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Atitudes e embaraço face ao preservativo em estudantes de enfermagem

Actitudes y vergüenza ante el preservativo en estudiantes de enfermería

Resumo

Objetivo

Conhecer a perceção do risco individual de infeção HIV; avaliar conhecimentos sobre infeção HIV; conhecer atitudes face ao uso do preservativo em função do sexo; conhecer o embaraço na aquisição, negociação e uso do preservativo em função do sexo, independentemente de preservativo masculino ou feminino.

Métodos

Estudo analítico-transversal. Amostra não probabilística constituída por 102 estudantes de Enfermagem. Instrumentos: questionário sociodemográfico e perceção do risco; teste de conhecimentos; escala de embaraço no uso do preservativo; escala de atitudes face ao uso do preservativo.

Resultados

A perceção do risco de infeção HIV é favorável/muito favorável para mais de 50% dos jovens e não estatisticamente diferente entre sexos (X2= 2,213; GL= 4, p= 0,697). Dos jovens inquiridos, 86,3% nunca fez teste HIV e 86,1% não se recorda de qualquer campanha de prevenção. O teste de conhecimentos teve resultado global de 83,7%. A dimensão médico-científica mostrou os resultados mais baixos (77,8%). O embaraço na aquisição do preservativo é superior nas inquiridas comparativamente com os inquiridos (t= -2,08; p= 0,04). A atitude face ao uso do preservativo não é significativamente diferente em função do sexo (t= -1,20; p= 0,23).

Conclusão

Os estudantes têm boa perceção do risco de infeção de HIV, mas baixa adesão à realização do teste e a maioria não se recorda da última campanha de prevenção. Os conhecimentos revelados são elevados, mas necessitam de ser incrementados na dimensão médico-científica. As estudantes revelam mais embaraço do que os estudantes face ao preservativo, porém, as atitudes manifestadas são idênticas. Programas formativos continuam imprescindíveis.

Síndrome de imunodeficiência adquirida; Atitude; Estudantes; Preservativo; Percepção; Risco

Resumen

Objetivo

Conocer la percepción del riesgo individual de infección por VIH. Evaluar los conocimientos sobre infección por VIH. Conocer las actitudes ante el uso del preservativo en función del sexo. Conocer el nivel de vergüenza en la adquisición, negociación y uso de preservativos en función del sexo, tanto preservativos masculinos como femeninos.

Métodos

Estudio analítico transversal. Muestra no probabilística, formada por 102 estudiantes de enfermería. Instrumentos: cuestionario sociodemográfico y percepción del riesgo, prueba de conocimientos, escala de vergüenza en el uso de preservativos, escala de actitudes ante el uso de preservativos.

Resultados

La percepción del riesgo de infección por VIH es favorable/muy favorable para más del 50 % de los jóvenes y no es estadísticamente diferente entre sexos (X2= 2,213; GL= 4, p= 0,697). De los jóvenes encuestados, el 86,3 % nunca realizó una prueba de VIH y el 86,1 % no recuerda ninguna campaña de prevención. El resultado global de la prueba de conocimientos fue del 83,7 %. La dimensión médico-científica tuvo los resultados más bajos (77,8 %). La vergüenza en la adquisición de preservativos es superior en las encuestadas en comparación con los encuestados (t= -2,08; p= 0,04). La actitud ante el uso del preservativo no es significativamente diferente en función del sexo (t= -1,20; p= 0,23).

Conclusión

Los estudiantes tienen una buena percepción del riesgo de infección por VIH, pero una baja adherencia a la realización de pruebas y la mayoría no recuerda la última campaña de prevención. Los conocimientos revelados son altos, pero necesitan aumentar en la dimensión médico-científica. Las estudiantes revelan más vergüenza que los estudiantes ante el preservativo, pero las actitudes manifestadas son idénticas. Los programas educativos continúan siendo imprescindibles.

Síndrome de inmunodeficiencia adquirida; Acttitud; Estudiantes; Condones; Percepción; Riesgo

Abstract

Objective

To investigate the perception of individual risk of HIV infection; to assess knowledge about HIV infection; to learn about condom use attitudes according to gender; to investigate embarrassment about obtaining, negotiating and using condoms according to gender, whether male or female condom.

