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Dimensões organizacionais de um Centro de Atenção Psicossocial para dependentes químicos

Dimensiones organizativas de un Centro de Atención Psicosocial para dependientes químicos

Resumos

OBJETIVO: Compreender a visão de profissionais sobre as dimensões estruturais e contextuais de um Centro de Atenção Psicossocial para dependentes de substâncias psicoativas do Estado de São Paulo. MÉTODOS: Estudo qualitativo que utilizou a entrevista semiestruturada com nove profissionais e dois gestores para obter os dados que foram analisados por meio da análise temática. RESULTADOS: A estrutura interna do serviço foi influenciada pelo ambiente externo e fundamenta-se no cuidado individualizado. Como alternativa de enfrentamento dos desafios, ressalta-se o trabalho em equipe e sobrecarga como problema resultante da dinâmica de trabalho. CONCLUSÃO: Há necessidade da contratação de profissionais para melhorar o funcionamento interno, assegurar a qualidade no atendimento e integrar a organização com os atores externos.

Centros de tratamento de abuso de substâncias; organização e administração; Transtornos relacionados ao uso de substâncias; Humanização da assistência


OBJETIVO: Comprender la visión de profesionales sobre las dimensiones estructurales y contextuales de un Centro de Atención Psicosocial para dependientes de sustancias psicoactivas del Estado de Sao Paulo. MÉTODOS: Estudio cualitativo en el que se usó la entrevista semiestructurada con nueve profesionales y dos gestores para obtener los datos que fueron analizados por medio del análisis temático. RESULTADOS: La estructura interna del servicio fue influenciada por el ambiente externo y se fundamenta en cuidado individualizado. Como alternativa de enfrentamiento de los desafios, se resalta el trabajo en equipo y sobrecarga como problema resultante de la dinámica de trabajo. CONCLUSIÓN: Hay necesidad de la contratación de profesionales para mejorar el funcionamiento interno, asegurar la calidad en la atención e integrar la organización con los actores externos.

Centros de tratamiento de abuso de sustancias; organización & administración; Trastornos relacionados con substancias; Humanización de la atención


OBJECTIVE: To understand the vision of professionals about the structural and contextual dimensions of a Psychosocial Care Center for those dependent on psychoactive substances in the state of São Paulo. METHODS: This qualitative study used semistructured interviews with nine professionals and two managers to obtain the data that were analyzed using thematic analysis. RESULTS: The internal structure of the service was influenced by the external environment and is based on individualized care. As an alternative to facing the challenges, it emphasized teamwork and overload as a problem resulting from the dynamics of work. CONCLUSION: There is a need to contract professionals to improve internal operations, ensure quality service and integrate the organization with external actors.

Substance abuse treatment centers; organization & administration; Substance-related disorders; Humanization of assistance


ARTIGO ORIGINAL

Dimensões organizacionais de um Centro de Atenção Psicossocial para dependentes químicos* * Trabalho realizado em um Centro de Atenção Psicossocial para dependentes químicos de uma cidade do interior de São Paulo.

Dimensiones organizativas de un Centro de Atención Psicosocial para dependientes químicos

Carla Aparecida Arena VenturaI; Angélica Silva AraújoII; Marciana Fernandes MollIII

IAdvogada. Professora da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil

IIAcadêmica em Terapia Ocupacional pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. Bolsista do Programa Ensinar com Pesquisa da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil

IIIPós-graduanda ( Doutorado) em Enfermagem pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo – USP – Ribeirão Preto (SP), Brasil

Autor Correspondente Autor Correspondente: Carla Aparecida Arena Ventura R. Aristides de Oliveira, 360 Ribeirão Preto - SP - Brasil Cep: 14076-190 E-mail: caaventura@eerp.usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Compreender a visão de profissionais sobre as dimensões estruturais e contextuais de um Centro de Atenção Psicossocial para dependentes de substâncias psicoativas do Estado de São Paulo.

MÉTODOS: Estudo qualitativo que utilizou a entrevista semiestruturada com nove profissionais e dois gestores para obter os dados que foram analisados por meio da análise temática.

RESULTADOS: A estrutura interna do serviço foi influenciada pelo ambiente externo e fundamenta-se no cuidado individualizado. Como alternativa de enfrentamento dos desafios, ressalta-se o trabalho em equipe e sobrecarga como problema resultante da dinâmica de trabalho.

