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Opinião de acompanhantes de crianças em quimioterapia ambulatorial sobre uma quimioteca no Município de São Paulo

Opinión de acompañantes de niños sometidos a quimioterapia en ambulatorio sobre una quimioteca en el municipio de Sao Paulo

Resumos

OBJETIVO: Conhecer a opinião dos acompanhantes de crianças de 2 a 12 anos de idade em tratamento quimioterápico sobre a Quimioteca Fundação Orsa. MÉTODOS: Trata-se de um estudo quantitativo descritivo. Realizaram-se entrevistas semi-estruturadas com 54 acompanhantes de crianças em tratamento quimioterápico ambulatorial. RESULTADOS: Na opinião desses acompanhantes, o ambiente colorido e cheio de brinquedos e a oferta de atividades lúdicas, durante a administração de quimioterápicos, têm influência positiva na qualidade do tratamento e no estado de bem-estar da criança. Apesar da avaliação extremamente positiva sobre o serviço, foram apontados aspectos que necessitam ser aprimorados, principalmente em relação ao atendimento. CONCLUSÃO: Os acompanhantes percebiam que o ambiente e o brincar colaboravam no bem estar das crianças em tratamento. A Quimioteca é uma experiência inovadora que pode servir de exemplo para o desenvolvimento de tecnologias criativas de cuidado às crianças com câncer e suas famílias, contribuindo para a melhoria da assistência a essa clientela.

Criança; Humanização da assistência; Quimioterapia; Jogos e Brinquedos


OBJETIVO: Conocer la opinión, de los acompañantes de niños de 2 a 12 años de edad sometidos a tratamiento de quimioterapia, sobre la Quimioteca Fundación Orsa. MÉTODOS: Se trata de un estudio cuantitativo descriptivo. Se realizaron entrevistas semi-estructuradas con 54 acompañantes de niños en tratamiento de quimioterapia en ambulatorio. RESULTADOS: En la opinión de esos acompañantes, el ambiente colorido lleno de juguetes y la oferta de actividades lúdicas, durante la administración de la quimioterapia, tiene influencia positiva en la calidad del tratamiento y en el estado de bienestar del niño. A pesar de la evaluación muy positiva sobre el servicio, fueron apuntados aspectos que necesitan ser mejorados, principalmente en relación a la atención. CONCLUSIÓN: Los acompañantes percibían que el ambiente y el jugar colaboraban en el bienestar de los niños en tratamiento. La Quimioteca es una experiencia innovadora que puede servir de ejemplo para el desarrollo de tecnologías creativas de cuidado a niños con cáncer y a sus familias, contribuyendo para la mejoría de la asistencia a esa clientela.

Niño; Humanización de la atención; Quimioterapia; Juego e Implementos de juego


OBJECTIVE: To know the opinion of adults escorting children, from 2 to 12 years, undergoing chemotherapy about the Orsa Foundation "Chemo-teca". METHODS: This is a descriptive quantitative study. Were conducted semi-structured interviews with 54 children's escorting companions during an outpatient chemotherapy treatment. RESULTS: In the opinion of those escorting companions, the colorful environment, the toys and the leisure activities, offered during the administration of chemotherapy, has positive influence on the quality of treatment and the state of child welfare. Despite the very positive evaluation of the service, were mentioned areas requiring improvement, particularly in relation to the attention care. CONCLUSION: The companions escorting the children perceived that the happy environment collaborated on the wellbeing of children in treatment. The "Chemo-teca" is an innovative experience that can serve as an example for the development of creative technologies to care for children with cancer and their families, contributing to the improvement of care assistance to this clientele.

Child; Humanization of Assistance; Drug therapy; Play and Playthings


ARTIGO ORIGINAL

Opinião de acompanhantes de crianças em quimioterapia ambulatorial sobre uma quimioteca no Município de São Paulo* * Estudo realizado na Quimioteca Fundação Orsa, no Instituto de Oncologia Pediátrica - IOP - São Paulo (SP), Brasil.