Method

This was an analytical cross-sectional study. A non-probabilistic sample was assembled consisting of 102 nursing students. Instruments: sociodemographic and risk perception questionnaire; knowledge test; scale of embarrassment about condom use; condom attitudes scale.

Results

Perception of risk of HIV infection is favorable/very favorable for more than 50% of young people and there was no statistical difference between the sexes (X 2=2.213; GL= 4, p= 0.697). Of the participants, 86.3% had never been tested for HIV and 86.1% did not recall any HIV prevention campaign. The global result of the knowledge test was 83.7%. The medical-scientific dimension presented the lowest results (77.8%) Embarrassment about obtaining condoms was higher among the women than men (t=-2.08; p=0.04). Attitude towards using condoms was not significantly different between the genders (t= -1.20; p= 0.23).

Conclusion

The students had a good perception of the risk of HIV infection, but presented low adherence to HIV testing and most did not remember the last prevention campaign. They presented having a high level of knowledge, but they need to improve their knowledge in the medical-scientific dimension. Female students were more embarrassed than the male students about condoms, however, the attitudes towards them were identical. Educational programs continue to be essential.

Acquired immunodeficiency syndrome; Attitude; Students; Condoms; Perception; Risk

Introdução

As infeções sexualmente transmissíveis (IST) constituem um problema de saúde pública a nível Mundial. Segundo a Joint United Nations Program on HIV/AIDS, em 2017 cerca de 5000 pessoas foram infetadas por dia pelo HIV. Destes, 4400 eram jovens adultos com mais de 15 anos, dos quais 33% dos 15-24 anos e 19% do sexo feminino.(11. Joint United Nations. Program on HIV/AIDS UNAIDS DATA 2018. Geneva: Joint United Nations Program on HIV/AIDS; 2018.)

Portugal apresenta das mais elevadas taxas de infeção HIV da União Europeia, com 10 casos/100 mil habitantes, comparativamente com a média de 5.7/100 mil habitantes na União Europeia,(22. European Centre for Disease Prevention and Control, WHO Regional Office for Europe. HIV/AIDS surveillance in Europe 2018-2017 data. Copenhagen: WHO Regional Office for Europe; 2018.) verificando-se que 33,2 % das pessoas infetadas por HIV têm idades entre 15-29 anos, 14,6 % entre 15-24 anos(33. Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge. Infeção VIH e SIDA: a situação em Portugal a 31 de dezembro de 2017. Lisboa; Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge; 2018.)e, 53,2% são diagnósticos tardios.(44. Direção Geral da Saúde. Infeção VIH e SIDA - Desafios e Estratégias 2018. Lisboa: Direção Geral da Saúde; 2018.)

O desenvolvimento de programas educativos em saúde escolar, tem sido notável. Atualmente, cerca de 80% dos jovens têm educação sexual relacionada com esta temática,(55. Kim YK, Small E, Okumu M. School-based HIV/AIDS education, risky sexual behaviors, and HIV testing among high school students in the United States. Soc Work Health Care. 2019;58(3):258–73.)o que é de enorme importância, já que estudantes com formação têm mais probabilidades de fazer o teste HIV perante comportamentos de risco sexual.(55. Kim YK, Small E, Okumu M. School-based HIV/AIDS education, risky sexual behaviors, and HIV testing among high school students in the United States. Soc Work Health Care. 2019;58(3):258–73.) No entanto, mantêm-se áreas lacunares ao nível das atitudes, crenças erróneas individuais e coletivas e discrepância entre conhecimentos e comportamentos sexuais de risco.