CONCLUSÃO: Há necessidade da contratação de profissionais para melhorar o funcionamento interno, assegurar a qualidade no atendimento e integrar a organização com os atores externos.

Descritores: Centros de tratamento de abuso de substâncias/organização e administração; Transtornos relacionados ao uso de substâncias; Humanização da assistência

RESUMEN

OBJETIVO: Comprender la visión de profesionales sobre las dimensiones estructurales y contextuales de un Centro de Atención Psicosocial para dependientes de sustancias psicoactivas del Estado de Sao Paulo.

MÉTODOS: Estudio cualitativo en el que se usó la entrevista semiestructurada con nueve profesionales y dos gestores para obtener los datos que fueron analizados por medio del análisis temático.

RESULTADOS: La estructura interna del servicio fue influenciada por el ambiente externo y se fundamenta en cuidado individualizado. Como alternativa de enfrentamiento de los desafios, se resalta el trabajo en equipo y sobrecarga como problema resultante de la dinámica de trabajo.

CONCLUSIÓN: Hay necesidad de la contratación de profesionales para mejorar el funcionamiento interno, asegurar la calidad en la atención e integrar la organización con los actores externos.

Descriptores: Centros de tratamiento de abuso de sustancias/organización & administración; Trastornos relacionados con substancias; Humanización de la atención

INTRODUÇÃO

Os Centros de Atenção Psicossocial a Usuários de Substâncias Psicoativas (CAPS-ad) são implantados em municípios com mais de 70.000 habitantes fundamentados na Portaria Ministerial nº336/02, que estabelece que este serviço deve prestar assistência psicossocial a pessoas com dependência de álcool e/ou drogas, com ênfase na reabilitação e reinserção social dessa clientela(1).

Com base nessa proposta assistencial, considera-se relevante compreender o sistema organizacional do CAPS-ad, uma vez que a organização de uma instituição interfere diretamente na qualidade da assistência prestada.

Subsistema CAPS-ad

As organizações são entidades sociais, dirigidas por metas e desenhadas como sistemas de atividades deliberadamente estruturados e coordenados, ligados ao ambiente externo(2-3). Nessa perspectiva, um sistema consiste em um conjunto de elementos interativos que recebe entradas do ambiente, transforma-as e emite saídas para o ambiente(2). Nesse contexto, o conceito de sistema aberto enfatiza o relacionamento da organização com o ambiente externo, afetando-o e sendo afetada por ele. Sendo assim, as organizações podem ser analisadas como sistemas compostos de vários subsistemas (produção,limites de fronteiras e administração) que desempenham funções específicas e necessárias à sua sobrevivência(4).

Os CAPS-ad, subsistemas abertos, são influenciados por todos os outros serviços de saúde que compõem arede assistencial do Sistema Único de Saúde, tais como: hospitais gerais e especializados, Estratégia Saúde daFamília, entre outros.

Os CAPS-ad devem oferecer atendimento diário, priorizando o planejamento terapêutico dentro de uma perspectiva individualizada de evolução contínua. Desenvolvem uma série de atividades que vão desde o atendimento individual até atendimentos em grupo ou oficinas terapêuticas e visitas domiciliares. Também oferecem condições para o repouso, bem como para desintoxicação ambulatorial de indivíduos que necessitem desse cuidado eque não demandem por atenção hospitalar(5). Nos CAPS-ad, o planejamento da assistência sustenta-se na lógica da Redução de Danos que contempla práticas voltadas para minimizar as consequências globais do uso de álcool e droga-se que não possuem a abstinência total como a única meta viável e possível aos dependentes químicos(5).

Dessa maneira, os CAPS-ad podem ser considerados organizações complexas e, por isso é ideal compreendê-las com base em uma abordagem sistêmica, pautando-se nas relações entre as dimensões estruturais e contextuais, e destas com o ambiente externo, em um processo dialético e contínuo(4).

Dimensões estruturais e contextuais das organizações como sistemas abertos

As organizações são compostas por um todo, formado por partes que ocupam diferentes posições e relacionam-se entre si, bem como com o ambiente externo(6). Por estrutura organizacional, entende-se o grau e o tipo de diferenciação horizontal e vertical, os mecanismos de coordenação e controle, a centralização e formalização do poder na organização. De forma geral, as estruturas organizacionais facilitam a consecução dos objetivos da organização, a minimização das influências de alterações dos indivíduos e a divisão de poderes e níveis de decisão. A estrutura influencia no processo de formulação e implementação de estratégias para o setor(6). Assim sendo não há uma única organização, mas organizações com diferentes potencialidades e limitações, o que fazem com que uma estrutura organizacional adapte-se a algumas tarefas e condições em determinado período de tempo(7).

