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A percepção do cliente em hemodiálise frente à fístula artério venosa em seu corpo

La percepición del cliente en hemodiálisis delante a la fístula arterío venosa en su cuerpo

Resumos

OBJETIVO: Identificar as percepções sensoriais dos clientes frente à fistula artério-venosa (FAV) e descrevê-las a partir dos sentidos sócio comunicantes do corpo. MÉTODOS: Aplicação de técnicas criativas durante sessão de hemodiálise com cinco pacientes. Foi pedido que desenhassem algo que representasse a presença da fístula artério-venosa e em seguida foram expostas seis gravuras, cada uma com um sentido corporal, sendo argüidos sobre sentimentos provocados pela fístula artério-venosa diante de cada sentido. Os depoimentos foram gravados em fita magnética. RESULTADOS: Com a aplicação das técnicas criativas foram apontados sentimentos como tristeza, amargura e dependência, advindos da presença da fístula artério-venosa e das abordagens no convívio social. CONCLUSÃO: Ao valorizar os sentidos do paciente no convívio com a FAV, o enfermeiro redimensiona o cuidado a ele prestado.

Diálise renal; Unidades hospitalares de hemodiálise; Percepção; Fístula arteriovenosa


OBJETIVO: Identificar las percepciones sensoriales de los clientes frente a la fístula arteriovenosa (FAV) y describirlas a partir de los sentidos sóciocomunicantes del cuerpo. MÉTODOS: Aplicación de técnicas creativas durante la sesión de hemodiálisis con cinco pacientes. Fue pedido que dibujen algo que represente la presencia de la fístula arteriovenosa y a seguir que expusieran seis grabaciones, cada una con un sentido corporal, siendo examinados sobre los sentimientos provocados por la fístula arteriovenosa frente a cada sentido. Las declaraciones fueron grabadas en cinta magnética. RESULTADOS: Con la aplicación de las técnicas creativas se apuntaron sentimientos como tristeza, amargura y dependencia, generados por la presencia de la fístula arteriovenosa y de los abordajes en la convivencia social. CONCLUSIÓN: Al valorizar los sentidos del paciente en la convivencia con la FAV, el enfermero redimensiona el cuidado que presta.

Diálisis renal; Unidades hospitalarias de hemodiálisis; Percepción; Fístula arteriovenosa


OBJECTIVE: To identify the sensorial perceptions of the patients towards the arteriovenous fistula and describe them from their social-communicating senses. METHODS: Creative techniques were performed during hemodialysis session with five patients. Participants were asked to draw something that represented having an arteriovenous fistula. After drawing, six pictures were displayed, each with a body sense, and patients were questioned about the feelings toward arteriovenous fistula for each of the senses. Their statements were recorded on magnetic tape. RESULTS: The creative techniques allowed for identifying feelings like sadness, bitterness, and dependence, caused by having an arteriovenous fistula and the approaches in social life. CONCLUSION: When valuing the patient's senses whilst living with an arteriovenous fistula, the nurse re-estimates the care that is delivered.

Renal dialysis; Hemodialysis units, hospital; Perception; Arteriovenous fistula


WCN 2007/NURSING MEETING

A percepção do cliente em hemodiálise frente à fístula artério venosa em seu corpo* * Estudo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso "A percepção do cliente frente à Fístula Artério Venosa: um desafio dos sentidos corporais", premiado em 2º lugar no 14º Pesquisando em Enfermagem da Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.

La percepición del cliente en hemodiálisis delante a la fístula arterío venosa en su cuerpo

Giselle Barcellos Oliveira KoepeI; Sílvia Teresa Carvalho de AraújoII

IPós-graduanda da Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – Rio de Janeiro (RJ), Brasil

IIDoutora, Professora da Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – Rio de Janeiro (RJ), Brasil

Autor Correspondente Autor Correspondente: Giselle Barcellos Oliveira Koeppe R. Cel. João Teles, 58 - Centro Duque de Caxias - RJ CEP. 25020-180 E-mail: gisellebarcellos@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Identificar as percepções sensoriais dos clientes frente à fistula artério-venosa (FAV) e descrevê-las a partir dos sentidos sócio comunicantes do corpo.

