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(In) Segurança alimentar em familias de pré-escolares de uma zona rural do Ceará

(In) Seguridad alimenticia en familias de preescolares de una zona rural del Ceará

Resumos

OBJETIVOS: Detectar a prevalência da (in) segurança alimentar entre as famílias residentes na zona rural de Maranguape e verificar a associação entre as variáveis socioeconômicas e o grau de (in) segurança alimentar. MÉTODOS: Estudo descritivo, com abordagem quantitativa, realizado no Centro de Saúde da Família (CSF) na zona rural de Maranguape-Ceará em setembro de 2009. A amostra constituiu-se de 200 famílias com crianças pré-escolares atendidas no CSF, sendo aplicada a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA). RESULTADOS: Das famílias, 12% apresentaram segurança alimentar e 88% insegurança alimentar. Constatou-se associação estatisticamente significante entre a prevalência da (in) segurança alimentar e a escolaridade do responsável (p<0,0001), número de moradores no domicílio (p=0,018) e renda familiar (p<0,0001). CONCLUSÃO: Com a aplicação da EBIA, pôde-se diagnosticar a (in) segurança alimentar, o que possibilita ao enfermeiro propor ações de educação em saúde, visando a melhorar os cuidados relativos à alimentação.

Segurança alimentar e nutricional; Prevalência; Pré-escolar; Consumo de alimentos; Fatores socioeconômicos


OBJETIVOS: Detectar la prevalencia de la (in) seguridad alimenticia entre las familias residentes en la zona rural de Maranguape y verificar la asociación entre las variables socioeconómicas y el grado de (in) seguridad alimenticia. MÉTODOS: Estudio descriptivo, con abordaje cuantitativo, realizado en el Centro de Salud de la Familia (CSF) en la zona rural de Maranguape-Ceará en setiembre del 2009. La muestra se constituyó de 200 familias con niños preescolares atendidos en el CSF, siendo aplicada la Escala Brasileña de Inseguridad Alimenticia (EBIA). RESULTADOS: De las familias, el 12% presentaron seguridad alimenticia y el 88% inseguridad alimenticia. Se constató asociación estadísticamente significativa entre la prevalencia de la (in) seguridad alimenticia y la escolaridad del responsable (p<0,0001), número de moradores en el domicilio (p=0,018) e ingreso familiar (p<0,0001). CONCLUSIÓN: Con la aplicación de la EBIA, se puede diagnosticar la (in) seguridad alimenticia, lo que posibilita al enfermero proponer acciones de educación en salud, visando mejorar los cuidados relativos a la alimentación.

Seguridad alimentaria; Prevalencia; Preescolar; Consumo de Alimentos; Factores socioeconômicos


OBJECTIVES: To determine the prevalence of food (in)security among housteholds in a rural zone of Maranguape, and to verify the association between socioeconomic variables and the degree of food (in)security. METHODS: A descriptive study with a quantitative approach, conducted in the Centro de Saúde da Família (CSF) , Center of Family Health, in a rural zone in Maranguape - Ceará in September of 2009. The sample consisted of 200 families with preschool children who are seen in the CSF, applying the Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), Brasilian Food Insecurity Scale. RESULTS: Of the families, 12% presented with food security and 88% with food insecurity. A statistically significant association was noted between the prevalence of food (in)security and education of the head of household (p<0.0001), number of household members (p = 0.018), and family income (p < 0.0001). CONCLUSION: With the application of the EBIA, we could diagnose food (in)security, which enables nurses to offer health education interventions aimed at improving care related to alimentation.

Food security; Prevalence; Child, preschool; Food consumption; Socioeconomic factors


ARTIGO ORIGINAL

(In) Segurança alimentar em familias de pré-escolares de uma zona rural do Ceará* * Trabalho realizado no município de Maranguape, localizado na região metropolitana de Fortaleza no Estado do Ceará, Brasil.