As dimensões das organizações são sintetizadas em categorias estruturais e contextuais; as estruturais possibilitam descrever as características internas de uma organização, oque favorece a mensuração e a comparação das organizações. As contextuais caracterizam toda a organização (porte,tecnologia, ambiente e metas) e podem representar também o ambiente, bem como descrever o ajuste organizacional que influencia e molda as dimensões estruturais. Desse modo,para conhecer e avaliar organizações é preciso examinar suas dimensões estruturais e contextuais(2).

As dimensões estruturais são a formalização, a especialização, a hierarquia de autoridade, a centralização,o profissionalismo e as taxas de pessoal. A formalização,refere-se ao volume de documentação escrita da organização (procedimentos, descrições de cargos,regulamentos e manuais de política) e representa o nivelem que as tarefas organizacionais são subdivididas em cargos. Nessa perspectiva, se a especialização for extensiva,cada funcionário desempenhará apenas um estreito leque de tarefas e se for baixa, os funcionários desempenharão um grande número de tarefas em seus cargos.

A hierarquia de autoridade define quem se reporta aquém e a esfera de controle para cada gerente. A hierarquia é retratada pelas linhas verticais do organograma organizacional e está relacionada ao limite de controle. Quando os limites do controle são estreitos, a hierarquia tende a ser alta. Quando os limites de controle são largos,a hierarquia de autoridade será mais baixa. A centralização refere-se ao nível hierárquico que tem autoridade para tomar uma decisão. Quando a tomada de decisão é reservada para o nível mais elevado, a organização é centralizada. Quando as decisões são delegadas a níveis organizacionais mais baixos, é descentralizada.

O profissionalismo diz respeito ao nível de educação formal e de treinamento dos funcionários, e é considerado elevado quando os funcionários recebem longos períodos de treinamento para assumir cargos na organização. Geralmente, é medido com o número médio de anos de formação dos funcionários. A taxa de pessoal relaciona-se ao desmembramento de pessoas pelas várias funções e departamentos. As taxas de pessoal incluem os graus administrativo, burocrático, e assessoria profissional e a proporção de mão de obra indireta para a direta, sendo medidas por meio da divisão do número de funcionários de uma classificação pelo número total de funcionários da organização.

Já as dimensões contextuais são o tamanho, a tecnologia organizacional, o ambiente, as metas e estratégias e a cultura organizacional.

O tamanho corresponde à magnitude da organização em termos do número de pessoas. Como as organizações são sistemas sociais, o tamanho deve ser medido pelo número de funcionários. A tecnologia organizacional inclui as ações e técnicas utilizadas para ofertar o serviço. Refere-se a como a organização realiza seu processo de transformação das entradas organizacionais em saídas. Ressalta-se que, na tecnologia de serviços, o produto é intangível, produzido e consumido simultaneamente, os elementos humanos são muito importantes (a interação entre os membros),sendo muito difícil mensurar a qualidade do serviço.

O ambiente inclui todos os elementos, além dos limites da organização, que podem afetá-la totalmente ou em parte. Sendo assim, é importante que a organização receba informações sobre as mudanças do ambiente. Contudo, nem sempre os tomadores de decisão possuem as informações claras, ou seja, o nível de incerteza do ambiente externo é bastante alto, pois suas variáveis modificam-se muito, dificultando a possibilidade de se prever os acontecimentos.

As metas e estratégias da organização definem seu propósito e os meios para atingi-lo. Estabelecem o escopo da ação organizacional e seu relacionamento externo e interno. Para a consecução destas metas, devem ser considerados os impulsos motivadores de comportamentos, para que os indivíduos alcancem seus objetivos. E, por fim, a cultura diz respeito ao conjunto subjacente de valores, crenças, conhecimentos e normas essenciais compartilhados pelos membros da organização.

As dimensões estruturais e contextuais são interdependentes e fornecem uma base para medição e análise de características não observáveis casualmente, revelando informações significativas sobre as organizações. Compreender a visão de profissionais sobre-as dimensões estruturais e contextuais de um Centro de Atenção Psicossocial para dependentes de substâncias psicoativas do Estado de São Paulo.

MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, apropriada quando o fenômeno em estudo é complexo, de natureza social, que não tende à quantificação e envolve uma abordagem interpretativa e natural do objeto de estudo(8). Inicialmente realizou-se a pesquisa descritiva com dados secundários, por meio de uma revisão bibliográfica sobre as organizações, o processo de reforma psiquiátrica e a evolução dos serviços destinados à atenção dos usuários de álcool e drogas no Brasil.

Após aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, realizou-se a entrevista semi estruturada que foi precedida pela obtenção da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido por parte dos participantes. A primeira entrevista foi realizada com a responsável pelo serviço hospitalar que direcionou a criação do CAPS-ad no município para buscar informações sobre sua estruturação e verificar suas dimensões estruturais e contextuais. Posteriormente, foram realizadas entrevistas semi estruturadas com a atual gestora do serviço e funcionários da organização (três homens e seis mulheres)que representam 45% do total e pertencem às seguintes categorias profissionais: um médico psiquiatra, uma assistente social, uma professora de educação física, uma enfermeira, dois psicólogos, uma terapeuta ocupacional e dois técnicos em enfermagem. As entrevistas foram interrompidas quando se percebeu a saturação de temas abordados pelos participantes, e os dados foram analisados por meio da análise temática indutiva que compreendeu duas fases: identificação de unidades de sentidos e descrição densa dos significados ou núcleos temáticos, discutidos luz do conhecimento produzido na área(9).

RESULTADOS

Detectou-se um baixo nível de formalização administrativa, pois relatou-se que a organização possuiria um organograma formalizado ou grande volume de documentação escrita, corroborando o observado quanto ao baixo grau de formalização. Todavia, verificou-se formalização, especialmente, noque diz respeito aos prontuários dos usuários do serviço e à documentação necessária exigida pelos órgãos de apoio e fiscalizadores. Há assim uma "burocracia fomentada por exigências externas":

Tem um dia que fica pesado que a gente preenche fichas que a prefeitura exige que a gente preencha?(...)fica uma burocracia que a gente perde dois dias pra preencher. (A)

Entretanto, adverte-se que a "burocracia não prejudica o acesso ao serviço":

Pro paciente ser tratado não há nenhuma burocracia. Ele não precisa ser encaminhado de outro serviço e, é essa uma das grandes vantagens do serviço. (...)ele acordou num dia de manhã e resolveu que ele precisa parar de beber, é só ele vir até aqui. (I)

A especialização mostrou-se baixa pelo pequeno número de funcionários e o fato de que cada profissional desempenha várias tarefas, de acordo com a necessidade e a demanda da organização. Constata-se, portanto, "o esforço conjunto em prol do serviço e a não delimitação rígida das tarefas desempenhadas":

Acho que existe muito respeito entre as pessoas, não existe disputa, Nesse tempo, faz 11 anos que eu estou aqui, sempre vi que existe uma tentativa de que o serviço esteja bem e existe um esforço individual, se alguém em um determinado momento não tá podendo fazer esse esforço, um outro profissional cobre. (I)

Mesmo com a presença de um duplo vínculo de autoridade representado pelas duas coordenadoras, a hierarquia de autoridade é quase inexistente, pois não é necessário que os funcionários reportem-se a elas para executarem tarefas. O processo de tomada de decisão é descentralizado. Por meio da observação, verificou-se uma forte articulação entre os profissionais que procuram discutir todos os casos individualmente com os membros da equipe. As decisões da organização são solucionadas pelo grupo, considerando a opinião dos vários profissionais – clínico geral, psicólogo, terapeuta ocupacional – fato que, segundo a equipe, ocorre para otimizar o tratamento e as intervenções.

