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Qualidade de vida de adolescentes após a maternidade

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a influência de variáveis sociodemográficas, obstétricas e neonatais no índice de qualidade de vida de adolescentes após a maternidade. MÉTODOS: Estudo transversal com 96 adolescentes que parturiram em um hospital de ensino, com coleta de dados realizada por meio de questionário aplicado em visita domiciliar. RESULTADOS: Índice Qualidade de Vida geral: 21,48. O domínio socioeconômico teve o menor escore atribuído (17,34) e o domínio família teve o maior escore (25,31). Variáveis estatisticamente significativas: escolaridade materna, renda própria, idade gestacional no momento do nascimento e o número de filhos vivos. CONCLUSÃO: Tais variáveis impactaram negativamente na qualidade de vida das adolescentes.

Qualidade de vida; Enfermagem; Enfermagem materno-infantil; Enfermagem de atenção primária; Adolescente


OBJECTIVE: To evaluate the influence of sociodemographic, obstetric and neonatal variables on the quality-of-life index of adolescents after maternity. METHODS: Cross-sectional study with 96 adolescents who gave birth in a teaching hospital, with data collection done through a questionnaire administered during home visits. RESULTS: Overall quality-of-life index: 21.48. The socioeconomic domain had the lowest score attributed (17.34) and the family domain had the highest score (25.31). Statistically significant variables: maternal level of education, own income, gestational age at birth and number of live children. CONCLUSION: Such variables had a negative impact on the quality of life of the adolescents.

Quality of life; Nursing; Maternal-child nursing; Primary care nursing; Adolescent


ARTIGO ORIGINAL

Qualidade de vida de adolescentes após a maternidade

Fernanda Marçal FerreiraI; Vanderlei José HaasII; Leila Aparecida Kauchakje PedrosaII

ICentro Universitário São Camilo, São Paulo, SP, Brasil

IIUniversidade Federal do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG, Brasil

Autor correspondente Autor correspondente: Leila Aparecida Kauchakje Pedrosa Av. Frei Paulino, 30, Uberaba, MG, Brasil. CEP: 38025-180 leila.kauchakje@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a influência de variáveis sociodemográficas, obstétricas e neonatais no índice de qualidade de vida de adolescentes após a maternidade.

MÉTODOS: Estudo transversal com 96 adolescentes que parturiram em um hospital de ensino, com coleta de dados realizada por meio de questionário aplicado em visita domiciliar.

RESULTADOS: Índice Qualidade de Vida geral: 21,48. O domínio socioeconômico teve o menor escore atribuído (17,34) e o domínio família teve o maior escore (25,31). Variáveis estatisticamente significativas: escolaridade materna, renda própria, idade gestacional no momento do nascimento e o número de filhos vivos.

CONCLUSÃO: Tais variáveis impactaram negativamente na qualidade de vida das adolescentes.

Descritores: Qualidade de vida; Enfermagem; Enfermagem materno-infantil; Enfermagem de atenção primária; Adolescente

Introdução

A gravidez e a maternidade constituem temas relevantes na adolescência devido às potenciais consequências de âmbito social, cultural, legal, psicoemocional e corporal para a jovem.(1,2) A maternidade impõe um processo de amadurecimento em razão das novas responsabilidades psicológicas, sociais e econômicas, para as quais a adolescente pode não estar ainda preparada, o que acaba tendo impacto direto na sua qualidade de vida.(3)

A qualidade de vida é um tema de interesse em saúde em função da complexidade e multifatorialidade dos determinantes que a envolvem.(4) A identificação dos aspectos potencialmente influentes permite uma visão das necessidades percebidas pela comunidade e, assim, melhorar a prática assistencial e gerencial dos serviços de saúde.(5)

A equipe de enfermagem atua na interface entre a comunidade e o serviço de saúde e, por isso, merece destaque na atenção à adolescente que vivencia a maternidade, na perspectiva da qualidade de vida.

O estudo tem como objetivo avaliar o índice de qualidade de vida de adolescentes após a maternidade e a influência de variáveis sociodemográficas, obstétricas e neonatais.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal e descritivo realizado no hospital de ensino na cidade de Uberaba, estado de Minas Gerais, região Sudeste do Brasil. Foram investigadas 96 adolescentes mães, entre 10 e 19 anos, que parturiram em um hospital de ensino, no período de janeiro a dezembro de 2010, independentemente do tipo de parto, da paridade e do tempo gestacional no momento do parto.

