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Fragilidade e funcionalidade familiar de idosos da Atenção Domiciliar: estudo transversal analítico

Fragilidad y funcionalidad familiar de adultos mayores en la Atención Domiciliaria: estudio transversal analítico

Resumo

Objetivo

Identificar a prevalência da fragilidade em idosos e o nível de funcionalidade familiar e analisar a associação dessas variáveis com características sociodemográficas e com o acesso aos serviços de saúde de idosos vinculados à Atenção Domiciliar tipo 1 da Atenção Primária à Saúde.

Métodos

Estudo transversal analítico, realizado por meio de visitas domiciliares, de outubro de 2018 a abril de 2019, com 124 idosos de 60 anos ou mais, vinculados à Atenção Domiciliar tipo 1 de um distrito sanitário de Porto Alegre. Utilizaram-se a Escala de Fragilidade de Edmonton, o APGAR da família e o questionário de dados sociodemográficos e de acesso ao serviço de saúde. Aplicaram-se o teste t de Student, o teste de Mann-Whitney, o teste do qui-quadrado, o teste exato de Fisher e o modelo de regressão de Poisson na análise estatística. Foi considerado como valor significativo p<0,05.

Resultados

A prevalência de fragilidade foi de 75%, e 84,7% dos idosos apresentaram bom nível de funcionalidade familiar. A fragilidade apresentou associação estatisticamente significativa, com maior faixa etária (p=0,009), elevado número médio de morbidades (p=0,027), presença de cuidador (p<0,001), não morar sozinho (p<0,001), défice cognitivo (p<0,001) e com forma de atendimento exclusivamente domiciliar (p<0,001). A funcionalidade familiar não apresentou associação estatisticamente significativa com as variáveis em estudo.

Conclusão

Houve alta prevalência de fragilidade e de boa funcionalidade familiar. Apenas a fragilidade esteve associada significativamente com algumas das variáveis em estudo. Conhecer essa população específica é imprescindível para que intervenções possam ser desenvolvidas, garantindo acesso aos serviços de saúde.

Atenção primária à saúde; Família; Fragilidade; Idoso

Resumen

Objetivo

Identificar la prevalencia de la fragilidad en adultos mayores y el nivel de funcionalidad familiar y analizar la asociación de esas variables con características sociodemográficas y con el acceso a los servicios de salud de adultos mayores vinculados a la Atención Domiciliaria tipo 1 de la Atención Primaria a la Salud.

Métodos

Estudio transversal analítico, realizado por medio de visitas domiciliarias, de octubre de 2018 a abril de 2019, con 124 adultos mayores de 60 años o más, vinculados a la Atención Domiciliaria tipo 1 de un distrito sanitario de Porto Alegre. Se utilizó la Escala de Fragilidad de Edmonton, el APGAR de la familia y el cuestionario de datos sociodemográficos y de acceso al servicio de salud. Se aplicaron la prueba t de Student, la prueba de Mann-Whitney, la prueba chi cuadrado, y la prueba exacta de Fisher y el modelo de regresión de Poisson en el análisis estadístico. Se consideró valor significante p<0,05.

Resultados

La prevalencia de fragilidad fue de 75 % y el 84,7 % de los adultos mayores presentaron un buen nivel de funcionalidad familiar. La fragilidad presentó una asociación estadísticamente significante, con mayor grupo de edad (p=0,009), elevado número promedio de morbilidades (p=0,027), presencia de cuidador (p<0,001), no vivir solo (p<0,001), déficit cognitivo (p<0,001) y con forma de atención exclusivamente domiciliaria (p<0,001). La funcionalidad familiar no presentó asociación estadísticamente significante con las variables en estudio.

Conclusión

Hubo una alta prevalencia de fragilidad y de buena funcionalidad familiar. Apenas la fragilidad estuvo asociada significantemente con algunas de las variables en estudio. Conocer a esa población específica es imprescindible para que se puedan desarrollar intervenciones, garantizando el acceso a los servicios de salud.

