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Práticas populares de mães adolescentes no cuidado aos filhos

Prácticas populares de madres adolescentes en el cuidado a los hijos

Resumos

OBJETIVO: Identificar e descrever os cuidados populares adotados por mães adolescentes na assitência aos filhos nos seis primeiros meses de vida. MÉTODOS: Pesquisa com abordagem qualitativa desenvolvida com seis mães adolescentes residentes em Cambé - PR. Os dados foram coletados no período de fevereiro a abril de 2007, por meio de entrevistas semi-estruturadas, realizadas no domicílio em quatro momentos distintos:uma semana, um, quatro e seis meses após o nascimento. RESULTADOS: As mães adolescentes revelaram reproduzir em seu cotidiano de cuidar várias práticas populares que fazem parte da cultura local e familiar, tais como amamentação cruzada, utilização de benzimentos, xaropes, chás e orações para tratar intercorrências, além de algumas crendices relacionadas com o coto umbilical, soluços e alteração no sono do bebê. CONCLUSÃO: Os profissionais de saúde precisam conhecer as crenças e práticas das mães adolescentes para então planejar, da melhor forma possível, a assistência a ser prestada ao binômio mãe-filho.

Cuidado do lactente; Adolescente; Relações mãe-filho


OBJETIVO: Identificar y describir los cuidados populares adoptados por madres adolescentes en la asistencia a los hijos en los seis primeros meses de vida. MÉTODOS: Investigación con abordaje cualitativo desarrollado con seis madres adolescentes residentes en Cambé - PR. Los datos fueron recolectados en el período de febrero a abril del 2007, por medio de entrevistas semi-estructuradas, realizadas en el domicilio en cuatro momentos distintos: una semana, uno, cuatro y seis meses después del nacimiento. RESULTADOS: Las madres adolescentes revelaron reproducir en su cotidiano de cuidar varias prácticas populares que hacen parte de la cultura local y familiar, tales como amamantamiento cruzado, utilización de bendiciones, jarabes, infusiones y oraciones para tratar ocurrencias, además de algunas creencias relacionadas con el muñón umbilical, hipos y alteraciones en el sueño del bebé. CONCLUSIÓN: Los profesionales de salud precisan conocer las creencias y prácticas de las madres adolescentes para entonces planificar, de la mejor forma posible, la asistencia a ser prestada al binomio madre-hijo.

Cuidado del lactante; Adolescente; Relaciones madrehijo; Medicina tradicional


OBJECTIVE: To identify and describe popular practices of teenage mothers caring for their children during the first six month after birth. METHODS: A qualitative approach was used with six teenage mothers from the city of Cambé, PR. Data were collected through semi-structured interviews from February to April 2007. Interviews were conducted in the participants' home in four different times (one week, one month, four months, and six months after the birth). RESULTS: Findings suggested that teenage mothers use popular practices that were part of their family and community culture when caring for their children. These popular practices included cross breast-feeding, teas, syrups, and blessing's plays to treat adverse events, and popular beliefs regarding the umbilical stump, hiccups, and sleeping pattern. CONCLUSION: Health professionals must be aware of practices and beliefs of teenage mothers in order to plan quality care to the mother-child binomial.

Infant care; Adolescent; Mother-child relations; Medicine, traditional


ARTIGO ORIGINAL

Práticas populares de mães adolescentes no cuidado aos filhos* * Estudo extraído da Dissertação de Mestrado em Enfermagem: Experiência de mães adolescentes no cuidado ao filho nos seis primeiros meses de vida, apresentada à Universidade Estadual de Maringá. - UEM - Maringá (PR), Brasil.

Prácticas populares de madres adolescentes en el cuidado a los hijos

Keli Regiane TomeleriI; Sonia Silva MarconII

IMestre em Enfermagem, Professora da Universidade Norte do Paraná – UNOPAR - Londrina (PR), Brasil

IIDoutora em Enfermagem, Professora do Departamento de Enfermagem da Universidade Estadual de Maringá – UEM – Maringá (PR), Brasil

Autor Correspondente Autor Correspondente: Keli Regiane Tomereli R. Belo Horizonte, 1829 Cambé- PR - Cep: 86181-02 E-mail: tomeleri@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Identificar e descrever os cuidados populares adotados por mães adolescentes na assitência aos filhos nos seis primeiros meses de vida.

MÉTODOS: Pesquisa com abordagem qualitativa desenvolvida com seis mães adolescentes residentes em Cambé - PR. Os dados foram coletados no período de fevereiro a abril de 2007, por meio de entrevistas semi-estruturadas, realizadas no domicílio em quatro momentos distintos:uma semana, um, quatro e seis meses após o nascimento.

RESULTADOS: As mães adolescentes revelaram reproduzir em seu cotidiano de cuidar várias práticas populares que fazem parte da cultura local e familiar, tais como amamentação cruzada, utilização de benzimentos, xaropes, chás e orações para tratar intercorrências, além de algumas crendices relacionadas com o coto umbilical, soluços e alteração no sono do bebê.

CONCLUSÃO: Os profissionais de saúde precisam conhecer as crenças e práticas das mães adolescentes para então planejar, da melhor forma possível, a assistência a ser prestada ao binômio mãe-filho.

