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Típico da ação do profissional de enfermagem quanto ao cuidado familial da criança hospitalizada

Característica de la acción del profesional de enfermería en lo que se refiere a los cuidados prestados por familiares del niño hospitalizado

Characteristics of actions of professionals nurses regarding the care provided by family members of hospitalized children

Resumos

OBJETIVOS: Analisar a dinâmica do cuidado nas unidades de internação pediátricas na perspectiva dos profissionais de enfermagem e apreender o típico da ação do profissional de enfermagem quanto ao cuidado familial da criança hospitalizada. MÉTODOS: O estudo descritivo qualitativo, foi baseado na Fenomenologia Sociológica de Alfred Schutz. Os sujeitos foram 15 profissionais de enfermagem das unidades de internação de um hospital do Município do Rio de Janeiro - Brasil. RESULTADOS: A entrevista fenomenológica possibilitou apreender que o profissional tem como "motivo para": fazer e dar o melhor de si enfrentando a dificuldade do relacionamento com a família, cuidar com diálogo e brincadeira para contribuir com a recuperação da criança e treinar a família na perspectiva profissional. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Concluímos que o cuidado familial da criança hospitalizada ainda é uma realidade distante da Enfermagem Pediátrica.

Enfermagem pediátrica; Enfermagem familiar; Criança hospitalizada; Pesquisa qualitativa


OBJETIVOS: Analizar la dinámica del cuidado en las unidades de internación pediátricas bajo la perspectiva de los profesionales de enfermería y aprender lo típico de la acción del profesional de enfermería en lo que se refiere al cuidado prestado por el familiar del niño hospitalizado. MÉTODOS: Se trata de un estudio descriptivo cualitativo, basado en la Fenomenología Sociológica de Alfred Schutz. Los sujetos fueron 15 profesionales de enfermería de las unidades de internación de un hospital del Municipio de Rio de Janeiro - Brasil. RESULTADOS: La entrevista fenomenológica posibilitó aprender que el profesional tiene como "motivo para": hacer y dar lo mejor de sí enfrentando la dificultad de la relación con la familia, cuidar con diálogo y juegos para contribuir con la recuperación del niño y entrenar a la familia en la perspectiva profesional. CONSIDERACIONES FINALES: Concluimos que el cuidado prestado por familiares del niño hospitalizado todavía es una realidad distante de la Enfermería Pediátrica.

Enfermería pediátrica; Enfermería de la familia; Niño hospitalizado; Investigación cualitativa


OBJECTIVES: To analyze the dynamics of care in pediatric inpatient units under the perspective of nurses and to learn the typical action of nurses regarding the care provided by the family of the hospitalized child. METHODS: Is a qualitative descriptive study, based on the phenomenological sociology of Alfred Schutz. The subjects were 15 nurses from inpatient units of a hospital in the municipality of Rio de Janeiro - Brazil. RESULTS: The phenomenological interview allowed to know that the professional has as a "reason for": to do and give their best to face the difficulty of the relationship with the family, to care through verbal communication and with games to help the child's recovery and to train the family in the professional perspective. FINAL CONSIDERATIONS: It was conclude that the care provided by family members of hospitalized children is still a distant reality of Pediatric Nursing.

Pediatric nursing; Family nursing; Hospitalized child; Qualitative research


ARTIGO ORIGINAL

Típico da ação do profissional de enfermagem quanto ao cuidado familial da criança hospitalizada* * Trabalho realizado em hospital público especializado no atendimento infantil no Município do Rio de Janeiro - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.