Atención primaria de salud; Familia; Fragilidad; Anciano

Abstract

Objective

To identify frailty prevalence and family functionality level in older people and analyze the association of these variables with sociodemographic characteristics and with access to health care services for older people linked to Home Care type 1 in Primary Health Care.

Methods

This is an analytical cross-sectional study, carried out through home care visits, from October 2018 to April 2019, with 124 older people aged 60 years or older, linked to Home Care type 1 in a health district in Porto Alegre. The Edmonton Frail Scale, the family APGAR and the sociodemographic data and access to health care service questionnaire were used. Student’s t test, Mann-Whitney test, chi-square test, Fisher’s exact test and Poisson regression model were applied in the statistical analysis. A significant value p<0.05 was considered.

Results

Frailty prevalence was 75%, and 84.7% of the older adults had a good family functionality level. Frailty had a statistically significant association, with a higher age group (p=0.009), a high average number of morbidities (p=0.027), presence of a caregiver (p<0.001), not living alone (p<0.001), cognitive decline (p<0.001) and exclusively home care (p<0.001). Family functionality did not show a statistically significant association with the variables under study.

Conclusion

There was a high frailty prevalence and good family functionality. Only frailty was significantly associated with some of the variables under study. Knowing this specific population is essential so that interventions can be developed, ensuring access to health care services.

Primary health care; Family; Frailty; Aged

Introdução

Cuidar de uma população cada vez mais envelhecida, por conta da rápida transição demográfica em âmbito mundial, é um grande desafio. ( 11. United Nations . Department of Economic and Social Affairs . Population Division . World Population Prospects. The 2017 Revision. Key findings & advance tables . New York : United Nations ; 2017 [ cited 2021 Aug 17 ]. Available from: https://population.un.org/wpp/publications/files/wpp2017_keyfindings.pdf
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) No envelhecimento fisiológico, observa-se perda funcional gradual e progressiva, que não provoca incapacidade, mas que resulta em limitações ao idoso. ( 22. Moraes EN . Processo de envelhecimento e bases da avaliação multidimensional do idoso . In: Borges AP , Coimbra AM , organizadores . Envelhecimento e saúde da pessoa idosa . Rio de Janeiro : Fundação Oswaldo Cruz ; 2008 . Capítulo 6 . p. 155 - 76 . [ citado 2021 Ago 17 ]. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/444168/mod_resource/content/1/Envelhecimento_e_saude_da_pessoa_idosa.pdf
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) Algumas dessas perdas podem ser mais expressivas e agrupadas, caracterizando a síndrome da fragilidade, ( 22. Moraes EN . Processo de envelhecimento e bases da avaliação multidimensional do idoso . In: Borges AP , Coimbra AM , organizadores . Envelhecimento e saúde da pessoa idosa . Rio de Janeiro : Fundação Oswaldo Cruz ; 2008 . Capítulo 6 . p. 155 - 76 . [ citado 2021 Ago 17 ]. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/444168/mod_resource/content/1/Envelhecimento_e_saude_da_pessoa_idosa.pdf
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) que, por sua vez, contribui para o aumento do risco de quedas, hospitalização, incapacidades, institucionalização, dependência e morte. ( 22. Moraes EN . Processo de envelhecimento e bases da avaliação multidimensional do idoso . In: Borges AP , Coimbra AM , organizadores . Envelhecimento e saúde da pessoa idosa . Rio de Janeiro : Fundação Oswaldo Cruz ; 2008 . Capítulo 6 . p. 155 - 76 . [ citado 2021 Ago 17 ]. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/444168/mod_resource/content/1/Envelhecimento_e_saude_da_pessoa_idosa.pdf
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, 33. Augusti AC , Falsarella GR , Coimbra AM . Analysis of frailty syndrome in primary care - Cross sectional study . Rev Bras Med Fam Comunidade . 2017 ; 12 ( 39 ): 1 - 9 . )

