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Mensuração da não-adesão aos medicamentos imunossupressores em receptores de transplante de fígado

Medición de la no adhesión a los medicamentos inmunosupresores en receptores de trasplante de hígado

Resumo

Objetivo

Avaliar os níveis de não-adesão à terapia imunossupressora em uma amostra de receptores de transplante de fígado utilizando a Basel Assessment of Adherence with Immunosuppressive Medication Scale; correlacionar as características sociodemográficas e os fatores clínicos à não-adesão medicamentosa.

Métodos

Estudo epidemiológico e transversal, realizado entre março 2016 e março 2018 no ambulatório de transplante de fígado da Universidade Federal de São Paulo.

Resultados

Foram avaliados 49 pacientes. O nível de não-adesão medicamentosa no transplante de fígado foi de 49% e esteve diretamente relacionado ao uso do ácido micofenólico (p=0,007) e à administração de múltiplas doses de imunossupressores diariamente (p=0,004). Não foram encontradas correlações estatisticamente significativas entre a não-adesão à terapia imunossupressora e as características sociodemográficas e demais variáveis clínicas analisadas.

Conclusão

Este estudo mostrou que quase a metade dos pacientes deixaram de aderir à terapia imunossupressora no pós transplante de fígado. Uma vez que os desfechos desfavoráveis no transplante estão intimamente relacionados à falhas na adesão, é importante os enfermeiros avaliarem esse comportamento durante o seguimento ambulatorial dos receptores de transplante de fígado.

Cooperação e adesão ao tratamento; Adesão à medicação; Transplante de fígado; Assistência integral à saúde; Cuidados de enfermagem

Resumen

Objetivo

Analizar los niveles de no adhesión a la terapia inmunosupresora en una muestra de receptores de trasplante de hígado utilizando la Basel Assessment of Adherence with Immunosuppressive Medication Scale y correlacionar las características sociodemográficas y los factores clínicos con la no adhesión a los medicamentos.

Métodos

Estudio epidemiológico y transversal realizado entre marzo de 2016 y marzo de 2018 en los consultorios externos de trasplante de hígado de la Universidad Federal de São Paulo.

Resultados

Fueron analizados 49 pacientes. El nivel de no adhesión a los medicamentos del trasplante de hígado fue de 49% y está directamente relacionado con el uso de ácido micofenólico (p=0,007) y con la administración de varias dosis inmunosupresoras diariamente (p=0,004). No se encontró correlación estadísticamente significativa entre la no adhesión a la terapia inmunosupresora y las características sociodemográficas y demás variables clínicas analizadas.

Conclusión

Este estudio mostró que casi la mitad de los pacientes dejó de realizar la terapia inmunosupresora en el postrasplante de hígado. Dado que los desenlaces desfavorables del trasplante están íntimamente relacionados con fallas en la adhesión, es importante que los enfermeros evalúen ese comportamiento durante el seguimiento ambulatorio de los receptores de trasplante de hígado.

Cumplimiento y adherencia al tratamento; Cumplimiento de la medicación; Trasplante de hígado; Atención integral de salud; Atención de Enfermería

Abstract

Objective

Assessing the level of non-adherence to immunosuppressive therapy in a sample of liver transplantation recipients using the Basel Assessment of Adherence with Immunosuppressive Medication Scale; correlating socio-demographic features and clinical factors to medication non-adherence.

Methods

This cross-sectional epidemiological study was conducted between March 2016 and March 2018 at the outpatient service for liver transplantations of the Federal University of São Paulo.

Results

Forty-nine patients were assessed. The level of medication non-adherence after liver transplantation was 49%. It was directly correlated to the use of mycophenolic acid (p=0.007) and to multiple daily dosing of immunosuppressant medication (p=0.004). No statistically significant correlations were found between non-adherence to immunosuppressive therapy, socio-demographic features, and the remaining clinical variables assessed.

Conclusion

This study shows that nearly half of all patients are not compliant with immunosuppressive therapy after liver transplantation. Given poor liver transplantation outcomes are intimately related to adherence failure, nurses need to assess this behavior in outpatient follow-up of liver transplantation recipients.

Treatment adherence and compliance; Medication adherence; Liver transplantation; Comprehensive health care; Nursing care