Characteristics of actions of professionals nurses regarding the care provided by family members of hospitalized children

Característica de la acción del profesional de enfermería en lo que se refiere a los cuidados prestados por familiares del niño hospitalizado

Cassiana Silva RossiI; Benedita Maria Rêgo Deusdará RodriguesII

IMestre em Enfermagem. Enfermeira do Hospital Universitário Pedro Ernesto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

IIDoutora em Enfermagem. Professora Titular do Programa de Pós Graduação da Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ - Rio de Janeiro (RJ), Brasil

Autor Correspondente Autor Correspondente: Cassiana Silva Rossi R. Genésio de Barros, 147 - Apto 103 Rio de Janeiro - RJ - Brasil - Cep: 20771-500 E-mail: cassiana.rossi@gmail.com

RESUMO

OBJETIVOS: Analisar a dinâmica do cuidado nas unidades de internação pediátricas na perspectiva dos profissionais de enfermagem e apreender o típico da ação do profissional de enfermagem quanto ao cuidado familial da criança hospitalizada.

MÉTODOS: O estudo descritivo qualitativo, foi baseado na Fenomenologia Sociológica de Alfred Schutz. Os sujeitos foram 15 profissionais de enfermagem das unidades de internação de um hospital do Município do Rio de Janeiro - Brasil.

RESULTADOS: A entrevista fenomenológica possibilitou apreender que o profissional tem como "motivo para": fazer e dar o melhor de si enfrentando a dificuldade do relacionamento com a família, cuidar com diálogo e brincadeira para contribuir com a recuperação da criança e treinar a família na perspectiva profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: Concluímos que o cuidado familial da criança hospitalizada ainda é uma realidade distante da Enfermagem Pediátrica.

Descritores: Enfermagem pediátrica; Enfermagem familiar; Criança hospitalizada; Pesquisa qualitativa

ABSTRACT

OBJECTIVES: To analyze the dynamics of care in pediatric inpatient units under the perspective of nurses and to learn the typical action of nurses regarding the care provided by the family of the hospitalized child.

METHODS: Is a qualitative descriptive study, based on the phenomenological sociology of Alfred Schutz. The subjects were 15 nurses from inpatient units of a hospital in the municipality of Rio de Janeiro - Brazil.

RESULTS: The phenomenological interview allowed to know that the professional has as a "reason for": to do and give their best to face the difficulty of the relationship with the family, to care through verbal communication and with games to help the child's recovery and to train the family in the professional perspective.

FINAL CONSIDERATIONS: It was conclude that the care provided by family members of hospitalized children is still a distant reality of Pediatric Nursing.

Keywords: Pediatric nursing; Family nursing; Hospitalized child; Qualitative research

RESUMEN

OBJETIVOS: Analizar la dinámica del cuidado en las unidades de internación pediátricas bajo la perspectiva de los profesionales de enfermería y aprender lo típico de la acción del profesional de enfermería en lo que se refiere al cuidado prestado por el familiar del niño hospitalizado.

MÉTODOS: Se trata de un estudio descriptivo cualitativo, basado en la Fenomenología Sociológica de Alfred Schutz. Los sujetos fueron 15 profesionales de enfermería de las unidades de internación de un hospital del Municipio de Rio de Janeiro - Brasil.

RESULTADOS: La entrevista fenomenológica posibilitó aprender que el profesional tiene como "motivo para": hacer y dar lo mejor de sí enfrentando la dificultad de la relación con la familia, cuidar con diálogo y juegos para contribuir con la recuperación del niño y entrenar a la familia en la perspectiva profesional.

CONSIDERACIONES FINALES: Concluimos que el cuidado prestado por familiares del niño hospitalizado todavía es una realidad distante de la Enfermería Pediátrica.

Descriptores: Enfermería pediátrica; Enfermería de la familia; Niño hospitalizado; Investigación cualitativa

INTRODUÇÃO

A assistência à criança hospitalizada transformou-se ao longo das décadas e, paralelamente, pelos avanços na prática médica ocorreram modificações de significados e valores sociais em relação à mesma. Esta assistência não pode ficar restrita apenas a uma dimensão biológica e/ou técnica, pois está vinculada a aspectos de ordem histórica, política, econômica e social(1). Cabe ressaltar que, nos últimos dez anos, diversos autores vêm se destacando no cenário brasileiro com suas publicações em enfermagem abordando, sobretudo, as questões da criança hospitalizada, da indissolubilidade do binômio mãe-filho e das relações entre o profissional de enfermagem e a família(2-7).