Jovens do ensino superior, do curso de enfermagem, demonstram baixa perceção de risco de infeção HIV e baixa adesão ao teste HIV/AIDS.(66. Cunha-Oliveira A Caramelo F, Patrício M, Camarneiro A, Massano-Cardoso S, Pita J. Impacto de um programa de intervenção educativa nos comportamentos sexuais de jovens universitários. Rev Enf Referência. 2017;13(IV):71–82.) Jovens universitários em Oakland, revelaram 98% de conhecimentos adequados sobre a transmissão do HIV, mas 53% mostrou ideias erradas; 70% indicou o preservativo como meio de prevenção, mas apenas 28% o utilizou; 67% revelou estar sexualmente ativo, mas só 19% fez o teste HIV nos últimos dois anos, sendo a maior parte das jovens mulheres.(77. Mackman S, Hussein I. Awareness, knowledge, and behavior regarding HIV/AIDS among freshman students at Oakland University. EuroMediter Biomed J. 2017;12(16):73–6.) Há evidências que estas valorizam mais o uso de preservativo do que os jovens do sexo masculino da mesma idade,(88. Bezerra E, Pereira M, Chaves A, Monteiro P. Representações sociais de adolescentes à cerca da relação sexual e do uso de preservativo. Rev Gaúcha Enferm. 2015;36(1):89–91.) Também o teste HIV é realizado com mais frequência pelo sexo feminino.(55. Kim YK, Small E, Okumu M. School-based HIV/AIDS education, risky sexual behaviors, and HIV testing among high school students in the United States. Soc Work Health Care. 2019;58(3):258–73.)

Para maior eficácia na luta contra as IST, em particular o HIV/AIDS, é da máxima importância continuar a apostar na educação como meio de prevenção de comportamentos sexuais de risco, mas repensando as metodologias utilizadas. Num estudo com adolescentes, estes evidenciaram a necessidade de incluir material educacional em IST/HIV/AIDS, para ser discutido e potenciar o conhecimento, tendo indicado como prioritário discutir o uso do preservativo durante as relações sexuais, de forma a colocar o foco na adesão ao mesmo. Assim, a educação tem de fazer dos educandos os seus protagonistas, de modo a construírem pensamento e sentimento de domínio sobre o tema.(99. Costa A, Araújo M, Araújo T, Gubert F, Vieira N. Protagonism of adolescents in preventing sexually transmitted diseases. Acta Paul Enferm. 2015;28(5):482–7.)

Este estudo tem como objetivos conhecer a perceção de risco individual face ao HIV em estudantes de enfermagem; avaliar o nível de conhecimentos de prevenção e transmissão da infeção HIV; conhecer as atitudes face ao uso do preservativo em função do sexo e conhecer o embaraço na aquisição, negociação e uso do preservativo em função do sexo, independentemente do tipo de preservativo, masculino ou feminino.

Métodos

Estudo quantitativo, analítico-transversal, com amostra não probabilística de conveniência, constituída por 102 estudantes do segundo ano do Curso de Graduação em Enfermagem de uma escola da região Centro de Portugal, que voluntariamente aceitaram participar, após explicação dos objetivos do estudo. Constituíram critérios de inclusão, idade superior a 18 anos e de exclusão o preenchimento irregular do questionário. Recolha de dados efetuada em junho de 2019.

A colheita de dados foi realizada com o instrumento a seguir descrito. Questionário sociodemográfico e de saúde (estado serológico e perceção de risco de infeção HIV), construído para o estudo. Subteste de conhecimentos sobre prevenção de HIV/AIDS, do Teste de Conhecimentos de Prevenção e Transmissão da Infeção VIH, de Koopman e Reid traduzido e adaptado para português(1010. Oliveira A. Preservativo, sida e saúde pública: factores que condicionam a adesão aos mecanismos de prevenção do VIH-SIDA. Coimbra: Universidade de Coimbra; 2008.), constituído por 45 questões, de resposta dicotómica, verdadeira ou falsa, que avalia três dimensões, conhecimentos médico-científicos, mitos sobre a transmissão do HIV e conhecimentos sobre comportamentos de alto risco e, comportamentos preventivos; tem pontuação final entre zero e 100%. Subescala de Atitudes face ao Preservativo, uma das cinco subescalas da Sexual Risks Scale, de DeHart e Birkimer traduzida e adaptada para português;(1010. Oliveira A. Preservativo, sida e saúde pública: factores que condicionam a adesão aos mecanismos de prevenção do VIH-SIDA. Coimbra: Universidade de Coimbra; 2008.) contém 13 itens pontuados numa escala tipo Likert, com cinco pontos; as pontuações mais altas indicam pré-disposição mais favorável a práticas de sexo seguro. Escala de Embaraço face ao Uso de Preservativo, de Vail-Smith e Durham, traduzida e adaptada para português,(1111. Cunha-Oliveira A, Cunha-Oliveira J, Cardoso I, Pita JR, Massano-Cardoso S. Adaptação para a língua portuguesa da Escala de Embaraço Face ao Preservativo. Interações. 2011; 11(20):133-50.) possui três dimensões, a primeira direcionada à aquisição, compra/aquisição ou posse de preservativos, a segunda à negociação para o uso com o parceiro e a terceira sobre o uso propriamente dito do preservativo; é constituída por 18 itens, avaliados numa escala de concordância, tipo Likert com cinco alternativas. A pontuação varia entre 18 (nível mais baixo de embaraço) e 90 (o mais elevado).