O avanço da fragilidade no idoso implica a necessidade de apoio de cuidadores, arranjos na estrutura física do ambiente e disponibilização de tempo e de conhecimento para os cuidados necessários a essa população. ( 44. Cunha JV , Reiners AA , Azevedo RC , Cardoso JD , Cunha CR , Silva KM . Functioning of families with fully dependent elderly . Cienc Cuid Saude . 2019 ; 18 ( 2 ): e48825 . ) Então, considerando-se que, muitas vezes, o cuidado com o idosos é prestado por familiares, o que pode gerar algum impacto na organização da família, é importante conhecer como se dá a dinâmica familiar, ou seja, o nível da funcionalidade familiar do idoso. Entende-se por funcionalidade da família o modo como esta é capaz de cumprir e harmonizar as funções essenciais, de forma apropriada à identidade e às relações das famílias e de seus membros, sendo realista quanto aos desafios que afetam a unidade familiar. ( 55. Fernandes CS , Magalhães B , Silva S , Edra B . Perception of family functionality during social confinement by Coronavirus Disease 2019 . J Nurs Health . 2020 ; 10 ( 4 ): 20104034 . )

Assim, a fragilidade e a funcionalidade familiar são aspectos importantes quando o enfermeiro realiza a avaliação de saúde do idoso, pois, sabendo-se que os idosos são grandes usuários dos serviços de saúde, o atendimento deve estar focado no acolhimento e na oferta de cuidado integral e continuado. ( 66. Dias FA , Gama ZA , Tavares DM . Atenção Primária à Saúde do idoso: modelo conceitual de enfermagem . Cogitare Enferm . 2017 ; 22 ( 3 ); e53224 . ) Aos idosos em estabilidade clínica, que necessitam de Atenção à Saúde em situação de restrição ao lar, de maneira temporária ou definitiva, ou em grau de vulnerabilidade, é ofertada, pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a Atenção Domiciliar tipo 1 (AD1), de responsabilidade da Atenção Primária à Saúde (APS). ( 77. Brasil . Ministério da Saúde . Portaria n° 825, de 25 de abril de 2016. Redefine a Atenção Domiciliar no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e atualiza as equipes habilitadas . Brasília (DF) : Ministério da Saúde ; 2016 [ citado 2021 Ago 17 ]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2016/prt0825_25_04_2016.html
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) A AD1 é direcionada aos usuários que possuem problemas de saúde controlados e necessitam de cuidados de menor frequência, bem como apresentem alguma dificuldade ou impossibilidade física de locomoção até um serviço de saúde. ( 77. Brasil . Ministério da Saúde . Portaria n° 825, de 25 de abril de 2016. Redefine a Atenção Domiciliar no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e atualiza as equipes habilitadas . Brasília (DF) : Ministério da Saúde ; 2016 [ citado 2021 Ago 17 ]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2016/prt0825_25_04_2016.html
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) Com o aumento da procura de serviços de saúde pela população idosa, torna-se importante conhecer os modelos de Atenção à Saúde que respeitem as características dos idosos com atendimento integral ao longo do percurso assistencial. ( 88. Cruz PK , Vieira MA , Carneiro JA , Costa FM , Caldeira AP . Difficulties of access to health services among non-institutionalized older adults: prevalence and associated factors . Rev Bras Geriatr Gerontol . 2020 ; 23 ( 6 ): e190113 . )

Tendo em vista que a funcionalidade familiar, a fragilidade e o acesso ao serviço de saúde são condições inerentes ao trabalho desempenhado pelo enfermeiro na Atenção Domiciliar, evidencia-se a importância desse profissional na consolidação do cuidado prestado de forma eficaz e resolutiva. Além disso, a população idosa demanda da enfermagem um atendimento mais direcionado e especializado, devido às suas particularidades. ( 99. Cacchione PZ . Innovative care models across settings: Providing nursing care to older adults . Geriatr Nurs . 2020 ; 41 ( 1 ): 16 - 20 . )