Com base nesses fatos e em nossa prática profissional, como enfermeiras pediatras, percebemos que a relação familiar/equipe de enfermagem é conflituosa. Para a equipe, não existe uma clareza quanto ao papel e participação desse familiar no cuidado prestado à criança hospitalizada, pois, em alguns momentos, acaba realizando atribuições de enfermagem. Nossas inquietações diante de tais questões fizeram com que as mesmas se tornassem o foco principal da dissertação de mestrado, e delimitássemos como objeto de estudo "o significado do cuidado familial da criança hospitalizada para o profissional de enfermagem".

Assim sendo, o presente artigo é parte do relatório da pesquisa que teve como objetivos analisar a dinâmica do cuidado nas unidades de internação pediátricas, na perspectiva dos profissionais de enfermagem e apreender o típico da ação do profissional de enfermagem quanto ao cuidado familial da criança hospitalizada.

Consideramos o cuidado familial, como aquele que acontece no mundo da vida, por meio das relações sociais, contribuindo para a formação do sujeito à medida que proporciona a apreensão de experiências e conhecimentos de seus predecessores, conforme ele, sujeito, tem suas próprias vivências, levando a uma significação muito particular dos fenômenos. Neste sentido, o mundo da vida nos coloca em relação uns com os outros, por meio de nossas ações nele exercidas. Portanto, podemos dizer que as relações entre profissionais de enfermagem e familiar da criança hospitalizada resultam em ações que são carregadas de significações. Cabe ressaltar que as significações expressam as vivências pessoais de cada sujeito envolvido(8). Desta forma, a Fenomenologia Sociológica de Alfred Schutz apresentou-se como o caminho adequado para a realização do estudo.

Considerando o cuidado familial, como um conceito amplo, complexo e cuja importância de sua inclusão na atenção à saúde da criança ainda é pouco explorada, acreditamos que a compreensão do significado desse cuidado pelo profissional de enfermagem seja fundamental para a reorientação da prática direcionada à criança hospitalizada.

Fundamentação teórica

No início do século XIX, apareceram os primeiros hospitais especiais para crianças, onde os pais tinham livre acesso. Mas, mediante o advento das infecções cruzadas e da dificuldade em contê-las, acreditava-se que o sistema de alojamento conjunto pediátrico favorecia o aparecimento dessas infecções e medidas rígidas de esterilização e isolamento foram adotadas para impedir a propagação das mesmas(9).

A manutenção das crianças isoladas de seus familiares com a finalidade de evitar a propagação das infecções durou até a década de 1930. Até então, pouco se considerava a respeito da importância do crescimento e desenvolvimento infantil, bem como suas reações psicológicas e o impacto causado pela doença e hospitalização sobre a criança e seus familiares. Mas, os avanços científicos e tecnológicos, como o uso crescente dos antibióticos, gerando um maior controle dos índices de infecção, e a utilização de conceitos advindos da Fisiologia e Patologia contribuíram, para que este modelo de assistir fosse modificado. A partir daí, um marco importante foi a transformação do conceito de criança que passa de uma visão meramente biológica para uma visão ampla, levando-se em consideração seus aspectos de crescimento e desenvolvimento, bem como suas necessidades emocionais, sociais, psicológicas e cognitivas(10).

A criança elabora suas relações consigo mesma, com os outros e com o mundo que a cerca no transcorrer de suas fases evolutivas. A capacidade para lidar com a hospitalização, suas implicações e suas consequências está intimamente ligada à fase evolutiva em que ela se encontra(11). Isto quer dizer que o modo como a situação de doença é elaborada e integrada à vida da criança influenciará na estruturação de sua personalidade(12). Como forma de minimizar esta ansiedade, a presença do familiar deve ser encorajada durante o período de hospitalização. De todos os fatores que influenciam a resposta da criança à hospitalização, a privação total ou parcial da família é que exerce mais peso nesse processo. A importância da presença da mãe, como forma de promover conforto, tanto físico como psicológico, é destacada, visto que ser esse conforto é extremamente benéfico para ambas(5).