Os dados foram processados em IBM, Statistical Pakage for Social Sciences, versão 24. Foram utilizados os testes t de Student para amostras independentes e Qui quadrado.

A pesquisa foi aprovada pelo Comissão de Ética da Unidade Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem, da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (Parecer nº 596/05-2019). Os participantes assinaram o consentimento informado.

Resultados

Participaram 102 indivíduos que frequentavam o segundo ano do curso de enfermagem, de uma escola superior de Enfermagem da região Centro de Portugal, com média de idades de 20,19 anos (DP= 3,81), dos quais 20 (19,6%) eram do sexo masculino e 82 (80,4%) do sexo feminino.

A perceção do risco de infeção HIV é favorável e muito favorável para mais de 50% dos jovens e não é estatisticamente diferente entre sexo (X22. European Centre for Disease Prevention and Control, WHO Regional Office for Europe. HIV/AIDS surveillance in Europe 2018-2017 data. Copenhagen: WHO Regional Office for Europe; 2018.= 2,213; GL= 4, p= 0,697).

Dos participantes 86,3% nunca fez o teste de VIH e apenas 5,1% o fez nos últimos 12 meses. A perceção do risco pessoal para contrair infeção foi mais baixa no sexo masculino (n=7; 35%), comparativamente com o sexo feminino (n= 36; 44,4%).

Dos inquiridos, 83,2% afirmou já ter participado em programas de educação para prevenção do HIV, durante o ensino secundário; 89,2% relatou ter sido “consumidor” de mensagens divulgadas pelos mídia, enquanto 63,4% recorda-se de campanhas de prevenção difundidas por outdoors ou outras formas de divulgação publicitária. Quando questionados sobre as últimas campanhas de mensagens preventivas associadas ao HIV, 86,1% não se recorda de nenhuma.

O teste de conhecimentos sobre o HIV (Tabela 1) teve, no seu global um resultado de 88,7%, na dimensão médico-científica apresentou resultados mais baixos (77,8%), na dimensão mitos sobre a transmissão, a média foi 82% e no conhecimento sobre comportamentos de alto risco e comportamentos preventivos a média foi 91,3%.

Tabela 1
Percentagem de respostas corretas aos itens no subteste de conhecimentos sobre prevenção de HIV/AIDS

Os resultados obtidos pela aplicação da Subescala de Atitudes Face ao Uso do Preservativo evidenciaram que os estudantes do sexo feminino obtiveram melhores resultados médios (M= 49,94; DP= 7,63), quanto comparados com o sexo masculino (M= 47,50; DP= 9,83), no entanto, esta diferença não é estatisticamente significativa (t= -1,20; p= 0,23). Os resultados da Escala de Embaraço Face ao Preservativo, na sua dimensão total, mostraram valores superiores nos estudantes do sexo feminino (M= 38,96; DP= 10,61) comparativamente aos do sexo masculino (M=35,63; DP= 12,72), no entanto sem significado estatístico (t= -1,17; p= 0,24). Ainda nesta escala, as diferenças entre os sexos são significativas para a subescala de embaraço na aquisição do preservativo (t= - 2,08; p= 0,04), sugerindo que são as jovens quem sente significativamente mais embaraço, nesta aquisição (Tabela 2).

Tabela 2
Teste t de Student e U de Mann Whitney de diferenças de médias nos resultados da Escala de Embaraço Face ao uso do Preservativo em função do sexo

Discussão

A presente investigação permitiu estudar questões relacionadas com o conhecimento sobre HIV, perceção do risco individual do HIV, atitudes face ao uso do preservativo e embaraço face à aquisição, negociação e uso do preservativo em jovens do curso de enfermagem. Participaram um maior número de jovens do sexo feminino do que do sexo masculino, como habitualmente neste tipo de graduação.

