Acessibilidade / Reportar erro

Estratégias de avaliação da visita domiciliar: uma revisão de escopo

Estrategias de evaluación de visitas domiciliarias: una revisión del alcance

Resumo

Objetivo

Explorar a literatura relacionada às estratégias de avaliação da visita domiciliar nos programas de visitação para a primeira infância.

Métodos

Revisão de escopo baseada na metodologia proposta pelo Instituto Joanna Briggs. Foram analisadas as seguintes bases: PubMed, Web of Science, Scopus, CINAHL, Embase, Biblioteca Virtual da Saúde e acrescentados estudos de outras fontes. Após revisão por dois revisores independente quanto aos critérios de inclusão, foram selecionados 19 estudos para compor a amostra.

Resultados

Os programas de visita domiciliar para a primeira infância utilizam a análise dos cadernos de anotação do visitador, a entrevista com participantes e a aplicação de instrumentos de medida como estratégias para avaliar a visita.

Conclusão

A revisão trouxe uma gama de abordagens que podem ser adotadas segundo o objetivo de cada programa e a disponibilidade de recursos. Carecem de estratégias efetividade comprovadas, além de instrumentos e métodos validados.

Visita domiciliar; Avaliação de programas e projetos de saúde; Desenvolvimento infantil; Atenção primária à saúde; Assistência integral à saúde

Resumen

Objetivo

investigar la literatura relacionada con las estrategias de evaluación de visitas domiciliarias en los programas de visitas en la primera infancia.

Métodos

revisión del alcance basada en la metodología propuesta por el Instituto Joanna Briggs. Se analizaron las siguientes bases: PubMed, Web of Science, Scopus, CINAHL, Embase, Biblioteca Virtual da Saúde y estudios de otras fuentes. Luego de la revisión realizada por dos revisores independientes sobre los criterios de inclusión, se seleccionaron 19 estudios para componer la muestra.

Resultados

los programas de visitas domiciliarias en la primera infancia utilizan un análisis de las notas del visitador, la entrevista con participantes y la aplicación de instrumentos de medida como estrategias para evaluar las visitas.

Conclusión

la revisión trajo una gama de enfoques que pueden ser adoptados según el objetivo de cada programa y la disponibilidad de recursos. Carecen de estrategias de efectividad comprobadas, además de instrumentos y métodos validados.

Visita domiciliaria; Evaluación de Programas y proyectos de salud; Desarrollo infantil; Atención primaria de salud; Atención integral de salud

Abstract

Objective

To explore the literature related to home visit assessment strategies in early childhood visiting programs.

Methods

A scope review based on the methodology proposed by the Joanna Briggs Institute, which used PubMed, Web of Science, Scopus, CINAHL, Embase, Virtual Health Library for search. There was addition of studies from other sources. After review by two independent reviewers of the inclusion criteria, 19 studies were selected to compose the sample.

Results

Home visiting programs for early childhood use analysis of visitor notebooks, interview with participants, and application of measurement tools as strategies to assess the visit.

Conclusion

The review has brought a range of approaches that can be adopted according to the purpose of each program and availability of resources. They lack proven effectiveness strategies, as well as validated tools and methods.

House calls; Program evaluation; Child development; Primary health care; Comprehensive health care

Introdução

Os custos sociais e econômicos da inação na primeira infância são elevados. Cerca de 250 milhões de crianças em países de baixa renda e de renda média sofrem com baixo desenvolvimento devido à pobreza.11. Britto PR, Lye SJ, Proulx K, Yousafzai AK, Matthews SG, Vaivada T, et al.; Early Childhood Development Interventions Review Group, for the Lancet Early Childhood Development Series Steering Committee. Nurturing care: promoting early childhood development. Lancet. 2017;389(10064):91–102. Ademais, uma em cada três crianças em idade pré-escolar que vivem em países pobres e em desenvolvimento está abaixo dos marcos básico em seu desenvolvimento cognitivo ou sócio-emocional.22. McCoy DC, Peet ED, Ezzati M, Danaei G, Black MM, Sudfeld CR, et al. Early Childhood Developmental Status in Low- and Middle-Income Countries: National, Regional, and Global Prevalence Estimates Using Predictive Modeling. PLoS Med. 2016;13(6):e1002034.