A criança não é um ser isolado, faz parte de uma estrutura de interdependência que é a família(13). Quando uma criança adoece, toda a família fica envolvida no processo. Não importa o caráter da doença (aguda ou crônica), nem o tipo de tratamento (hospitalar ou domiciliar), a criança e a família serão impactadas por ela. Sempre existirá uma necessidade de ajustes e de adaptações na dinâmica do modo de ser dessa família, visando ao novo equilíbrio familiar(14). A capacidade da família em lidar de uma maneira melhor ou pior com este evento dependerá de suas percepções da situação, bem como de suas habilidades para lutar contra as dificuldades. O modo de enfrentamento da hospitalização de um filho é singular para cada núcleo familiar e, muitas vezes, os pais poderão se encontrar tão ou mais abalados que a criança(3).

MÉTODOS

A utilização da fenomenologia permite, por meio da descrição do fenômeno por quem de fato o vivenciou, alcançar uma compreensão do mesmo, tendo em vista que, nos estudos fenomenológicos, o que se busca é o desvelar dos significados atribuídos pelo sujeito à sua experiência de vida(15-16).

A conduta humana não pode ser estabelecida por uma lei causal; o que ocorre são "possibilidades típicas", nos quais determinados fatos levarão a determinadas ações sociais(17). O foco principal da Fenomenologia Social não é estudar o comportamento individual de cada sujeito, mas o que importa é apreender os pontos em comum, ou seja, aquilo que se constitui, como uma característica típica de um grupo que vivencia determinada situação(18).

Para Schutz, a compreensão, o significado da ação e o conceito de mundo da vida são as bases da Sociologia Compreensiva. Estas bases permitem captar o sentido que o homem dá a seu agir e, pela da Fenomenologia, torna-se possível chegar a uma eidética sociológica(19).

Além disto, Schutz baseou-se no conceito de mundo cotidiano (ou mundo da vida ou mundo do sentido comum), para traçar a estrutura e a significação desse mundo onde cada um desenvolve a sua existência. Estas expressões são para designar o mundo intersubjetivo experienciado pelo homem, ou seja, a região da ação social, na qual os homens entram em relação um com o outro. Esse mundo cotidiano é o cenário das relações sociais, e é definido como um mundo intersubjetivo, vivenciado e interpretado por outros (aos quais Schutz chama de predecessores) e que agora se dá à nossa experiência e interpretação. Esta interpretação depende da totalidade das experiências vividas no curso da existência concreta de cada um(17,19-20).

Considerando que as ações sociais são permeadas pela subjetividade do mundo e pela compreensão da ação do outro por intermédio intersubjetividade, estas relações podem se dar de diferentes maneiras. Uma delas é na relação face a face, quando compartilhamos um tempo e um espaço comum como sujeitos e um tem a consciência do outro como tal. É a orientação para o tu, o modo puro de eu estar consciente de outro ser humano, como uma pessoa. Portanto, esta relação acontece quando há comunidade de espaço e de tempo, pois é uma experiência direta entre pessoas (17,21).

A ação significa a conduta baseada em um projeto preconcebido, onde existe uma intenção ao realizá-lo. Isto quer dizer que as ações empreendidas são dotadas de intencionalidade, e estão relacionadas a um projeto no qual o sujeito encontra significado, ou seja, as ações são comportamentos motivados. Toda ação social não está desvinculada de uma história, de seus motivos. Desta forma, as motivações que podem indicar para o futuro, são definidas como os "motivos para" e as motivações que indicam para o passado, como os "motivos porque"(17).