A formação em enfermagem constitui-se um amplo campo de saberes e conhecimentos que interagem com vários domínios científicos. Apesar de estes estudantes dominarem um considerável leque de conhecimentos científicos relativamente à saúde, não significa que os comportamentos e conhecimentos sobre o HIV sejam inequivocamente corretos. Neste estudo, cerca de um quarto dos estudantes afirma que “Pode-se ser infetado pelo HIV, e depois contrair a Sida, ao dar sangue”. Este dado é revelador de crenças e conhecimentos contrários ao conhecimento cientifico, revelando a presença de ideias erróneas, acarretando medos infundados. O mesmo acontece com os conhecimentos relacionados com o uso correto do preservativo. Sabe-se que a utilização do preservativo, quando usado de maneira correta e consistente, é eficaz na prevenção do HIV.(1212. Slaymaker E. A critique of international indicators of sexual risk behaviour. Sex Transm Infect. 2004;80 Suppl 2:ii13–ii21.) Para tal, priorizar intervenções dirigidas às populações, promovendo o acesso ao preservativo, carece de investimento e avaliação do conhecimento relativamente ao tema. Quando questionados sobre o facto de se poder “morrer de Sida se contrair a doença”, mais de dois terços considera que não. As mortes não são diretamente resultantes da Sida em si mesma, mas das doenças ou condições que resultam da imunossupressão, as quais não estariam presentes sem a doença de base.(1313. Cunha-Oliveira A, Cunha-Oliveira J, Massano-Cardoso S. VIH/ Sida: situação da prevenção em Portugal e o contexto europeu. Debater a Europa. 2016;14(14):141–74.)

A importância sobre o conhecimento do estado serológico das populações é fundamental. A ONUSIDA(1414. Direção Geral da Saúde. Programa nacional para a infeção VIH, Sida e tuberculose. Lisboa: Direção Geral da Saúde; 2017.) prevê que até 2020, 90% das pessoas que vivem com infeção saibam que estão infetadas, 90% das pessoas que sabem que estão infetadas estejam em tratamento e 90% das pessoas que estejam em tratamento tenham a infeção controlada. Com estas medidas, e de acordo com as Nações Unidas, prevê-se que em 2030 o HIV/AIDS seja erradicado.(1515. Joint United Nations Programme on HIV/AIDS (UNAIDS). 90-90-90. An ambitious treatment target to help end the AIDS epidemic. Geneva: UNAIDS; 2014.) No entanto, a motivação da população para as medidas preventivas e conhecimentos do seu estado serológico, não parece seguir as recomendações internacionais.

No presente estudo, 86,3% nunca fez o teste HIV, e apenas 5,1% o fez nos últimos 12 meses. Estes baixos resultados são corroborados com outros estudos.(1616. Morales A, Espada JP, Orgilés M. Barreras hacia la prueba de deteccíon del VIH en adolescentes en España. Psychosoc Intervent. 2016;25(3):135–41.)Adicionalmente, a baixa perceção do risco individual para contrair infeção por HIV, variou entre os 35% para o sexo masculino e 44,4% para o sexo feminino, revelando-se um fraco preditor de prevenção e, consequentemente, uma eventual explicação para que estes estudantes não tenham realizado testes de deteção, resultados também encontrados noutras investigações.(1616. Morales A, Espada JP, Orgilés M. Barreras hacia la prueba de deteccíon del VIH en adolescentes en España. Psychosoc Intervent. 2016;25(3):135–41.)

O envolvimento em programas de prevenção é um indicador positivo de interesse sobre o conhecimento do HIV e os dados sugerem uma boa adesão, verificando-se que 83,2% referiu ter participado em programas de educação para a prevenção. Contudo, estes valores não implicam, necessariamente, que tenha havido mudança efetiva de comportamentos. Uma grande maioria relatou ter sido “consumidor” de mensagens divulgadas pelos mídia, mas não se lembra das últimas campanhas preventivas associadas ao HIV, privilegiando a recordação de campanhas difundidas através de outdoors. Em Portugal, desde 2009, está prevista na lei a natureza obrigatória de educação sexual no ensino básico e secundário.(1717. República Portuguesa. Decreto-lei nº 3/84. Educação sexual e planeamento familiar. D.R. 1ª Série.71; 24 mar 1984. p. 981-3.) Para além disso, são seguidas as orientações da ONUSIDA, realizando-se campanhas anuais para assinalar o dia de luta contra a sida e, intensificam-se por todo o país, nas festas académicas, ações de sensibilização e prevenção.