Na literatura, existem lacunas quanto à relação entre a fragilidade e funcionalidade da família e o acesso aos serviços de saúde. Estudos têm trazido enfoque nessas temáticas com idosos da comunidade, porém sem associação com o acesso aos serviços de saúde. ( 33. Augusti AC , Falsarella GR , Coimbra AM . Analysis of frailty syndrome in primary care - Cross sectional study . Rev Bras Med Fam Comunidade . 2017 ; 12 ( 39 ): 1 - 9 . , 1010. Campos AC , Rezende GP , Ferreira EF , Vargas AM , Gonçalves LH . Family functioning of Brazilian elderly people living in community . Acta Paul Enferm . 2017 ; 30 ( 4 ): 358 - 67 . ) Nesse sentido, os dados encontrados nesta pesquisa podem nortear a priorização e a implementação de intervenções e de melhorias do cuidado prestado.

Este estudo teve como objetivo identificar a prevalência de fragilidade em idosos e o nível de funcionalidade familiar e analisar a associação dessas variáveis com características sociodemográficas e com o acesso aos serviços de saúde de idosos vinculados à AD1 da APS.

Métodos

Estudo transversal analítico com idosos vinculados à AD1 da APS de um distrito sanitário do Município de Porto Alegre, na Região Sul do Brasil, o qual era dividido em 17 distritos sanitários. A coleta de dados foi realizada de outubro de 2018 até abril de 2019.

A população total de idosos vinculados à AD1 no distrito era de 227 indivíduos. Para o cálculo do tamanho da amostra, foi utilizado o programa WinPepi, versão 11.65. Considerando-se correlação mínima de 0,25 entre as escalas de fragilidade e funcionalidade familiar com a frequência de acesso aos serviços de saúde, 5% de significância e 80% de poder estatístico, o resultado foi uma amostra de 124 sujeitos. ( 1111. Silva DM , Vilela AB , Souza AS , Alves MR , Silva DM , Souza TO . Evaluation of family functionality of elderly . J Nurs UFPE On line 2013 ; 7 ( 9 ): 5550 - 6 .

12. Paskulin LM , Valer DB , Vianna LA . Utilização e acesso de idosos a serviços de atenção básica em Porto Alegre (RS, Brasil) . Cienc Saude Colet . 2011 ; 16 ( 6 ): 2935 - 44 .
- 1313. Carneiro J , Cardoso R , Durães M , Guedes M , Santos F , Costa F , et al . Prevalence and factors associated with frailty in non-institutionalized older adults . Rev Bras Enferm . 2017 ; 70 ( 4 ): 780 - 5 . ) A identificação dos usuários deu-se por meio de listas disponibilizadas pelos serviços de saúde, as quais continham nome completo, endereço e telefone.

Foram incluídos no estudo idosos com 60 anos ou mais, vinculados à AD1 do referido distrito. Foram excluídos idosos não localizados após três tentativas de contato telefônico, em turnos e dias diferentes, ou que não estavam no domicílio após uma tentativa de visita domiciliar; sem capacidade de comunicação verbal ou escrita; com diagnóstico médico prévio de demência avançada (informado pelo cuidador/familiar ou profissional da equipe) e institucionalizados, devido ao acesso e aos cuidados contínuos de profissionais da saúde. Os indivíduos que preencheram os critérios de inclusão foram contatados por telefone, para agendamento da entrevista no domicílio, ou foi feita uma tentativa de visita domiciliar, caso o contato telefônico não fosse possível.

A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas estruturadas no domicílio dos idosos, conduzidas por enfermeiras pós-graduandas e discentes da graduação de enfermagem. Aplicou-se a versão do Miniexame do Estado Mental adaptada e validada para uso no Brasil, ( 1414. Bertolucci PH , Brucki SM , Campacci SR , Juliano Y . The Mini-Mental State Examination in an outpatient population: influence of literacy . Arq Neuropsiquiatr . 1994 ; 52 ( 1 ): 1 - 7 . ) utilizando os seguintes pontos de corte: 13 para analfabetos, 18 para baixa e média escolaridade e 26 para alta escolaridade. Quando a pontuação foi menor ou igual a 13, o cuidador/familiar que estava acompanhando o idoso foi convidado a auxiliar nas respostas aos instrumentos.