Descritores: Cuidado do lactente; Adolescente; Relações mãe-filho; Medicina tradicional

RESUMEN

OBJETIVO: Identificar y describir los cuidados populares adoptados por madres adolescentes en la asistencia a los hijos en los seis primeros meses de vida.

MÉTODOS: Investigación con abordaje cualitativo desarrollado con seis madres adolescentes residentes en Cambé - PR. Los datos fueron recolectados en el período de febrero a abril del 2007, por medio de entrevistas semi-estructuradas, realizadas en el domicilio en cuatro momentos distintos: una semana, uno, cuatro y seis meses después del nacimiento.

RESULTADOS: Las madres adolescentes revelaron reproducir en su cotidiano de cuidar varias prácticas populares que hacen parte de la cultura local y familiar, tales como amamantamiento cruzado, utilización de bendiciones, jarabes, infusiones y oraciones para tratar ocurrencias, además de algunas creencias relacionadas con el muñón umbilical, hipos y alteraciones en el sueño del bebé.

CONCLUSIÓN: Los profesionales de salud precisan conocer las creencias y prácticas de las madres adolescentes para entonces planificar, de la mejor forma posible, la asistencia a ser prestada al binomio madre-hijo.

Descriptores: Cuidado del lactante; Adolescente; Relaciones madrehijo; Medicina tradicional

INTRODUÇÃO

A cultura nos é transmitida desde o momento em que nascemos. Com o passar do tempo, nosso modo de ser e agir se amolda aos valores, crenças e costumes do meio em que vivemos, tornando-nos seres singulares, com necessidades diferentes, porém sob a influência do contexto cultural. Desta forma, é possível afirmar que, em certo aspecto, o ser humano é resultado do meio cultural onde foi criado, sendo herdeiro e transmissor do conhecimento e das experiências adquiridas pelas gerações que o antecederam(1).

Por ser a mulher a principal responsável pelo cuidado à família, muitas vezes transmite, a partir do cuidado, as crenças, valores e recursos locais, na maioria das vezes desenvolvidos na vivência cotidiana(2).

Os saberes e a prática do cuidado iniciam-se a partir da concepção, mas configuram-se imediatamente após o nascimento, quando a criança é totalmente dependente pois, embora possua todas as potencialidades para sobreviver, ela precisa de cuidados que não pode prestar a si mesma, devendo alguém – geralmente a mãe – cuidá-la(3).

O puerpério é um período carregado de mitos, crenças e costumes aos quais precisamos estar atentos, procurando respeitar as crenças e práticas culturais de cada família, na medida em que não prejudiquem a saúde da mãe e do filho. O cuidado, permeado por práticas culturais,passadas de mãe para filha, através das gerações, é muito marcante nesse período, mas muitas vezes a equipe de enfermagem não valoriza, e até despreza essas crenças, gerando conflitos com as famílias.

Concordamos com Leininger(4) quando afirma que o cuidado é a essência da Enfermagem, porém não pertence somente a esta profissão. O cuidar é intrínseco aos seres humanos, suas formas é que podem variar de acordo com as vivências e crenças de cada um. No caso da mãe adolescente, uma dúvida que surge é se ela, ao cuidar do filho recém-nascido, também adota práticas populares.

Levando em consideração tais fatos, e ainda que proporcionar cuidado que valorize significados, padrões, valores e modo de vida da mãe adolescente e respeitando sua cultura não significa abandonar ou desprezar o sistema profissional de saúde, mas sim, interagir com essas formas de cuidar(4), definimos como objetivo deste estudo identificar e descrever os cuidados populares desenvolvidos pelas mães adolescentes atendidas em uma maternidade de Cambé - PR, no cuidado aos filhos nos seis primeiros meses de vida.

MÉTODOS

A pesquisa, de abordagem qualitativa, utilizou a Teoria da Diversidade e Universalidade do Cuidado Cultural(4) como referencial teórico no estudo de maior amplitude que gerou este manuscrito. Esta teoria reconhece a importância da cultura e sua influência sobre tudo aquilo que envolve os alvos e os provedores do cuidado de enfermagem.

O estudo foi desenvolvido no município de Cambé - PR, localizado na Região Norte do Estado, contando aproximadamente 88.186 habitantes(5). Foram incluídas no estudo mães adolescentes que tiveram seus filhos na maternidade de um hospital filantrópico do município, residentes na zona urbana, que estavam em alojamento conjunto e aceitaram participar do estudo.

Os dados foram coletados no período de fevereiro a outubro de 2007, junto a seis mães adolescentes e seus filhos, que foram acompanhadas até o sexto mês de vida do filho. Duas delas desistiram do estudo antes desse período (aos quinze e aos 30 dias), porém suas informações foram utilizadas neste estudo. Os dados foram coletados em cinco momentos distintos: logo após o parto - ainda no hospital, e no domicílio em quatro ocasiões: ao fim da primeira semana, e no primeiro, quarto e sexto mês de vida da criança. Para a coleta de dados foram utilizadas entrevistas abertas e observação.