Opinión de acompañantes de niños sometidos a quimioterapia en ambulatorio sobre una quimioteca en el municipio de Sao Paulo

Ione Queiroz de JesusI; Ana Luiza Vilela BorgesII; Iara Cristina da Silva PedroIII; Lucila Castanheira NascimentoIV

IEspecialista em Enfermagem Obstétrica e em Enfermagem de Saúde Pública. Consultora em Aleitamento Materno pelo International Board Certified Lactation Consultant

IIDoutora em Saúde Pública. Professora do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo - USP. São Paulo (SP), Brasil

IIIMestre em Enfermagem em Saúde Pública

IVDoutora em Enfermagem. Professora do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e de Saúde Pública da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil

Autor Correspondente Autor Correspondente: Ana Luiza Vilela Borges Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César São Paulo (SP), Brasil - CEP: 05401-001 E-mail: alvilela@usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Conhecer a opinião dos acompanhantes de crianças de 2 a 12 anos de idade em tratamento quimioterápico sobre a Quimioteca Fundação Orsa.

MÉTODOS: Trata-se de um estudo quantitativo descritivo. Realizaram-se entrevistas semi-estruturadas com 54 acompanhantes de crianças em tratamento quimioterápico ambulatorial.

RESULTADOS: Na opinião desses acompanhantes, o ambiente colorido e cheio de brinquedos e a oferta de atividades lúdicas, durante a administração de quimioterápicos, têm influência positiva na qualidade do tratamento e no estado de bem-estar da criança. Apesar da avaliação extremamente positiva sobre o serviço, foram apontados aspectos que necessitam ser aprimorados, principalmente em relação ao atendimento.

CONCLUSÃO: Os acompanhantes percebiam que o ambiente e o brincar colaboravam no bem estar das crianças em tratamento. A Quimioteca é uma experiência inovadora que pode servir de exemplo para o desenvolvimento de tecnologias criativas de cuidado às crianças com câncer e suas famílias, contribuindo para a melhoria da assistência a essa clientela.

Descritores: Criança; Humanização da assistência; Quimioterapia; Jogos e Brinquedos

RESUMEN

OBJETIVO: Conocer la opinión, de los acompañantes de niños de 2 a 12 años de edad sometidos a tratamiento de quimioterapia, sobre la Quimioteca Fundación Orsa.

MÉTODOS: Se trata de un estudio cuantitativo descriptivo. Se realizaron entrevistas semi-estructuradas con 54 acompañantes de niños en tratamiento de quimioterapia en ambulatorio.

RESULTADOS: En la opinión de esos acompañantes, el ambiente colorido lleno de juguetes y la oferta de actividades lúdicas, durante la administración de la quimioterapia, tiene influencia positiva en la calidad del tratamiento y en el estado de bienestar del niño. A pesar de la evaluación muy positiva sobre el servicio, fueron apuntados aspectos que necesitan ser mejorados, principalmente en relación a la atención.

CONCLUSIÓN: Los acompañantes percibían que el ambiente y el jugar colaboraban en el bienestar de los niños en tratamiento. La Quimioteca es una experiencia innovadora que puede servir de ejemplo para el desarrollo de tecnologías creativas de cuidado a niños con cáncer y a sus familias, contribuyendo para la mejoría de la asistencia a esa clientela.

Descriptores: Niño; Humanización de la atención; Quimioterapia; Juego e Implementos de juego

INTRODUÇÃO

O Ministério da Saúde implantou, no ano de 2004, a Política Nacional de Humanização (PNH) do Sistema Único de Saúde (SUS) como eixo transversal de consolidação dos princípios norteadores da atenção à saúde no país. Dentre seus pressupostos, ressalta-se que a humanização é uma prática que deve valorizar os diferentes sujeitos partícipes do sistema - usuários, trabalhadores e gestores - e as diversas dimensões que compõem as práticas em saúde - subjetivas, culturais, sociais e clínicas(1). Enfatiza, também, a necessidade de assegurar atenção integral à população por meio de estratégias que ampliem o exercício dos direitos dos indivíduos e grupos.

A PNH parte de um princípio que visa à reorganização dos processos de trabalho em saúde, por meio de transformações nas relações sociais entre trabalhadores e gestores na organização e condução de serviços, tanto quanto de transformações nas formas de produzir e prestar serviços à população. Outro ponto em questão é que objetiva provocar transformações na interação a ser estabelecida entre profissionais e usuários(2).

