Acessibilidade / Reportar erro

Resolutividade na atenção à saúde da criança: percepção de pais e cuidadores

Resumos

OBJETIVO: Compreender como ocorre a resolutividade do problema de saúde do filho na visão de pais e cuidadores, a partir dos atributos da atenção primária à saúde. MÉTODOS: Pesquisa qualitativa com abordagem hermenêutico-dialética, envolvendo 16 cuidadores de crianças menores de um ano, atendidas em serviços de pronto atendimento. RESULTADOS: Falta de acesso, ausência de vínculo e coordenação, privação do cuidado integral contribui para não resolutividade, levando a busca por soluções alternativas para resolver os problemas de saúde das crianças. CONCLUSÃO: Na apreensão do estudo observa-se que os serviços de atenção primária não se mostram resolutivos diante dos problemas de saúde das crianças, visto que, os atributos essenciais para efetividade nesse ponto de atenção não estiveram presentes.

Saúde da criança; Enfermagem de atenção primária; Enfermagem pediátrica; Resolução de problemas; Cuidados de enfermagem; Cuidadores


OBJECTIVE: Understand how the health problems of a child are solved in the perspective of parents and caregivers, based on the attributes of primary health care. METHODS: Qualitative study using a hermeneutic-dialectic approach involving 16 caregivers of children younger than one year old, assisted at an emergency unit. RESULTS: Lack of access, absence of bonding and coordination, and comprehensive care deprivation contribute to the lack of resolvability, leading to a search for alternatives to solve the health problems of children. CONCLUSION: As observed, primary health care services demonstrate no problem-solving capacity in children's health problems, as the essential attributes for the effectiveness of such care were not present.

Child health; Primary care nursing; Pediatric nursing; Problem solving; Nursing care; Caregivers


ARTIGO ORIGINAL

Resolutividade na atenção à saúde da criança: percepção de pais e cuidadores

Rosane Meire Munhak da SilvaI; Cláudia Silveira VieraII; Beatriz Rosana Gonçalves de Oliveira TosoII; Eliane Tatsch NevesIII; Rosa Maria RodriguesII

IUniversidade Estadual do Oeste do Paraná, Foz do Iguaçu, PR, Brasil

IIUniversidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavel, PR, Brasil

IIIUniversidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil

Autor correspondente Autor correspondente: Rosane Meire Munhak da Silva Av. Tarquínio Joslin dos Santos, 1600 Foz do Iguaçu, PR, Brasil. CEP: 85870-650 zanem2010@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Compreender como ocorre a resolutividade do problema de saúde do filho na visão de pais e cuidadores, a partir dos atributos da atenção primária à saúde.

MÉTODOS: Pesquisa qualitativa com abordagem hermenêutico-dialética, envolvendo 16 cuidadores de crianças menores de um ano, atendidas em serviços de pronto atendimento.

RESULTADOS: Falta de acesso, ausência de vínculo e coordenação, privação do cuidado integral contribui para não resolutividade, levando a busca por soluções alternativas para resolver os problemas de saúde das crianças.

CONCLUSÃO: Na apreensão do estudo observa-se que os serviços de atenção primária não se mostram resolutivos diante dos problemas de saúde das crianças, visto que, os atributos essenciais para efetividade nesse ponto de atenção não estiveram presentes.

Descritores: Saúde da criança; Enfermagem de atenção primária; Enfermagem pediátrica; Resolução de problemas; Cuidados de enfermagem; Cuidadores

Introdução

Estratégias governamentais implementadas por políticas públicas de saúde à criança possibilitam reduzir causas que levam ao adoecimento infantil, aliadas a ações de distribuição de renda que potencializam as políticas assistenciais.(1,2) Este cenário pode ser demonstrado, por exemplo, pelos resultados nos índices de Mortalidade Infantil alcançados, visto que na época do Brasil colonial, a mortalidade infantil atingia 700/1000 nascidos vivos, atualmente o país mostra um índice de 16/1000 nascidos vivos.(3)

A mortalidade no período neonatal permanece elevada, pois 60% de mortes precoces poderiam ser evitadas pelo acesso em tempo adequado a serviços de saúde de qualidade e resolutivos.(1,2) Esse panorama mostra à existência de políticas de saúde voltadas a saúde infantil e disponibilização de serviços da Atenção Primária à Saúde às famílias e suas crianças, no entanto, não há repercussão intensa na redução da morbimortalidade por causas evitáveis. A falta de ações preventivas e de promoção da saúde faz com que a morbimortalidade evitável continue acontecendo, associadas à vulnerabilidade da atenção primária à saúde.(4)