Apesar de haver evidências consistentes que os programas de visitação domiciliar são intervenções eficazes na promoção do desenvolvimento infantil,33. Sama-Miller E, Akers L. Mraz-Esposito A, Zukiewicz M, Avellar S, Paulsell D, Del Grosso P. Home visiting evidence of effectiveness review: Executive summary. Washington, DC: Office of Planning, Research and Evaluation, Administration for Children and Families, U.S. Department of Health and Human Services; 2017.nos países pobres e em desenvolvimento poucas intervenções foram ampliadas e avaliadas, além do acesso ainda ser limitado.44. Yousafzai AK, Aboud FE, Nores M, Kaur R. Reporting guidelines for implementation research on nurturing care interventions designed to promote early childhood development. Ann N Y Acad Sci. 2018;1419(1):26–37.

Estímulos adequados aliados a um cuidado responsivo nessa fase têm resultados duradouros e impactam em todo o curso de vida da criança.55. Gertler P, Heckman J, Pinto R, Zanolini A, Vermeersch C, Walker S, et al. Labor market returns to an early childhood stimulation intervention in Jamaica. Science. 2014;344(6187):998–1001. Tais desfechos não se restringem ao seio familiar, visto que sociedades que investem na primeira infância ganham na formação do capital humano em seu pleno desenvolvimento e, consequentemente, preparados para os desafios de um mercado de trabalho exigente e em constante transformação.66. Cypel S, organizador. Fundamentos do desenvolvimento infantil: da gestação aos 3 anos. São Paulo: Fundação Maria Cecília Souto Vidigal; 2011.

A visita domiciliar tem sido amplamente adotada como ferramenta de entrega dos programas na primeira infância. Sua potência está em possibilitar um atendimento longitudinal e considerar o vínculo com o profissional visitador fundamental para que se alcancem os resultados esperados.77. Kebian LVA; Acioli S. A visita domiciliar de enfermeiros e agentes comunitários de saúde da Estratégia Saúde da Família. Rev Eletrôn Enferm. 2014; 16(1):161-9. Além disso, o domicílio é um ambiente ideal para a realização das intervenções de parentalidade, por ser um local confortável e conveniente para os pais com crianças pequenas para receberem apoio dos profissionais.88. Gadsden VL, Ford M, Breiner H, editors. Parenting matters: Supporting parents of children ages 0-8. Washington, DC: The National Academies Press; 2016. 524p.

Por isso, avaliar a visita domiciliar, no sentido de compreender as estratégias da visita e o padrão de engajamento das famílias é uma importante ferramenta para que os objetivos dos programas sejam alcançados.99. Roggman LA, Cook GA, Innocenti MS, Jump Norman V, Boyce LK, Christiansen K, et al. Home visit quality variations in two early head start programs in relation to parenting and child vocabulary outcomes. Infant Ment Health J. 2016;37(3):193–207. Os efeitos de um programa são mais robustos quando as intervenções são bem implementadas, ou seja, quando um elevado grau de fidelidade é alcançado.1010. Black KJ, Wenger MB, O’ Fallon M. Developing a fidelity assessment instrument for nurse home visitors. Res Nurs Health. 2015;38(3):232–40.,1111. Manz P, Power T, Roggman L, Eisenberg R, Gernhart A, Faison J, et al. Integrating the little talks intervention into Early Head Start: An experimental examination of implementation supports involving fidelity monitoring and performance feedback. Child Youth Serv Rev. 2017;79:87–96. Quando os resultados de um programa não alcançam o esperado, investiga-se como os serviços foram implementados em relação ao proposto e argumenta-se se o programa teria funcionado melhor se tivesse sido operado corretamente.1212. Goldberg J, Bumgarner E, Jacobs F. Measuring program- and individual-level fidelity in a home visiting program for adolescent parents. Eval Program Plan. 2016;55:163-73.

Além disso, tais informações também podem ser utilizadas no desenvolvimento profissional, nas atividades de supervisão e na formulação de cursos de formação. Por essas razões, ferramentas de avaliação das visitas domiciliares têm grande relevância na consolidação de programas eficazes em grande escala.1313. Schodt S, Parr J, Araujo MC, Rubio-Codina M. Measuring the quality of home-visiting services: a review of the literature. Washington, DC: Inter-American Development Bank; 2015. (IDB Technical Note, 881).

Nesse sentido, há uma escassez de estudos que esclareçam sobre quais metodologias são adotadas para a avaliação da visita domiciliar em programas de visitação, que possam ser confiáveis e que atendam aos propósitos dos programas. Por isso, esta revisão de escopo procurou explorar a literatura relacionada às estratégias de avaliação da visita domiciliar nos programas de visitação para a primeira infância.