MÉTODOS: Aplicação de técnicas criativas durante sessão de hemodiálise com cinco pacientes. Foi pedido que desenhassem algo que representasse a presença da fístula artério-venosa e em seguida foram expostas seis gravuras, cada uma com um sentido corporal, sendo argüidos sobre sentimentos provocados pela fístula artério-venosa diante de cada sentido. Os depoimentos foram gravados em fita magnética.

RESULTADOS: Com a aplicação das técnicas criativas foram apontados sentimentos como tristeza, amargura e dependência, advindos da presença da fístula artério-venosa e das abordagens no convívio social.

CONCLUSÃO: Ao valorizar os sentidos do paciente no convívio com a FAV, o enfermeiro redimensiona o cuidado a ele prestado.

Descritores: Diálise renal; Unidades hospitalares de hemodiálise; Percepção; Fístula arteriovenosa/enfermagem

RESUMEN

OBJETIVO: Identificar las percepciones sensoriales de los clientes frente a la fístula arteriovenosa (FAV) y describirlas a partir de los sentidos sóciocomunicantes del cuerpo.

MÉTODOS: Aplicación de técnicas creativas durante la sesión de hemodiálisis con cinco pacientes. Fue pedido que dibujen algo que represente la presencia de la fístula arteriovenosa y a seguir que expusieran seis grabaciones, cada una con un sentido corporal, siendo examinados sobre los sentimientos provocados por la fístula arteriovenosa frente a cada sentido. Las declaraciones fueron grabadas en cinta magnética.

RESULTADOS: Con la aplicación de las técnicas creativas se apuntaron sentimientos como tristeza, amargura y dependencia, generados por la presencia de la fístula arteriovenosa y de los abordajes en la convivencia social.

CONCLUSIÓN: Al valorizar los sentidos del paciente en la convivencia con la FAV, el enfermero redimensiona el cuidado que presta.

Descriptores: Diálisis renal; Unidades hospitalarias de hemodiálisis; Percepción; Fístula arteriovenosa /enfermería

INTRODUÇÃO

Este estudo trata da percepção sensorial que o cliente com insuficiência renal crônica em tratamento de hemodiálise, tem sobre seu corpo frente à fístula artério venosa (FAV). O interesse por esta pesquisa surgiu a partir de uma experiência de quatro anos no cuidado a esta clientela.

A hemodiálise é um tratamento que remove as substâncias tóxicas e o excesso de líquido acumulado no sangue e tecidos do corpo em conseqüência da falência renal. Na hemodiálise, o sangue, carregado de toxinas e resíduos nitrogenados, é desviado do paciente para uma máquina, um dialisador, no qual é limpo e, em seguida, devolvido ao paciente(1).

Para que o sangue possa ser retirado, limpo e devolvido ao corpo é necessário que seja estabelecido um acesso à circulação do paciente. A FAV é um acesso permanente, criado por meios cirúrgicos ao se unir uma artéria em uma veia. As agulhas são inseridas dentro do vaso a fim se obter o fluxo sangüíneo adequado para passar através do dialisador.

O setor de hemodiálise é muito enriquecedor no que diz respeito à interação enfermagem-paciente. Nesta especialidade de cuidar, o cliente comparece ao setor três vezes por semana, permanecendo em média por um período diário de quatro horas. Isto resulta em interação integral, cuja relação de proximidade leva, muitas vezes, a um conhecimento amplo sobre a pessoa, o contexto familiar e o processo da doença. Durante esta interação pude observar características comportamentais freqüentes nestas pessoas nas quais inúmeras vezes, imagens se repetiam sob forma de mecanismos de defesa e que eram expressas por eles, em sua maioria, de forma não-verbal.