Um sistema de saúde resolutivo é entendido como resposta social às necessidades de saúde. Define-se resolutividade como capacidade de solucionar problemas de saúde de pessoas em situação de vulnerabilidade social e biológica, como a criança, independente da complexidade ou nível de atenção.(5) Esta capacidade deve estar norteada pela atenção primária à saúde, apreendida pelo seguimento à seus atributos, quais sejam, acesso, longitudinalidade, integralidade e coordenação, somados a atributos complementares, família, comunidade e cultura.(6)

Resolver os problemas de saúde das crianças nestas dimensões significa que as ações devem direcionar-se ao contexto amplo de saúde, conduzidas pelo cuidado integral, pelo seguimento de elementos essenciais, como: movimento, interação, alteridade, plasticidade, projeto, desejo, temporalidade, não-causalidade e responsabilidade.(7)

O objetivo deste estudo foi compreender como ocorre a resolutividade do problema de saúde do filho na visão de pais e cuidadores, a partir dos atributos da Atenção Básica.

Métodos

Estudo qualitativo ancorado no referencial metodológico da hermenêutica-dialética. A hermenêutica parte da experiência concreta do encontro ou alteridade, não se limita a uma repetição lógica do método tradicional do pensar, busca ampliar horizontes do pensamento pela compreensão e interpretação.(8) A dialética emerge como proposta para discutir perspectivas de resolutividade no adoecer da criança.

A população do estudo foi constituída por crianças menores de um ano e suas famílias atendidas nas Unidades de Pronto Atendimento da cidade de Cascavel, estado do Paraná, região sul do Brasil em 2010. Selecionou-se aleatoriamente 16 sujeitos residentes na área urbana do município. Estes foram contatados por telefone e, em seguida, receberam visita domiciliar para realização da entrevista. A coleta de dados documental foi nos setores de arquivo das unidade pronto atendimento e as entrevistas nas residências das famílias, no período de março a maio de 2012.

Por se tratar de pesquisa de abordagem qualitativa, a soma das entrevistas não foi relevante para a proposta metodológica, mesmo fazendo parte da práxis compreensiva. Quando os resultados passaram a gerar constructo e responder aos questionamentos iniciais, concluiu-se a coleta de dados.(9) Três técnicas de coleta foram utilizadas: inquérito domiciliar; mapas falantes; entrevista semiestruturada.(10)

A construção dos resultados seguiu três passos, a saber: leituras das entrevistas transcritas buscando familiarizar-se com o texto e identificar significados; identificação de conexões significativas, compondo a leitura interpretativa; interpretação do todo, efetuando-se reflexão da leitura inicial perpassando a leitura interpretativa, obtendo a compreensão ampla dos dados, descrevendo temas e subtemas para discussão, a qual foi balizada nos referenciais dos atributos da Atenção Primária a Saúde(6) e elementos do cuidado integral.(7,8)

O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.

Resultados

Emergiram no tema resolutividade à saúde da criança subseções que demonstram dificuldades e impedimentos para resolver os problemas de saúde das crianças, descritos a seguir.

Falta de acesso, ausência de vínculo e coordenação dos serviços de saúde contribuindo para a não resolutividade

Apesar das transformações no pensar saúde atualmente, acrescida aos avanços tecnológicos, muitas pessoas ainda encontram dificuldades no acesso aos serviços para resolver os problemas de saúde de suas crianças.

"[...] para começar fazer o tratamento, é muito complicado. Que nem meu neto [...] tinha adenoide e fez a cirurgia, só que levou um ano e três meses para conseguir a cirurgia" (sujeito 10).

Somado ao acesso, os serviços de Atenção Primária a Saúde devem apresentar como ferramenta essencial para o cuidado o acolhimento. Na ausência do acolhimento, dificilmente se estabelecerá vínculo entre profissionais e familiares.

"[...] tem horas que as meninas [recepcionistas] [...] atendem bem, tem hora que não. Tem hora que se você for pedir alguma coisa já levantam para as dez" [refere-se ao atendimento agressivo] (sujeito 8).

O desinteresse e não responsabilização adicionou-se como propriedades para a não resolutividade para esta realidade.

"[...] a profissional que me atendeu [médica] se tivesse mais interesse em cuidar da saúde dele [filho], o que teria feito? Ido mais além, teria feito mais alguma coisa [...], mas simplesmente me receitou um paracetamol [...]" (sujeito 4).