Não se pode compreender o agir do outro sem conhecer seu motivo - para ou o motivo - porque, ou seja, o significado de uma ação acontece quando a própria pessoa interpreta seus motivos(20). A "intencionalidade" (ou "motivo a fim de", ou "motivo para") é o motivo em função do qual a ação ocorreu. Ao ponto de vista do ator, o "motivo porque" diz respeito às experiências passadas, que determinaram que o sujeito agisse de tal forma.

Aquilo que é vivenciado como novo já é conhecido, pois lembra coisas parecidas ou iguais anteriormente percebidas. Mas, o que já foi captado uma vez em sua tipicidade, traz consigo um horizonte de experiências possíveis, com as referências correspondentes à familiaridade(17).

As tipificações emergem das experiências cotidianas que surgem de uma rede de tipificações - tipificações de indivíduos humanos, de seus padrões de linhas de ação, de seus motivos e objetivos ou dos produtos sócioculturais que se originam de suas ações(17). Isto quer dizer que a identificação da estrutura comum dos significados conferidos à determinada ação ou ato pode ocorrer quando estes são reduzidos a seus motivos típicos(20). Assim sendo, por meio da identificação dos pontos em comum, pode-se chegar ao típico do vivido ou ao típico da ação.

Trajetória do estudo

O cenário do estudo foi um hospital especializado no atendimento infantil, localizado na cidade do Rio de Janeiro e pertencente à rede municipal de saúde. A instituição hospitalar cumpre a determinação do Estatuto da Criança e do Adolescente, no que diz respeito à permanência do familiar durante a internação da criança. Cabe ressaltar que esta instituição foi pioneira, desde a década de 1960, no sentido de permitir a permanência do familiar, durante a hospitalização da criança(1).

Os sujeitos foram 15 profissionais de enfermagem de nível médio e universitário que atuavam nas unidades de internação pediátricas da referida instituição. A escolha ocorreu, conforme o critério de espontaneidade, ou seja, todos os profissionais de enfermagem, sem distinção de categoria, que demonstraram interesse e desejo de participar, tornaram-se sujeitos da pesquisa.

Para atender à Resolução nº196/96 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde que estabelece as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas envolvendo Seres Humanos(22), o projeto foi submetido à apreciação da Direção Geral e de Enfermagem e ao Comitê de Ética e Pesquisa ao qual o hospital escolhido está vinculado, sendo aprovado em 04/2007 com o Protocolo CEP/SMS-RJ n.º 22/07. Aos sujeitos do estudo, foi garantido o anonimato e sua participação deu-se por livre e espontânea vontade, mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Utilizamos a entrevista fenomenológica, a fim de obter a descrição do fenômeno que se constituiu no objeto de estudo. Neste sentido, a entrevista é a técnica mais apropriada ao método fenomenológico porque o sujeito, ao reportar-se sobre algo, nos traz à tona sua história de vida, colocando seu passado e seu futuro no presente, aqui e agora(23). Este acontecimento conduz para a "intencionalidade" e para o "motivo porque", o que permitirá chegar à tipificação.

A entrevista fenomenológica não é um procedimento mecânico, e sim, um encontro social, no qual deve acontecer uma relação pesquisador-pesquisado caracterizada pela empatia, intuição e imaginação(16,23).

Assim sendo, para apreender o típico da ação do profissional de enfermagem quanto ao cuidado familial da criança hospitalizada, utilizamos a seguinte questão orientadora da entrevista "O que você tem em vista no cuidado diário durante a internação da criança?".

As entrevistas foram gravadas e transcritas a fim de serem analisadas. Nesse momento, a atenção do pesquisador deve estar focada na apreensão das similaridades das experiências vividas, identificadas nas falas dos sujeitos, das quais emergiram as categorias concretas do vivido que se constituíram no típico(23).