Introdução

O transplante de fígado (TXF) é considerado o tratamento de escolha para o paciente com doença hepática progressiva, irreversível e terminal, o qual não encontra outro tipo de tratamento.11. Meirelles Júnior RF, Salvalaggio P, Rezende MB, Evangelista AS, Della Guardia B, Matielo CE Lourenço et al. Transplante de fígado: história, resultados e perspectivas. einstein (São Paulo). 2015;13(1):149-52. Tem sido considerado um tratamento bem sucedido quando indicado por oferecer a oportunidade de uma vida mais longa e com melhor qualidade de vida.22. Castro-e-Silva Jr O, Sankarankutty AK, Oliveira GR, Pacheco E, Ramalho FS, Dal Sasso K. et al. Transplante de fígado: indicação e sobrevida. Acta Cir Bras. 2002; 17(Suppl 3):83-91. O Brasil possui o maior sistema público de transplantes do mundo, sendo o Sistema Único de Saúde (SUS) responsável pelo financiamento de 96% de todos os procedimentos relacionados ao processo de transplantação. Portanto, é uma área prioritária da política de saúde nacional.33. Paim J, Travassos C, Almeida C, Bahia L, Macinko J. O sistema de saúde brasileiro: história, avanços e desafios. Lancet. (Série Brasil). 2011;11-31.,44. Brasil Ministério da Saúde. Portal da Saúde. Transplante [“O Brasil aumenta número de doadores e bate recordes em transplantes” [Internet]. Brasília, DF; Ministério da Saúde; 2018. [citado em 2018 Dez 7]. Disponível em: http://portalms.saude.gov.br/noticias/agencia-saude/44442-brasil-aumenta-doacao-de-orgaos-e-bate-recorde-em-transplantes
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Com relação ao modelo de financiamento, o governo brasileiro é responsável por custear todas as etapas do tratamento, o que inclui a dispensação de imunossupressores e o seguimento ambulatorial dos pacientes, com investimentos que chegam a R$2,2 bilhões por ano.55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Transplantes de Tecidos, Órgãos e Partes do Corpo Humano. Lei 9.434/97 regulamentada pelo Decreto 2.268/97. [Internet]. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 1997. [citado 2018 Dec 27]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1997/d2268.htm
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,66. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Portaria Nº 712, de 13 de agosto de 2014. Aprova o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Imunossupressão no Transplante Renal [Internet]. Brasília, DF, Ministério da Saúde; 2014. [citado 2018 Dez 27]. Disponível em: http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2014/agosto/14/IMUNOSSUPRESSAO-TRANSPLANTE-RENAL-MINUTA-Portaria-SAS-PCDT.pdf
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Segundo dados do Registro Brasileiro de Transplantes, no ano de 2018 foram realizados 2.122 TxF, o que representou um crescimento de 2,4% com relação ao ano anterior. Estes dados colocam o país em segundo lugar em números absolutos de TxF e contabiliza uma taxa de 10,5 transplantes por milhão de população (pmp).77. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Registro Brasileiro de Transplantes- RBT. 2018: Jan/Dez. Dimensionamento dos Transplantes no Brasil e em cada Estado [Internet]. São Paulo: ABTO; 2018. [citado 2018 Dec 18]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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Atualmente, o país possui 75 equipes transplantadoras distribuídas em 15 Estados, sendo o Estado de São Paulo responsável por mais de um terço (30,1%) do total de TxF realizados. Com relação ao tipo de doador, a maior parte dos TXF (92,4%) é realizada com doadores falecidos.77. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Registro Brasileiro de Transplantes- RBT. 2018: Jan/Dez. Dimensionamento dos Transplantes no Brasil e em cada Estado [Internet]. São Paulo: ABTO; 2018. [citado 2018 Dec 18]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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A sobrevida em um ano do paciente e do enxerto é de 77% e de 74% e em cinco anos de 70% e 67%, respectivamente,77. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Registro Brasileiro de Transplantes- RBT. 2018: Jan/Dez. Dimensionamento dos Transplantes no Brasil e em cada Estado [Internet]. São Paulo: ABTO; 2018. [citado 2018 Dec 18]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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a depender do tipo de doença responsável pela indicação do transplante e de outras variáveis, como morbidades associadas, acesso a equipe de saúde e capacidade de desenvolver e gerenciar o autocuidado.77. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Registro Brasileiro de Transplantes- RBT. 2018: Jan/Dez. Dimensionamento dos Transplantes no Brasil e em cada Estado [Internet]. São Paulo: ABTO; 2018. [citado 2018 Dec 18]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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8. Martin P, DiMartini A, Feng S, Brown Jr RS, Fallon M. Evaluation for liver transplantation in adults: 2013 Practice Guideline by the American Association for the Study of Liver Diseases and the American Society of Transplantation. Hepatology. 2014;59(3):1144-65.

9. Xu MM, Brown RS Jr. Liver transplantation for the referring physician. Clin Liver Dis. 2015;19(1):135-53.
-1010. Morrissey PE, Flynn ML, Lin S. Medication noncompliance and its implicationsin transplant recipients. Drugs. 2007;67(10):1463-81. Review.

Os resultados positivos nos transplantes estão diretamente relacionados ao comprometimento regular do paciente com seu tratamento. Devido ao risco inerente de rejeição do enxerto, os pacientes são submetidos à terapia imunossupressora no pós transplante1010. Morrissey PE, Flynn ML, Lin S. Medication noncompliance and its implicationsin transplant recipients. Drugs. 2007;67(10):1463-81. Review. e devem ser monitorados quanto aos sinais de rejeição.1111. Pinsky BW, Takemoto SK, Lentine KL, Burroughs TE, Schnitzler MA, Salvalaggio PR. Transplant outcomes and economic costs associated with patient noncompliance to immunosuppression. Am J Transplant. 2009;9(11):2597-606.

