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Busca ativa para conhecer o motivo da evasão de usuários em serviço de saúde mental

Resumos

OBJETIVO: Realizar a busca ativa de usuários que evadiram de um Centro de Atenção Psicossocial tipo I há mais de 30 dias, a fim de conhecer o motivo do abandono do tratamento. MÉTODOS: Pesquisa transversal realizada com 24 usuários que evadiram do serviço há mais de 30 dias. O instrumento de pesquisa foi um questionário sobre dados socioeconômicos, diagnósticos médicos, medicamentos em uso e motivos que levaram a evasão. RESULTADOS: Dos participantes, 67% eram homens, com médias de idade de 40 anos. Prevaleceram os diagnósticos de transtornos decorrentes do uso de substâncias psicoativas, sendo este também o principal motivo de abandono do tratamento. CONCLUSÃO: A busca ativa revelou que os dependentes de substâncias psicoativas são mais prevalentes no abandono do tratamento.

Enfermagem em saúde comunitária; Saúde mental; Cuidados de enfermagem; Prática avançada de enfermagem; Pacientes desistentes do tratamento


OBJECTIVE: To conduct an active surveillance of users who withdrew themselves from a type I Center for Psychosocial Care over 30 days in order to know the reason for dropping out the treatment. METHODS: Cross-sectional research conducted with 24 users who withdrew themselves from treatment for more than 30 days. The research instrument was a questionnaire on socioeconomic data, medical diagnoses, current medication and leading reasons to withdrawals. RESULTS: From the participants, 67% were male with a mean age of 40 years. The disorders diagnosis, which prevailed, were the ones caused by substance abuse, which is also the main reason of withdrawals from treatment. CONCLUSION: The active surveillance revealed that psychoactive substance dependents are more prevalent in treatment withdrawals.

Community health nursing; Mental health; Nursing care; Advanced practice nursing; Patient dropouts


ARTIGO ORIGINAL

Busca ativa para conhecer o motivo da evasão de usuários em serviço de saúde mental

Maria Odete PereiraI; Aluana AmorimII; Vanessa VidalII; Mara Filomena FalavignaII; Márcia Aparecida Ferreira de OliveiraI

IEscola de Enfermagem, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

IIFaculdades Integradas Teresa D'Ávila, Lorena, SP, Brasil

Autor correspondente Autor correspondente: Maria Odete Pereira Av. Doutor Enéas de Carvalho Aguiar, São Paulo, SP, Brasil. CEP: 05403-000 mariaodete@usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Realizar a busca ativa de usuários que evadiram de um Centro de Atenção Psicossocial tipo I há mais de 30 dias, a fim de conhecer o motivo do abandono do tratamento.

MÉTODOS: Pesquisa transversal realizada com 24 usuários que evadiram do serviço há mais de 30 dias. O instrumento de pesquisa foi um questionário sobre dados socioeconômicos, diagnósticos médicos, medicamentos em uso e motivos que levaram a evasão.

RESULTADOS: Dos participantes, 67% eram homens, com médias de idade de 40 anos. Prevaleceram os diagnósticos de transtornos decorrentes do uso de substâncias psicoativas, sendo este também o principal motivo de abandono do tratamento.

CONCLUSÃO: A busca ativa revelou que os dependentes de substâncias psicoativas são mais prevalentes no abandono do tratamento.

Descritores: Enfermagem em saúde comunitária; Saúde mental; Cuidados de enfermagem; Prática avançada de enfermagem; Pacientes desistentes do tratamento

Introdução

A busca ativa é um termo muito usado nas vigilâncias epidemiológica e sanitária, bem como na saúde do trabalhador, que a definiu como "ir a procura de indivíduos com o fim de uma identificação sintomática, principalmente das doenças e agravos de notificação compulsória".(1) No entanto, este é um sentido estrito do termo.

Durante uma busca ativa é possível interagir não só com o usuário, de maneira isolada, mas com o mundo que o cerca, seu espaço e território. Entender e conhecer as relações que o usuário cria com sua morada, familiares e sociedade, assim como o grau de envolvimento com os mesmos.(2,3) Permite também avaliar o sofrimento psíquico do usuário e de seus familiares, suas condições e qualidade de vida, avaliar se existem co-morbidades associadas aos transtornos mentais. Enfim, enxergá-lo de forma holística visando não só o tratamento adequado, mas uma melhora na sua qualidade de vida, objetivando a reinserção do mesmo à sociedade.(1-3)