No primeiro e único encontro no hospital com o propósito de pesquisa, o foco foi estabelecer o rapport inicial e solicitar a participação no estudo. Nesta ocasião, não foi feita entrevista, mas todo o contexto da interação foi registrado no diário de campo. Nos demais encontros, o foco esteve voltado para a experiência da mãe adolescente em relação ao cuidado do filho. As entrevistas, com o consentimento das participantes, foram gravadas e posteriormente transcritas na íntegra, e os dados oriundos da observação durante as visitas no domicílio e da reflexão sobre o andamento do estudo foram registrados no diário de campo, logo após cada interação com as adolescentes.

Os encontros nos domicílios foram previamente agendados e, quando possível, confirmados por telefone na véspera. A cada novo encontro algumas questões norteadoras eram introduzidas: "Como está o seu bebê desde a última vez que nos vimos?" "Como está sendo, para você, cuidar dele?" É importante ressaltar que existia um roteiro de aspectos que deveriam ser abordados com as mães, caso elas não falassem livremente sobre eles, o qual incluía: dificuldades e facilidades na realização do cuidado cotidiano ao filho, intercorrências na saúde da mãe e da criança e condutas tomadas diante dessas situações. Cada encontro teve a duração média de 60 minutos e dele participaram a adolescente e as pessoas que estavam presentes na casa, geralmente sua mãe.

Os dados obtidos foram tratados segundo a análise de conteúdo(6), ou seja, após a transcrição do conteúdo das entrevistas o material foi lido na íntegra, iniciando-se a pré-análise e exploração dos dados; em seguida os dados foram organizados sistematicamente e agregados em unidades, o que permitiu uma descrição exata das características pertinentes. Procedeu-se, então, à categorização, que consistiu em isolar os elementos do discurso e impor certa organização às mensagens, investigando os pontos comuns entre si. Os resultados permitiram a identificação de crenças e práticas relacionadas com a amamentação, o cuidado cotidiano e as atitudes diante de intercorrências.

O desenvolvimento do estudo ocorreu em conformidade com o preconizado pela Resolução n.º 196/96 do Conselho Nacional de Saúde(7) e o projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá (Parecer n.º 035/2007). Todas as adolescentes participantes, assim como seus responsáveis, foram informados sobre os objetivos do estudo e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em duas vias.

RESULTADOS

As mães adolescentes em estudo tinham idade entre 15 e 18 anos (uma tinha 15 anos, duas 16, duas 17 e uma, 18 anos), sendo que três delas moravam com o pai da criança, quatro eram primíparas e duas secundíparas. Quando se descobriram grávidas, nenhuma delas estava trabalhando, e das quatro que estudavam, duas interromperam os estudos ao saber da gravidez. Vale acrescentar que as outras duas adolescentes já o haviam feito durante a gravidez anterior. A renda familiar variou de um a três salários-mínimos.

Nas primeiras interações, ocorridas ainda durante a hospitalização, foi observado que havia adolescentes que realizavam todos os cuidados com o recém-nascido, demonstrando segurança e desenvoltura, mas também algumas mostravam bastante insegurança, em especial, medo ao pegar ou tocar no recém-nascido. Com uma adolescente, o contato ocorreu logo após o parto, quando seu filho ainda não havia sido trazido para o quarto e por isto, não foi possível observar sua atuação junto ao filho.

Os relatos das mães referentes às práticas de cuidado adotadas no domicílio ao longo dos seis meses de acompanhamento, permitiram a identificação de três categorias: crenças e práticas relacionadas com a amamentação; crenças e práticas relacionadas com o cuidado cotidiano; e crenças e práticas populares diante de intercorrências.

Crenças e práticas relacionadas com a amamentação

As crenças e práticas relacionadas com a amamentação foram diversificadas e reveladoras da influência que sobre essas jovens mães exerciam o meio familiar e o externo, desde os primeiros dias com o bebê em casa:

Minha tia veio falar por que eu não dava mamadeira [...] eu fiquei com medo dele estar passando fome [...] conversei com a minha mãe [...] daí ela falou que meu leite estava sustentando sim, porque o bebê mama e dorme, e que quando a gente era pequeno ela tinha que dar mamadeira porque não tinha leite [...] se não sustentasse o bebê irá chorar .

Ao final da primeira semana de vida do recém-nascido uma das adolescentes, embora não apresentasse fissuras, estava usando um "bico de silicone" na mama como meio de aliviar as dores:

Fui à farmácia, ver se tinha algum remédio, porque estava com dor demais [...] daí o farmacêutico orientou o bico, eu usei e o bebê pegou bem [...].

No caso de uma adolescente que apresentava fissura nos mamilos, algumas vezes seu filho estava sendo amamentado por uma vizinha. A mãe acreditava que desta forma ela descansaria e, ao mesmo tempo, seu filho continuaria recebendo leite materno. Revelou ainda que tal situação havia ocorrido, também, com sua primeira filha.

[...] da outra vez também rachou e eu tive sorte, porque minha irmã estava com filho pequeno e ela me socorreu, ficou amamentando até meu peito melhorar.

As crenças referentes ao "leite fraco" ou "pouco leite" também estiveram presentes no cotidiano das adolescentes, tanto que uma delas iniciou a complementação com leite artificial ainda na primeira semana de vida.