Food (in)security in families of preschool children in a rural zone of Ceará

(In) Seguridad alimenticia en familias de preescolares de una zona rural del Ceará

Julliana dos Santos AiresI; Mariana Cavalcante MartinsII; Emanuella Silva JoventinoIII; Lorena Barbosa XimenesIV

IPós-graduanda (Mestrado) em Enfermagem, Universidade Federal do Ceará - UFC - Fortaleza (CE), Brasil

IIDoutora em Enfermagem. Universidade Federal do Ceará - UFC - Fortaleza (CE), Brasil

IIIPós-graduanda (Doutorado) em Enfermagem, Universidade Federal do Ceará - UFC - Fortaleza (CE), Brasil

IVDoutora em Enfermagem. Professora Associada I do Departamento de Enfermagem, Universidade Federal do Ceará - UFC - Fortaleza (CE), Brasil. Coordenadora do Programa de Pós-Graduação de Enfermagem. Pesquisadora do CNPq

Autor correspondente Autor correspondente: Julliana dos Santos Aires Av. Bezerra de Menezes, 2381 apt 401 - São Gerardo Fortaleza (CE), Brasil, CEP. 60325-003 E-mail: jullianaaires@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVOS: Detectar a prevalência da (in) segurança alimentar entre as famílias residentes na zona rural de Maranguape e verificar a associação entre as variáveis socioeconômicas e o grau de (in) segurança alimentar.

MÉTODOS: Estudo descritivo, com abordagem quantitativa, realizado no Centro de Saúde da Família (CSF) na zona rural de Maranguape-Ceará em setembro de 2009. A amostra constituiu-se de 200 famílias com crianças pré-escolares atendidas no CSF, sendo aplicada a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA).

RESULTADOS: Das famílias, 12% apresentaram segurança alimentar e 88% insegurança alimentar. Constatou-se associação estatisticamente significante entre a prevalência da (in) segurança alimentar e a escolaridade do responsável (p<0,0001), número de moradores no domicílio (p=0,018) e renda familiar (p<0,0001).

CONCLUSÃO: Com a aplicação da EBIA, pôde-se diagnosticar a (in) segurança alimentar, o que possibilita ao enfermeiro propor ações de educação em saúde, visando a melhorar os cuidados relativos à alimentação.

Descritores: Segurança alimentar e nutricional; Prevalência; Pré-escolar; Consumo de alimentos; Fatores socioeconômicos

ABSTRACT

OBJECTIVES: To determine the prevalence of food (in)security among housteholds in a rural zone of Maranguape, and to verify the association between socioeconomic variables and the degree of food (in)security.

METHODS: A descriptive study with a quantitative approach, conducted in the Centro de Saúde da Família (CSF) , Center of Family Health, in a rural zone in Maranguape - Ceará in September of 2009. The sample consisted of 200 families with preschool children who are seen in the CSF, applying the Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA), Brasilian Food Insecurity Scale.

RESULTS: Of the families, 12% presented with food security and 88% with food insecurity. A statistically significant association was noted between the prevalence of food (in)security and education of the head of household (p<0.0001), number of household members (p = 0.018), and family income (p < 0.0001).

CONCLUSION: With the application of the EBIA, we could diagnose food (in)security, which enables nurses to offer health education interventions aimed at improving care related to alimentation.

Keywords: Food security; Prevalence; Child, preschool; Food consumption; Socioeconomic factors.

RESUMEN

OBJETIVOS: Detectar la prevalencia de la (in) seguridad alimenticia entre las familias residentes en la zona rural de Maranguape y verificar la asociación entre las variables socioeconómicas y el grado de (in) seguridad alimenticia.

MÉTODOS: Estudio descriptivo, con abordaje cuantitativo, realizado en el Centro de Salud de la Familia (CSF) en la zona rural de Maranguape-Ceará en setiembre del 2009. La muestra se constituyó de 200 familias con niños preescolares atendidos en el CSF, siendo aplicada la Escala Brasileña de Inseguridad Alimenticia (EBIA).

RESULTADOS: De las familias, el 12% presentaron seguridad alimenticia y el 88% inseguridad alimenticia. Se constató asociación estadísticamente significativa entre la prevalencia de la (in) seguridad alimenticia y la escolaridad del responsable (p<0,0001), número de moradores en el domicilio (p=0,018) e ingreso familiar (p<0,0001).

CONCLUSIÓN: Con la aplicación de la EBIA, se puede diagnosticar la (in) seguridad alimenticia, lo que posibilita al enfermero proponer acciones de educación en salud, visando mejorar los cuidados relativos a la alimentación.

Descriptores: Seguridad alimentaria; Prevalencia; Preescolar; Consumo de Alimentos; Factores socioeconômicos

INTRODUÇÃO

A alimentação e a nutrição são constituintes básicos para a promoção e proteção da saúde, favorecendo o crescimento e o desenvolvimento humano com maior possibilidade de se atingir níveis adequados de qualidade de vida(1).