As etapas seguidas foram as descritas por estudiosos da Fenomenologia Sociológica(20,23-26). Portanto, após a transcrição dos depoimentos descritivos das ações vividas, realizamos uma leitura atentiva do material não estruturado com a finalidade de captar as convergências dos aspectos comuns nas falas. A partir de então, foi possível iniciar a constituição das categorias concretas do vivido para compreender, como os sujeitos da ação social vivenciam o fenômeno pesquisado. Quando as falas atingiram a saturação, ou seja, quando houve repetitividade, as entrevistas foram encerradas.

RESULTADOS

As falas possibilitaram identificar três categorias que emergiram do concreto vivido dos profissionais de enfermagem que cuidam de crianças hospitalizadas permitindo, assim, apreender que o profissional, em seu ato de cuidar inserindo o familiar nesse processo tem como "intencionalidade":

- Fazer e dar o melhor enfrentando a dificuldade do relacionamento com a família

Nesta categoria, as falas evidenciam a vontade das profissionais em fazer o melhor e a dar o melhor de si para ajudar a criança a se recuperar o mais rápido possível. Este desejo vai para além do cuidado técnico, visando ao bem-estar físico e emocional por meio de um cuidado pautado na promoção do conforto. As entrevistadas expressam sua vontade de "passar segurança" e estabelecer uma relação de confiança com a criança, a fim de que a mesma não tenha receios da equipe. O cuidado, como ato intencional, tem por finalidade o restabelecimento da saúde e a alta da criança para sua residência, conforme visto abaixo.

... fazer o melhor, dar o melhor de si pra ela. Como eu ouvi outro dia aqui da chefe da clínica, entendeu? 'Vamos ver o que a gente pode fazer de melhor pra essa criança enquanto ela está aqui'. [...] Ter caridade, se colocar no lugar daquela mãe, daquela família, entendeu? Pra poder dar o melhor de si pra aquela criança. O cuidado, a técnica, isso é obrigação de todos nós, enfermeiros. Isso a gente tem que ter mesmo. Eu acho que a visão mais ampla é muito necessária, é o que está faltando. (Paciência)

... no meu pensamento, é procurar dar melhor assistência pra essa criança, né? É passar segurança pra ela, procurar métodos que ela não venha a sentir receio da enfermagem. (Carinho e Segurança)

- Cuidar com diálogo e brincadeira para contribuir com a recuperação da criança

Esta categoria demonstra que as entrevistadas planejam suas ações de cuidado baseadas na individualidade e nas necessidades de cada criança. Elas referem que conhecer a criança, sobretudo, e sua família, ajuda-as a nortear essas ações. As profissionais utilizam a brincadeira, como forma de suavizar a aproximação dentro de um ambiente que é hostil à criança. As mesmas utilizam o diálogo, a fim de esclarecer os cuidados técnicos realizados com o intuito de amenizar o trauma causado pela hospitalização. A assistência está pautada em dar tanto o cuidado físico como o emocional, sempre visando à recuperação da criança, de acordo com as falas:

... eu, pelo meno,s procuro chegar sempre brincando, conversando, dando uma atenção... Um carinho especial, pra evitar que essa criança [...] não, deixe eu me aproximar dela, pra estar fazendo os cuidados necessários nela. Então, [...] eu acho que você procura a melhor maneira de estar colaborando com a assistência dessa criança, de estar ajudando essa criança a se recuperar. (Carinho)

... dar o cuidado, a parte técnica propriamente dita; punção venosa; todos os cuidados propriamente ditos tecnicamente. Mas também, principalmente, a acolhida, a questão da humanização e assistir a criança. Lembrar que ela está fora do seu meio natural de vivência e que isso traz, a gente sabe que traz um trauma, traz uma série de modificações e não esquecendo que a família tem que fazer parte desse contexto todo. [...] Dar carinho, respeitar como ser humano, tanto a criança como o acompanhante. Acho que isso é muito importante. (Acolher)