Para alcançar resolutividade é preciso um serviço de Atenção Primária a Saúde coordenado, ou seja, planejado e organizado, com vistas a atender as pessoas de forma eficiente, ágil e resolutiva, esgotando todas as possibilidades de atenção a saúde, antes de realizar encaminhamentos.

"A gente devia ir consultar, se a criança estivesse mal, consultar aqui [Unidade Básica de Saúde] que é mais perto [...]" (sujeito 9).

Deficiência do cuidado integral gera a não resolutividade

Para obter resolutividade na atenção à saúde da criança é fundamental ter um serviço guiado pelo cuidado integral. Para tanto, é necessário que os serviços considerem determinantes sociais para cuidar. O relato a seguir ressalta que essa compreensão de integralidade e resolutividade não foram consideradas pelos serviços públicos de saúde.

"No meu caso que sou mãe de cinco filhos, resolve o quê? [...] O que seria 100% pra mim? Seria um bom atendimento, ter um lugar pra deixar eles [filhos] [...]. Porque se ele [filho] estivesse na creche e tivesse um probleminha, elas [educadoras] tem como levar ali [UBS], [...] eu não disponho de nada" (sujeito 12).

Para complementar esta concepção sobre os determinantes sociais, serviços de saúde resolutivos voltados à integralidade devem oferecer condições para que as famílias cuidem de suas crianças.

"[...] acho que o governo tinha que mandar mais medicamentos, porque tem muitas pessoas que não tem condições de comprar, e como faz? [...] como que a mãe vai comprar se não tem dinheiro, é difícil. [...] Assim a mãe sempre vai conseguir cuidar de sua criança" (sujeito 8).

O olhar biológico, o qual desconsidera o contexto social familiar, dificilmente proporcionará felicidade às pessoas, pois esse olhar sumariza-se em solução do problema imediato e deixa de perceber o que levou o adoecer da criança.

"[...] a médica deixou a desejar, tanto é que nunca mais a procurei. [...] tem médicos que vão bem além, veem o que está acontecendo [...] vamos descobrir o que é, onde está, ir além, é deixar o paciente feliz. Ele já está com dor, vai procurar o médico, vai procurar para ficar bem. O médico precisa se empenhar fazer seu papel como se fosse para alguém da família [...]. [...] falam [profissionais] assim, querem tudo do bom e do melhor. Não é do bom e do melhor, a gente quer o necessário [...]" (sujeito 4).

Contrapondo-se ao relato anterior, emerge a compreensão que resolutividade é sinônimo de tratamento de doenças, ou seja, o cuidado na concepção biológica.

"[...] eu considero ir consultar, passar um remédio, ver se está tudo certinho. [...] que nem eles fizeram um raio -X , eu achei que foi bom [...]" (sujeito 3).

A dispensação de fármacos, realização de exames laboratoriais e imagem também foram apreciados para um serviço de saúde resolutivo no adoecer das crianças.

"Acho que tem que ser mais rápido, não ficar com essa demora [...]. Falo dos exames [...] tem que esperar muitos dias, se a pessoa está bem ruim, [...] acaba ficando pior ainda [...]. E não faltar remédio também, eu tomo um remédio controlado [...] agora a médica falou que esse não vai vir mais, vou ter que comprar" (sujeito 10).

"[...] você levar para consultar, ser atendido, não demorar muito [...] e sair medicado [...]. E não demorar muito se precisar fazer exames [...]" (sujeito 14).

Para os cuidadores, os profissionais de saúde encontram-se despreparados para a integralidade no atendimento às crianças.

"[...] acho também que falta mais organização da recepção, orientações para elas [recepcionistas]. Os médicos que ficam lá atrás [consultórios] não veem o que está acontecendo [...] vai que morre lá na frente" (sujeito 1).

Busca por soluções alternativas para resolver problemas de saúde

Diante da não resolutividade dos problemas de saúde dos filhos, as famílias buscam alternativas que, muitas vezes, podem auxiliar ou prejudicar o cuidado à criança. Como alternativa auxiliar, a busca por ajuda em entidades religiosas foi mencionado.

"Ela [pediatra] me deu um monte de remédios [...], eu falei vou recorrer a pastoral da criança. Na pastoral [...] eu trato meu filho hoje, com os remédios da pastoral, eu dou remédio para anemia, eu dou tudo" (sujeito 12).

Somado a expectativa de ajuda em entidades religiosas, emergiu também espiritualidade e fé como forma de solucionar problemas de saúde dos filhos.