A não-adesão (NA) à terapêutica pós-transplante é compreendida como qualquer desvio no esquema terapêutico imunossupressor prescrito capaz de influenciar negativamente os resultados esperados1212. Morrison A, Stauffer ME, Kaufman AS. Defining medication adherence in individual patients. Patient Prefer Adherence. 2015;9:893-7. - incluindo erros de dose e de horários prescritos. É considerado um fenômeno multidimensional, determinado pela interação de múltiplos fatores tais como o sistema de saúde em que o paciente está inserido, o nível socioeconômico dele, a modalidade de tratamento ofertado, as condições clínicas paciente assim como sua doença.1313. Oliveira RA, Turrini RNT, Poveda VB. Adherence to immunosuppressive therapy following liver transplantation: an integrative review. Rev Lat Am. Enfermagem. 2016; 24:e2778. O paciente é considerado com adesão ao tratamento farmacológico quando utiliza de 80 a 110% da quantidade de medicamento prescrito.1414. Correr CJ, Otuki MF, Soler O. Assistência farmacêutica integrada ao processo de cuidado em saúde: gestão clínica do medicamento. Rev Pan-Amaz Saude. 2011; 2(3):41-9. Em transplantes, estima-se que a NA varie de 2% a 67%, com médias anuais em torno de 35,6%,55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Transplantes de Tecidos, Órgãos e Partes do Corpo Humano. Lei 9.434/97 regulamentada pelo Decreto 2.268/97. [Internet]. Brasília, DF: Ministério da Saúde; 1997. [citado 2018 Dec 27]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1997/d2268.htm
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,1010. Morrissey PE, Flynn ML, Lin S. Medication noncompliance and its implicationsin transplant recipients. Drugs. 2007;67(10):1463-81. Review. o que resulta em rejeição ou falência do enxerto, aumento do custo do tratamento e da morbimortalidade.1313. Oliveira RA, Turrini RNT, Poveda VB. Adherence to immunosuppressive therapy following liver transplantation: an integrative review. Rev Lat Am. Enfermagem. 2016; 24:e2778.,1515. Lamba S, Nagurka R, Desai KK, Chun SJ, Holland B, Koneru B. Self-reported non-adherence to immunesuppressant therapy in liver transplant recipients: demographic, interpersonal, and intrapersonal factors. Clin Transplant. 2012;26(2):328-35.,1616. Dew MA, DiMartini AF, De Vito Dabbs A, Myaskovsky L, Steel J, Unruh M, et al. Rates and risk factors for nonadherence to the medical regimen after adult solid organ transplantation. Transplantation. 2007;83(7):858-73.

Estudos avaliaram diferentes estratégias para identificar a NA, dentre elas a contagem de comprimidos, a aplicação de questionários de autorrelato, o registro de efeitos colaterais relacionados à terapia imunossupressora (IMS), análises laboratoriais dos níveis séricos de IMS e o monitoramento eletrônico.1313. Oliveira RA, Turrini RNT, Poveda VB. Adherence to immunosuppressive therapy following liver transplantation: an integrative review. Rev Lat Am. Enfermagem. 2016; 24:e2778.,1414. Correr CJ, Otuki MF, Soler O. Assistência farmacêutica integrada ao processo de cuidado em saúde: gestão clínica do medicamento. Rev Pan-Amaz Saude. 2011; 2(3):41-9.

15. Lamba S, Nagurka R, Desai KK, Chun SJ, Holland B, Koneru B. Self-reported non-adherence to immunesuppressant therapy in liver transplant recipients: demographic, interpersonal, and intrapersonal factors. Clin Transplant. 2012;26(2):328-35.

16. Dew MA, DiMartini AF, De Vito Dabbs A, Myaskovsky L, Steel J, Unruh M, et al. Rates and risk factors for nonadherence to the medical regimen after adult solid organ transplantation. Transplantation. 2007;83(7):858-73.

17. Su GC, Greanya ED, Partovi N, Yoshida EM, Shapiro RJ, Levy RD. Assessing medication adherence in solid-organ transplant recipients. Exp Clin Transplant. 2013;11(6):475-81.
-1818. De Bleser L, Dobbels F, Berben L, et al. The spectrum of nonadherence with medication in heart, liver, and lung transplant patients assessed in various ways. Transpl Int. 2011;24(9):882-91. Entretanto, o autorrelato é a forma mais comum de avaliar a NA, por se mostrar útil na prática clínica, ser de fácil aplicação e possui baixo custo. Esse método possuí moderada correlação com as demais estratégias de mensuração e boa capacidade preditiva dos resultados clínicos. Apesar da baixa sensibilidade, são altamente específicos e podem ser combinadas com outras estratégias, permitindo obter informações sobre o comportamento do paciente em relação ao uso das medicações.1313. Oliveira RA, Turrini RNT, Poveda VB. Adherence to immunosuppressive therapy following liver transplantation: an integrative review. Rev Lat Am. Enfermagem. 2016; 24:e2778.,1919. Dobbels F, Lut B, De Geest S, Drent G, Lennerling A, Whittaker C, Kugler C. Transplant360 Task Force. The psychometric properties and practicability of self-report instruments to identify medication non-adherence in adult transplant patients to date: a systematic review. Transplantation. 2010;90(2):205–19.,2020. Marsicano EDO, Fernandes NS, Colugnati F, Grincekov FRS, Fernandes NMS, De Geest S, et al. Transcultural adaptation and initial validation of Brazilian-Portuguese version of the Basel assessment of adherence to immunosuppressive medications scale (BAASIS) in kidney transplants. BMC Nephrology. 2013 14:108.