Métodos

Trata-se de uma revisão de escopo, com o objetivo de mapear conceitos que sustentam uma determinada área do conhecimento, com diversos tipos de fontes disponíveis e com base numa abrangente cobertura da literatura, para identificar lacunas de pesquisa na literatura existente.1414. Arksey H, O’Malley L. Scoping studies: towards a methodological framework. Int J Soc Res Methodol. 2005;8(1):19-32.

Na presente revisão, utilizou-se a estratégia PCC para formulação da pergunta, sendo “P” para população/participantes, “C” para o conceito que se pretende investigar, “C” para contexto. Ajustando-se o objeto de estudo à estratégia PCC, tem-se como questão norteadora: Quais são as estratégias de avaliação das visitas domiciliares nos Programas de Visitação da Primeira Infância? Onde “visitas domiciliares” corresponde a população, “estratégias de avaliação” é o conceito e “programas de visitação da primeira infância” o contexto da pesquisa.

Foram incluídos estudos que considerem a visita domiciliar como a principal estratégia de prestação de serviços; demonstrem alguma estratégia adotada para avaliação da visita domiciliar; e em programa de visita domiciliar que atua em pelo menos um dos oito domínios mais relevantes para a primeira infância: saúde infantil; desenvolvimento infantil e prontidão escolar; autossuficiência econômica da família; rede social; saúde materna; práticas parentais positivas; redução de maus-tratos infantis; redução da delinquência juvenil, violência familiar e criminalidade.33. Sama-Miller E, Akers L. Mraz-Esposito A, Zukiewicz M, Avellar S, Paulsell D, Del Grosso P. Home visiting evidence of effectiveness review: Executive summary. Washington, DC: Office of Planning, Research and Evaluation, Administration for Children and Families, U.S. Department of Health and Human Services; 2017. Adotou-se como critérios de exclusão programas com abordagens grupais, acompanhamento da família por telefone ou outras plataformas digitais e que não há clareza que o programa atue em pelo menos um dos domínios mais relevantes para a primeira infância.

Esta revisão de escopo incluiu estudos primários quantitativos ou qualitativos e estudos de revisão que atenderam aos critérios de inclusão para os participantes, conceito e contexto. Além disso, textos e artigos de opinião, teses, dissertação, relatórios de programas de visitação e documentos técnicos também foram considerados para inclusão nesta revisão. Estudos publicados em inglês, espanhol, e português foram incluídos. Não houve limite de tempo para a seleção de estudos.

Estratégia de busca

A estratégia de pesquisa e todo o processo de revisão foi baseado na metodologia de revisão do Instituto Joanna Briggs.1515. Peters MDJ, Godfrey C, McInerney P, Baldini Soares C, Khalil H, Parker D. Scoping reviews. In: Aromataris E, Munn Z, editors. Joanna Briggs Institute Reviewer’s Manual. Melbourne: The Joanna Briggs Institute; 2017. Chapter 11. Portanto, a estratégia de busca em etapas foi utilizada nesta revisão. Uma primeira etapa de pesquisa foi limitada à MEDLINE para uma análise dos títulos, resumos e descritores usados nos artigos. Uma segunda etapa da pesquisa utilizou todas as palavras-chave identificadas e descritores em todas as bases de dados incluídas no estudo. Numa terceira etapa, estudos adicionais foram acrescentados.

A pesquisa nas bases de dados foi realizada entre maio e julho/2018 por dois revisores independentes e incluiu estudos das seguintes bases até junho/2018: MEDLINE, CINAHL, Web of Science, Biblioteca Virtual de Saúde, Scopus, EMBASE. A pesquisa de estudos não publicado incluiu: google acadêmico, Banco de teses USP, National Health Service - NHS, U.S. Departament of Health and Human Service. A estratégia de busca adotada em cada base de dados, os descritores/palavras-chaves utilizados e as referências recuperadas e selecionadas estão descritas no quadro 1.

Quadro 1
Bases de dados, estratégia de busca e referências

Seleção dos estudos

A estratégia de busca identificou um total de 904 estudos e outros 12 foram incluídos de outras fontes. Depois de excluir 52 citações duplicadas e 710 estudos que não atendiam aos critérios de inclusão pela leitura do título, 142 estudos foram selecionados para leitura do resumo e determinação da relevância aos critérios de inclusão. Posteriormente, 41 artigos foram excluídos, uma vez que não cumpriram os critérios de inclusão. Finalmente, foi feita a leitura na íntegra de 101 estudos, destes, 82 foram excluídos e 19 foram incluídos na revisão. Os resultados da pesquisa estão apresentados em um fluxograma PRISMA (Figura 1). Todos os estudos identificados foram agrupados e exportados para o Mendeley® e os duplicados foram removidos. Títulos e resumos foram analisados por dois revisores independentes para avaliação em relação aos critérios de inclusão para a revisão. Os estudos que atenderam aos critérios estabelecidos foram recuperados na íntegra e seus detalhes foram importados para o SUMARI® (software de apoio à pesquisa do Instituto Joanna Briggs). O texto completo dos estudos selecionados foi recuperado e avaliado em detalhes em relação aos critérios de inclusão, sendo que os que não atenderam foram excluídos.