O foco do estudo foi a percepção diante da FAV, pois as cicatrizes e, por vezes, os aneurismas provocados por ela causam comprometimento da auto-imagem dos clientes, podendo causar sofrimentos que na maioria das vezes não são verbalizados. Contudo detive-me especificamente aos clientes com FAV formadas recentemente, pois penso que nestes a abordagem será mais rica, já que se encontram em fase de adaptação.

A assistência de enfermagem em hemodiálise é um tanto tecnicista, em decorrência de toda mecanização envolvida neste cuidado. Porém, considero importante que a enfermeira que atue nesta especialidade, se eduque em direcionar também a sua atenção para todos os sentidos comunicantes de seu cliente, não atentando somente para o que é visível e para o que é verbalizado.

O fato de o cliente afirmar que está bem e que se sente confortável no ambiente de tratamento, pode privá-lo de expor emoções, sentimentos e pensamentos, por acreditar que nada poderá modificar seu estado ou que a equipe não se interessa por ele(2).

Quando a enfermeira é capaz de entender o que está oculto em seu cliente, o cuidar se torna mais satisfatório, na medida em que será possível atendê-lo, não somente em suas necessidades visíveis, mas também naquelas que se encontram encobertas. As percepções, emoções, sentimentos e o imaginário do cliente precisam ser conhecidos, pois favorecem a compreensão de comportamentos e reações que apresenta no decorrer do tratamento, e que através da sociopoética, o cliente consciente de sua condição e de seus sentimentos, consiga expressar-se mais facilmente(2).

As questões norteadoras que direcionaram este estudo foram:

- Como o cliente se percebe frente à convivência com a FAV implantada em seu corpo?

- Como os sentidos corporais do cliente expressam a convivência com a FAV?

Foi elaborado como objeto de estudo: a percepção sensorial do cliente, frente à fístula artério venosa recém confeccionada.

O estudo teve como objetivos:

- Identificar a percepção sensorial do cliente frente à FAV;

- Descrever como a vivência dos sentidos sócio comunicantes do corpo revelam a percepção sensorial do cliente frente à FAV.

É importante que as percepções, emoções e sentimentos do cliente sejam conhecidos, pois este entendimento favorece a compreensão de comportamentos e reações que apresenta no decorrer do tratamento(2).

MÉTODOS

Trata-se de um estudo com abordagem qualitativa, na qual a representatividade da pesquisa não se baseia no critério numérico.

"A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa" (3) .

Nesta pesquisa trabalhei com os sentidos sócio-comunicantes do corpo utilizados por Araújo(4), pois acredito que o corpo fala e quando acontece algo que prejudica alguma de suas partes, ele reage. O corpo de cada um de nós é uma forma de vida, que por ter uma história e raízes ancestrais ainda atuantes, vivas, irradiantes, sabe muitas coisas(5).

A pesquisa teve início em fevereiro de 2005 e término em dezembro do mesmo ano. Teve como cenário o Setor de Hemodiálise da Unidade de Nefrologia de um Hospital Universitário no município do Rio de Janeiro. Os cinco sujeitos pesquisados foram pacientes submetidos à hemodiálise com FAV confeccionada de dois a sete meses antes, de ambos os sexos e de faixa etária variável.

A pesquisa foi autorizada pelo chefe do Serviço de Nefrologia, pela chefia de Enfermagem e pelos sujeitos a partir do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, de acordo com os preceitos da Resolução nº 196/96 que trata da pesquisa com seres humanos. Para a produção de dados foram realizadas duas técnicas criativas na primeira, eram fornecidos papel e lápis ao grupo de cinco pacientes para que desenhassem uma figura e escrevessem uma palavra que representasse o significado da FAV e que posteriormente explicassem cada figura e palavra.

Na segunda foram expostas seis gravuras, cada uma representando um sentido (olho, nariz, boca, mão, ouvido, coração). Sobre o coração como um sentido corporal, sua cinesia é comprovada a partir da harmonia com os outros sentidos, passando de mero símbolo à condição de um novo sentido corporal(4).