No Brasil, os estudos sobre a NA no seguimento pós-transplante ainda são incipientes. Não ter a dimensão desse problema torna mais difícil a implementação de políticas públicas com o foco na melhoria dos desfechos clínicos relacionados ao TXF e vinculados a adesão ao tratamento.2020. Marsicano EDO, Fernandes NS, Colugnati F, Grincekov FRS, Fernandes NMS, De Geest S, et al. Transcultural adaptation and initial validation of Brazilian-Portuguese version of the Basel assessment of adherence to immunosuppressive medications scale (BAASIS) in kidney transplants. BMC Nephrology. 2013 14:108.,2121. Geest S, Berben L. Editorial. Acta Paul Enferm. 2014; 27(3): 4-4. Sendo assim, o objetivo desse trabalho é avaliar os níveis de NA à terapia imunossupressora em uma amostra de pacientes submetidos ao transplante de fígado utilizando a Basel Assessment of Adherence with Immunosuppressive Medication Scale (BAASIS®) e correlacionar características sociodemográficas e fatores clínicos dessa amostra à NA medicamentosa.

Métodos

Estudo epidemiológico e transversal,2222. Lima-Costa MF, Barreto SM. Tipos de estudos epidemiológicos: conceitos básicos e aplicações na área do envelhecimento. Epidemiol Serv Saúde. 2003; 12(4):189-201. realizado com pacientes adultos submetidos ao transplante de fígado que consentiram em participar da pesquisa e que são acompanhados no ambulatório de transplante hepático do Hospital Universitário da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Este estudo foi e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da UNIFESP sob o parecer 623.082 e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) nº 1643201470005505.

A coleta de dados foi realizada entre março de 2016 e março de 2018 com todos os pacientes que utilizaram o serviço ambulatorial nesse período e que se enquadravam nos critérios de inclusão da pesquisa. As informações foram obtidas durante consulta previamente agendada com profissionais do Programa de Residência Multiprofissional em Transplante e Captação de Órgãos da UNIFESP que foram treinados pelos pesquisadores.

Foram excluídos da amostra pacientes com encefalopatia hepática grave por não apresentarem condições cognitivas para responder aos questionários utilizados na pesquisa. Também foi considerado critério de exclusão pacientes que realizaram transplante duplo ou que realizaram mais de um TXF, pelo potencial risco de viés de amostra.

Para avaliar a adesão, utilizou-se a escala BAASIS® na versão validada em português. Este instrumento considera, em seu modelo conceitual de avaliação da adesão à terapêutica medicamentosa, o número de doses e horários prescritos pelo médico em relação ao efetivamente cumprido pelo paciente. É composto de quatro questões, do tipo “sim/não”, para que o paciente relate sua adesão ao esquema imunossupressor, considerando as últimas quatro semanas de tratamento. Considera-se NA qualquer resposta positiva (“sim”) em qualquer dos itens do questionário, situação em que são feitas perguntas adicionais sobre seu comportamento.1919. Dobbels F, Lut B, De Geest S, Drent G, Lennerling A, Whittaker C, Kugler C. Transplant360 Task Force. The psychometric properties and practicability of self-report instruments to identify medication non-adherence in adult transplant patients to date: a systematic review. Transplantation. 2010;90(2):205–19.,2020. Marsicano EDO, Fernandes NS, Colugnati F, Grincekov FRS, Fernandes NMS, De Geest S, et al. Transcultural adaptation and initial validation of Brazilian-Portuguese version of the Basel assessment of adherence to immunosuppressive medications scale (BAASIS) in kidney transplants. BMC Nephrology. 2013 14:108.

Os pacientes também foram questionados quanto a sua percepção referida da adesão medicamentosa nas últimas 4 semanas a partir de uma escala visual analógica que varia entre a perfeita adesão (100%) a não adesão (0% = 0 cm).1919. Dobbels F, Lut B, De Geest S, Drent G, Lennerling A, Whittaker C, Kugler C. Transplant360 Task Force. The psychometric properties and practicability of self-report instruments to identify medication non-adherence in adult transplant patients to date: a systematic review. Transplantation. 2010;90(2):205–19. Instrumentos adicionais foram elaborados para o registro da variáveis sociodemográficas e clínicas dos pacientes no pós TxF. Parte das informações foram obtidas por meio de consulta aos prontuários e outra através de entrevista com os pacientes.