Figura 1
Fluxograma PRISMA de seleção de estudo e processo de inclusão

Extração de dados

Os dados foram extraídos dos artigos incluídos na revisão de escopo por dois revisores independentes usando a ferramenta padronizada de extração de dados do Instituto Joanna Briggs no software SUMARI®. Os dados extraídos incluíram detalhes específicos sobre a população, conceito, contexto, métodos de estudo e principais descobertas relevantes para o objetivo da revisão.

Resultados

Características dos estudos

Os estudos incluídos foram publicados após 2001, e quase metade deles foi publicada a partir de 2012, o que demonstra um interesse relativamente recente dos programas de visitação em utilizar a visita domiciliar como estratégia de avaliação. Quanto ao país onde o estudo foi desenvolvido, os Estados Unidos concentram a maioria dos estudos (n=14), por este país possuir uma ampla rede de serviços voltados para a primeira infância. Em relação aos participantes dos estudos, as famílias (n=8) foram majoritariamente o objeto de avaliação da visita, seguidos pelos visitadores/supervisores (n=6) e por último, avaliou-se a visita dentro do programa (n=4), como descrito no quadro 2.

Quadro 2
Caracterização das publicações quanto ao autor, ano, objetivo, desenho do estudo, participantes e país de origem

Estratégias para avaliação da visita domiciliar

Em relação às estratégias adotadas para avaliação da visita domiciliar nos programas de visitação, as publicações foram categorizadas em três modalidades de avaliação, com base nos objetivos do estudo. O quadro 3 apresenta as estratégias de avaliação adotadas e os programas de visitação.

Quadro 3
Modalidades de avaliação da visita domiciliar e programas de visitação

Análise dos cadernos de visitação

Esta categoria temática foi a menos predominante em termos de frequência, com três ocorrências. As anotações realizadas pelo visitador durante a visita domiciliar foram utilizadas como fonte de informações referentes, principalmente, ao conteúdo abordado na visita e se tais conteúdos estavam condizentes com o currículo dos programas.

Os tópicos mais comumente analisados nos cadernos são os conteúdos que compõem o currículo do programa e devem ser abordados nas visitas, como por exemplo, na avaliação de um programa por meio da análise de 1058 anotações dos cadernos da visita domiciliar de 105 famílias.2323. Saïas T, Lerner E, Greacen T, Simon-Vernier E, Emer A, Pintaux E, et al.; CAPEDP Study Group. Evaluating fidelity in home-visiting programs a qualitative analysis of 1058 home visit case notes from 105 families. PLoS One. 2012;7(5):e36915. Este estudo demonstrou que alguns tópicos relevantes para o programa não foram abordados ou foram parcialmente abordados durante a visita, tais como: educação em saúde, desenvolvimento infantil, ambiente familiar, planos de educação da mãe e rotina pessoal, apoio do parceiro e brincadeira com a criança. Já alguns temas que não faziam parte do escopo do programa emergiram durante a visita domiciliar, como problemas sociais, relações familiares e com os serviços de saúde.2323. Saïas T, Lerner E, Greacen T, Simon-Vernier E, Emer A, Pintaux E, et al.; CAPEDP Study Group. Evaluating fidelity in home-visiting programs a qualitative analysis of 1058 home visit case notes from 105 families. PLoS One. 2012;7(5):e36915.

Uma análise dos conteúdos abordados ao longo do tempo revelou que questões de saúde e desenvolvimento de habilidades permaneceram estáveis tanto nas visitas iniciais quanto nas tardias, já as atividades que abordavam o desenvolvimento da primeira infância diminuíram de 28% durante as visitas iniciais para 16% nas visitas posteriores. Além de elevado percentual de temas que não se encaixavam na taxonomia pré-estabelecida para avaliação da intervenção.2525. Drummond JE, Weir AE, Kysela GM. Home visitation practice: models, documentation, and evaluation. Public Health Nurs. 2002;19(1):21–9.