A recente avaliação da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação constatou que havia 1,02 bilhão de pessoas desnutridas no mundo em 2009, sendo esse número maior que o estimado em 2008, que foi de 915 milhões de indivíduos(2). Estes padecem por questões alimentares e nutricionais, seja pela ausência ou má qualidade do alimento, ou ainda, por condições de vida e saúde que impedem o aproveitamento adequado do alimento disponível(3).

No Brasil, nos últimos anos, há o desenvolvimento de políticas públicas voltadas a combater a fome e a pobreza, com base na concepção da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), que possibilitam novas formas de compreensão da alimentação, além do ato de comer(4), pois se sabe que os efeitos adversos da insegurança alimentar são, particularmente, mais severos em mulheres, idosos e crianças(5), sendo estas populações associadas à função cognitiva prejudicada e a problemas em seu desenvolvimento(6).

Nesse contexto, torna-se relevante o conceito de segurança alimentar, que se refere ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade em quantidade suficiente, sem comprometer a satisfação de outras necessidades essenciais. Baseia-se em práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis (7).

A segurança alimentar diz respeito ao acesso constante a alimentos ricos em vitaminas e minerais, não se restringindo simplesmente ao ato de consumir esses nutrientes(8). Para tanto, a identificação das condições de vida e a disponibilidade dos alimentos no cotidiano das famílias tornam-se instrumentos essenciais para avaliação da (in) segurança alimentar (9).

Perante essa realidade, emergem os seguintes questionamentos: as famílias de crianças pré-escolares que residem na zona rural apresentam insegurança alimentar? As condições socioeconômica-demográfica das famílias têm associação com os níveis de (in) segurança alimentar?

Diante dessas indagações, justificou-se a necessidade da realização da presente pesquisa, por meio da aplicação da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar, que tem o intuito de estimar a (in) segurança alimentar, possibilitando um diagnóstico plausível e coerente com a realidade das famílias residentes na zona rural de um município localizado na região metropolitana de Fortaleza - Ceará.

A escolha do município deu-se baseada em estudo anterior(10), realizado na mesma zona rural, o qual evidenciou que as crianças em alimentação complementar consumiam alimentos de baixo teor energético e nutritivo, bem como de alto custo (iogurtes, macarrão instantâneo, refrigerantes). Em contrapartida, detectou-se ainda que estas famílias possuíam precárias condições de vida, fato que provavelmente influencia na situação de segurança alimentar.

Munidos desse diagnóstico, constata-se a relevância deste estudo, à medida que os profissionais de saúde, em especial, os enfermeiros poderão atuar de maneira compatível com a situação socioeconômica da população, buscando sensibilizá-la a respeito da importância da manutenção de hábitos alimentares saudáveis, bem como orientando alternativas que se adaptem à sua realidade e que satisfaçam as necessidades nutricionais de seus familiares.

Nessa perspectiva, objetivou-se detectar a prevalência da (in) segurança alimentar entre as famílias residentes na zona rural de Maranguape e verificar a associação entre as variáveis socioeconômicas e o grau de (in) segurança alimentar.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo com abordagem quantitativa, desenvolvido em um Centro de Saúde da Família (CSF), situado no distrito de Sapupara, zona rural do município de Maranguape, região metropolitana de Fortaleza - Ceará (Brasil).

A amostra constituíiu-se de 200 famílias com crianças na faixa etária de três a seis anos (pré-escolar) atendidas no referido CSF. Os critérios de inclusão adotados foram: familiares de crianças pré-escolares que fossem cadastradas no CSF selecionado e que residissem no distrito de Sapupara. O critério de exclusão foi: familiares que possuíssem problemas mentais ou cognitivos.

A coleta de dados ocorreu em setembro de 2009. Realizou-se uma entrevista individualizada com as famílias das crianças, no próprio CSF, onde se aplicou um formulário socioeconômico e a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA)(11), composta de 15 perguntas relacionadas à alimentação da família e das crianças/adolescentes, permitindo avaliar a percepção de segurança alimentar intrafamiliar(12). A pontuação atribuída para a escala é de 1 ponto para cada resposta "sim" e zero ponto à resposta "não" ou "não sabe". O somatório desses pontos permite verificar se a família encontra-se em situação de segurança alimentar (zero pontos), insegurança leve (1 a 5 pontos), insegurança moderada (6 a 10 pontos) e insegurança grave (11 a 15 pontos)(11).