As informações coletadas foram compiladas e armazenadas em planilha eletrônica (software Microsoft Excel®) para análise descritiva dos dados. Também foram desenvolvidas planilhas utilizadas como base para a análise estatística em software específico (SPSS® versão 20.0).

Com relação à metodologia estatística, inicialmente os dados foram analisados descritivamente. Para as variáveis categóricas, as informações são apresentadas com frequências absolutas e relativas e para as variáveis numéricas, com medidas-resumo (média, quartis, mínimo, máximo e desvio padrão).

A existência de associações entre duas variáveis categóricas foi verificada utilizando-se o teste de Qui-Quadrado ou teste exato de Fisher. A comparação de médias entre dois grupos foi realizada utilizando-se o teste t de Student para amostras independentes.

Para se avaliar os efeitos simultâneos sob a NA, foram ajustadas regressões logísticas. Devido ao grande número de variáveis preditoras frente ao tamanho da amostra, foram selecionadas para os modelos iniciais as variáveis cujas associações com a variável dependente foram significantes a 10% na análise univariada. Em seguida as variáveis não significantes a 5% foram excluídas uma a uma por ordem de significância. Adicionalmente, o teste de Hosmer e Lemeshow foram utilizados para avaliar a adequação de ajuste do modelo final.

Resultados

Foram avaliados 57 pacientes. No entanto, 8 foram excluídos por apresentarem instrumentos com informações incompletas. Assim, a amostra final foi composta por 49 pacientes.

As idades dos pacientes variaram entre 18 e 73 anos (idade média de 47,0 e DP= 17,3 anos). Do total, 57,1% eram do sexo masculino, 55,1% brancos e 51,0% casados. Com relação à escolaridade e renda, verificou-se que 42,9% dos pacientes possuíam de 9 a 12 anos de estudo e 22,4% entre 5 e 8 anos. Em 61,2% dos casos, a renda per capita referida foi inferior à 1 salário mínimo, sendo que a taxa de desocupação foi superior à 65% e somente 22,4% exercem atividades laborais remuneradas. Nota-se ainda que 65,3% dos pacientes eram católicos, 46,9% residiam com o cônjuge e 69,4% contavam com rede de apoio. Com relação ao acesso ao ambulatório, 67,3% utilizavam como meio de transporte o ônibus e 63,3% faziam uso de apenas 1 modalidade de transporte e a maioria dos pacientes (71,4%), relataram não ter dificuldade para se locomover até o serviço de transplante.

Os pacientes foram classificados segundo sua doença de base, tempo de transplante e esquema IMS (Tabela1). Verificou-se que maioria (25,0%) apresentavam hepatite viral, seguido por hepatocarcinoma (14,6%) e doença autoimune (10,4%). Em média, os pacientes realizaram o transplante há 7 anos e 55,1% realizaram o procedimento há mais de 6 anos. Apenas em dois casos, o transplante era recente (menos de 1 ano). Com relação ao IMS, quase a totalidade (98,0%) utilizavam o tacrolimo, 65,3% o ácido micofenólico e 24,5% utilizavam prednisona. Dessa forma, 73,5% dos pacientes utilizam os IMS em associação (2 ou mais) e em apenas 26,5% dos casos optou-se pela monoterapia imunossupressora com duas doses diárias de tacrolimo. Nos demais casos, os pacientes utilizam esquema múltiplo de doses e de medicamento.

Tabela 1
Distribuição dos pacientes por doença de base, tempo de transplante e regime imunossupressor adotado

A aplicação do instrumento BAASIS® revelou que 49% dos pacientes deixaram de aderir a uma ou mais das quatro situações avaliadas, ao menos uma vez, nas últimas 4 semanas. Dentre as 4 questões que avaliam a NA através do BAASIS®, a pergunta 3 (“Você se lembra de ter tomado suas medicações imunossupressores com mais de 2 horas de diferença em relação ao horário prescrito, nas últimas 4 semanas?”) foi a que apresentou maior porcentagem de resposta afirmativa (40,8% contra no máximo de 20,4%) (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição da adesão aos medicamentos imussupressores, dos pacientes adultos submetidos a TXF, por item do BAASIS®

Quanto à distribuição da adesão e NA no TXF segundo as características sociodemográficas e clínicas (Tabela 3), foi possível identificar associação entre NA e uso de ácido micofenólico (p=0,007) e número de imunossupressores em uso (p=0,004). Dessa forma, nota-se que os pacientes que fazem uso de ácido micofenólico têm porcentagem maior de NA (76,5%) comparativamente àqueles que não fazem uso desse medicamento (34,4%). Além disso, aqueles que fazem uso de apenas 1 medicação (tacrolimo) têm porcentagem maior de adesão (84,6%) comparativamente àqueles que usam 2 medicações (28,0%). Assim, o uso de dois ou mais IMS parece favorecer a NA. As demais características clínicas e sociodemográficas foram analisadas em associação com a adesão, mas não apresentaram diferenças estatisticamente significantes. Apenas um fator se revelou marginalmente significante, que foi o estado cível. Conforme a tabela abaixo, os pacientes sem companheiros (solteiros, divorciados ou viúvos) apresentam relação diretamente proporcional com a NA (p=0,065).