Outra forma adotada para análise dos cadernos de anotação é estimar o tempo gasto em cada domínio a ser abordado durante a visita. Isso permite verificar se os domínios estão sendo trabalhados no momento previsto e se há continuidade na condução do tema, além de verificar se os materiais educativos estão sendo utilizados com a família.2727. Brand T, Jungmann T. Implementation differences of two staffing models in the german home visiting program “pro kind”. J Community Psychol. 2012;40(8):891–905.

Entrevista

Três estudos compuseram esta categoria. Envolver a participação tanto de familiares como do próprio visitador no processo de avaliação, numa perspectiva qualitativa, possibilita acessar as experiências e os sentimentos dos indivíduos envolvidos na intervenção. Essa metodologia permitiu às mães participantes de um programa de visitação expressarem sentimentos e fazerem uma avaliação individualizada das intervenções.2222. Vaughn L, Forbes J, Howell B. Enhancing home visitation programs: input from a participatory evaluation using photovoice. Infants Young Child. 2009;22(2):132–45.Em relação a entrevista com o visitador, os estudos estavam direcionados para implementar ou aprimorar estratégias de práticas reflexivas na interação com a família. O objetivo era verificar se as práticas adotadas no domicílio, partindo de uma situação hipotética no momento da supervisão, eram condizentes com o preconizado nas diretrizes do programa. Apresentava-se a situação e questionava-se ao visitador com a seguinte pergunta: “Se você observou essa interação entre pais e filhos, o que você diria ou faria em seguida?”3030. Tomlin AM, Hines E, Sturm L. Reflection in home visiting: the what, why, and a beginning step toward how. Infant Ment Health J. 2016;37(6):617–27.Esta abordagem, além de avaliar a visita domiciliar, também serve como uma possibilidade para o desenvolvimento profissional do visitador. Tanto visitadores como supervisores foram questionados sobre como a prática reflexiva impactou na condução do trabalho, no sentimento de eficácia, no manejo das dificuldades encontradas no convívio com as famílias e nos aspectos estressantes do trabalho.2020. Watson CL, Bailey AE, Storm KJ. Building capacity in reflective practice: a tiered model of statewide supports for local home-visiting programs. Infant Ment Health J. 2016;37(6):640–52.

Instrumentos

Esta categoria foi a mais predominante em termos de frequência. Os dados são coletados por meio da observação da visita, seja autoaplicável (próprio visitador) ou por um observador externo. Comumente adota-se a filmagem ou gravação de áudio de algumas visitas ao longo da duração do programa, para que se tenham uma avaliação de momentos diversos.99. Roggman LA, Cook GA, Innocenti MS, Jump Norman V, Boyce LK, Christiansen K, et al. Home visit quality variations in two early head start programs in relation to parenting and child vocabulary outcomes. Infant Ment Health J. 2016;37(3):193–207. Os instrumentos se concentram em domínios relacionados a dosagem, conteúdo e relacionamento, fornecem dados quantitativos e culminam em um escore de pontos que qualifica a visita domiciliar.1717. Paulsell D, Boller K, Hallgren K, Esposito A. Assessing home visit quality. Zero to Three (J). 2010 ;30(6):16-21. A quadro 4 descreve os domínios avaliados em cada instrumento.

Quadro 4
Descrição dos instrumentos e respectivos domínios avaliados

Discussão

Mapear a literatura a respeito das estratégias de avaliação da visita domiciliar em programas de visitação para a primeira infância permitiu identificar diversas modalidades adotadas pelos programas e que cada uma atende a um propósito diferente. A escolha do meio mais apropriado para avaliação da visita domiciliar em programas de visitação depende de fatores relacionados à disponibilidade financeira, de pessoal, de tempo, de expertise e de adequação aos objetivos propostos.1616. Leer J, Boo F, Expósito A, Powell C. A Snapshot on the Quality of Seven Home Visit Parenting Programs in Latin America and the Caribbean. Washington, DC: Inter-American Development Bank; 2015. (IDB Technical Note, 1083).Pode-se inferir que não há consenso sobre a metodologia mais adequada e eficaz, porque os cenários de intervenção e os objetivos dos programas são muito variados ao redor do mundo. Os resultados demonstraram que há um quantitativo maior do uso de instrumentos, em detrimento da análise documental e aspectos qualitativos da intervenção.