O instrumento de pesquisa foi um questionário elaborado com base nas variáveis de estudo. A estratégia adotada para a coleta de dados foi a aplicação do questionário em visitas domiciliares às adolescentes, que ocorreram entre maio e julho de 2011.

As variáveis sociodemográficas selecionadas para o estudo foram: idade no momento do parto, idade no momento da entrevista, situação conjugal, ocupação, escolaridade, principal meio de informação utilizado, número de membros da família, renda média mensal familiar e possuir renda própria. As variáveis de histórico ginecológico, obstétrico e os antecedentes neonatais investigados foram: idade do recém-nascido, número de gestações, número de partos, número de abortos, idade gestacional no momento do último parto, tipo de parto, complicação materna na última gravidez, má-formação neonatal, assistência hospitalar neonatal especializada, número de filhos vivos e aleitamento materno.

Para avaliação da qualidade de vida foi utilizada a versão genérica do Índice de Qualidade de Vida – IQV, que mensura a qualidade de vida em geral e subdivide seus itens em quatro domínios, para o quais gera as respectivas pontuações do escore: Saúde e funcionamento; Psicológico e Espiritual; Família e Socioeconômico.(6) A pontuação varia na faixa de 0-30, para todas as versões, sendo que quanto maior o escore final maior a qualidade de vida.

O gerenciamento dos dados e o cálculo dos escores do Índice de Qualidade de Vida foram feitos através do software Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 11.5 e da sintaxe computadorizada do índice de qualidade de vida.(6) Utilizou-se análise pelo Teste T para amostras independentes para variáveis quantitativas e categóricas, verificando-se se os resultados obtidos foram estatisticamente significativos (p<0,05), considerando que os valores de p deveriam ser interpretados na hipótese de que a casuística constitui uma amostra aleatória simples de uma população com características semelhantes.

O desenvolvimento do estudo atendeu às normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.

Resultados

No período em estudo 20,8% dos nascimentos foram de mães adolescentes. Destes, o universo de adolescentes selecionadas para a pesquisa foi constituído por 144 mães que se enquadraram nos critérios de inclusão, dentre as quais 96 entrevistas foram válidas, uma vez que foram registradas 48 perdas.

Para as jovens entrevistadas, a média do escore geral do índice de qualidade de vida, considerando todos os domínios avaliados foi de 21,48 pontos, com variação de 16,84 pontos entre o menor e o maior valor atribuído. A avaliação por domínios da qualidade de vida indica que os aspectos mais afetados são os socioeconômicos, enquanto as questões relacionadas com a família apresentaram maior média de escore. Dentre os itens componentes da qualidade de vida, aquele com maior e aquele com menores médias de escores relacionaram-se, respectivamente, aos filhos das adolescentes e ao fato de não desenvolverem atividades com vínculo empregatício (Tabela 1).

Dentre as variáveis sociodemográficas investigadas, a comparação do escore do domínio socioeconômico com a escolaridade foi estatisticamente significativa (Tabela 2), indicando que quanto maior a escolaridade maior a qualidade de vida para esse aspecto da vida. A maioria das adolescentes (79,2%) percebeu a importância da instrução formal, identificando-a como necessária para ocupar uma posição no mercado de trabalho e melhorar a sua condição econômica, mesmo que o retorno à escola não fosse previsto em curto prazo.

A variável renda própria foi significativa para o domínio socioeconômico (Tabela 2), indicando que há certa preocupação com a situação de dependência econômica, reforçada pelo fato de que "Não ter um trabalho" está entre os escores mais baixos do instrumento avaliativo. As demais variáveis sociodemográficas analisadas não foram estatisticamente significativas para nenhum domínio nem para o índice de qualidade de vida geral.

Quanto às variáveis obstétricas e de antecedentes neonatais, o número de filhos vivos foi estatisticamente significativo para o índice de qualidade de vida geral e para os domínios saúde e funcionamento e família (Tabela 2).

Os resultados do presente estudo apontam que a prematuridade (≤36 semanas) teve impacto negativo no domínio saúde e funcionamento da qualidade de vida das adolescentes (Tabela 2). As demais variáveis obstétricas e neonatais investigadas não apresentaram diferença estatística significativa na análise do IQV geral e por domínios.

Discussão

As limitações dos resultados deste estudo estão relacionadas ao desenho transversal, que não permite o estabelecimento de relações causais, a população do estudo, adolescentes provenientes de um serviço público de saúde local e a dificuldade da busca ativa domiciliar, que gerou 33% de perdas na população do estudo. Os resultados contribuem para o entendimento de aspectos impactantes na qualidade de vida das adolescentes mães e sinalizam a importância de uma visão integral das jovens, para que a assistência em saúde seja mais efetiva e contínua após o nascimento da criança.