Tabela 3
Distribuição da adesão no transplante de fígado segundo características clínicas e sociodemográficas

Discussão

Nos últimos anos, a evolução da terapia imunossupressora tem garantido maior segurança ao paciente transplantado, reforçando os benefícios do transplante. No entanto, a não-adesão ao tratamento IMS no pós transplante ainda é uma importante barreira a ser superada.

Neste estudo 49,0% dos pacientes estudados deixaram de aderir a uma ou mais das quatro situações avaliadas pelo BASSIS, ao menos uma vez nas últimas 4 semanas. Este índice é superior a vários outros estudos internacionais que obtiveram uma taxa de NA entre 5% e 47%.2323. Correia DT, Barbosa A, Mega I, Barroso E, Monteiro E. Adesão nos doentes transplantados. Acta Med Port. 2007; 20:73-85.

24. Leite Rf, Silva AC, Oliveira PC, Silva LM, Pestana JM, Schirmer J, et al. Mensuração da adesão aos medicamentos imunossupressores em receptores de transplante renal. Acta Paul Enferm. 2018; 31(5):489-96.

25. Burra P, Germani G, Gnoato F, et al. Adherence in liver transplant recipients. Liver Transpl. 2011;17:760-70.
-2626. Neuberger JM, Bechstein WO, Kuypers DR, Burra P, Citterio F, De Geest S, et al. Practical recommendations for long-term management of modifiable risks in kidney and liver transplant recipients: a guidance report and clinical checklist by the Consensus on Managing Modifiable Risk in Transplantation (COMMIT) Group. Transplantation. 2017;101:S1-S56.

Em apenas um estudo, a índice de NA foi superior ao encontrado na pesquisa, com uma taxa de NA de 73%. No entanto, o método adotado para aferir a adesão foi o monitoramento eletrônico e não a aplicação de um instrumento de auto-relato.2727. Stilley CS, DiMartini AF, de Vera ME, Flynn WB, King J, Sereika S, et al. Individual and environmental correlates and predictors of early adherence and outcomes after liver transplantation. Prog Transplant. 2010; 20:5866. Está é uma questão importante que dificulta a comparação entre os achados de adesão no transplante, pois não há homogeneização dos métodos de mensuração utilizados em diferentes estudos.2626. Neuberger JM, Bechstein WO, Kuypers DR, Burra P, Citterio F, De Geest S, et al. Practical recommendations for long-term management of modifiable risks in kidney and liver transplant recipients: a guidance report and clinical checklist by the Consensus on Managing Modifiable Risk in Transplantation (COMMIT) Group. Transplantation. 2017;101:S1-S56.

Nos Estados Unidos, os dados mais recentes demonstram uma melhora nos índices de rejeição e falência do enxerto em pacientes após transplante de fígado. A taxa de falência do enxerto em 6 meses em pacientes transplantados em 2014 foi de 7,8% para enxertos de doador falecido e 12,5% para enxertos de doadores vivos e as taxas de 1 ano são 10,3% e 15,1%, respectivamente. A melhora global nas taxas de falência e sobrevida do enxerto é provavelmente resultado de inúmeros fatores que incluem avanços tecnológicos e na técnica cirúrgica ou melhorias no tratamento clínico e na terapia de imunossupressão e não necessariamente à melhora dos índices de adesão ao tratamento medicamentoso.2828. Whitsett M, Levitsky. J Medication adherence in liver transplantation. Clin Liver Dis. 2018;10(6):157-60. Reiew.

29. Eberlin M, Otto G, Krämer I. Increased medication compliance of liver transplant patients switched from a twice-daily to a once-daily tacrolimus-based immunosuppressive regimen. Transplant Proc. 2013;45(6):2314-20.

30. Dopazo C, Rodriguez R, Llado L, Calatayud D, Castells L, Ramos E, et al. Successful conversion from twicedaily to once-daily tacrolimus in liver transplantation: observational multicenter study. Clin Transplant. 2012;26(1):E32-7.

31. Beckebaum S, Lacob S, Sweid D, Sotiropoulos GC, Saner F, Kaiser G, et al. Efficacy, safety, and immunosuppressant adherence in stable liver transplant patients converted from a twice-daily tacrolimus-based regimen to once-daily tacrolimus extended-release formulation. Transplant Int. 2011;24(7):666-75.