A avaliação da visita domiciliar em programas de visitação está pautada majoritariamente em três elementos essenciais - dosagem, conteúdo e relacionamento. A dosagem consiste na frequência de visitas, duração do programa e do tempo médio de cada visita domiciliar. O conteúdo refere-se ao currículo do programa, suas diretrizes que foram desenhados conforme os objetivos que se deseja alcançar.1717. Paulsell D, Boller K, Hallgren K, Esposito A. Assessing home visit quality. Zero to Three (J). 2010 ;30(6):16-21. Já o relacionamento é o elemento central na visita domiciliar, já que a base da intervenção se pauta na confiança mútua e no engajamento dos participantes.1111. Manz P, Power T, Roggman L, Eisenberg R, Gernhart A, Faison J, et al. Integrating the little talks intervention into Early Head Start: An experimental examination of implementation supports involving fidelity monitoring and performance feedback. Child Youth Serv Rev. 2017;79:87–96.

Uma revisão sistemática dos critérios de qualidade adotados em 20 programas de visitação domiciliar demonstrou que todas as iniciativas tinham requisitos mínimos para a frequência das visitas e treinamento prévio dos visitadores. A maioria das intervenções estava associada a programas nacionais ou instituições de ensino superior que oferecem treinamento e suporte, e possuíam protocolos para monitorar a fidelidade das visitas em relação ao conteúdo abordado e atividades desenvolvidas.33. Sama-Miller E, Akers L. Mraz-Esposito A, Zukiewicz M, Avellar S, Paulsell D, Del Grosso P. Home visiting evidence of effectiveness review: Executive summary. Washington, DC: Office of Planning, Research and Evaluation, Administration for Children and Families, U.S. Department of Health and Human Services; 2017.

Um estudo que explorou as práticas de visita domiciliar em relação ao desenvolvimento infantil evidenciou que, quando o visitador usava boas práticas de visitação domiciliar, a família e a criança eram mais efetivamente envolvidas nas atividades, os resultados parentais eram mais fortes e, por sua vez, os resultados do desenvolvimento da criança eram melhores. A qualidade da visita domiciliar refletiu-se nos relacionamentos positivos dos visitantes com as famílias, na responsividade à família, na facilitação de interações positivas mãe-criança e na colaboração sem intromissão com as famílias, bem como no envolvimento das famílias nas visitas domiciliares.99. Roggman LA, Cook GA, Innocenti MS, Jump Norman V, Boyce LK, Christiansen K, et al. Home visit quality variations in two early head start programs in relation to parenting and child vocabulary outcomes. Infant Ment Health J. 2016;37(3):193–207.Quando há uma relação de confiança entre a mãe e o visitador, além de se atingir melhores resultados no desenvolvimento infantil, também há impactos positivos no funcionamento familiar e na parentalidade.3131. Zapart S, Knight J, Kemp L. ‘It Was Easier Because I Had Help’: Mothers’ Reflections on the Long-Term Impact of Sustained Nurse Home Visiting. Matern Child Health J. 2016;20(1):196–204.

A avaliação da visita domiciliar por meio da análise dos cadernos possibilitou a visualização da complexidade de conhecimentos e temas que surgem durante a visita, que demanda dos formuladores do programa abertura para flexibilidade e autonomia do visitador para adequação às necessidades da família, assim possibilita adaptar o currículo à realidade e às necessidades sociais, psicológicas e de saúde da população-alvo para garantir que a intervenção tenha impacto sobre o indivíduo e a comunidade.1111. Manz P, Power T, Roggman L, Eisenberg R, Gernhart A, Faison J, et al. Integrating the little talks intervention into Early Head Start: An experimental examination of implementation supports involving fidelity monitoring and performance feedback. Child Youth Serv Rev. 2017;79:87–96.Já a utilização dos instrumentos possibilitam avaliar a visita domiciliar por meio de parâmetros numéricos e comparáveis, sendo uma ferramenta muito útil quando se pretende dar escalabilidade a um programa.44. Yousafzai AK, Aboud FE, Nores M, Kaur R. Reporting guidelines for implementation research on nurturing care interventions designed to promote early childhood development. Ann N Y Acad Sci. 2018;1419(1):26–37.