Os resultados sugerem que o conhecimento dos alunos foi na sua maioria elevado, no entanto, identificaram-se respostas que traduzem crenças erradas e demonstram falta de conhecimento, o que se torna preocupante quando se trata de futuros profissionais de saúde. De acordo com a literatura, ideias erróneas associadas ao uso do preservativo, bem como desconhecimento sobre a transmissão, potenciam comportamentos de risco principalmente nas mulheres.(1818. Tsala Dimbuene Z, Kuate Defo B. Fostering accurate HIV/AIDS knowledge among unmarried youths in Cameroon: do family environment and peers matter? BMC Public Health. 2011;11(1):348.)

A Escala de Atitudes Face ao Uso do Preservativo revelou valores superiores no sexo feminino, comparativamente ao sexo masculino, mas sem significado estatístico. De facto, os estudantes universitários portugueses têm atitudes razoavelmente positivas face ao uso do preservativo masculino.(1818. Tsala Dimbuene Z, Kuate Defo B. Fostering accurate HIV/AIDS knowledge among unmarried youths in Cameroon: do family environment and peers matter? BMC Public Health. 2011;11(1):348.) Os resultados da presente pesquisa indiciam a necessidade de aprofundamento através de um estudo longitudinal com uma amostra mais significativa. A investigação sobre a temática tem sido amplamente debatida, apontando para que programas de prevenção devam focar-se na mudança de atitudes no sexo masculino. Esta ideia é suportada pelo facto de o uso do preservativo masculino estar, em primeira instância, associado ao sexo masculino. No entanto, as recomendações evocam a necessidade de desenvolvimento de estratégias de negociação e promoção do uso do preservativo em função do sexo, de forma a potenciar a aceitabilidade do seu uso como comportamento preventivo na relação com o parceiro.(1919. Reis M, Ramiro L, Matos M, Diniz J. Determinants influencing male condom use among university students in Portugal. Int J Sex Health. 2013;25(2):115–27.)

No que respeita ao embaraço na aquisição, negociação e uso, sabe-se que atitudes mais favoráveis determinam menor embaraço na aquisição.(2020. Vasilenko SA, Kreager DA, Lefkowitz ES. Gender, Contraceptive Attitudes, and Condom Use in Adolescent Romantic Relationships: A Dyadic Approach. J Res Adolesc. 2015;25(1):51-62.) Nesta investigação, as estudantes demonstraram significativamente maior embaraço na aquisição do preservativo do que os estudantes, portanto, tomam menos iniciativa nessa aquisição. Também, na Escala de Embaraço, total, apresenta valores superiores, embora sem significância estatística. Foram limitações ao estudo, o tamanho da amostra e a baixa representatividade do sexo masculino.

Conclusão

A maioria dos estudantes tem boa perceção do risco de infeção de HIV, não sendo diferente consoante o sexo. A realização de testes serológicos de HIV não é ainda uma realidade entre os estudantes. O conhecimento sobre a infeção de HIV é aceitável ou mesmo, tendencialmente, bom. Contudo, existem falsos conceitos quanto à forma de transmissão e prevenção. A atitude face ao uso do preservativo demostrou ser aceitável. Já os resultados relativos ao embaraço face à aquisição, negociação e uso do preservativo sugerem mais insegurança no sexo feminino do que no sexo masculino. Assim, propõe-se a implementação de programas formativos orientados para a mudança de comportamentos para além da aquisição de conhecimentos.

Agradecimentos

Este trabalho é financiado por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a o Ciencia e Tecnologia, I.P., no âmbito do projeto Refª.UIDB/ 00742/2020.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Nov 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    22 Jul 2019
  • Aceito
    2 Dez 2020
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