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O tratamento de manutenção do enxerto consiste em uma combinação de agentes imunossupressores que diferem em seus mecanismos de ação. Esta estratégia minimiza a morbidade e a mortalidade associadas a cada classe de agente imunossupressor, maximizando a eficácia global do tratamento.3434. Brasil. Ministério da Saúde – Secretaria de Ciência, tecnologia e Insumos Estratégicos/CONITEC – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS : Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas imunossupressão no transplantante hepático em adultos – relatório de recomendação. Agosto 2016 [Internet]. [citado 2018 Maio 8]. Disponível em: conitec.gov.br
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A terapia padrão para a profilaxia da rejeição é um inibidor de calcineurina, tipicamente o tacrolimo ou ciclosporina (em casos de contraindicação do tacrolimo), adicionado ou não de micofenolato de mofetila ou micofenolato de sódio, de everolimo e de corticoesteroide.3434. Brasil. Ministério da Saúde – Secretaria de Ciência, tecnologia e Insumos Estratégicos/CONITEC – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS : Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas imunossupressão no transplantante hepático em adultos – relatório de recomendação. Agosto 2016 [Internet]. [citado 2018 Maio 8]. Disponível em: conitec.gov.br
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Neste estudo, 76,5% dos pacientes que faziam uso de ácido micofenólico apresentaram falha no uso do medicamento. Os micofenolatos são conhecidos por suas reações adversas e levam à redução ou suspensão da dose do IMS em 40-50% dos casos. Os efeitos colaterais gastrointestinais são a principal razão para a mudança de dose ou descontinuação, o que frequentemente compromete os desfechos de curto e longo prazo da sobrevida do enxerto. Dor abdominal, diarreia, alterações nas mucosas, como úlceras e inflamação submucosa, são sinais comuns de toxicidade gastrointestinal por ácido micofenólico.3434. Brasil. Ministério da Saúde – Secretaria de Ciência, tecnologia e Insumos Estratégicos/CONITEC – Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS : Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas imunossupressão no transplantante hepático em adultos – relatório de recomendação. Agosto 2016 [Internet]. [citado 2018 Maio 8]. Disponível em: conitec.gov.br
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,3535. Staatz CE, Tett SE. Pharmacology and toxicology of mycophenolate in organ transplant recipients: an update. Arch Toxicol. 2014; 88(7):1351–89.

A amostra foi composta majoritariamente por pacientes submetidos ao TXF há mais de seis anos. O comportamento da adesão ao tratamento pode ser afetado pela presença de outras comorbidades e limitações associadas que podem frustrar as expectativas do paciente com relação à melhora clínica que o transplante é capaz de proporcionar, afetando diretamente as taxas de adesão, A observação de que o transplante é uma modalidade de tratamento e não se configura como “cura” pode dificultar a percepção dos efeitos positivos desse tratamento e reduzir a sua motivação com o tratamento no transcorrer do tempo após o transplante,3636. Vasconcelos AG, Pessoa VL, Menezes FW, Florêncio RS, Frota MX. Repercussões no cotidiano dos pacientes pós-transplante cardíaco. Acta Pau Enferm. 2015; 28(6):573-9. corroborando para o elevado índice de não adesão encontrado no estudo.

É importante ressaltar que o centro transplantador estudado apresentou redução abrupta no número de transplantes realizados nos últimos anos; entre os anos de 2012 e 2016 realizava em média 19 transplantes anualmente. No entanto, em 2017 apenas um procedimento foi realizado pela equipe.77. Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Registro Brasileiro de Transplantes- RBT. 2018: Jan/Dez. Dimensionamento dos Transplantes no Brasil e em cada Estado [Internet]. São Paulo: ABTO; 2018. [citado 2018 Dec 18]. Disponível em: http://www.abto.org.br/abtov03/Upload/file/RBT/2018/Lv_RBT-2018.pdf
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Esse fato colaborou para amostra ser composta por transplantados tardio, com pouca representatividade de transplantes realizados recentemente.

Os resultados relativos à redução no número de doses diárias estarem relacionados fatores protetores para NA são concordantes com outros estudos. Uma revisão integrativa1313. Oliveira RA, Turrini RNT, Poveda VB. Adherence to immunosuppressive therapy following liver transplantation: an integrative review. Rev Lat Am. Enfermagem. 2016; 24:e2778. compilou os fatores de risco sobre a não adesão aos medicamentos imunossupressores entre pacientes adultos submetidos a transplante de fígado e identificou que e a redução da posologia para dose única diária está vinculada a menores índices de NA devido às dificuldades de adesão geradas pelo uso de vários medicamentos simultaneamente. Como proposta de intervenção é sugerida a alteração da posologia de duas doses diárias para uma dose ao dia. Com essa intervenção, foi verificada significativa redução da NA, estabilização dos níveis séricos do fármaco e ausência de complicações hepáticas, renais e cardiológicas.1313. Oliveira RA, Turrini RNT, Poveda VB. Adherence to immunosuppressive therapy following liver transplantation: an integrative review. Rev Lat Am. Enfermagem. 2016; 24:e2778.,2525. Burra P, Germani G, Gnoato F, et al. Adherence in liver transplant recipients. Liver Transpl. 2011;17:760-70.