"[...] não comprei o leite [indicado pela pediatra devido à possível alergia a lactose], vim pra casa, rezei [...]" (sujeito 13).

Como alternativa prejudicial, descreveu-se a procura direta por medicamentos em farmácias sem o aconselhamento médico. E ainda, a exigência de receitas médicas para a compra de antibióticos percebida como empecilho para o cuidado à criança.

"E agora nas farmácias não vende mais antibiótico, então é só com receita [...]" (sujeito 6).

Este cenário nos serviços públicos de saúde fez e faz com que as famílias procurem atenção em serviços privados, demonstrando a ausência de acesso, coordenação, longitudinalidade e integralidade.

"[...] levei ele no posto, o pediatra pediu vários exames, [...] apareceu uma febre repentina [...], fui ao laboratório, colhi os exames e os resultados não deram nada. Ele não melhorou, peguei os exames e levei ao médico particular, que passou um medicamento. [...] ele melhorou [...]" (sujeito 4).

"[...] na hora que você precisa não tem [...] tem que esperar e até esse esperar você tem que procurar um particular. [...] se eu sair agora e quero marcar uma consulta pro meu filho eu consigo [...], mas ele não está precisando agora [...]" (sujeito 13).

Por fim, as famílias deixam de buscar atenção nos serviços públicos de saúde pela não resolutividade na atenção à saúde dos filhos.

"[...] agora eu não estou indo mais, porque vou e fico perdendo tempo, então não vou mais" (sujeito 8).

Deste modo, frente a essas dificuldades, as famílias preferiram buscar atenção à saúde dos filhos em serviços de pronto atendimento, denominado Posto de Atendimento Continuado.

Esta busca aconteceu devido a empecilhos para acesso aos serviços de Atenção Primária a Saúde; falta de organização dos serviços de APS; ausência de acolhimento e responsabilização; morosidade nos atendimentos; entre outros.

Discussão

Esta pesquisa oferece subsídios para que profissionais e gestores atuantes na APS reflitam sobre suas práticas e invistam no aprimoramento de ações para potencializar a resolutividade na atenção à saúde da criança, uma vez que, os serviços de saúde do município estudado não apresentaram resolutividade às questões de saúde aduzidas por crianças menores de um ano.

O estudo apresentou como limitações a percepção das famílias, sendo que, a implementação das sugestões citadas requer também a visão dos profissionais que atuam em diversos pontos de atenção, como exemplo, a enfermagem.

A falta de resolutividade foi evidenciada pelo não seguimento aos atributos da Atenção Primária a Saúde. Esta pode ser obtida pelo acesso aos serviços, contudo, para esta realidade, esta busca esteve distante. Salienta-se que o acesso preferencial para o cuidado à saúde é a Atenção Primária à Saúde, mas diante da demora no atendimento nesses serviços, os cuidadores procuraram alternativas consideradas acessíveis para resolver seus problemas.(6)

A procura por serviços que não caracterizem a entrada prioritária ao sistema resulta em demanda colossal em serviços de urgência e emergência e descontentamento familiar por não receberem a atenção necessária, uma vez que estes não dispõem de responsabilização pela continuidade do cuidado.(4,7) Essa forma de organização sem projeto para cuidar visto pelo aumento de demandas espontâneas e sumarização da atenção a problemas agudos, refletem a não resolutividade.(4-6)

Outro problema referiu-se a falta de acolhimento às famílias, gerando um ambiente de desconfiança para o cuidado.(1,11) A longitudinalidade acontece mediante um ambiente de confiança construído ao longo do tempo, somente assim, o cuidado será próspero e se alcançará resolutividade.(4,6)

O desinteresse e não responsabilização também elencada pelas famílias, levou igualmente a não resolutividade.(7,12) Tais percepções demonstraram ausência de alteridade e interação dos profissionais de saúde, inclusive evidenciaram a carência da escuta, impedindo essencialmente a fusão de horizontes.(13)

Em relação à integralidade, toma-se como norte o olhar à criança que resgate suas subjetividades e a considere sujeito social e de direitos, pertencente a uma família que também necessita ser cuidada.(4,7,14) Essa concepção é possível se considerar os determinantes sociais para o cuidado à criança, sejam, econômicos, habitacionais, alimentares, educacionais, entre outros, caracterizando uma resposta social aos problemas infantis.(4,14) Essa compreensão para a concretude da resolutividade não esteve presente neste estudo, bem como, notou-se a falta de condições mínimas para que famílias cuidem de suas crianças, construídas pelo movimento do cuidar.(4,7)