Além disso, foi aplicado um questionário elaborado pelas pesquisadoras, contendo dados sociodemográficos (data de nascimento, sexo, escolaridade, fonte de renda, estado conjugal e número de indivíduos que residem no domicílio), morbidades e acesso aos serviços de saúde – esse último foi avaliado por meio das características de oferta, que facilitam ou dificultam o uso desses serviços, ( 1515. Travassos C , Uma revisão sobre os conceitos de acesso e utilização de serviços de saúde . Cad Saude Publica . 2004 ; 20 ( Suppl 2 ): S190 - 8 . Review . ) ou seja, foi considerada a possibilidade de utilização dos serviços pelo idoso, visando atender às necessidades do indivíduo. Dessa forma, as seguintes questões foram utilizadas para avaliar o acesso aos serviços de saúde: Possui algum plano de saúde? Quando necessita de assistência, qual a forma que utiliza? Com que frequência recebe visita domiciliar?

A Escala de Fragilidade de Edmonton, versão adaptada e validada para uso no Brasil, ( 1616. Fabrício-Wehbe SC , Cruz IR , Haas VJ , Diniz MA , Dantas RA , Rodrigues RA . Reproducibility of the Brazilian version of the Edmonton Frail Scale for elderly living in the community . Rev Lat Am Enfermagem . 2013 ; 21 ( 6 ): 1330 - 6 . ) foi utilizada para avaliar a fragilidade. Essa escala é composta de nove domínios: cognição, estado geral de saúde, independência funcional, suporte social, uso de medicamentos, nutrição, humor, continência e desempenho funcional. Os escores finais para análise da fragilidade são de zero a quatro se não apresenta fragilidade, cinco a seis se aparentemente vulnerável, sete a oito se fragilidade leve, nove a dez se fragilidade moderada e 11 a 17 se fragilidade severa. ( 1717. Fabrício-Wehbe SC , Schiaveto FV , Vendrusculo TR , Haas VJ , Dants RA , Rodrigues RA . Cross-cultural adaptation and validity of the “Edmonton Frail Scale - EFS” in a Brazilian elderly sample . Rev Lat Am Enfermagem . 2009 ; 17 ( 6 ): 1 - 7 . ) Para este estudo, utilizaram-se como pontos de corte de zero a seis para não frágil e de sete a 17 para frágil. ( 1313. Carneiro J , Cardoso R , Durães M , Guedes M , Santos F , Costa F , et al . Prevalence and factors associated with frailty in non-institutionalized older adults . Rev Bras Enferm . 2017 ; 70 ( 4 ): 780 - 5 . )

O instrumento APGAR da Família, adaptado e validado para uso no Brasil, foi aplicado para avaliar a funcionalidade familiar. ( 1818. Silva MJ , Victor JF , Mota FR , Soares ES , Leite BM , Oliveira ET . Analysis of psychometric properties of family APGAR with elderly in northeast Brazil . Esc Anna Nery . 2014 ; 18 ( 3 ): 527 - 32 . ) Trata-se de um acrônimo que avalia adaptação ( adaptation ), companheirismo ( partnership ), desenvolvimento ( growth ), afetividade ( affection ) e capacidade resolutiva ( resolve ). Os referidos quesitos são avaliados por meio de cinco questões simples, com opções de resposta: “sempre (2)”, “algumas vezes (1)” e “nunca (0)”. Utilizaram-se os pontos de corte de zero a seis (apresenta disfunção familiar) e de sete a dez (apresenta boa funcionalidade familiar). ( 1919. Rabelo DF , Neri AL . The household arrangements, physical and psychological health of the elderly and their satisfaction with family relationships . Rev Bras Geriatr e Gerontol . 2015 ; 18 ( 3 ): 507 - 19 . )

Os pesquisadores foram previamente capacitados, e todas as entrevistas foram conduzidas por dois pesquisadores. Foi realizada dupla digitação dos dados no programa Excel, e, após, os dados foram transportados e analisados no Statistical Package for the Social Sciences , versão 21.0.