Nessa perspectiva, ao serem perguntados sobre adinâmica do trabalho no CAPS-ad, os profissionais enfatizaram o tema "trabalho conjunto e decisões tomadas em equipe como uma família":

Uma equipe multiprofissional é uma organização assim, não tem um gerente que manda e todo mundo obedece. Todos falam, todos têm opinião, todos procuram se gerenciar e gerenciar o serviço, dá um pouco mais de trabalho, mas é uma construção de todos. (B)

Ao ser abordado o processo de trabalho no CAPS-ad, observa-se a "sobrecarga de trabalho" citada com frequência pelos membros da equipe, o que acarreta também a diminuição do grau de especialização do trabalho:

Percebo que a gente teve um aumento muito grande de serviço,do número de usuários do serviço, então estão todos assim um pouco sobrecarregados(...),mas como regra geral a gente procura manter, pelo menos, o mínimo disso. (B)

Ainda, deve-se ressaltar que o trabalho em equipe não implica a inexistência de conflitos, os quais são a base para a inovação criativa e devem ser enfrentados pelo grupo. Nesse serviço, as reuniões da equipe são propícias para este enfrentamento. Nessa perspectiva, muitos entrevistados mencionaram "o trabalho em equipe caracterizado por conflitos", ao explicarem sua rotina de trabalho:

Eu acho que existem momentos que o clima fica tenso, e eu espero que seja assim, porque não, às vezes, muita harmonia agente supõe que as diferenças não estão aparecendo(...). A equipe é pró-ativa nesse sentido. (E)

O profissionalismo da organização é elevado, pois a equipe de trabalho é constituída por profissionais com graduação ou treinamento específico para a função exercida. Em relação à taxa de pessoal, há no serviço os seguintes profissionais: clínico geral, psiquiatras, psicólogos,terapeutas ocupacionais, assistentes sociais, enfermeiras,professor de educação física, técnicos de enfermagem e secretários. Com base na combinação das dimensões estruturais, no CAPS-Ad predomina o trabalho em equipee as relações de coordenação entre os profissionais, emdetrimento da valorização da subordinação. Quanto à estrutura física, os entrevistados consideram-na "adequada,porém com algumas limitações":

Eu acho que é adequada. Poderia ser mais funcional, talvez tenha algumas coisas que a gente poderia fazer diferente, é, tem alguns equipamentos aqui dentro que poderiam ser melhor organizados, mas eu acho que, em geral, a gente não tem assim uma dificuldade de trabalho por conta da estrutura. (E)

Com relação às dimensões contextuais que se relacionam ao ambiente externo, o tamanho da organização é pequeno, uma vez que existem 20profissionais atuantes na proposta terapêutica do referido serviço. A tecnologia organizacional também é baixa,porque se embasa nas relações interpessoais entre os profissionais de saúde e os usuários/familiares do serviço.

O trabalho dos profissionais do Fundamenta-se no cuidado à pessoa realizado por pessoas. Dessa forma, as pessoas são o centro da rede de assistência ao dependente químico, o que facilita o predomínio do trabalho em equipe e, consequentemente,a baixa hierarquia de autoridade observada na organização. Nesse contexto, os valores que fundamentam a cultura do serviço são "o respeito ao ser humano e a conduta ética":

Preocupação muito grande de escutar o sujeito, né? E eu achoque isso é um valor que a gente carrega. (C)

Nós temos alguma coisa a oferecer e quem tá vindo aqui, está vindo pelo desejo de se tratar, então, é um ambiente de tratamento livre e aberto. (I)

Para a realização do cuidado com base nestes valores, algumas atividades são desenvolvidas, como "reuniões de equipe, confraternizações, simpósios":

Toda semana a gente tem reunião da equipe? Então, uma vez por mês a gente recolhe uma caixinha entre os profissionais da equipe e dentro da reunião de equipe a gente tem a festa pros aniversariantes do mês. (B)

Todo ano realiza um simpósio, isso aberto à população emgeral. Isso é algo que acontece já há quatro anos(...). (H)

Dentre as atividades mencionadas, alguns entrevistados citaram a existência no passado de"reuniões de avaliação", que constituíam momentos importantes de reflexão da equipe e de oportunidade para o enfrentamento de conflitos e a busca criativa de soluções conjuntas:

A gente contava até com uma reunião de reflexão, onde isso ajudava? (G)

O ambiente externo da organização é bastante complexo, englobando "a Secretaria Municipal de Saúde,hospitais psiquiátricos e outras unidades de saúde, escolas,familiares e usuários do serviço". No caso da dependência ao álcool e drogas, salientam-se vários fatores de risco presentes no ambiente externo.