[...] parecia que eu não tinha leite, ele mamava, mamava e nada, parecia que não sustentava, daí eu comprei NAN [...] Dei o leite na chuca e ele dormiu [...] logo meu leite voltou [...].

Crenças e práticas populares relacionadas com o cuidado cotidiano

No decorrer dos quatro encontros realizados no domicílio, ao longo dos seis meses, foi observado que, no cuidado dos filhos, as adolescentes adotavam práticas populares ora embasadas nas experiências de sua família, ora em suas próprias experiências.

Um fator que pareceu gerar dúvidas e insegurança era não saber ao certo se havia ou não necessidade de dar água ao filho. O clima muito quente da região pareceu contribuir para o surgimento dessa dúvida, embora as adolescentes tenham feito referência ao fato de terem sido orientadas a nada oferecer, além do leite materno.

[...] minha mãe fala pra eu dar água pra ele quando está muito quente, daí eu dou só a água.

Embora desencorajadas por suas mães, algumas adolescentes acreditavam que a chupeta ajudava a acalmar o filho e, além disso, achavam bonito a criança usar chupeta, tanto que algumas compraram antes mesmo de o filho nascer.

Eu dei a chupeta só pra trocar [...] ele não dorme com a chupeta, porque ele não chora [...] só na hora de trocar ele chora, aliás, grita [...] daí eu dou a chupeta [...].

Eu acho tão bonitinho, faz pouco tempo que ele está com a chupeta.

Também desenvolveram o cuidado popular para aliviar o soluço colocando um pedaço de lã na testa dos filhos e virando um copo de boca para baixo.

Quando ela tem soluço, tiro uns fiapinhos de lã e coloco na testa, tem que ir à cozinha e virar um copo de boca para baixo [...] daí espera um pouco e passa.

A preocupação com o coto umbilical foi evidente, pois este é visto como "algo perigoso", "que pode sangrar".

[...] tinha medo que ele ficasse aberto, estufado [...].

Nossa! Fiquei morrendo de medo quando caiu o umbigo. Minha mãe não estava em casa e sangrou na roupa, fiquei com aquele negócio na mão, não sabia o que fazer, nossa! [...] liguei para ela na hora, fiquei com medo que o bebê morresse [...] Ninguém tinha me falado que sangrava. Aquele negócio era seco, como podia sangrar?

Uma prática relacionada com o coto umbilical encontrada é a de guardá-lo:

Daí minha mãe me mandou guardar em um frasquinho pra dar sorte.

Eu guardei o umbigo, é para dar sorte [...] da outra filha também está guardado.

A prática de vestir os filhos com as roupas ao avesso para prevenir que eles trocassem o dia pela noite foi referida por duas adolescentes

Minha avó diz que é para ele não trocar o dia pela noite [...] é pra ela dormir de noite e ficar mais acordada de dia.

Ele não dorme de noite. De dia o rádio está ligado e ele dorme assim mesmo, à noite ele chora e não dorme [...] de dia ele dorme e tem noite que ele fica acordado.

O cuidado desenvolvido pelas adolescentes para verificar o aparecimento de dentes nos filhos revelou quanto o cuidado cotidiano é permeado por práticas populares passadas pelas mulheres da família.

Quando olhava na boca dela não via nada de dente [...] minha avó me ensinou que tem que colocar uma colher na boca dela para fazer barulho, porque às vezes o dente saiu, mas não dá pra ver ainda.

Crenças e práticas populares diante de intercorrências

Para as jovens mães do estudo existem dois tipos de ocorrência: algumas, que elas de certa forma esperam, como as cólicas intestinais, e as inesperadas.

Em relação às cólicas intestinais as mães revelaram fazer uso de chás de diferentes ervas, tanto para prevenção como para alívio da cólica, e também para acalmar o bebê. Para algumas adolescentes o oferecimento de chás faz parte da cultura de sua família de origem.

Estava dando chá de erva-doce e de camomila [...] estou dando outro chá. Esse foi minha mãe que falou. Veio de lá de trás, minha avó falava [...] e realmente foi bom. Eu não conhecia, você não deve conhecer, é erva-de-são-joão, um mato, calmante, mas assim, não deu reação nenhuma nele, pelo contrário, acalma.

Para outras adolescentes, oferecer chás é uma prática que passou a ser incorporada a partir da convivência com a família do esposo:

Ah, para sustentar só o peito, mas estou dando chá. Minha sogra que mandou, disse que é bom pra ela soltar os gases e não dar cólica nela. Para a outra também eu dei.

Outra prática apontada referia-se a algo que não fazia parte de seu núcleo familiar:

[...] ela chorou bastante, se contorcia, daí eu fiz chá de erva-doce e dei na chuca, passou [...] dei o chá, porque já ouvi dizer que é bom para a cólica [...] acho que acalmou, ela parou de chorar.

O aparecimento de cólicas no filho era interpretado como associado aos alimentos ingeridos pelas adolescentes. Assim, passaram a não ingerir determinados alimentos:

Eu tomo bastante chá e não como brigadeiro [...] fui a um aniversário e comi bastante brigadeiro, daí deu muita cólica nele.

