre ela e o serviço de estomaterapia, bem como com outros estomizados, por poder ir com freqüência às reuniões. Com isso, foi estabelecido um vínculo contínuo, contribuindo com suas opiniões para a melhoria da visão dos outros estomizados com relação a si, além de participar ativamente nas mudanças internas do próprio serviço.

Assim, percebe-se a recursividade(3), entre o serviço de estomaterapia e Violeta. A idéia recursiva representa a ruptura com a linearidade causa/efeito, de produto/produtor, de estrutura/superestrutura, já que tudo o que é produzido volta-se sobre o que se produz num ciclo, no qual ele mesmo é autoconstrutivo, auto-organizador e autoprodutor.

O ecomapa pode ser utilizado em todos os ambientes de cuidado da saúde para aumentar a percepção do enfermeiro sobre a família e o sujeito, bem como nas interações destes com os sistemas mais amplos e no sistema intrafamiliar, remontando às questões que circundam a construção familiar ou do sujeito(7).

Os amigos e vizinhos são apresentados por Violeta como amistosos no convívio, o que permite maior aproximação e amizade, em que ela se coloca como articuladora frente às necessidades deles, bem como eles também. Recursivamente, Violeta coloca-se à disposição de seus amigos e vizinhos no intuito de fortalecer os laços de vínculo, através de sua determinação e coragem.

A ausência de ligações fica evidenciada entre Violeta e outros serviços de saúde, dado que não os procura, somente busca atendimento no hospital por conta do serviço de estomaterapia. Violeta expressa que outros serviços de saúde, como a UBS do seu bairro e outro próximo são considerados menos complexos às suas necessidades, não a atendendo adequadamente, como aconteceu em experiência anterior, o que desestimula a sua procura a esses locais. Esse argumento fica evidenciado através de seu depoimento:

"Aqui o mais perto é o posto de saúde, mas não vou nunca. Três anos que eu não vou ao médico. [risos]. Vou ao hospital universitário pegar as bolsinhas".

Um dos suportes da UBS, principalmente da unidade de Saúde da Família, é oferecer suporte e fortalecer as famílias sob sua responsabilidade, pois a família é a unidade de cuidado na Estratégia de Saúde da Família. Porém torna-se necessária instrumentalização dos trabalhadores para adotar essa abordagem(12).

No ecomapa de Lírio foi possível observar o serviço de estomaterapia, como um dos componentes de sua rede social, apresentando relação com ligações fortes e por freqüentá-lo constantemente, ele percebe a importância do serviço, bem como dos outros estomizados em seu processo de aceitação da estomia.

Em relação à sua família, composta por três filhos, mora com um deles, e cinco netos, a estrutura de apoio é marcada por linhas fortes, pela proximidade e a dedicação deles. Considera a família como a extensão de seu amor por sua esposa, já falecida. Para Lírio a estomização foi um acontecimento mais fácil de aceitar do que o falecimento da esposa, a qual esteve toda sua vida ao seu lado. Esse relato fica evidente no seu depoimento:

"A ostomia nem dou bola para ela. Eu não tenho prazer de sair. Eu estou sempre pensando nela [esposa], é muita falta, muita saudade. Infelizmente, ela não está aqui para me acompanhar, ela era meu braço direito. Nunca se pensou que minha mulher morria primeiro que eu".

Frente à morte, tal experiência humana comporta "uma consciência da morte como um buraco negro, onde se aniquila o indivíduo; comporta, ao mesmo tempo, uma recusa de seu desaparecimento"(11).

Com os amigos e vizinhos é denotada uma ligação de respeito e confiança, por todos participarem ativamente no seu cuidado, pessoas que o acompanham com freqüência, religando-o, em meio a uma sensação de vazio surgida com a morte de sua esposa.