Mediante cada sentido exposto, era feita uma pergunta sobre sentimentos provocados pela FAV mediante aquele sentido. Estas perguntas foram baseadas nas frases norteadoras utilizadas por Saes(2), na fase de coleta de dados em uma das dinâmicas realizadas. Foram elas:

- Para o olho: Como seus olhares percebem a FAV? Que emoções e sentimentos esses olhares lhe provocam?

- Para a audição: O que você percebe sobre o que falam sobre a FAV? Que emoções e sentimentos essa fala provoca?

- Para a mão: Como você percebe as sensações de toque na FAV? Que emoções e sentimentos esse toque provoca?

- Para a boca: Você percebe algum sabor na boca que pode ser associado à FAV? Que emoções e sentimentos isso lhe provoca?

- Para o nariz: Como você percebe os cheiros na região onde está a FAV? Que emoções e sentimentos essa reação lhe provoca?

- Para o coração: Como você percebe suas emoções e sentimentos frente à FAV? Que reações essas percepções geram?

O encontro com o grupo foi realizado no mês de outubro de 2005. As técnicas criativas foram gravadas em fita magnética e transcritas para análise. Durante a aplicação das dinâmicas, os clientes não ficaram presos somente àquilo que eu perguntava ou orientava a fazer, mas expuseram várias questões guardadas em seu interior que lhes trazia inquietação, levando à valorosa compreensão de como o cliente se percebe frente à FAV implantada em seu corpo. Os sujeitos foram identificados por codinomes como forma de anonimato.

RESULTADOS

Das palavras colocadas no papel, necessidade foi uma das mais utilizadas, seguida da palavra amor e vida. Os desenhos que apareceram foram desenhos do sol e da chuva, figuras de coração e um cliente desenhou os filhos.

Quanto à apresentação aos clientes das figuras, cada uma com um sentido corporal, os resultados são descritos a seguir.

Em relação à visão, em geral os sujeitos disseram sentir tristeza cada vez que olham para a FAV, sendo que para alguns esta tristeza é decorrente do constrangimento causado pelos olhares alheios.

"As pessoas sentem curiosidade, ficam olhando, tem umas pessoas que perguntam `o que é isso'? Sempre que saio e que vou ao supermercado as pessoas me perguntam `o que é isso?' Aqueles curativos no braço, aqueles caroços, aí eles perguntam". (Clássica).

Sobre a audição, a maior parte dos clientes sentia-se incomodado ao ouvir as pessoas falando sobre sua FAV, se sentiam perturbados, pois percebiam certo espanto de quem fala.

"Muitos sentem espanto, outros pena, -`nossa o que é isso, que horror" (Divina)

"Fui na casa de uma menina e ela botou a mão e disse: o que é isso tremendo? Você parece um robô!" (Clássica)

Quanto ao toque, nenhum dos clientes se mostrou incomodado pelo fato de tocarem na FAV, alguns inclusive disseram gostar desta proximidade.

Sobre a boca, a maior parte associou a FAV a um sabor amargo. Houve um cliente que atribuiu à FAV tanto o sabor amargo como o doce, o amargo pelo incômodo do tratamento e o doce por ser ela o motivo de sua sobrevida.

Os clientes sentiram dificuldade de expressar sentimentos através do sentido olfato, não sendo atribuídos, por eles nenhum cheiro à região da FAV. Apenas um cliente disse sentir cheiro de vida.

Alguns choraram ao falar do coração e mostraram toda a fragilidade e angústia provocada pela FAV e por todo o tratamento hemodialítico.

"...eu tenho pena de mim mesma..." (Divina).

"...gostaria que fosse um tratamento rápido, que ela não precisasse ficar no meu braço¨" (Clara).