Uma prática humanizada representa um conjunto de iniciativas que possibilitem a prestação de cuidados de saúde que sejam capazes de conciliar a melhor tecnologia disponível com a promoção de acolhimento e respeito ético e cultural ao sujeito da assistência, bem como de espaços de trabalhos favoráveis ao bom exercício técnico e à satisfação dos trabalhadores e usuários(3). Nesse sentido, a implantação de projetos de humanização da assistência, tais como o da Atenção Humanizada ao Recém-Nascido de Baixo Peso - Método Canguru, Humanização do Pré-natal, Parto e Nascimento, Iniciativa Hospital Amigo da Criança, entre outros, tem em seu conjunto ações que procuram tornar a vivência de uma internação ou do cuidado ambulatorial menos dolorosa, estressante ou traumática, como o horário livre para visitas, a permanência de acompanhantes, a melhoria física dos espaços de atendimento e internação, a responsabilização e vínculo dos profissionais com os usuários e a oferta de atividades lúdicas, dentre elas a idealização de brinquedotecas(3-6).

No que concerne especificamente à atenção às crianças doentes em situação de internação hospitalar ou cuidado ambulatorial, uma das inúmeras formas de humanizar essa assistência é promover e propiciar a elas algo que toda criança gosta, faz e necessita fazer, que é brincar. A literatura demonstra, com grande ênfase, a importância do brincar para o desenvolvimento intelectual e social das crianças e para auxiliá-las a lidar com a doença, a hospitalização e a dor(7-10). Segundo autores(11), a criança, quando brinca no hospital, muda o ambiente, aproximando-o de sua realidade cotidiana, trazendo um efeito positivo sobre a hospitalização. Ela faz do brincar um recurso viável e adequado para enfrentar sua condição. Essas autoras reforçam, ainda, que "a atividade recreativa, livre e desinteressada, tem um efeito terapêutico, quando se considera terapêutico tudo que auxilie na promoção do bem-estar da criança". Indiretamente, o brincar exerce ainda impacto nos pais da criança doente, pois, ao presenciá-la brincando, eles podem se sentir menos angustiados e mais confiantes no tratamento, já que as atividades lúdicas representam um sinal de saúde, sobretudo na perspectiva dos pais(12).

Durante a administração de quimioterapia, a inclusão de brincadeiras e atividades lúdicas também é indicada como parte das práticas de cuidado à saúde das crianças doentes, visando ao relaxamento da criança e possibilitando obter algum controle sobre a situação a ser enfrentada, pois a criança com câncer e hospitalizada também quer e necessita brincar(11). Nessa perspectiva, elaborou-se uma nova proposta de tratamento quimioterápico ambulatorial para crianças e adolescentes, por meio de uma parceria entre a Universidade Federal de São Paulo, o Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer, empresas, fundações e comunidade para a implementação do Instituto de Oncologia Pediátrica no Município de São Paulo, cujo ambulatório de quimioterapia pediátrica é também chamado de Quimioteca Fundação Orsa.

Com o objetivo central de humanizar o tratamento quimioterápico, a Quimioteca Fundação Orsa foi reestruturada a partir de um projeto arquitetônico criativo, aliado ao uso de estratégias pedagógicas e lúdico-terapêuticas para auxiliar as crianças, os adolescentes e os seus familiares a enfrentar o desconforto desse tratamento.

Baseando-se no pressuposto de que a assistência à saúde mais humanizada requer a incorporação de novas práticas e a readequação das rotinas dos serviços de saúde, buscou-se explorar a reformulação realizada na Quimioteca Fundação Orsa na ótica dos sujeitos/atores do processo, aqui considerados os pais ou acompanhantes das crianças em tratamento quimioterápico. Assim, o objetivo desta pesquisa foi conhecer a opinião dos acompanhantes de crianças de 2 a 12 anos de idade em tratamento quimioterápico sobre a Quimioteca Fundação Orsa.

MÉTODOS

Foi realizado um estudo descritivo, do tipo quantitativo, conduzido na Quimioteca Fundação ORSA, no Instituto de Oncologia Pediátrica (IOP), a qual é uma instituição filantrópica, sem fins lucrativos, inaugurada em 1998. Está localizada no Município de São Paulo, Estado de São Paulo, em uma área construída de 4.200 m2, com nove andares e dois subsolos; presta assistência à criança e ao adolescente com câncer, do Município, em cidades vizinhas e outros Estados.

A Quimioteca propriamente dita ocupa uma área de 300 m2, no segundo andar do IOP. Possui 28 posições de quimioterapia, sala de procedimentos, coleta de exames, posto de enfermagem, cozinha, expurgo e quatro banheiros. Realiza, em média, 785 quimioterapias por mês. Seu espaço físico foi totalmente reformado, tornando o ambiente acolhedor, colorido, cheio de brinquedos, jogos, livros e cd-players.