Em busca realizada na Biblioteca Virtual de Saúde - BVS, acerca dos estudos já publicados a respeito da prática de busca ativa, verificamos que entre os anos de 2004 e 2012 foram localizados três trabalhos. O primeiro deles abordou acerca do trabalho de enfermeiras que, por meio da técnica de Busca Ativa, puderam diagnosticar a subnotificação de casos de transtorno mental em um território.(2) O segundo mostrou a eficácia das técnicas de busca ativa e visita domiciliária, realizadas por uma equipe matricial de saúde mental e a capacitação dessa, com relação às técnicas e instrumentos estabelecidos pelo SUS;(3) por fim, terceiro tratou acerca da problematização do trabalho itinerante em saúde mental.(4)

Neste estudo pretendemos realizar a busca ativa de usuários que abandonaram o tratamento em de um Centro de Atenção Psicossocial há mais de 30 dias. Sabemos que a evasão de usuários de serviços de saúde mental é uma realidade, porém ainda não divulgada em trabalho científico, o que determinou a relevância da realização do presente estudo. Em adição, os dados divulgados por este estudo poderão ser utilizados pelos serviços de saúde e Diretorias Regionais de Saúde – DRS, a fim do melhor direcionamento das estratégias na área.

Desse modo, este estudo objetivou reconhecer o motivo da evasão dos usuários do Centro de atenção psicossocial participante.

Métodos

Pesquisa transversal realizada no Centro de Atenção Psicossocial de Lorena, município do Médio Vale do Paraíba Paulista, região sudeste do Brasil, com 24 usuários do serviço que haviam abandonado o tratamento há mais de trinta dias, no período de janeiro a agosto de 2012.

Elaboramos um instrumento semi-estruturado para a coleta dos dados de caracterização sócio-demográfica, levantamento de diagnósticos, medicamentos em uso e motivo de abandono do tratamento.

Os dados foram processados no software Excel® – versão 2010 e apresentados em tabelas e em seguida, em seguida procedemos a análise estatística descritiva dos dados.

O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.

Resultados

Dos 24 usuários que abandonaram o tratamento, 16 eram homens e oito mulheres. A média de idade entre os homens foi de 40 anos e entre as mulheres foi de 51 anos. Estavam em tratamento semi-intensivo 13 usuários e 11 em tratamento intensivo.

Os diagnósticos médicos foram: nove usuários apresentavam transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool e outras drogas; oito apresentavam transtornos esquizofrênicos e esquizotípicos. Dentre os homens, sete apresentaram diagnósticos de transtornos devido ao uso de álcool e outras drogas, e entre as mulheres, três apresentaram transtornos de bipolaridade, depressivos e de humor.

As medicações prescritas, em uso, foram: antipsicóticos (n=9), antidepressivos (n=3) e anticonvulsivantes (n=3). No momento da busca ativa oito estavam fazendo uso de medicamentos.

Durante as visitas de busca, constatamos que o motivo que predominou entre os 24 usuários que abandonaram seus tratamentos foi a dependência de álcool e outras drogas, totalizando um percentual de 41% (n=10). Entre eles 80% (n=8) eram homens e 20% (n=2) mulheres.

Vale ressaltar que dentre os dez usuários dependentes de substâncias psicoativas, um tinha diagnóstico de transtorno psíquico desenvolvido em decorrência dela, identificado no prontuário e que foram confirmados posteriormente, na entrevista, durante a busca ativa.

Na tabela 1 estão os motivos de evasão relatados.

Discussão

A pergunta deste estudo consiste em saber qual foi o motivo da evasão do CAPS e é fato que o abandono do serviço de saúde mental é uma característica marcante entre os usuários, o que dificulta que a assistência a sua saúde seja efetiva.

Neste estudo, os dados contabilizados referentes às variáveis de diagnósticos e motivos de evasão demonstraram que o consumo de substâncias psicoativas e os transtornos decorrentes de seu uso prevaleceram, quando comparados aos demais motivos e diagnósticos. Estes achados são corroborados por outro estudo realizado no mesmo serviço, que também identificou os transtornos comportamentais devido ao uso de substâncias psicoativas como os diagnósticos mais prevalentes.(5,6) Este dado indica o perfil epidemiológico do município em questão, já que em outro estudo,(7) a esquizofrenia como a principal morbidade entre os usuários, transtorno grave e persistente.