Então, a gente tem dificuldades nesse sentido. Em relação à escola que precisa voltar a estudar e não tem onde, é, situação de emprego, situação social, de família, então, toda a rede de serviços do município influencia, sim no atendimento e no progresso do tratamento da pessoa. (B)

Em relação ao ambiente externo, "a insuficiência de verbas" foi um tema recorrente nas entrevistas. Ainda, no que tange aos usuários, muitos entrevistados se preocupam com o "aumento dos usuários como fator dificultante para a manutenção da qualidade do serviço":

A gente percebe várias limitações, principalmente pela estrutura,pelo número de pacientes, pelo aumento da demanda. (B)

Por fim, os entrevistados avaliaram o CAPS-ad como um "serviço de qualidade e referência no País":

Eu avalio, assim, um serviço excelente. (A)

De maneira geral, observaram-se várias inter-relações entre as dimensões estruturais e contextuais. O ambiente externo é a variável e afeta a estrutura organizacional,provocando mudanças na dinâmica do trabalho realiza dono CAPS-ad, confirmando que este serviço é um sistema aberto. Como sugestões, as atividades, como as reuniões de integração e reflexão entre os membros da equipe,devem ser ainda mais valorizadas na organização:

A gente periodicamente fazia uma reunião de reflexão duas ou três horas, e aí as dificuldades internas de relacionamento cevão surgindo, então, eram pra se refletir... Há algum tempo, agente não tem isso, e a gente vai tentando acertar as arestas assim entre nós mesmos. (B)

DISCUSSÃO

O grau baixo de formalização parece ser ideal para uma organização pequena como o CAPS-ad, mas a existência de burocracia é necessária, pois é importante registrar osa tendimentos e acompanhá-los quantitativamente. A estrutura é horizontalizada, caracterizada do modo funcional pelo trabalho em equipe, pelo baixo grau de especialização e de hierarquia e pelo esforço conjunto em prol do serviço.

Nessa perspectiva, o trabalho em equipe multidisciplinar é essencial nos centros de atenção psicossocial. As equipes são formas mais aprimoradas de grupos de trabalhos, pois estabelecem metas uníssonas para o trabalho coletivo(10). Os trabalhadores das equipes são, como os usuários, membros da mesma comunidade: de ação, interação, conhecimento e intersubjetividade,permeada por diferenças sociais, étnicas e culturais(11).

Um recurso que contribuiu para a melhoria do desempenho da equipe foram as reuniões, nas quais se discutem aspectos relacionados ao cuidado e às questões administrativas. Tais reuniões correspondem a um ri toque favorece o crescimento dos profissionais e da própria equipe. Para que sejam contemplados os benefícios das reuniões, é fundamental que aconteçam em espaços de discussão, reflexão e divulgação desconhecimento e não só uma tentativa de resolver problemas emergenciais(10).

Nas reuniões realizadas, o enfrentamento direto dos conflitos, induz ao aprendizado coletivo da própria equipe(4), uma vez que o fato de existir um trabalho em equipe não implica a inexistência de conflitos. Nesse sentido, o trabalho em equipe é considerado uma estratégia para enfrentar o intenso processo de especialização na saúde, que aprofunda verticalmente o conhecimento e a intervenção em aspectos individualizados das necessidades de saúde(12).

Na organização estudada, apesar do alto grau de profissionalismo, a especialização é baixa, visando a integrar a equipe no cuidado, articulando as diferentes ações e saberes individuais(10,12). Em função da própria filosofia de trabalho que caracteriza a estruturação interna e os valores da organização, observou-se que os profissionais entrevistados identificam-se com o seu trabalho e prestam um cuidado de qualidade.

Dessa forma, como um sistema aberto, a organização influencia o ambiente externo, especialmente, por meio da assistência aos usuários de álcool e drogas e o ambiente externo do CAPS-ad é bastante complexo,composto por diferentes instituições (saúde e educação)e pelos familiares e usuários do serviço, interferem nessa organização por meio dos seguintes aspectos: restrições financeiras para a realização das atividades previstas,incompreensão dos profissionais da rede de saúde e da sociedade sobre o papel do CAPS-Ad, dificuldades de integração do serviço com a família dos usuários e o estigma frente à dependência química. É importante aproximar profissionais que atuam nos serviços de saúde mental das equipes de Saúde da Família, buscando qualificar os profissionais atuantes na Saúde da Família para o cuidado integral(13). Ainda, devem ser priorizadas a integração e a cooperação entre os serviços de saúde existentes, de modo que a atenção primária possa desenvolver ações que valorizem a identificação no território de demandas que necessitem de atenção especializada em saúde mental(13).