As recomendações do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) ( 2020. von Elm E , Altman DG , Egger M , Pocock SJ , Gøtzsche PC , Vandenbroucke JP ; STROBE Initiative . The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies . Lancet . 2007 ; 370 ( 9596 ): 1453 - 7 . ) foram utilizadas para apoiar o rigor deste estudo e descrever todos os elementos necessários.

Para comparar as médias das variáveis de interesse, foram aplicados o teste t de Student e, em caso de assimetria, o teste de Mann-Whitney. O teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher foi realizado para comparar as proporções. Para controle de fatores confundidores, aplicou-se o modelo de regressão de Poisson. Foram inseridas no modelo multivariado todas as variáveis que apresentaram p<0,20 na análise bivariada. Foram consideradas associações estatisticamente significativas aquelas que apresentaram p<0,05.

O estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (nº 2.740.678) (CAAE: 90632418.3.0000.5327) e da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre (nº 2.900.696) (CAAE: 90632418.3.3001.5338).

Resultados

Houve predomínio de idosos frágeis, representando 75% da amostra. Quanto à funcionalidade familiar, a maior parte (cerca de 85%) apresentou boa funcionalidade. Conforme a tabela 1 , houve associação estatisticamente significativa entre as seguintes variáveis com a fragilidade: faixa etária de 85 anos ou mais, presença de cuidador, não morar sozinho, receber visita domiciliar exclusiva como forma de atendimento e apresentar défice cognitivo.

Tabela 1
Associações entre as variáveis sociodemográficas, acesso ao serviço de saúde e cognição com a funcionalidade familiar e fragilidade de idosos

O grupo de idosos frágeis apresentou maior número de morbidades. Além disso, quando avaliadas as morbidades individualmente, as que se associaram significativamente com a presença de fragilidade foram Parkinson (100% frágeis; p=0,037), demência (95% frágeis; p=0,048) e depressão (88,4% frágeis; p=0,022). A maioria dos idosos frágeis apresentava boa funcionalidade familiar. Quanto à funcionalidade familiar, observou-se que os idosos mais jovens, do sexo feminino, aposentados, que não moravam sozinhos, sem défice cognitivo e que recebiam visita domiciliar exclusiva como forma de atendimento possuíam um maior percentual de disfunção familiar. Entretanto, apenas as variáveis referentes ao recebimento de benefício e possuir plano de saúde suplementar, quando analisadas no modelo multivariado com a funcionalidade familiar, apresentaram associação estatística limítrofe, respectivamente, de p=0,073 e p=0,051. Na tabela 2 é possível observar que, após análise multivariada, os idosos que não moravam sozinhos possuíam mais de duas vezes a chance de apresentar fragilidade.

Tabela 2
Análise de regressão de Poisson multivariada para avaliar os fatores independentemente associados com a fragilidade

A figura 1 apresenta a distribuição média da Escala de Fragilidade de Edmonton relacionada à forma de atendimento utilizada pelos idosos do estudo. O escore médio da escala de fragilidade foi de 8,7 pontos entre idosos que recebiam visita domiciliar exclusiva, enquanto que, entre os idosos que possuíam também outras formas de acesso, foi de 6,7 pontos (p=0,001).