Para o alívio das cólicas, as adolescentes também realizavam massagens e colocavam toalha quente no abdômen, e ainda adotavam algumas posições, como deixar o bebê de bruços.

[...] quando dá coliquinha, fico com ele no colo, depois passa a dor [...] eu o deito de bruço [...] não dou nada de remédio pra ele.

Cólica ele tem bastante, nossa! Eu faço massagem nas perninhas, do jeito que me ensinaram na maternidade.

Nos casos de intercorrências inesperadas, as jovens mães desenvolveram o cuidado popular e, algumas vezes, recorreram ao cuidado profissional. Quando percebiam a possibilidade de a alteração ser sinônimo de algo prejudicial à saúde dos bebês, ficavam apreensivas e procuravam ajuda dos profissionais de saúde; porém, os cuidados profissionais foram seguidos pelas mães adolescentes, de forma concomitante com os cuidados populares aconselhados por suas mães ou sogras, pois estas são suas referências.

Uma intercorrência relacionada ao períneo do filho foi associada à ida ao serviço de saúde.

Levei ele no 24 horas. Saiu umas bolinhas no bumbum. Lá fizeram exames de sangue e urina, mas a médica falou que não era assadura, era só uma irritação [...] estava bem feio, mas agora eu estou passando Hipoglós, estava bem pior [...] ficou feio de um dia para o outro [...] quando mostrei para minha mãe, ela sabia que não era assadura [...] fiquei assustada e ela também [...] agora já melhorou.

Diante de constipação intestinal por volta do vigésimo dia de vida, a mãe referiu:

Fiquei noites em claro [...] ela só chorava, mamava e chorava. É que não conseguia fazer cocô, só com supositório.

Quando essa adolescente procurou o serviço de saúde, o pediatra relacionou a constipação à ingestão de leite pela mãe, orientando-a a interromper a ingesta de leite e iniciar a complementação da alimentação da filha com leite artificial específico.

O médico [...] pediu para eu comprar uma lata de NAN [...] porque meus peitos tão muito murchos.

Observa-se que o profissional, que também herdou crenças, desestimulou a amamentação, insinuando que ela não tinha leite suficiente. Diante dessa situação, a adolescente passou a levar a filha para benzer. Ela acreditava nesse cuidado como uma maneira de prevenir problemas de saúde e também de proteger a criança.

Estou levando o bebê para benzer [...] minha sogra falou que é bom para não dar mau-olhado, que ela precisa de proteção, que o vento virou [...] tinha que levar para ficar boa.

Uma, dentre as crianças, apresentou reação à primeira dose da vacina tetravalente, com hipertermia acompanhada de mal-estar e apatia. Diante dessa situação, a adolescente desenvolveu o cuidado popular, fazendo um banho de imersão para aliviar a hipertermia, mas também ofereceu medicação antitérmica.

[...] eu dei um banho para melhorar, eu sei que banho é bom para passar a febre, refresca o corpo e depois o remédio fez efeito.

Outra adolescente, ao deparar-se com a situação de doença do filho, aos quatro meses de vida, levou-o ao hospital e chegou a iniciar o tratamento, fazendo inalação, porém, logo após, iniciou o cuidado popular.

Fiz inalação no hospital, no outro dia parecia que ele estava pior, então parei com a inalação. Daí minha mãe pegou um xarope caseiro de uma mulher ali da rua de cima, aquelas 'garrafadas' sabe? [...] Coisa feita com mel, açúcar, só coisa natural. Comecei a dar pra ele três vezes no dia, passou uns dias e ele tava bom.

A oração também foi um cuidado adotado por essa adolescente, que acreditava em seus benefícios:

Como ele estava doente, levei-o para o pastor fazer orações, e os irmãos fizeram orações também [...] assim ele sarou rápido [...] a oração tem poder de curar as pessoas.

Já outra adolescente, ao deparar-se com uma situação de doença do filho aos quatro meses de vida, desenvolveu somente o cuidado popular, não procurando o serviço de saúde.

[...] essa semana que esfriou, ela ficou 'gripadinha', mas como não deu febre, não levei no médico; minha mãe fez um chá e um xarope melado e foi só o que dei pra ela [...] não dei nem remédio.

DISCUSSÃO

As adolescentes que demonstraram maior segurança e habilidade para lidar com o filho desde a maternidade foram as secundíparas e uma que, embora primigesta, tinha a seu favor o fato de já ter ajudado a cuidar de um irmão mais novo, o que é coerente com o que tem sido descrito na literatura(8).

No que se refere às crenças e práticas relacionadas com a amamentação, as adolescentes em estudo mostraram a importância da identificação precoce de problemas para o sucesso do aleitamento materno, e também de se identificar, ainda durante o pré-natal, o arcabouço cultural da adolescente representado por suas crenças e costumes, bem como sua predisposição em relação ao aleitamento materno. Duas delas mostraram, por exemplo, a força da vivência de uma experiência anterior na experiência atual. De onde se deduz que, se a primeira experiência foi negativa, a mãe, de certa forma, fica esperando que ocorra o mesmo no segundo momento. Parece ter sido isto o que aconteceu com a adolescente que, ainda na maternidade, já estava apreensiva, com medo de não conseguir amamentar, ocasião em que foi observado que seus mamilos estavam hiperemiados, embora a forma de apreendê-los estivesse correta.