No presente estudo, analisou-se somente as respostas positivas (sim) e negativas (não), pois não houve prevalência no item "não sabe". Ressalta-se, ainda, que não houve avaliação quanto à alternativa das questões, em caso de positivas, tais como: em quase todos os dias, em alguns dias, em apenas um ou dois dias, e não sabe ou recusa responder, assim como em outras pesquisas (13-17).

Salienta-se que a opção pela alternativa positiva na escala indica que a família apresenta em seu cotidiano situações que caracterizam a insegurança alimentar, ou seja, quanto mais respostas "sim" maior será a gravidade de insegurança alimentar da família.

Os dados foram tabulados e processados pelo Predictive Analytics Software (PASW), versão 18. Para a análise, valeu-se da estatística descritiva, por meio de frequências absolutas, relativas e o teste de significância estatística linear by linear, de acordo com a literatura pertinente.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará sob o Parecer nº 98/09. Foram respeitados os requisitos éticos previstos para pesquisas envolvendo seres humanos, conforme a Resolução nº 196/96(18). Ressalta-se que todos os participantes, após explanação da finalidade da pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Com base nos dados da Tabela 1, pode-se observar a distribuição das respostas dos participantes em relação à EBIA. Constatou-se que a pergunta do item 3 apresentou maior proporção de respostas afirmativas (72%) e o item 15 obteve maior quantidade de respostas negativas (95%).

Em relação aos itens 7, 8, 9, 10 e 11, que se referem à alimentação dos adultos da casa, observou-se que as situações de restrição alimentar, de fome e perda de peso eram vivenciadas de forma minimizada pelas famílias, fato identificado pela prevalência de respostas negativas, que variaram de 53,5% a 77%. Contudo, ressalta-se que os itens 7 e 8 receberam um número considerável de respostas positivas, 46,5% e 46%, respectivamente.

Os itens 5, 6, 12, 13, 14 e 15 que dizem respeito às refeições das crianças no cotidiano das famílias, embora tenham obtido uma maior proporção de respostas negativas, variaram de 35% a 95%. O item 6 foi ressaltado afirmativamente por um número significativo de participantes (42,5%).

Observou-se que, das 200 famílias entrevistadas, 24 (12%) encontravam-se em situação de segurança alimentar, mas a maioria apresentou insegurança alimentar (176 - 88%). Dessas, 70 (35%) foram classificadas como insegurança alimentar leve; 57 (28,5%) como insegurança alimentar moderada e 49 (24,5%) como insegurança alimentar grave (Figura 1).


Por meio dos dados da Tabela 2, pode-se detectar a correlação entre o grau de (in) segurança alimentar e as variáveis socioeconômicas da amostra. Verificou-se associação estatisticamente significante entre a prevalência da (in) segurança alimentar e a escolaridade do responsável (p<0,0001), o número de moradores no domicílio (p=0,018) e a renda familiar mensal (p<0,0001). Quanto às demais variáveis, observou-se que não houve associação estatisticamente significante entre (in) segurança alimentar e estado civil (p=0,790), trabalho fora de casa (p=0,625) e número de filhos na idade pré-escolar (p=0,662).

DISCUSSÃO

No Brasil, a questão da (in) segurança alimentar tem sido foco de atenção do governo, recebendo contribuições de diferentes abordagens e, cada vez mais, ocupa o cenário das políticas públicas(19).

Pode-se observar que a preocupação com a falta do alimento em casa (item 1) foi ressaltada por 132 (66%) entrevistados, sendo similiar à encontrada em estudo realizado em Quebec, Canadá, onde a insegurança psicológica foi referida por 34 (62%) das famílias entrevistadas(20).

No que diz respeito aos itens que abordam a questão das refeições das crianças, constatou-se que o 5 apresentou um número elevado de respostas positivas (65%), e que os demais (6, 12, 13, 14 e 15) tiveram maior porcentagem de respostas negativas. Tal aspecto pode ser relacionado à gravidade das perguntas, pois, ao avaliar a proporção das respostas afirmativas com o comprometimento quantitativo da dieta das crianças, verificou-se que o número de respostas positivas foi reduzido, à medida que o grau de severidade das perguntas foi aumentado.