"...me dá tristeza, a gente fica triste porque eu acho que meu braço não tá normal, tem uma coisa dentro do braço da gente, dá tristeza. A gente não vai sentir alegria tendo uma coisa dentro do braço da gente, dá tristeza. Eu não gostaria de estar com isso no braço" (Clássica).

"...se eu pudesse escolher, não estaria aqui. Mas como a gente tem que passar por essas situações....... (Bela)".

DISCUSSÃO

A palavra necessidade pode ser associada à importância da FAV para o tratamento. Os desenhos do sol e da chuva representam que a FAV foi colocada como tão importante para a vida quanto estes elementos. A palavra amor juntamente com a figura de um coração representou que o amor pela FAV está associado ao amor a vida.

Para alguns clientes a FAV é vista como algo que traz esperança, isso foi constatado pelo desenho dos filhos, onde o paciente alegou que a FAV prolonga sua vida, lhe dando a oportunidade de permanecer por um pouco mais de tempo perto dos familiares.

O amor, a esperança e a extrema necessidade associados à FAV pelos clientes, são decorrentes da consciência que estes têm de que a FAV é o meio pelo qual acontece o tratamento tão importante para o prolongamento de suas vidas.

O cliente em tratamento dialítico vive um conflito diário entre o amor e o ódio à máquina e ao tratamento e tem a consciência de que sem a diálise, não vive, mas, por outro lado, o tratamento lhe faz lembrar constantemente que sua vida está por um fio(2).

A apresentação aos clientes das figuras, cada uma com um sentido corporal, desvelou uma gama de sentimentos, muitas vezes ainda não verbalizados pelos clientes. Acredito que isso foi resultante da liberdade dada aos clientes de expressarem verbalmente tudo aquilo que lhes incomodava, não ficando presos ao que estava sendo exposto a eles nas figuras.

Diante dos depoimentos relacionados à visão, que mostraram tristeza e constrangimento diante dos olhares, penso que, aquilo que pensam sobre você ou sobre algo em você, interfere em seu modo de agir e sentir. Pensamos através dos outros, enquanto outros pensam em nós(4).

Sobre a audição, durante os depoimentos percebi que as vozes espantadas e curiosas, demonstrando até mesmo certa repulsa, machuca determinados clientes. No entanto, eles avaliam que expressar esse sentimento é inútil, já que necessitam conviver constantemente com a FAV, que é algo que sempre será estranho e que sempre despertará alguma reação nos outros. Sendo assim preferem aprender a aceitar o fato, a se acostumar com ele, reprimindo seus sentimentos.

Refreamos muitos de nossos sentimentos, porque não somos acostumados a expor aos de fora o que há de mais sincero em nosso interior. O problema de sabermos até onde podemos ir nos possibilita pensar nos limites e na expressividade de nossos sentimentos(4).

Em relação ao toque, acredito que os clientes não se importam com o toque na FAV e até gostam em algumas situações porque, inconscientemente, o toque lhes traz segurança, lhes traz conforto e bem estar. O toque em outro ou apertar-lhe a mão nos alivia as tensões (4).

Quanto a boca, acredito que o sabor amargo representa intensa tristeza e amargura. Houve um cliente que atribuiu à FAV tanto o sabor amargo como o doce, o amargo pelo incômodo do tratamento e o doce por ser ela o motivo de sua sobrevida.

A FAV não apresenta um gosto específico ao paladar dos clientes, já que não é uma bebida ou comida, mas cada um deles foi capaz de associá-la a um determinado sabor. Isso demonstra que o sentido paladar é capaz de falar sobre aquilo que sentimos. A sensibilidade gustativa pensa porque sente o gosto da própria vida(4).

Apesar do olfato se apresentar como um sentido difícil de ser explicado, acredito que quando paramos e respiramos, imaginando o cheiro de alguma coisa, nos transportamos a outras dimensões. Para a autora(4), o sentido do olfato possui memória sensorial e nos permite respirar e lembrar de odores e perfumes da vida a partir dos contatos com pessoas e objetos.