É sabido que ao avaliar a visita domiciliar monitora-se a capacidade do visitador em trabalhar com a família o currículo proposto do programa.1717. Paulsell D, Boller K, Hallgren K, Esposito A. Assessing home visit quality. Zero to Three (J). 2010 ;30(6):16-21. No entanto, a visita sendo a ferramenta de entrega da intervenção na primeira infância, compõe uma estrutura mais ampla que envolve supervisão, treinamento, disponibilidade de recursos que também precisam ser analisados ao se pensar em estratégias de aprimoramento da visita domiciliar.2626. Korfmacher J, Sparr M, Chawla N, Fulford J, Fleming J. Illinois Prevention Initiative Birth to Three Program Evaluation Illinois Prevention Initiative (PI) Birth to Three Program Evaluation. Illinois: Herr Research for Children and Social Policy Erikson Institute; 2012. O estudo tem como limitação a dificuldade em demonstrar qual metodologia de avaliação tem melhores resultados na prática. Os desafios para pesquisas futuras estão em desenvolver estudos que demonstrem a efetividade das intervenções avaliativas, além de propor instrumentos e métodos validados.

Conclusão

A presente revisão de escopo mostrou que o tema avaliação da visita domiciliar em programas de visitação para a primeira infância vem sendo melhor explorado nos últimos anos, principalmente em decorrência da ampliação dos programas. Cabe ressaltar a escassez de processos avaliativos em países pobres e em desenvolvimento. Quanto a pesquisa, a presente revisão evidencia uma lacuna quanto as estratégias para avaliação da visita domiciliar e instrumentaliza programas para incluir esta abordagem no monitoramento das intervenções, segundo o objetivo de cada programa e a disponibilidade de recursos.