Ao abordarem as metas, os profissionais referiram não haver um planejamento formal da organização, cujas diretrizes norteiam-se pela assistência individualizada centrada nas particularidades de cada usuário. Apesar desse cuidado individualizado, é comum a problemática do álcool e outras drogas entre os usuários deste serviço e a superação da dependência química pressupõe o objetivo do serviço(14).

Para que haja maior vínculo do usuário com o serviço,habitualmente, o profissional que realiza a primeira entrevista é designado técnico de referência do usuário e assume a responsabilidade pelo acompanhamento do tratamento desse indivíduo, inclusive com a equipe para determinação das atividades individuais e grupais necessárias à sua reabilitação(15). A condução das atividades grupais do CAPS-ad são realizadas por profissionais diferentes, o que sinaliza o baixo grau de especialização e observou-se uma diversidade de grupos com fins terapêuticos diferenciados, que se denominam: grupos de acolhimento, acompanhamento, oficinas terapêuticas e assembleias(14). Um componente importante para o bom funcionamento do grupo é o coordenador que pode ser representado pelas diferentes profissões, de acordo com o enfoque de cada grupo(14).

Sendo assim, o cotidiano socialmente construído no CAPS-ad e assim (re)conhecido pela sociedade, bem como os diagnósticos psicossociais recorrentemente estabelecidos, podem se transformar em eixos de gestão do trabalho, os quais subsidiarão a atuação interdisciplinar das equipes e a promoção da saúde coletiva(13).

Afirma-se que a estratégia de atendimento comunitário em saúde mental para dependentes químicos para a reabilitação psicossocial oferece resultados efetivos e deve ser ampliada no contexto do Sistema Único de Saúde, mesmo diante de necessidades financeiras, de infraestrutura e na organização destes serviços(16). Destaca-se que o modelo de tratamento mais utilizado no cenário brasileiro é o psicossocial(17), por possibilitar a assistência integral do indivíduo. Assim,considera-se relevante qualificar a assistência oferecida pelo CAPS-ad, o que induz a necessidade de valorizaras dimensões estruturais e contextuais para melhorar o funcionamento e a gestão desta instituição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A organização CAPS-ad apresenta inter-relações importantes entre suas dimensões organizacionais. Sua estrutura interna é reflexo de seu tamanho e de sua cultura, fundamentada nos valores do cuidado individualizado, em consonância com a política nacional centrada na reinserção social. Como consequência desta identidade entre as dimensões estruturais e contextuais, identificou-se um enfrentamento conjunto dos desafios,por meio do trabalho em equipe.

Todavia, a sobrecarga de trabalho é um ponto preocupante que pode influenciar negativamente a realização de reuniões e a proposta de cuidado integrado e individualizado, baseado no alto grau de profissionalismo e baixa especialização. Nesse sentido, devem-se buscar alternativas para a contratação de profissionais para um melhor funcionamento do ambiente interno e para garantir a qualidade do atendimento.

Como sugestões para o avanço e intenso aprendizado organizacional, aponta-se para a manutenção desta estrutura horizontalizada e descentralizada, a intensificação das reuniões de integração e reflexão entre a equipe, bem como a realização de avaliações externas que proporcionem uma visão crítica do serviço prestado.

Sugere-se, ainda, a interação do serviço com a comunidade, por meio de simpósios e outras formas de abertura do serviço à sociedade, especialmente, aos familiares dos usuários, com o propósito de esclarecer o papel do CAPS-ad e também enfrentar o estigma social dos usuários de álcool e drogas.

Destaca-se, por fim, a necessidade de maior integração do CAPS-ad com o ambiente externo, especialmente com outros serviços de saúde mental para otimizar o atendimento aos usuários e integrar um trabalho em rede,como preconizam as bases da reforma psiquiátrica brasileira.

Artigo recebido em 09/10/2010 e aprovado em 09/05/2011

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  • Autor Correspondente:
    Carla Aparecida Arena Ventura
    R. Aristides de Oliveira, 360
    Ribeirão Preto - SP - Brasil
    Cep: 14076-190
    E-mail:
  • *
    Trabalho realizado em um Centro de Atenção Psicossocial para dependentes químicos de uma cidade do interior de São Paulo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Dez 2011
    • Data do Fascículo
      2011

    Histórico

    • Recebido
      09 Out 2010
    • Aceito
      09 Maio 2011
    Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
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