Salienta-se que a busca pelo cuidado resolutivo edifica-se em um cuidado além do biológico, a nãocausalidade.(7) Este envolve a apreensão do ser humano como indivíduo com subjetividades encontrado em condições vulneráveis.(5,14) No entanto, esta condição momentânea não deve ser interpretada como um estado condicionado à decisão do profissional, mas refletida conjuntamente ao sujeito a ser cuidado, no caso da criança, a seus responsáveis. Para que assim, seja alcançado sucesso prático propiciando felicidade. O acolhimento e responsabilização são excelentes maneiras de proporcionar felicidade.(11-13,15)

Contrapondo-se a essa argumentação, algumas famílias compreendem que resolutividade é sinônimo de tratamento de doenças, sinalizando apenas à causalidade. Tal argumentação demonstra o quanto às famílias tornam-se vítimas de um sistema de saúde enfraquecido. Essa concepção reducionista, centrada na fragmentação do cuidado e incitada pela indústria médica farmacêutica emerge entre muitos profissionais envoltos pela falta de alteridade e plasticidade.(7) Isto faz com que informações inadequadas cheguem às famílias, tornando-as vulneráveis em meio à nossa sociedade capitalista.

Para enfrentar essa problemática e resolver de fato problemas de saúde é preciso haver coordenação, para atender as necessidades de forma ágil e plena. Contudo, os serviços de saúde encontram-se frágeis, com trabalhos isolados e não padronizados, resultando em ações fragmentadas e pouco resolutivas.(6) Esse contexto denota as condições disponíveis aos serviços da APS, que os faz prestar assistência e não atenção à saúde, mesclando elementos da APS seletiva e como primeiro nível de atenção do Sistema Único de Saúde (SUS), caracterizando o pano de fundo de muitos problemas enfrentados pela APS no país. Serviços com o atributo coordenação presente atendem as crianças de forma programada e não apenas espontaneamente.(4)

Os serviços de APS mostraram-se vulneráveis devido à morosidade e indisponibilidade nos momentos que necessitam. Esta vulnerabilidade relacionou-se a falta de serviços de apoio para esgotar as possibilidades de soluções antes de encaminhar a outras esferas de atenção.(4,6) E ainda, os serviços de referência apresentaram-se poucos funcionais e lentos, provando a ausência de longitudinalidade. Este fato levou as famílias, mesmo que em dificuldades financeiras, a onerarem-se na tentativa de resolver o problema de saúde do filho. Tais considerações denotaram ausência de desejo, projeto e movimento para cuidar.(7)

Para além da situação econômica, a ausência de desejo, projeto e movimento também pressupôs o despreparo dos profissionais ao atender às crianças.(7) A coordenação presente em um serviço tende a capacitar seus membros de forma competente e satisfatória, envolvendo todos que participam do serviço. Uma equipe preparada acolhe seu usuário e apresenta soluções para seus problemas de saúde, mesmo que não resulte em uma consulta médica. Às vezes, um diálogo é suficiente para resolver o problema que os afligem.(4,6,12,13,15)

Coordenação também envolve prestação de serviços em tempo preciso, reduzindo ao menor tempo sofrimento das pessoas.(9) Somado à agilidade na atenção a saúde, a disponibilização de tecnologias possibilita reorganizar e transformar as práticas de saúde voltadas à atenção integral e resolutividade a saúde da criança.(14)

Por não obterem resolutividade, as famílias buscaram alternativas para resolver problemas de saúde, mesmo que dentre as soluções, algumas os afetaram negativamente. A procura por ajuda em entidades religiosas, espiritualidade e fé emergiram como auxiliares do cuidado, mas a busca direta por medicamentos apareceu como prejudiciais. Esta procura aconteceu por ser entendida como solução imediata. E ainda, fez também com que buscassem atenção em serviços privados,(6) mesmo sem possuir condições econômicas favoráveis para esta busca, colaborando para potencializar suas precárias condições de subsistência.

Este cenário levou muitas famílias a deixar de procurar estes serviços, desacreditando que o setor público de saúde pode ou poderá colaborar com o cuidado às crianças.

Salienta-se o valor de que políticas públicas e práticas profissionais tenham como horizonte concreto, a resolutividade na APS, seja para evitar iatrogenias inerentes a práticas assistemáticas ou descomprometidas, seja para efetivar a integralidade em continuidade exclusivamente aos casos impossíveis de serem tratados neste nível assistencial. Longe de significar focalização da assistência a nível primário, oferecendo assistência pobre para pobres, a resolutividade deve ser o alicerce sobre o qual se sustenta o SUS implementado em sua plenitude, foco da luta dos profissionais e da população.