Os usuários que evadiram estavam em regime de tratamento intensivo ou semi-intensivo, o que sugere que o vínculo estabelecido entre ele e profissional de referência e equipe técnica não foi suficiente para mantê-lo aderido ao tratamento.(8)

As pessoas do sexo masculino prevaleceram às do sexo feminino, o que pode ser explicado pelo fato de que a dependência de substâncias psicoativas é mais prevalente entre homens, além do mais, de um modo geral, as mulheres procuram muito menos os serviços de saúde para tratar dependência química.(9,10) Estes dados, como a média de idades dos usuários homens (20 a 59 anos) foram encontrados em outros estudos.(6,7) São pessoas em fase de atividade econômica, o que gera impacto negativo sobre a economia do município.

Cerca de 54% dos participantes haviam interrompido abruptamente a terapia medicamentosa e outros 33% a mantiveram de forma irregular, sem orientações sobre dosagens e freqüência da administração. Este dado foi corroborado por estudo que mostrou que a terapia medicamentosa em usuários do serviço mental, assim como sua prescrição e dispensação são desarticulados entre a equipe, ocorrendo por vezes a prescrição indiscriminada, aleatória e a não orientação do usuário e familiares.(9) Como conseqüência, os autores listaram o uso abusivo, a dependência, interrupção e interação com outras substâncias, que oferece risco em potencialidade para os usuários. Outros autores confirmam os dados quanto ao uso indiscriminado de psicofármacos, sem acompanhamento psiquiátrico e/ ou psicológico.(3-5)

Quanto à procedência das regiões do município, verificamos maior procedência da Oeste, onde está situado o serviço.

Consideramos que por não ser um serviço especializado no tratamento de usuários dependentes de álcool e outras drogas, o abandono do tratamento é alto.

Conclusão

O principal motivo de evasão ao tratamento foi a dependência de substâncias psicoativas.

Colaborações

Pereira MO; Amorim A e Vidal V contribuíram na concepção e planejamento do projeto, obtenção dos dados e interpretação dos dados. Contribuíram com a elaboração do rascunho, revisão crítica do conteúdo e aprovação da versão final do manuscrito. Falavigna MF, Oliveira MAF colaboraram com a aprovação da versão final do manuscrito.

Submetido 26 de Agosto de 2013

Aceito 16 de Outubro de 2013

Conflitos de interesse: não há conflito de interesses a declarar.

  • 1. Lemke AR, Silva NA. A busca ativa como princípio político das práticas de cuidado no território. Estudos Pesq Psicol UERJ. 2010;10(1):281-95.
  • 2. Oliveira BA, Ataíde CF, Silva AM. A invisibilidade dos problemas de saúde mental na atenção primária: O trabalho da enfermeira construindo caminhos junto às equipes de saúde da família. Texto & Contexto Enferm. 2013;13(4):618-24.
  • 3. Barban GE, Oliveira AA. O Modelo de assistência matricial de saúde mental no programa saúde da família no município de São José do Rio Preto. Arq Ciênc Saúde. 2007;14(1):52-63.
  • 4. Lemke AR, Silva NA. Um estudo sobre a itinerância como estratégia de cuidado no contexto das políticas públicas de saúde no Brasil. Physis: Rev Saúde Coletiva. 2011;21(3): 979-1004.
  • 5. Ribeiro SM, Poço CL. Motivos referidos para abandono de tratamento em um sistema público de atenção à saúde mental. Revista APS. 2006;9(2):136-45.
  • 6. Pereira MO, Souza JM, Costa JA, Vargas D, Oliveira MA, Moura WN. Perfil dos usuários de serviços de Saúde Mental do município de Lorena São Paulo. Acta Paul Enferm. 2012;25(1):48-54.
  • 7. Oliveira BG. Trabalho e cuidado no contexto da atenção psicossocial: algumas reflexões. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2007;10(4):694-702.
  • 8. Oliveira PM, Loyola DM. Pintando novos caminhos: A visita domiciliar em saúde mental como dispositivo de cuidado em enfermagem. Esc Anna Nery Rev Enferm. 2006;10(4):645-51.
  • 9. Ribeiro ML, Medeiros MS, Albuquerque SJ, Fernandes AB. Saúde mental e enfermagem na estratégia saúde da família: Como estão atuando os enfermeiros. Rev Esc Enferm USP. 2010;44(2):376-82.
  • 10. Nunes M, Torrente M, Ottoni V, Neto MV, Santana M, A dinâmica do cuidado em saúde mental: signos, significados e práticas de profissionais em um Centro de Assistência Psicossocial em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saúde Pública. 2008;24(1):188-96.
  • Autor correspondente:

    Maria Odete Pereira
    Av. Doutor Enéas de Carvalho Aguiar,
    São Paulo, SP, Brasil. CEP: 05403-000
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      26 Ago 2013
    • Aceito
      16 Out 2013
    Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
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