O mesmo também pode ter ocorrido com a adolescente que repetiu a prática de amamentação cruzada, o que era visto como natural por ela e sua família e, aceito pela vizinha, que oferecia seu leite ao bebê. Na concepção da família desta adolescente, o importante é que a criança receba leite humano, não importando de quem.

Para o Ministério da Saúde, o aleitamento materno cruzado, incluindo aquele às vezes praticado nos sistemas alojamento conjunto e pelas tradicionais amas-de-leite, não deve ser realizado(9). Esta é uma prática não recomendada pelos profissionais de saúde. Com relação a este aspecto, em nossa opinião uma boa anamnese durante o pré-natal possibilitaria que os profissionais de saúde tomassem conhecimento da ocorrência deste fato em períodos anteriores. Isto lhes permitiria abordar a questão numa ocasião em que a adolescente tivesse mais tempo para assimilar os riscos envolvidos na amamentação cruzada, sem contar que este período certamente seria mais apropriado para novas aprendizagens, diferentemente de quando já está sendo colocada em prática uma determinada conduta.

A justificativa apontada pelas adolescentes que iniciaram a complementação com leite artificial reforça a necessidade de maiores esclarecimentos por parte dos profissionais de saúde sobre a questão de que não existe leite fraco, e que o fato de o filho chorar não quer dizer necessariamente que ele esteja com fome, pois o choro é a primeira forma de comunicação social do bebê, sendo considerado uma manifestação normal e fisiológica durante os primeiros meses de vida(10). Isto é muito importante, pois a baixa qualidade ou quantidade do leite é o primeiro fator a ser associado ao choro(11).

O relato da adolescente que revelou a atitude de sua tia, tentando influenciá-la para iniciar a complementação, mostra um problema comum enfrentado pelas mães no cotidiano, demonstrando, inclusive, que a despeito de sua importância como fonte de apoio e transmissão de conhecimentos, a família também pode atuar de forma negativa, o que é bastante comum em relação ao processo de amamentação.

Neste caso específico foi observado que, apesar de ter recebido a orientação de profissionais da área da saúde no sentido de amamentar sem complementação até os seis meses, a adolescente ficou em dúvida quando a tia a questionou. Contudo, o fato de sua mãe - que estava mais próxima e, nessa condição, constituía seu referencial de cuidar - ter amamentado os filhos sem complementação, foi decisivo para embasar sua decisão de manter o aleitamento materno exclusivo.

Com vistas ao aumento dos índices de amamentação, destacamos a importância de os profissionais de saúde acompanharem, de forma mais freqüente e com maior atenção, as jovens mães, especialmente quando elas não podem contar com uma rede social de apoio, e também de conhecerem a história familiar pregressa em relação ao aleitamento, o que lhes possibilitará identificar os casos mais vulneráveis ao desmame.

A importância da experiência e conselho materno também podem ser verificados quando a adolescente demonstrou insegurança quanto a iniciar ou não a introdução de água oferecida ao bebê, já que, na opinião de sua mãe, devido ao grande calor que fazia seria importante o bebê receber água para não se desidratar. Com relação a este fato, consideramos necessário explorar como, em cada experiência, são tomadas as decisões sobre a introdução ou não de outros líquidos. Assim, os profissionais poderão identificar aquelas situações em que a não-introdução da água, em função da ansiedade gerada na mãe e nos familiares, pode ser mais prejudicial do que a própria introdução.

Ao considerar as práticas incluídas na segunda categoria observamos mais facilmente o movimento de transmissão de crenças entre gerações. O uso da chupeta se mostrou como uma exceção, pois nem sempre as adolescentes levam em conta os conselhos e as experiências de suas mães.

Em relação ao coto umbilical, as mães adolescentes, especialmente as de "primeira viagem", demonstraram o quanto se sentiam inseguras em relação ao manuseio e à queda do coto umbilical, reforçando o fato de que, para as mulheres, o coto umbilical é envolto em mistério, desconhecimento e ambigüidade, uma vez que ele tanto "alimenta a criança", como "pode levá-la à doença"(12).

É interessante observar que, entre estas seis adolescentes, não foram encontradas algumas crenças relacionadas ao coto umbilical identificadas em outros estudos e consideradas bem conhecidas de toda a população, como enfaixar o coto, colocar moeda e utilizar / passar diferentes ingredientes como banha de galinha, arruda e folha de fumo(12). Por outro lado, foi evidenciada a crença quanto à importância de guardar o coto para "dar sorte", o que não foi encontrado em outros estudos. Isto nos leva a inferir ser esta uma crença mais presente nesta localidade do que em outras e revela a importância do contexto social na disseminação de crenças e valores populares, evidenciada pela confiança das adolescentes nos conhecimentos de mulheres que já passaram por essa experiência(13).

As crenças sobre maneiras de aliviar o soluço, evitar que o filho troque o dia pela noite e verificar o surgimento de dentes também mostram que o saber familiar é reconhecido como um conhecimento vindo da experiência e carregado de sentimentos, afetos e competências, e que os participantes do cuidado compartilham vivências, conceitos e práticas(12).