Diante da dificuldade de acesso aos alimentos, pesquisa desenvolvida com 213 mulheres na Costa Rica constatou que a resposta ao item da escala, validada no país, sobre o adulto permanecer um dia inteiro sem ingerir algum alimento, oscilou por volta de 6,1% e sobre a criança ter permanecido durante um dia inteiro sem comer, obteve a porcentagem positiva em 2,8% das famílias(21). Tais resultados diferiram do presente estudo, que apresentou, respectivamente, 22,5% de respostas positivas aos adultos e 5% às crianças. Contudo, constatou-se que o fato de as crianças serem protegidas pelos familiares em relação à sua alimentação diária mostrou-se como um caráter similar entre os estudos citados.

Pesquisa realizada com famílias indígenas de pré-escolares no Canadá corrobora os achados, pois apontou que o índice de insegurança alimentar entre os adultos da casa foi superior ao das crianças, visto que há redução da ingestão de alimentos pelos adultos, priorizando a nutrição infantil(22).

Verificou-se que 176 (88%) famílias entrevistadas encontravam-se em insegurança alimentar, assemelhando-se com estudo que constatou a situação alimentar em famílias da área rural da zona da mata nordestina, com 87% de insegurança alimentar(13) e com uma pesquisa que analisou a situação de (in) segurança alimentar no semiárido nordestino, que constatou 87% de insegurança alimentar(14).

No entanto, esses resultados diferiram dos obtidos por meio da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2004, que identificou, em todo o território nacional, que apenas 34,8% dos domicílios encontravam-se em situação de insegurança alimentar, sendo 16% de insegurança leve, 12,3% de moderada e 6,5% de grave. No que diz respeito à Região Nordeste, esta apresentou prevalência de insegurança alimentar de 53,5%, sendo 19,5% de insegurança leve, 21,6% moderada e 12,4% grave, sendo maior na área rural (49,9%) que no meio urbano (37,7%)(23).

Ademais, no presente estudo, verificou-se que houve associação estatisticamente significante com as variáveis escolaridade, renda mensal e número de moradores no domicílio. Logo, pode-se ressaltar que quanto menor a escolaridade do responsável das famílias (p<0,0001) maior será o número de moradores no domicílio (p=0,018) ou menor a renda familiar mensal (p<0,0001) das famílias estudadas, mais elevada será a gravidade de insegurança alimentar. Para tanto, um estudo ecológico desenvolvido com 19.037 indivíduos no Sul da Austrália corrobora ao considerar que as referidas variáveis foram fatores de risco para a situação de insegurança alimentar(24).

Pesquisa realizada no município de Duque de Caixas (RJ) em 1.085 domicílios também identificou que a proporção de famílias em insegurança alimentar moderada e grave diminuiu, à medida que houve um aumento na escolaridade no chefe familiar. Por outro lado, a insegurança alimentar leve não foi crescente com o aumento do grau escolar do responsável da família(15). Além disso, estudo realizado em 1.045 domicílios na cidade de Pelotas (RS) verificou, ainda, que a prevalência de insegurança alimentar apresenta-se mais elevada entre as famílias com cinco ou mais moradores no domicílio(25).

Apesar disso, uma análise dos determinantes da insegurança alimentar no Brasil afirmou que a variável com maior relevância em relação à insegurança alimentar é a baixa renda domiciliar(26). Tal achado corrobora o estudo realizado na zona rural de um município de Minas Gerais onde foi identificado que, entre as famílias com renda familiar inferior a um salário mínimo, a prevalência de insegurança alimentar foi de 68,7%, e nas famílias com ganho superior ou igual a um salário mínimo, a insegurança alimentar foi de 16,6%(16). Na Paraíba, famílias com renda mensal maior que um salário mínimo praticamente não apresentaram insegurança alimentar grave (0,9%) e obtiveram índices baixos de insegurança moderada (3,5%) e leve (10,4%)(17).

Sabe-se que os hábitos alimentares estão relacionados a fatores econômicos e culturais, que influenciam na disponibilidade e acessibilidade aos alimentos. Dessa forma, os alimentos consumidos e apreciados pela família costumam também ser aceitos pela criança(27).