- Envolver a família na perspectiva profissional

Nesta categoria, fica claro que a inserção da família se dá visando à continuidade do tratamento no domicílio. Quando a criança é dependente de tecnologia, as profissionais preocupam-se em ajudar à família a lidar com essa situação, ensinando a melhor forma de fazer, por meio de uma linguagem acessível. As entrevistadas pretendem obter uma interação, na qual o familiar é fonte de informações relevantes. Elas percebem essa interação, como algo que irá contribuir para a recuperação da criança. A inclusão do familiar visa a sua colaboração no cuidado, sob a forma de apoio psicológico, a fim de melhorar a situação da criança, segundo as falas abaixo:

... a criança já chega aqui com a doença instalada, né?... E o que eu quero, é a recuperação... Os cuidados para que ela saia recuperada, e a orientação à família também, para a mãe ou o responsável. [...] Temos também casos de doentes crônicos, que nós precisamos treinar certos procedimentos. É até o que eu ia fazer agora... Eu vou treinar uma mãe ali a aspirar, é um neuropata. E vou ensinar outra a colocar dieta na gastrostomia, e... Eu acho que é isso. Aqui é a parte terciária, então, é recuperação. E o doente crônico é a orientação... Para que ele possa ir para casa, receba todos os cuidados e que volte o menos possível. (Observação)

... explicar tudo o que a gente está fazendo e falar: "dessa forma, vai ser melhor". Se for um cuidado que ela tenha que dar continuidade em casa, principalmente. Uma gastro... Eu tenho muita criança com cateterismo intermitente, que você tem que estar ensinado pra poder prevenir infecção. Enfim... [...] cuidar fazendo que ela participe, pelo menos olhando, explicando o porquê daquilo, numa linguagem que ela vai entender, bem simples. Enfim, eu tento orientar muito, pra tentar fazer com que aquela criança não retorne por falta de orientação e de cuidado. (Acompanhante)

DISCUSSÃO

A eficácia do processo de cuidar como meio de promoção do bem-estar está ligada à identificação e ao atendimento das necessidades de cuidados de saúde do ser humano, e a provisão de cuidados diz respeito a qualquer pessoa que ajuda a outra com o propósito de continuar a vida(27). Neste sentido, a equipe de enfermagem, ao fazer e dar o melhor de si pretende contribuir para o restabelecimento da criança, ajudando a mesma a voltar para casa com as melhores condições de saúde possíveis.

O rompimento brusco das atividades do dia a dia ocasionado pela doença e hospitalização pode constituir-se em uma experiência dolorosa à criança. Esta experiência adversa pode gerar reações como raiva, depressão, medo e insegurança. Portanto, as atitudes e ações dos profissionais podem suavizar estas reações e facilitar a adaptação à nova situação, bem como diminuir riscos de traumas, ajudando no processo de recuperação(27). Assim sendo, as entrevistadas, ao cuidarem buscando estabelecer uma relação de confiança, pretendem amenizar o trauma da hospitalização, contribuindo com a recuperação da criança.

O profissional de enfermagem deve conhecer como esta família se cuida, quais são suas possibilidades, quais seus limites de atuação e que forças ela é capaz de mobilizar para resolver problemas de saúde(6:32). Para que ocorra a integração família/equipe, a mesma deve discutir com a família a participação desta no cuidado e fornecer-lhe informação, aconselhamento e suporte para realizá-lo. Assim sendo, não basta apenas informar ou treinar o familiar, mas é necessário dar-lhe condições e suporte teórico e emocional para cuidar de sua criança em casa.

Nos últimos tempos, os avanços tecnológicos ocorridos geraram um aumento do número de crianças com doenças crônicas que são cuidadas no domicílio. Para se adaptarem a esta nova realidade, a família teve de se tornar suficientemente esclarecida ao ponto de saber reconhecer sintomas e ajustar-se ao novo estilo de vida(7). Para tanto, os pais das crianças com doenças crônicas necessitam de mútua confiança, e eles esperam que seus conhecimentos sejam validados, e sua participação no cuidado com a criança seja aceita(7).