Figura 1
Distribuição da pontuação média da Escala de Fragilidade de Edmonton, de acordo com o acesso ao serviço de saúde, por meio de visita domiciliar exclusiva ou não

IC95% - intervalo de confiança de 95%


Discussão

Houve predomínio de idosos frágeis (75%) divergindo de outro estudo brasileiro, que utilizou a mesma escala para avaliar a fragilidade de idosos (60 anos ou mais), cadastrados em uma Unidade de Saúde da Família de João Pessoa (PB), o qual encontrou prevalência de 39,6% de idosos frágeis. ( 2121. Pereira RR , Silva CR , Vasconcelos SC , Braga LA , Monteiro EA , Pontes ML . Cognition and frailty in community-dwelling elderly . Cogitare Enferm . 2019 ; 24 : e60578 . ) Tais diferenças podem ser explicadas pelas características particulares das amostras, além dos diferentes contextos socioculturais. Neste estudo, a população de idosos foi específica daqueles acompanhados pela AD1, e, dentre suas características, está a dificuldade de locomoverem-se até o serviço de saúde, o que pode justificar um número elevado de indivíduos frágeis, sendo, portanto, maior quando comparada a todos idosos cadastrados em uma APS. Assim, salienta-se a importância de a identificação e o tratamento da fragilidade serem incorporados como prática padrão na APS e, consequentemente, na Atenção Domiciliar, podendo ser usados programas específicos para monitorá-la e gerenciá-la. ( 2222. Won CW . Diagnosis and management of frailty in primary health care . Korean J Fam Med . 2020 ; 41 ( 4 ): 207 - 13 . )

Em relação à funcionalidade familiar, a maioria dos idosos apresentou boa funcionalidade, que está relacionada à capacidade de adaptação e de manutenção de relações afetivas e à possibilidade dos membros de solucionar problemas. ( 2323. Lins AE , Rosas C , Neri AL . Satisfaction with family relations and support according to elderly persons caring for elderly relatives . Rev Bras Geriatr Gerontol . 2018 ; 21 ( 3 ): 330 - 41 . ) Estudo realizado em Minas Gerais utilizando a escala de APGAR com idosos da comunidade apresentou resultados semelhantes, com percentual de famílias funcionalmente satisfatórias de 76,3%. ( 1010. Campos AC , Rezende GP , Ferreira EF , Vargas AM , Gonçalves LH . Family functioning of Brazilian elderly people living in community . Acta Paul Enferm . 2017 ; 30 ( 4 ): 358 - 67 . ) Esse achado é importante para a elaboração do plano de cuidado do indivíduo idoso pelo enfermeiro, pois a família desempenha papel valoroso no suporte e no cuidado com a pessoa idosa; uma boa funcionalidade familiar pode refletir no sucesso e na efetividade do plano de cuidados. Outrossim, estudo multicêntrico transversal realizado em Portugal com 521 pacientes de cuidados primários com multimorbidade, que também utilizou a escala APGAR, identificou que 70,4% das famílias eram altamente funcionais. ( 2424. Prazeres F , Santiago L . Relationship between health-related quality of life, perceived family support and unmet health needs in adult patients with multimorbidity attending primary care in Portugal: a multicentre cross-sectional study . Health Qual Life Outcomes . 2016 ; 14 ( 1 ): 156 . ) Além disso, pacientes com alta contagem de morbidade (seis ou mais doenças crônicas) tiveram percepção ligeiramente maior de ter uma família disfuncional, o que pode justificar a boa funcionalidade familiar da amostra, já que o número de morbidades dos idosos foi relativamente baixo, com razão de prevalência 1,05 (variando de 0,99 a 1,09). ( 2424. Prazeres F , Santiago L . Relationship between health-related quality of life, perceived family support and unmet health needs in adult patients with multimorbidity attending primary care in Portugal: a multicentre cross-sectional study . Health Qual Life Outcomes . 2016 ; 14 ( 1 ): 156 . )