O coração representa nossas emoções e sentimentos, ele é a sede de toda a emoção(2). Percebi que ao falar dele os clientes expuseram aquilo que estava mais oculto em seu interior.

Neste momento, pareceu-me que as emoções foram totalmente liberadas, sem barreiras, os clientes se mostraram de uma forma muito especial.

A fragilidade está relacionada ao fato de haver um certo desequilíbrio na vida desses clientes, ou seja, eles não vivem ¨normalmente¨ como os outros, já que precisam se adaptar com algo estranho em seu corpo (FAV), precisam comparecer a um hospital três vezes por semana, entre outras situações desagradáveis provenientes do tratamento. Autores afirmam que, o ser humano torna-se potencialmente mais complexo e frágil nas situações de desequilíbrio no seu sistema, ameaçando seu bem-estar, sua vida, seus objetivos futuros, enfim, sua relação com o mundo, com os outros e consigo próprio(6).

CONSIDERAÇÕE FINAIS

As dinâmicas utilizadas no estudo permitiram que os clientes verbalizassem sentimentos guardados, por vezes por longo tempo, em seu interior. Isso aconteceu de forma tranqüila, sem constrangimento e com muita liberdade. Através desta oportunidade, foi possível compartilhar emoções, angústias, sofrimentos e reforçar laços de vida e esperança.

Foi muito gratificante pesquisar o imaginário desta clientela, entender o que há de subjetivo nestes indivíduos. Este entendimento faz com que nos tornemos sensíveis a algumas reações que ocorrem com nossos clientes durante o tratamento, as quais inúmeras vezes não compreendemos o motivo. Isso também faz com que nos tornemos capazes de ajudar estas pessoas a enfrentarem melhor todo o processo, contribuindo para uma assistência de enfermagem de qualidade.

O sentido visão e audição foram apontados como monopolizadores das emoções do paciente, por reafirmarem a partir da FAV e dos comentários alheios, os desvios de saúde, gerando constrangimento e tristeza.

Ressalto aqui minha idéia de que o cuidar em hemodiálise vai além de dominar toda a parte técnica envolvida neste cuidado. É preciso atentarmos para o cliente em si, e não somente para o lado mecânico que o cerca.

Artigo recebido em 21/06/2007 e aprovado em 25/08/2007

  • 1. Smeltzer SC, Bare BG. Brunner & Suddarth: tratado de enfermagem médico-cirúrgica. 9a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002. v.3.
  • 2. Saes SC. O cuidar da enfermeira no imaginário do cliente com necessidades especiais de saúde na área renal: um desafio através dos sentidos corporais e da sociopoética [tese]. Rio de Janeiro: Escola de Enfermagem Anna Nery. Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2003.
  • 3. Chizzotti A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 4a ed. São Paulo: Cortez; 2000.
  • 4. Araújo STC. Os sentidos corporais dos estudantes no aprendizado da comunicação não-verbal do cliente na recepção pré-operatória: uma semiologia da expressão através da sociopoética [tese]. Rio de Janeiro: Escola de Enfermagem Anna Nery. Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2000.
  • 5. Gauthier J. Sociopoética: encontro entre arte, ciência e democracia na pesquisa em ciências humanas e sociais, enfermagem e educação. Rio de Janeiro: EEAN/UFRJ; 1999.
  • 6. Santos I, Gauthier J, Figueiredo NMA, Petit SH. Prática da pesquisa em Ciências Humanas e Sociais: abordagem sociopoética. Rio de Janeiro: Atheneu; 2005.
  • Autor Correspondente:
    Giselle Barcellos Oliveira Koeppe
    R. Cel. João Teles, 58 - Centro
    Duque de Caxias - RJ CEP. 25020-180
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    Estudo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso "A percepção do cliente frente à Fístula Artério Venosa: um desafio dos sentidos corporais", premiado em 2º lugar no 14º Pesquisando em Enfermagem da Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jun 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Aceito
      25 Ago 2007
    • Recebido
      21 Jun 2007
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