O cuidar por meio da complexidade se dá considerando-se que "a complexidade é um desafio, não a resposta"(3); a idéia de complexidade comporta a imperfeição, já que ela traz em si a incerteza e o reconhecimento do irredutível; a complexidade junta o científico com o não-científico, sem anulá-lo, mas permitindo-lhe exprimir-se; a complexidade comporta a solidariedade e, principalmente a cumplicidade(3).

No ecomapa de Lírio verifica-se a visualização dos vínculos, sejam eles certos e errados para o sujeito, tornando-se importante instrumento para o enfermeiro verificar a existência de vínculos mútuos e de que forma são expressos. Isto será influenciado por questões como sexo, raça, cultura, orientação sexual, classe social (11).

A relação de Lírio com os demais serviços de saúde, como a UBS é demonstrada pela ausência de ligações, denotando a falta de contato com esses serviços, visto que se consulta com médicos já conhecidos do hospital, o que lhe garante mais segurança quanto ao atendimento e seu tratamento.

CONCLUSÃO

Ao estabelecer um diálogo, por meio de entrevistas gravadas, nos domicílios das quatro pessoas idosas pesquisadas, Rosa, Margarida, Violeta e Lírio, cadastrados em um serviço de estomaterapia da região Sul do Brasil, percebeu-se que a visão da estomização é única, representando um universo de sentimentos e comportando várias categorias.

Com o ecomapa de cada pessoa idosa verificou-se que a necessidade de um olhar terapêutico e complexo perpassa por toda uma rede de apoio, como a família, que participa no cotidiano de enfrentamento; como os amigos/vizinhos, que acompanham com respeito toda a mudança; como o serviço de estomaterapia, que os ajuda na compreensão do fenômeno; como os outros estomizados, que servem de estímulo para encarar uma nova forma de viver. Frente a isso, os enfermeiros precisam ter um novo olhar sobre as pessoas idosas estomizadas e, com isso, defender um novo cuidado, em que essa pessoa seja vista, (re)olhada por suas potencialidades.

A partir disso, necessita-se perceber que os cuidados de enfermagem carecem de reformulação, com o intuito de visar à reconstrução do entendimento acerca da estomia como parte dessa nova imagem corporal, despertando a pessoa idosa a buscar mais qualidade de vida, amenizando os efeitos dessa mudança caracterizada como deficiência física.

Verificou-se uma lacuna, percebida na relação entre as pessoas idosas estomizadas e a rede básica de saúde, principalmente as UBS, sendo necessário mais integralidade. A deficiência encontrada pode ser entendida de duas maneiras, seja por parte da rede básica em não atender adequadamente as necessidades dos estomizados, ou pelo hábito deles próprios em procurar a rede hospitalar, mesmo em situações mais simples. Com isso, é importante que haja uma reorganização desses serviços básicos, sendo eles a porta de entrada no atendimento do Sistema Único de Saúde.

Quanto ao ecomapa, sua utilização apresentou-se como um recurso tecnológico frente aos achados pertinentes aos sujeitos do estudo e sua dimensão real, contribuindo para a indicação de estratégias que promovam um cuidado amplo e dinâmico à pessoa idosa estomizada e sua família, além de mostrar as facilidades e dificuldades enfrentadas por estas pessoas e seus familiares no processo de estomização.

Verificou-se que a rede social de apoio mostra-se nas suas relações e interações inseridas no sistema social complexo e que as relações de cuidado se fazem presentes nesta rede social de apoio às pessoas idosas estomizadas e família.

Artigo recebido em 18/03/2008 e aprovado em 10/07/2008

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  • Autor Correspondente:
    Edaiane Joana Lima Barros
    R. Santa Catarina, 536
    Rio Grande - RS – CEP. 96211-600
    E-mail:
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    Estudo desenvolvido em um serviço de estomaterapia de um hospital universitário da região Sul do Brasil, sendo parte da dissertação do Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande – FURG – Rio Grande (RS), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jan 2009
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Recebido
      18 Mar 2008
    • Aceito
      10 Jul 2008
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