Constatou-se que o estado civil e o fato de trabalhar fora de casa não apresentaram associação estatisticamente significante com a (in) segurança alimentar. Contudo, pesquisa desenvolvida em nível nacional verificou que nas famílias cujas mães possuíam cônjuge, a prevalência de segurança alimentar (18%) e insegurança alimentar leve (29,6%) foram superiores, e entre aquelas que não tinham cônjuge destacaram-se as inseguranças alimentares moderada (36,31%) e grave (24,37%)(28).

Mesmo não tendo sido verificada neste estudo associação estatisticamente significante entre o número de filhos pré-escolares e a prevalência de (in) segurança alimentar, observou-se que entre as famílias com apenas um filho, a prevalência de segurança alimentar foi superior às demais. Para tanto, sabe-se que a atenção da família à criança exerce papel primordial em seu desenvolvimento por proporcionar uma alimentação adequada, fortalecer o vínculo afetivo e, assim, promover hábitos alimentares mais saudáveis(29). Dessa forma, o número menor de filhos pode facilitar essas ações.

Tendo em vista a limitação financeira de algumas famílias, acredita-se que uma alternativa seria utilizar os alimentos regionais (caju, banana, siriguela, jerimum, batata-doce, entre outros) para proporcionar uma alimentação nutritiva e saudável, que são, em geral, de baixo custo, fácil acesso e alto valor nutritivo(10). Entretanto, grande parte dos indivíduos limita seu uso no preparo de sucos, por desconhecer os benefícios para a promoção de uma alimentação de boa qualidade às crianças(30).

Embora estudos nacionais e internacionais(13-14,20) tenham encontrado resultados semelhantes em relação à (in) segurança alimentar, a prioridade dada a esta problemática em cada país ou região é diferenciada por fatores políticos, econômicos e culturais que influenciam no estilo de vida e no tipo de alimento que cada pessoa venha a utilizar. Apesar disso, acredita-se que a possibilidade de nutrição dos indivíduos deve ser prioridade nas discussões em todos os países e estados, pois esta pode influenciar diversos aspectos como educação, moradia, ocupação, entre outros, sendo inclusive decisiva na sobrevivência do ser humano.

CONCLUSÃO

A EBIA mostrou-se um instrumento relevante para identificar a situação alimentar de famílias residentes em zona rural. No entanto, considerou-se como limitação do estudo o não detalhamento das frequências das respostas afirmativas contidas na EBIA (em quase todos os dias, em alguns dias, em apenas um ou dois dias, não sabe ou recusa responder), tendo em vista que este poderia se constituir em um mecanismo para melhor compreender os achados da pesquisa ou ainda obter novas conclusões.

O contexto descrito nesse estudo proporcionou um olhar ampliado em níveis social, econômico e demográfico e sua relação com a (in) segurança alimentar, possibilitando um embasamento para os profissionais de saúde, sobretudo os enfermeiros, como educadores em saúde, para um planejamento e execução de intervenções que possibilitem a inclusão de alimentos disponíveis nas regiões brasileiras, contribuindo com a melhoria da qualidade da alimentação das crianças, bem como promovendo o desenvolvimento infantil adequado.

Destaca-se que o contexto estudado foi da zona rural da região metropolitana de uma capital, apesar disso o índice de insegurança alimentar identificado foi alarmante. Dessa forma, infere-se que a realidade da nutrição de populações de outras regiões brasileiras, inclusive das zonas rurais do sertão nordestino, deva possuir situação de pobreza mais marcante.

Faz-se premente, portanto, a participação do setor acadêmico, bem como dos setores governamentais, visando a subsidiar informações que referenciem a construção de políticas e programas de alimentação. Além disso, ressalta-se que ainda são poucos os municípios brasileiros que possuem inquéritos de avaliação da SAN, por meio da EBIA, os quais devem ter seu uso estimulado, pois poderiam ser utilizados como indicadores para as políticas de combate à insegurança alimentar e à fome, tanto em âmbito regional como nacional.

Artigo recebido em 05/01/2011 e aprovado em 04/08/2011

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  • Autor correspondente:
    Julliana dos Santos Aires
    Av. Bezerra de Menezes, 2381 apt 401 - São Gerardo
    Fortaleza (CE), Brasil, CEP. 60325-003
    E-mail:
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    Trabalho realizado no município de Maranguape, localizado na região metropolitana de Fortaleza no Estado do Ceará, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Maio 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      05 Jan 2011
    • Aceito
      04 Ago 2011
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