Os jogos e atividades lúdicas são oferecidos no próprio local em que as crianças estão recebendo os medicamentos, respeitando-se seus interesses, possibilidades, limitações e disponibilidade. As atividades lúdicas são desenvolvidas por uma pedagoga, voluntários treinados e parceiros de outras ONGs que desenvolvem atividades planejadas, tais como oficina de palitos, contação de histórias, música, origami, bexiga, artes visuais, brincadeiras com palhaços, jogos, brinquedos e livros diversos. A experiência de implantação desta Quimioteca já foi descrita anteriormente(13).

Para selecionarmos os participantes, estabelecemos os seguintes critérios de inclusão: acompanhantes de crianças que estavam em tratamento quimioterápico no dia do estudo; acompanhantes presentes no IOP durante todo o dia e não apenas por meio período; acompanhantes com idade igual ou superior a 18 anos; acompanhantes responsáveis por crianças com idade superior a dois anos e em tratamento quimioterápico no IOP há mais de um mês, pelo fato de as mesmas interagirem mais com o ambiente ao seu redor e já estarem adaptadas à rotina da Quimioteca.

A coleta de dados foi realizada entre os dias 2 e 31 de janeiro de 2006, às terças e quintas-feiras, durante todo o dia. Foram convidados a participar do estudo todos os acompanhantes presentes nestes dias, dentro dos critérios estabelecidos. Ressalte-se que acompanhantes de crianças que estavam presentes apenas para colher exames e realizar outros procedimentos não foram convidados a participar do estudo. Não houve recusas.

Foi utilizado um questionário pré-testado e semi-estruturado para a realização das entrevistas com 54 acompanhantes. As perguntas fechadas versaram primeiramente sobre a caracterização sociodemográfica das crianças e seus acompanhantes e, posteriormente, sobre a opinião dos acompanhantes em relação à influência do ambiente físico e das atividades lúdicas na qualidade do tratamento, na diminuição do estresse da criança, no sentimento de rejeição da criança no tocante ao tratamento e no seu bem-estar. As respostas permitiam as seguintes alternativas: "nada", "pouco", "médio" ou "muito". No que diz respeito às questões abertas, os acompanhantes foram questionados sobre o que mudariam na Quimioteca em relação às atividades lúdicas ofertadas, ao ambiente físico e ao atendimento dos profissionais.

Enquanto as crianças recebiam a quimioterapia, os acompanhantes foram convidados a participar voluntariamente do estudo, após uma explicação dos objetivos da pesquisa e do conteúdo das questões. Caso aceitassem, procedia-se à leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e, após o esclarecimento das dúvidas, o questionário era lido para o responsável pela criança que concordara em fazer parte da pesquisa. Estima-se que cada entrevista tenha levado de 10 a 15 minutos para ser realizada.

As diretrizes para a realização de pesquisa envolvendo seres humanos foram integralmente respeitadas. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo em 2005 (Protocolo nº 1368), e foi obtida autorização do IOP para realização do estudo. Os dados foram digitados e analisados no software Epiinfo 6.0, e os resultados estão descritos por meio de números absolutos e proporções. As respostas obtidas por meio de questões abertas foram reunidas em categorias posteriormente elaboradas e quantificadas.

RESULTADOS

Os 54 acompanhantes de crianças em tratamento quimioterápico, tinham idade média de 31,4 anos (dp=7,5) e, eram predominantemente, do sexo feminino (92,6%). As mães foram a maioria (49), mas quatro pais e uma tia também foram entrevistados. A escolaridade foi bem diversificada, abrangendo desde aqueles com ensino fundamental incompleto (23) até outros que chegaram ao ensino superior (5). Praticamente metade era oriunda da própria cidade de São Paulo (53,7%) ou da Região Metropolitana de São Paulo (18,5%), ao passo que seis (11,1%) eram do interior do Estado de São Paulo e nove (16,7%), de outros Estados.

A média de idade das crianças em tratamento foi 6,2 anos (dp=2,9), sendo 36 (66,7%) do sexo masculino. Um pouco mais da metade das crianças (59,3%) freqüentava a Quimioteca há menos de um ano, e 15,1% há mais de dois anos.