Conclusão

Na apreensão da compreensão dos pais e cuidadores o serviço não se apresentam resolutivos diante dos problemas de saúde das crianças, visto que, atributos essenciais da Atenção Primária a Saúde não estiveram presentes. Tendo em vista que, inúmeros problemas foram identificados, como, falta de acesso e morosidade na atenção às crianças; ausência de vínculo desencadeado pelo desinteresse e não responsabilização; carência da integralidade; falta de organização dos serviços pela privação da coordenação.

Agradecimentos

Pesquisa realizada com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, aprovado no Edital Universal 014/2010.

Colaborações

Silva RMM e Viera CS contribuíram com a concepção do projeto, análise e interpretação dos dados. Silva RMM; Viera CS; Toso BRGO; Neves ET e Rodrigues RM colaboraram com a redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual aprovação da versão final a ser publicada.

Submetido 30 de Agosto de 2013

Aceito 7 de Novembro de 2013

Conflitos de interesse: não há conflitos de interesse a declarar.

  • 1. Momoi C, Vasconcelos SRS, Silva EM, Strufaldi MW, Terao SM, Puccini RF. [Child health: risk factors applied in programs of primary health care]. Acta Paul Enferm. 2012;25(2):231-7. Portuguese.
  • 2. Victora CG, Aquino EM, Carmo Leal M, Monteiro CA, Barros FC, Szwarcwald CL. Maternal and child health in Brazil: progress and challenges. Lancet. 2011;377(9780): p. 1863-76.
  • 3. Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Committing to child survival: a promise renewed. New York (USA); 2012.
  • 4. Oliveira BR, Viera CS, Collet N, Lima RA. [Causes of hospitalization in the National Healthcare System of children aged zero to four in Brazil]. Rev Bras Epidemiol. 2010;13(2):268-77. Portuguese.
  • 5. Lantz PM, Lichtenstein RL, Pollack AH. Health policy approaches to population health: the limits of medicalization. Health Affairs. 2007;26(5):1253-7.
  • 6. Starfield B. Atenção primária: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília: UNESCO, MS; 2002. 726p.
  • 7. Ayres JR. [Care and reconstruction in healthcare practices]. Interface (Botucatu). 2003/2004;8(14):73-92. Portuguese.
  • 8. Gadamer H. Verdade e método: Traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Tradução de Ênio Paulo Giachini. 4a ed. Petrópolis: Vozes; 2002. 731 p.
  • 9. Streubert HJ, Carpenter DR. Phenomenology as method. In: Streubert HJ, Carpenter DR, editors. Qualitative research in nursing: Advancing the humanistic imperative. 5th ed. Philadelphia: Lippincott Willians & Wilkins. 2011. p. 72-95
  • 10. Pacheco ST, Cabral IE. [Feeding the baby with low birth weight at home: family coping and challenges for nursing care]. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2011;15(2):314-22. Portuguese.
  • 11. Lima MA, Ramos DD, Rosa RB, Nauderer TM, Davis R. [Access and quality care in health care centers from the users' point of view]. Acta Paul Enferm. 2007;20(1):12-7. Portuguese.
  • 12. Pina JC, Mello DF, Mishima SM, Lunardelo SR. [Contribution of a shelter-based Integrated Management of Childhood Illnesses Program for children under the age of five years]. Acta Paul Enferm. 2009;22(2):142-8. Portuguese.
  • 13. Ayres JR. [Norms and human development: philosophical horizons for evaluation practices in the context of health promotion]. Cienc Saúde Coletiva. 2004;9(3):583-92. Portuguese.
  • 14. Figueiredo GL, Mello DF. [Child health care in Brazil: aspects of program vulnerability and human rights]. Rev Latinoam Enferm. 2007;15(6):1171-6. Portuguese.
  • 15. Ayres JR. [Hermeneutics and humanization of the health practices]. Cienc Saúde Coletiva. 2005;10(3):549-60. Portuguese.
  • Autor correspondente:

    Rosane Meire Munhak da Silva
    Av. Tarquínio Joslin dos Santos, 1600
    Foz do Iguaçu, PR, Brasil. CEP: 85870-650
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Nov 2013
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      30 Ago 2013
    • Aceito
      07 Nov 2013
    Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actapaulista@unifesp.br