A investigação apontou que ter mais de um filho vivo está diretamente relacionado com sobrecarga na vivência da maternidade, influenciando de forma negativa na qualidade de vida das jovens, mostrando que a reincidência da gravidez na adolescência é uma situação que merece atenção. Apesar disso, há aceitação sociocultural da maternidade adolescente no grupo estudado, indicada pela grande valoração do domínio família.

Estatísticas do hospital de ensino em que as adolescentes investigadas neste estudo parturiram acompanham a estimativa nacional dos nascidos vivos filhos de mulheres nessa fase da vida, estimativa que é de 10 a 20%.(7)

Os resultados para média geral da qualidade de vida do grupo de adolescentes estudado ficou, respectivamente, 1,80 e 4,34 pontos abaixo dos resultados registrados em outros estudos, que também utilizaram o índice de qualidade de vida para avaliar mulheres grávidas e após o nascimento da criança, incluindo mulheres adolescentes, e que mostram médias gerais do referido escore de 23,28 e 25,82.(5,8)

Os escores por dimensão da qualidade de vida do presente estudo reforçam a valorização da instituição familiar pelos jovens e a representatividade enquanto base de apoio, independentemente da percepção que eles têm da convivência entre os membros familiares.(9)

A análise dos itens mais e menos pontuados do instrumento avaliativo, considerando a relação entre a satisfação e a importância atribuída, revela que há uma mudança de foco na vida das adolescentes em consequência da incorporação do papel materno, valorando os filhos como o melhor aspecto da vida.

O item "não ter um trabalho" teve o pior escore, sendo também apontado em estudo com grávidas,(5) e em situação de puerpério mediato.(8) As condições econômicas e a questão da dependência parecem preocupar as mulheres durante a gravidez e após o nascimento da criança, sem distinção de idade materna, e influenciam negativamente a sua qualidade de vida.

Os resultados para a relação entre as variáveis sociodemográficas e a qualidade de vida corroboram os achados de um estudo, segundo os quais após a maternidade, o planejamento da vida profissional passa a ser uma preocupação longínqua.(10) Mas as narrativas de adolescentes também indicam que a impossibilidade de continuar estudando é uma das perdas sofridas em consequência da maternidade.(11)

Embora exista uma relação diretamente proporcional entre a escolaridade e a qualidade da vida socioeconômica, mesmo entre as jovens com menor escolaridade [para as quais o impacto sobre o domínio socioeconômico seria negativo, de acordo com a relação observada para essas variáveis] parece haver um conformismo social quanto ao poder aquisitivo delas, uma vez que a comparação dos escores de qualidade de vida, geral e por domínios, com a renda per capita das famílias não aponta diferenças estatísticas significativas.

Os escores de qualidade de vida foram inferiores para as adolescentes que têm mais de um filho vivo, reforçando que o impacto negativo está mais relacionado à vivência da maternidade do que ao número de gravidezes. Os resultados do presente estudo sustentam a hipótese de que o impacto negativo sobre a vida da jovem está relacionado diretamente ao desfecho da gravidez, ou seja, a maternidade ou mais uma gestação interrompida. Assim, a afirmação de que "pior que uma gravidez na adolescência é a sua repetição" é aplicável ao grupo estudado, desde que o desfecho da gravidez sucessiva tenha sido o nascimento de mais um filho vivo, o que ressalta a importância do planejamento familiar às jovens mães.(12)

Conclusão

A avaliação por domínios da qualidade de vida indicou que os aspectos mais afetados foram os socioeconômicos, enquanto as questões relacionadas com a família apresentaram maior média de escore. Dentre os itens componentes da qualidade de vida, aquele com maior e com menor média de escore relacionaram-se respectivamente, aos filhos das adolescentes e ao fato de não desenvolverem atividades com vínculo empregatício.

Colaborações

Ferreira FM; Haas VJ e Pedrosa LAK declaram que contribuíram com a concepção e projeto, análise e interpretação dos dados; redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual e aprovação final da versão a ser publicada.

Submetido 15 de Abril de 2013

Aceito 6 de Junho de 2013

Conflitos de interesse: Não há conflitos de interesse a declarar.

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  • Autor correspondente:

    Leila Aparecida Kauchakje Pedrosa
    Av. Frei Paulino, 30, Uberaba, MG, Brasil. CEP: 38025-180
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      15 Abr 2013
    • Aceito
      06 Jun 2013
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