A opinião dos acompanhantes sobre a influência das atividades lúdicas ofertadas para as crianças e do ambiente físico colorido e cheio de brinquedos revelou que esses aspectos têm influência positiva na qualidade do tratamento realizado e no estado de bem-estar da criança durante a quimioterapia, em maior ou menor medida, considerando o desconforto da criança e sua rejeição para realizar o tratamento, conforme mostra a Tabela 1.

A Tabela 1 ainda demonstra a alta proporção dos entrevistados que relataram achar muito importante ter um profissional específico para brincar com as crianças.

Por meio de uma pergunta aberta, os entrevistados foram estimulados a relatar de que formas o ambiente físico colorido e a oferta de atividades lúdicas facilitavam o tratamento quimioterápico das crianças. A Tabela 2 mostra que tais aspectos contribuem, principalmente, para o esquecimento da dor e da hospitalização, funcionando como incentivo ao tratamento e contribuindo para que o tempo passasse mais rápido. Somente uma mãe não havia observado nenhum tipo de contribuição positiva desses aspectos sobre o tratamento, provavelmente, segundo ela, porque sua filha ainda estava no início do tratamento.

Os entrevistados também foram estimulados a apontar aspectos que eles modificariam na Quimioteca, em relação às atividades lúdicas ofertadas (Tabela 3) e em relação ao ambiente físico (Tabela 4). A maior parte considerou que não haveria nada a ser modificado ou melhorado, mas foram apontadas a necessidade de aumentar o número e a freqüência de realização das atividades lúdicas bem como diminuir o barulho do local.

Entre as sugestões para melhoria do atendimento na Quimioteca, apesar de mais da metade dos acompanhantes referir que não havia nada a ser melhorado, foram apontadas algumas sugestões para que houvesse maior rapidez no atendimento, aumento do número de funcionários, melhora do relacionamento com os usuários e orientação dos acompanhantes de forma adequada, sem contradições. Também foi sugerido que houvesse o fornecimento de almoço, ao invés de lanches, para aqueles que permanecem o dia todo em tratamento, principalmente para aqueles que se locomovem de outros municípios.

Os dez acompanhantes que conheceram e freqüentaram o ambulatório de quimioterapia, antes da reforma atual, foram questionados sobre qual nota (de 1 a 10) dariam à Quimioteca, antes e após a reforma. O resultado foi nota média de 5,4, considerando o ambulatório antes da reforma, e nota 10,0, levando-se em conta esse espaço depois da reforma.

DISCUSSÃO

O brincar pode ajudar a criança a ampliar seus relacionamentos com a realidade exterior, estabelecendo uma ligação entre seu próprio mundo e o do hospital(4). Brincando, a criança transforma o ambiente no qual está inserida, enfrentando positivamente a situação vivenciada no momento. A literatura nacional e internacional(4,14-19) já demonstrou diversas experiências que utilizaram o brincar, durante as hospitalizações e tratamentos ambulatoriais, e obtiveram resultados que valorizaram o processo de desenvolvimento da criança e do seu bem-estar. Nesse sentido, o presente estudo colabora com achados para esse campo de pesquisa, valorizando o recurso da brincadeira em um novo espaço hospitalar, a Quimioteca.

A Quimioteca Fundação Orsa mescla ações recreativas, usualmente desenvolvidas em brinquedotecas e salas de espera, no espaço de tratamento quimioterápico da criança. Os resultados positivos obtidos com esta pesquisa demonstraram que essa experiência inovadora vem ao encontro das diretrizes da Política Nacional de Humanização do SUS(1) e, portanto, pode servir de exemplo para ser concretizada em outros hospitais.

As atividades lúdicas, o ambiente físico adequado ao mundo infantil e a disponibilidade de brinquedos na Quimioteca influenciaram positivamente na qualidade do tratamento prestado e no estado de bem-estar da criança com câncer, durante a quimioterapia, conforme a opinião dos acompanhantes. Segundo os entrevistados, tais aspectos colaboram, principalmente, para o esquecimento da dor e da hospitalização, para o incentivo ao tratamento e auxílio com relação ao tempo em que permanecem no referido local. Esses resultados são condizentes com a literatura(4,11,15, 20).