Por fim, as crenças e práticas diante de intercorrências constituem uma demonstração viva da importância do contexto familiar e social na adoção de práticas de cuidados relacionadas com a saúde. O uso de chás de certas ervas para tentar acalmar ou tratar a cólica intestinal se mostrou uma prática freqüente, que tanto pode ser trazida da família de origem como aprendida a partir da interação com novas pessoas significantes, como a sogra ou mesmo conhecidos e profissionais de saúde. A literatura mostra que os chás caseiros são possuidores de grande aceitação entre a população e que seu uso ocorre a partir de experiências adquiridas ao longo da vida. Normalmente seu uso provém de informações repassadas entre as gerações e está ligado a tradições e costumes socioculturais(14).

Como visto, os conhecimentos sobre ervas são difundidos pela cultura popular por meio das práticas dos familiares e do conselho de pessoas que já as utilizaram(15). É interessante observar que quem utiliza práticas populares não se preocupa com a cientificidade dos recursos utilizados no tratamento de doenças, e sim com as respostas às suas necessidades em determinado momento(14,16).

As mulheres adquirem conhecimentos de medicina caseira que são transmitidos oralmente das mais velhas para as mais novas. Tais conhecimentos se referem a práticas que são tidas como eficazes, já que funcionam. Por outro lado, a dimensão emotiva que envolve o cuidado, dentro do contexto familiar, permite que esses recursos tenham boa adesão por parte da mãe adolescente. De fato, "as redes sociais que se formam entre as famílias e as relações de vizinhança têm sido profícuas na troca e difusão das práticas populares de saúde"(17).

Ao reconhecer as práticas populares de autocuidado, o enfermeiro pode preservar essa sabedoria, interagindo no intercâmbio entre o conhecimento científico e o popular(18).

As adolescentes revelaram que, em muitas situações consideradas de intercorrência, fizeram uso de cuidados populares, não chegando sequer a procurar assistência médica; e mais: que mesmo nas situações em que ocorreu esta procura, elas não deixaram de utilizar o conhecimento popular, ou seja, as práticas do cuidado profissional foram utilizadas em concomitância com as do cuidado popular. As adolescentes, assim, vão tecendo e combinando os conhecimentos científicos com os populares, numa fusão de múltiplos saberes, que vão sendo incorporados por elas e seus familiares e, desta forma, se fazem presentes em suas decisões. Por meio da negociação entre os saberes, construímos um melhor, formado a partir da aliança dos conhecimentos populares e científicos(19).

A intercorrência no períneo de um dos bebês nos mostrou mais uma vez que as famílias tentam primeiramente resolver os problemas de saúde a partir de conhecimentos que já possuem, e só quando estes não resolvem é que decidem procurar ajuda profissional. Neste caso específico, a mãe da adolescente chegou a reconhecer que não se tratava de assadura, porém fez uma tentativa e iniciou o cuidado popular que conhecia utilizando pomada específica para assadura. A adolescente, por sua vez, utilizou o medicamento, indicado pelo profissional de saúde para tratamento da monilíase, mas, talvez por não ter sido suficientemente esclarecida sobre o tipo de problema da filha, continuou usando o produto indicado por sua mãe.

É importante salientar que, quando as explicações dos profissionais de saúde não conseguem convencer a mãe sobre a eficácia da conduta indicada, este estudo mostrou que, antes mesmo de colocá-la em prática, as mães adolescentes procuram outros recursos terapêuticos, como, por exemplo, levar o filho para benzer. Esta prática é percebida como eficaz na prevenção de problemas de saúde em geral e na proteção à criança(16). Em um estudo realizado com mulheres de pescadores, benzer a criança foi identificado como um rito de cuidado essencial para prevenir o "mal do espírito" que se manifesta no corpo da criança"(12).

O estudo também evidenciou que, ao procurar o sistema profissional de cuidado à saúde, as adolescentes querem observar melhora quase imediata do quadro que motivou a busca por atendimento. Se, ao contrário, percebem piora, este cuidado é substituído por outro, em geral um cuidado popular, que pode até não mostrar resultado imediato, mas é bem aceito, especialmente por ser considerado "natural". Esta foi a situação observada no caso da jovem mãe, que até iniciou as inalações indicadas pelo médico, mas passou a utilizar "garrafada" xarope natural, feito de uma mistura de mel, açúcar, limão e certas ervas que constitui um cuidado popular muito bem aceito no contexto onde ela morava. Neste caso, foi um cuidado popular que transcendeu o ambiente familiar, porquanto era passado pela vizinha para toda a comunidade onde ela estava inserida, confirmando, assim, que o cuidado é transmitido através de crenças, valores e atitudes de pessoas para pessoas num determinado contexto social(1).

Outro tipo de cuidado popular, este utilizado por uma das adolescentes que era evangélica, foi a oração. Ela acreditava em sua eficácia para prevenir problemas de saúde, proteger a criança e obter melhora em casos de doença. A medicina religiosa pertence ao contexto sociocultural e, geralmente, é influenciada por familiares ou grupos sociais. Pertencendo a um processo histórico, consegue sobreviver, mesmo diante das inovações tecnológicas da atualidade(14). "A religiosidade envolve um sistema de culto e doutrina que é compartilhado por um grupo e por isso tem características comportamentais, sociais, doutrinárias e valorais específicas"(20).