Referências

  • 1
    Britto PR, Lye SJ, Proulx K, Yousafzai AK, Matthews SG, Vaivada T, et al.; Early Childhood Development Interventions Review Group, for the Lancet Early Childhood Development Series Steering Committee. Nurturing care: promoting early childhood development. Lancet. 2017;389(10064):91–102.
  • 2
    McCoy DC, Peet ED, Ezzati M, Danaei G, Black MM, Sudfeld CR, et al. Early Childhood Developmental Status in Low- and Middle-Income Countries: National, Regional, and Global Prevalence Estimates Using Predictive Modeling. PLoS Med. 2016;13(6):e1002034.
  • 3
    Sama-Miller E, Akers L. Mraz-Esposito A, Zukiewicz M, Avellar S, Paulsell D, Del Grosso P. Home visiting evidence of effectiveness review: Executive summary. Washington, DC: Office of Planning, Research and Evaluation, Administration for Children and Families, U.S. Department of Health and Human Services; 2017.
  • 4
    Yousafzai AK, Aboud FE, Nores M, Kaur R. Reporting guidelines for implementation research on nurturing care interventions designed to promote early childhood development. Ann N Y Acad Sci. 2018;1419(1):26–37.
  • 5
    Gertler P, Heckman J, Pinto R, Zanolini A, Vermeersch C, Walker S, et al. Labor market returns to an early childhood stimulation intervention in Jamaica. Science. 2014;344(6187):998–1001.
  • 6
    Cypel S, organizador. Fundamentos do desenvolvimento infantil: da gestação aos 3 anos. São Paulo: Fundação Maria Cecília Souto Vidigal; 2011.
  • 7
    Kebian LVA; Acioli S. A visita domiciliar de enfermeiros e agentes comunitários de saúde da Estratégia Saúde da Família. Rev Eletrôn Enferm. 2014; 16(1):161-9.
  • 8
    Gadsden VL, Ford M, Breiner H, editors. Parenting matters: Supporting parents of children ages 0-8. Washington, DC: The National Academies Press; 2016. 524p.
  • 9
    Roggman LA, Cook GA, Innocenti MS, Jump Norman V, Boyce LK, Christiansen K, et al. Home visit quality variations in two early head start programs in relation to parenting and child vocabulary outcomes. Infant Ment Health J. 2016;37(3):193–207.
  • 10
    Black KJ, Wenger MB, O’ Fallon M. Developing a fidelity assessment instrument for nurse home visitors. Res Nurs Health. 2015;38(3):232–40.
  • 11
    Manz P, Power T, Roggman L, Eisenberg R, Gernhart A, Faison J, et al. Integrating the little talks intervention into Early Head Start: An experimental examination of implementation supports involving fidelity monitoring and performance feedback. Child Youth Serv Rev. 2017;79:87–96.
  • 12
    Goldberg J, Bumgarner E, Jacobs F. Measuring program- and individual-level fidelity in a home visiting program for adolescent parents. Eval Program Plan. 2016;55:163-73.
  • 13
    Schodt S, Parr J, Araujo MC, Rubio-Codina M. Measuring the quality of home-visiting services: a review of the literature. Washington, DC: Inter-American Development Bank; 2015. (IDB Technical Note, 881).
  • 14
    Arksey H, O’Malley L. Scoping studies: towards a methodological framework. Int J Soc Res Methodol. 2005;8(1):19-32.
  • 15
    Peters MDJ, Godfrey C, McInerney P, Baldini Soares C, Khalil H, Parker D. Scoping reviews. In: Aromataris E, Munn Z, editors. Joanna Briggs Institute Reviewer’s Manual. Melbourne: The Joanna Briggs Institute; 2017. Chapter 11.
  • 16
    Leer J, Boo F, Expósito A, Powell C. A Snapshot on the Quality of Seven Home Visit Parenting Programs in Latin America and the Caribbean. Washington, DC: Inter-American Development Bank; 2015. (IDB Technical Note, 1083).
  • 17
    Paulsell D, Boller K, Hallgren K, Esposito A. Assessing home visit quality. Zero to Three (J). 2010 ;30(6):16-21.
  • 18
    Korfmacher J, Laszewski A, Sparr M, Hammel J. Assessing Home Visit Program Quality. Final Report to the Pew Center on the States [Internet]. Chicago; 2012 [cited 2018 May 7]. Available from: https://www.researchconnections.org/childcare/resources/26454
    » https://www.researchconnections.org/childcare/resources/26454
  • 19
    Hallgren K, Boller K, Paulsell D. Better beginnings: Partnering with families for early learning home visit observations [Internet]. Princeton, NJ: Mathematica Policy Research; 2010. [cited 2016 May 31]. Available from: https://www.mathematica-mpr.com/our-publications-and-findings/publications/better-beginnings-partnering-with-families-for-early-learning-home-visit-observations
    » https://www.mathematica-mpr.com/our-publications-and-findings/publications/better-beginnings-partnering-with-families-for-early-learning-home-visit-observations
  • 20
    Watson CL, Bailey AE, Storm KJ. Building capacity in reflective practice: a tiered model of statewide supports for local home-visiting programs. Infant Ment Health J. 2016;37(6):640–52.
  • 21
    Ammerman RT, Putnam FW, Kopke JE, Gannon TA, Short JA, Van Ginkel JB, et al. Development and implementation of a quality assurance infrastructure in a multisite home visitation program in Ohio and Kentucky. J Prev Interv Community. 2007;34(1-2):89–107.
  • 22
    Vaughn L, Forbes J, Howell B. Enhancing home visitation programs: input from a participatory evaluation using photovoice. Infants Young Child. 2009;22(2):132–45.
  • 23
    Saïas T, Lerner E, Greacen T, Simon-Vernier E, Emer A, Pintaux E, et al.; CAPEDP Study Group. Evaluating fidelity in home-visiting programs a qualitative analysis of 1058 home visit case notes from 105 families. PLoS One. 2012;7(5):e36915.
  • 24
    Sanders J, Owen-Jones E, Robling M. Evaluating the family nurse partnership in England: the Building Blocks trial. Pract Midwife. 2011;14(7):13–5.
  • 25
    Drummond JE, Weir AE, Kysela GM. Home visitation practice: models, documentation, and evaluation. Public Health Nurs. 2002;19(1):21–9.
  • 26
    Korfmacher J, Sparr M, Chawla N, Fulford J, Fleming J. Illinois Prevention Initiative Birth to Three Program Evaluation Illinois Prevention Initiative (PI) Birth to Three Program Evaluation. Illinois: Herr Research for Children and Social Policy Erikson Institute; 2012.
  • 27
    Brand T, Jungmann T. Implementation differences of two staffing models in the german home visiting program “pro kind”. J Community Psychol. 2012;40(8):891–905.
  • 28
    Roggman L, Boyce L, Cook G, Jump V. Inside home visits: A collaborative look at process and quality. Early Child Res Q. 2001;16(1):53–71.
  • 29
    King PL. Quality assurance guidelines. Developing standards for a freestanding ambulatory surgery unit. AORN J. 1989;50(1):98–102.
  • 30
    Tomlin AM, Hines E, Sturm L. Reflection in home visiting: the what, why, and a beginning step toward how. Infant Ment Health J. 2016;37(6):617–27.
  • 31
    Zapart S, Knight J, Kemp L. ‘It Was Easier Because I Had Help’: Mothers’ Reflections on the Long-Term Impact of Sustained Nurse Home Visiting. Matern Child Health J. 2016;20(1):196–204.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Out 2019
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2019

Histórico

  • Recebido
    6 Ago 2018
  • Aceito
    14 Jun 2019
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: actapaulista@unifesp.br