Embora a maioria destes achados tenham sido positivos, também foram observadas avaliações de cunho negativo. Houve relatos de acompanhantes que revelaram pouco ou nenhum efeito das atividades lúdicas sobre o desconforto da criança ou sobre sua rejeição para realizar a quimioterapia. Tais relatos talvez demonstrem que o brincar pode servir como um grande facilitador, durante o tratamento quimioterápico, mas o desconforto vivenciado pode ser intenso e necessitar de outros recursos para ser aliviado. Isso pode ocorrer, principalmente, para aquelas crianças que iniciaram o tratamento há pouco tempo, opinião também compartilhada por uma das mães entrevistadas.

Com o intuito de aperfeiçoar o trabalho já realizado, os entrevistados também foram estimulados a dar os seus pontos de vista com relação a mudanças que deveriam ser feitas na Quimioteca. A grande maioria referiu que não haveria nada a ser modificado ou melhorado, mas foram feitas considerações a respeito da necessidade de aumentar o número e a freqüência das atividades lúdicas bem como propiciar mais conforto para os próprios acompanhantes e diminuir o barulho do local. Esses aspectos mencionados demonstram que se deve ter atenção para que as atividades desenvolvidas cumpram seu papel de humanizar o ambiente e tratamento, fazendo com que o desgaste físico e emocional experimentado pelas crianças e acompanhantes possam ser amenizados e não interfiram em sua disposição, como também já observado anteriormente(4).

Muitos usuários sofrem grandes deslocamentos para chegar até o local e esperam muito tempo para iniciar e/ou terminar o tratamento. Assim, como revelado em algumas entrevistas, iniciativas como fornecer almoço, ao invés de lanches, para aqueles que permanecem o dia todo em tratamento, e poltronas mais confortáveis podem colaborar com a humanização da assistência prestada que não deve ter como foco apenas o indivíduo em tratamento, mas também aqueles que o acompanham, em geral os pais, visto que a doença e o longo tratamento são potenciais de desgaste para todo o núcleo familiar(21).

Também foram feitas considerações com relação à melhoria do atendimento dos profissionais, mostrando que são necessárias mudanças não apenas no âmbito da estrutura física, mas também nas relações e interações entre trabalhadores e usuários. Mesmo assim, a nota dada pelos acompanhantes que conheceram e freqüentaram o ambulatório de quimioterapia, antes e depois da reforma, mostra o quanto a transformação do ambiente e as atividades lúdicas foram importantes e impactantes para os acompanhantes.

O brincar nesse novo espaço, a Quimioteca, mostrou-se capaz de proporcionar às crianças doentes momentos de alegria e bem-estar, durante o tratamento, deixando não só elas, como também seus acompanhantes, mais animados e incentivados a continuar a luta contra o câncer. Por meio do brincar, é possível transformar o contexto que rodeia a criança, oferecendo às mesmas uma oportunidade de desenvolvimento integral. Portanto, iniciativas como essa devem ser cada vez mais estruturadas e implementadas, nos diversos espaços da hospitalização. Acrescenta-se, ainda, que a produção de conhecimento acerca do papel do brincar no cotidiano de crianças em tratamento ambulatorial é essencial, pois seu fruto pode gerar subsídios científicos para incentivar aqueles diretamente envolvidos com essas crianças a exercitarem esse comportamento e a proporcionar um ambiente no qual o brincar ocorra de forma mais enriquecedora(22).

Na Quimioteca, as atividades lúdicas e o ambiente colorido e bonito fazem parte do cotidiano das crianças e, além disso, mostram que é possível conjugar o tratamento quimioterápico às brincadeiras e demais atividades típicas da infância.

CONCLUSÃO

A experiência positiva e inovadora da Quimioteca Fundação Orsa, em que crianças com câncer são estimuladas a brincar enquanto realizam seu tratamento quimioterápico ambulatorial, pode servir de exemplo e incentivo para a construção de novas estratégias criativas no cuidado de crianças com câncer e de seus familiares e acompanhantes. Além disso, proporcionar a esse grupo um espaço promotor de bem estar, e a outras crianças que por ventura estejam hospitalizadas e possam também usufruir da atividade do brincar, vem ao encontro de uma abordagem integral no cuidado de crianças, com ênfase na humanização da assistência.

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  • Autor Correspondente:
    Ana Luiza Vilela Borges
    Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 - Cerqueira César
    São Paulo (SP), Brasil - CEP: 05401-001
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    Estudo realizado na Quimioteca Fundação Orsa, no Instituto de Oncologia Pediátrica - IOP - São Paulo (SP), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Maio 2010
    • Data do Fascículo
      Abr 2010
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