Vários estudos têm apontado que a religião/espiritualidade, além de constituir um importante apoio no enfrentamento da doença(21-22), também tem papel relevante na manutenção e recuperação da saúde, uma vez que a fé e a esperança podem ajudar a aliviar a dor e o sofrimento causados pela doença no cotidiano, além de ser motivo de esperança em relação à cura(22).

Por fim, no relato da adolescente de que a criança ficou "gripadinha", mas não apresentou febre, é possível identificar que as mães adolescentes, apoiadas por suas próprias mães, utilizam-se de um referencial de cuidar que lhes permite identificar as situações nas quais se faz necessário buscar ajuda profissional. A mãe da adolescente, por sua vez, relatou que o chá e o xarope são receitas que sua mãe havia lhe ensinado e ela tinha feito para todos os filhos quando ficavam doentes. Essa troca de experiência entre mãe e filha demonstra, de forma clara, como o cuidado popular é transmitido de geração a geração. Também mostra que as atitudes do ser humano resultam do meio cultural em que ele foi criado, já que este meio é herdeiro e transmissor do conhecimento e das experiências adquiridas pelas gerações que o antecederam(1).

Assim, é por meio das medidas caseiras que as adolescentes procuram curar seus filhos das intercorrências que julgam menos graves, deixando a procura por atendimento médico para quando a situação foge do seu controle(16).

Ao contrário da visão hegemônica da sociedade e dos profissionais de saúde em geral, que consideram a adolescente incapaz de exercer a maternagem, a experiência de cuidar do filho é repleta de significados positivos, também para a mãe adolescente, que apresenta competência para tal, desde que possa contar com uma rede de apoio composta de objetos sociais que ofereçam suporte financeiro e emocional, este traduzido por afeição, aprovação e preocupação, promovendo sentimentos de acolhimento, como perceber-se pertencente a um grupo(23).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos perceber que todas as mães adolescentes deste estudo fizeram uso de medidas caseiras para solucionar os problemas, as intercorrências de saúde com as quais se depararam nos primeiros seis meses de vida de seus filhos, e que as medidas adotadas eram usadas de longa data e, certamente, já testadas pela comunidade. Isto revela que, apesar dos grandes avanços tecnológicos obtidos na área da saúde, o uso de recursos populares continua com credibilidade, por responderem, em muitos casos, às necessidades e expectativas da população.

No presente estudo, os cuidados populares apareceram fortemente arraigados na vida das mães adolescentes e da comunidade onde vivem, sendo transmitidos e orientados pelas pessoas mais experientes e usados muitas vezes por elas como primeira escolha.

As mães adolescentes desenvolveram cuidados populares presentes na cultura familiar, como a amamentação cruzada, o oferecimento de chás, a roupa ao avesso, a guarda do coto umbilical, o oferecimento de xaropes, os benzimentos, entre outros; e - mais importante - diante das intercorrências na saúde dos filhos, as mães adolescentes atendidas na maternidade campo deste estudo realizaram o cuidado popular, muitas vezes intercalando-o com o cuidado profissional, embora em algumas situações nem sequer procuraram o serviço de saúde, realizaram somente o cuidado popular.

Sendo assim, os profissionais de saúde precisam conhecer as crenças e práticas das mães adolescentes para então planejar, da melhor forma possível, a assistência a ser prestada ao binômio mãe-filho. É preciso que os profissionais de saúde aprofundem seus conhecimentos sobre as diferentes práticas de cuidado para entender as mães, interagindo com elas, não esquecendo que elas pertencem a um contexto familiar permeado por conhecimentos, valores e crenças que fazem parte do seu dia-a-dia. Dessa forma, será possível estabelecer um relacionamento terapêutico que as auxilie no cuidado ao filho. O saber popular deve ser compreendido e acrescido de conhecimentos e atitudes respaldados pelo saber científico, pois esses conhecimentos populares (benzeduras, chás caseiros e simpatias), que ultrapassam gerações e fazem parte do contexto da população, dificilmente são passíveis de mudanças.

Por fim, acreditamos que os resultados deste estudo possam concorrer para a transformação da prática assistencial, especialmente do cuidado da mãe adolescente para com o filho, com a compreensão da importância de reconhecer os fatores culturais na assistência a essas mães. Esperamos, ainda, que sirvam como subsídios para o desenvolvimento de pesquisas e programas educativos referentes ao tema.

Artigo recebido em 14/05/2008 e aprovado em 26/11/2008

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  • Autor Correspondente:
    Keli Regiane Tomereli
    R. Belo Horizonte, 1829
    Cambé- PR - Cep: 86181-02
    E-mail:
  • *
    Estudo extraído da Dissertação de Mestrado em Enfermagem: Experiência de mães adolescentes no cuidado ao filho nos seis primeiros meses de vida, apresentada à Universidade Estadual de Maringá. - UEM - Maringá (PR), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jul 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Recebido
      14 Maio 2008
    • Aceito
      26 Nov 2008
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