O estudo possibilitou, a partir da captação do "motivo para" do ato intencional de cuidar inserindo a família nesse contexto, apreender o típico da ação do profissional de enfermagem quanto ao cuidado familial da criança hospitalizada. Esta ação apresenta-se no sentido de fazer e dar o melhor enfrentando a dificuldade do relacionamento com a família, por meio do cuidar com diálogo e brincadeira para contribuir com a recuperação da criança e do envolver a família na perspectiva profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ação social que acontece no mundo da vida entre profissionais de enfermagem que cuidam e familiar da criança hospitalizada está permeada de significações atribuídas pelos atores destas relações. A apreensão do significado intencional da ação de cuidar possibilitou identificar os fatores que motivam o profissional de enfermagem nesta relação. Esses motivos compreendem fazer e dar o melhor de si para o sujeito de seu cuidado, ou seja, a criança, com o intuito de contribuir para o pronto restabelecimento de sua saúde, além de cuidar com diálogo e brincadeira e envolver e interagir com a família.

Este fazer e dar o melhor visam ao bem-estar físico e emocional da criança, por meio da promoção do conforto e do estabelecimento de uma relação de confiança entre a criança e a equipe. Ao pensar dessa forma, a equipe de enfermagem mostra que compreende que crianças possuem necessidades físicas e emocionais singulares e que o atendimento de tais necessidades certamente contribui, na medida do possível, para uma melhor recuperação de sua saúde.

Durante seu cuidar, a equipe espera estabelecer com a criança uma relação de confiança e verdade, fazendo com que a mesma não tema sua aproximação. Esta aproximação tende a acontecer de forma mais amena, por meio do diálogo e da brincadeira. Ao brincar e dar carinho, a equipe pretende suavizar a hostilidade do ambiente hospitalar. As profissionais demonstraram acreditar no diálogo como forma de estabelecer uma relação na qual a criança sinta-se esclarecida a respeito dos procedimentos que serão realizados com ela, minimizando, assim, o medo do desconhecido.

No que diz respeito à inserção da família, ficou claro que a equipe busca envolver e interagir com o familiar, com a finalidade de contribuir para o bem-estar da criança e continuidade do tratamento no domicílio. Agindo desta forma, as profissionais esperam diminuir as reinternações decorrentes dos cuidados prestados inadequadamente em casa. Suas falas também reforçam a ideia de que veem no familiar uma fonte importante de informações a respeito do estado de saúde da criança, tanto no ambiente domiciliar como no hospitalar.

Desta forma, salientamos que o cuidado deve acontecer fundamentado pelo diálogo, na relação face a face entre profissionais e família. Não deve ser verticalizado, e sim, compartilhado e pautado no respeito mútuo, tendo em vista a melhor maneira de cuidar.

A presença do familiar deve ser vista com naturalidade e não como um elemento ainda estranho dentro do ambiente hospitalar. Pais, irmãos, avós, tios, enfim, a família, não deve mais ser vista como "visitante", e sim, como integrante do processo de cuidar. Todos fazem parte do mundo da vida daquela criança e aos profissionais cabe a sensibilidade de compreendê-los desta forma. Assim, os profissionais de enfermagem devem agir como facilitadores, identificando deficiências, compartilhando saberes, viabilizando este cuidado da família sem, porém, delegar funções.

Artigo recebido em 08/11/2009 e aprovado em 04/06/2010

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  • Autor Correspondente:
    Cassiana Silva Rossi
    R. Genésio de Barros, 147 - Apto 103
    Rio de Janeiro - RJ - Brasil - Cep: 20771-500
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    Trabalho realizado em hospital público especializado no atendimento infantil no Município do Rio de Janeiro - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Recebido
      08 Nov 2009
    • Aceito
      04 Jun 2010
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