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31. Beckebaum S, Lacob S, Sweid D, Sotiropoulos GC, Saner F, Kaiser G, et al. Efficacy, safety, and immunosuppressant adherence in stable liver transplant patients converted from a twice-daily tacrolimus-based regimen to once-daily tacrolimus extended-release formulation. Transplant Int. 2011;24(7):666-75.
-3232. Toha MR, Teoa V, Kwana YH, Raaja S, Tanc SD, Tan JZY. Association between number of doses per day, number of medications and patient’s non-compliance, and frequency of readmissions in a multi-ethnic Asian population. Prev Med Report. 2014; 1:43-7.

Tradicionalmente, ao avaliar NA no contexto do transplante, correlacionam-se os fatores sociais e culturais aos resultados de adesão encontrados. No entanto, nesse estudo, apenas um variável mostrou alguma relevância, que foi o estado civil. Foi possível observar escores mais altos de adesão em paciente casados comparativamente aos solteiros, viúvos ou divorciados Embora a influência da existência de um cônjuge não seja conclusiva em algumas publicações, em trabalho recente ser separado ou divorciado também foi fator associado com a NA.3333. Reber S, Morawa E, Stößel L, Jank S, Vitinius F, Eckardt K, et al. Prevalence and Modifiable Determinants of Non-Adherence in Adult Kidney Transplant Recipients in a German Sample. Z Psychosom Med Psychother. 2016; 62(3):270-83. Por se caracterizar como uma importante rede de apoio, é possível sugerir que as variáveis que contemplam o contexto familiar e social influenciam diretamente a vida do indivíduo e consequentemente na sua adesão.3636. Vasconcelos AG, Pessoa VL, Menezes FW, Florêncio RS, Frota MX. Repercussões no cotidiano dos pacientes pós-transplante cardíaco. Acta Pau Enferm. 2015; 28(6):573-9.

As consequências da NA aos IMS são múltiplas. Para os pacientes, relaciona-se aos priores prognósticos no transplante, com o aumento das taxas de rejeição, perda de enxerto e mortalidade. Para o sistema de saúde, o impacto pode ser estimado com base no custo de diagnósticos adicionais, no aumento da imunossupressão para tratamento da rejeição e, em última instância, ao custo do retransplante. Dessa forma, a NA ao regime imunossupressor pode ser considerada um problema de saúde pública e também uma questão bioética importante, tendo em vista a demanda crescente pelo transplante como opção terapêutica e a necessidade de racionalizar recursos financeiros na área da saúde.1111. Pinsky BW, Takemoto SK, Lentine KL, Burroughs TE, Schnitzler MA, Salvalaggio PR. Transplant outcomes and economic costs associated with patient noncompliance to immunosuppression. Am J Transplant. 2009;9(11):2597-606.,2727. Stilley CS, DiMartini AF, de Vera ME, Flynn WB, King J, Sereika S, et al. Individual and environmental correlates and predictors of early adherence and outcomes after liver transplantation. Prog Transplant. 2010; 20:5866.,3737. Malta DC, Silva MM, Albuquerque GM, Lima CM, Cavalcante T, Jaime PC, et al. A implementação das prioridades da Política Nacional de Promoção da Saúde, um balanço, 2006 a 2014. Ciênc Saúde Coletiva. 2014;19(11):4301-12.

Esta pesquisa apresenta algumas limitações por se tratar de um estudo transversal com amostra de conveniência. Ainda assim, os resultados apresentados chamam atenção à necessidade de incorporação de mensurações de adesão na prática clínica de enfermagem no atendimento a pacientes transplantados para melhoria da qualidade do atendimento as necessidades dos pacientes com potencial de criação de intervenções com foco na melhoria das taxas de adesão.

Conclusão

Os resultados deste estudo evidenciaram que quase a metade dos pacientes deixaram de aderir à terapia imunossupressora no pós transplante de fígado no período estudado. Uma vez que os desfechos desfavoráveis no transplante estão intimamente relacionados à falhas na adesão, é importante os enfermeiros avaliarem esse comportamento durante o seguimento ambulatorial dos receptores de transplante de fígado, afim de promover ações que mitiguem o risco de não adesão nesses pacientes. São necessários mais estudos na área para avaliar qualitativamente quais são as causas da NA e para apoiar a implementação de intervenções com foco na redução dos índices de NA ao tratamento imunossupressor no transplante de fígado.

Agradecimentos

Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico (CNPq) que financiou o projeto de pesquisa do qual a tese que deu origem a esse artigo faz parte. Sendo assim, tese compõe o Edital Universal CNPq intitulado “Impacto do atendimento multiprofissional na adesão ao transplante de fígado”. A autora principal também agradece a agência de fomento à pesquisa pelo financiamento do Programa de Bolsas Demanda Social Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico (CNPq).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    May-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    11 Fev 2019
  • Aceito
    8 Abr 2019
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