Um arranjo familiar adequado pode pressupor melhor qualidade de vida dos idosos, mostrando o quão significativas são as interações familiares, sua organização, seu apoio e seu entendimento desta pelos profissionais de saúde. ( 1919. Rabelo DF , Neri AL . The household arrangements, physical and psychological health of the elderly and their satisfaction with family relationships . Rev Bras Geriatr e Gerontol . 2015 ; 18 ( 3 ): 507 - 19 . , 2525. Aguiar AC , Menezes TM , Camargo CL . Family arrangements with the elderly: contributory factors . Av Enferm . 2018 ; 36 ( 3 ): 292 - 301 . ) O idoso frágil, por exemplo, demanda cuidados por parte da família, o que impacta na dinâmica familiar e, por conseguinte, nas relações intrafamiliares. ( 1818. Silva MJ , Victor JF , Mota FR , Soares ES , Leite BM , Oliveira ET . Analysis of psychometric properties of family APGAR with elderly in northeast Brazil . Esc Anna Nery . 2014 ; 18 ( 3 ): 527 - 32 . ) No presente estudo, a funcionalidade familiar não esteve relacionada de forma estatisticamente significativa com as demais variáveis, o que pode ser justificado pela possibilidade de o idoso sentir-se desconfortável em responder negativamente questões sobre as pessoas que cuidam dele, ser mais tolerante com a família por pensar que é trabalhoso cuidar dele e também pelo seu próprio desempenho cognitivo. Os idosos acompanhados pela AD1 provavelmente apresentam porcentagem significativa de boa funcionalidade familiar, pois um dos critérios para estar cadastrado nessa modalidade é que o idoso tenha um familiar responsável. Outro aspecto que pode estar associado a esse achado é que as ações da AD1 contemplam orientações educativas para a família, envolvendo-a no cuidado tanto físico, quanto emocional da pessoa idosa.

Quanto aos fatores associados significativamente à fragilidade, destacam-se a faixa etária elevada (≥85 anos) e a presença de cuidador. Têm-se encontrado na literatura evidências de que a prevalência da fragilidade aumenta com a idade. ( 2626. Farías-Antúnez S , Fassa AG . Frailty prevalence and associated factors in the elderly in Southern Brazil, 2014 . Epidemiol Serv Saude . 2019 ; 28 ( 1 ): e2017405 . , 2727. Pinheiro HA , Mucio AA , Oliveira LF . Prevalence and factors associated with the frailty syndrome in older adults in the Brazilian Federal District . Geriatr Gerontol Aging . 2020 ; 14 ( 1 ): 8 - 14 . ) Em relação à presença de cuidador, o idoso frágil demanda mais cuidados e ajuda para realização de Atividades da Vida Diária. Por isso, ele pode necessitar de um cuidador. ( 1313. Carneiro J , Cardoso R , Durães M , Guedes M , Santos F , Costa F , et al . Prevalence and factors associated with frailty in non-institutionalized older adults . Rev Bras Enferm . 2017 ; 70 ( 4 ): 780 - 5 . ) Além disso, este pode auxiliar o profissional enfermeiro, envolvendo-se no cuidado e visando a uma melhor qualidade de vida para o idoso. ( 66. Dias FA , Gama ZA , Tavares DM . Atenção Primária à Saúde do idoso: modelo conceitual de enfermagem . Cogitare Enferm . 2017 ; 22 ( 3 ); e53224 . , 1010. Campos AC , Rezende GP , Ferreira EF , Vargas AM , Gonçalves LH . Family functioning of Brazilian elderly people living in community . Acta Paul Enferm . 2017 ; 30 ( 4 ): 358 - 67 . ) A capacitação do cuidador pela enfermagem é essencial para que ele esteja apto a apoiar o idoso nas diferentes situações, inclusive na identificação precoce de sinais de fragilidade, e saiba como intervir.

Morar sozinho também apresentou associação com menor nível de fragilidade. Idosos que moravam sozinhos eram menos frágeis, ou seja, residiam sozinhos possivelmente por possuírem melhores condições de saúde. Uma revisão sistemática e metanálise com 203 estudos identificou uma associação transversal significativa entre viver sozinho e fragilidade. ( 2828. Kojima G , Taniguchi Y , Kitamura A , Fujiwara Y . Is living alone a risk factor of frailty? A systematic review and meta-analysis . Ageing Res Rev . 2020 ; 59 : 101048 . ) Porém, ao se realizar uma análise estratificada por gênero, o estudo de revisão mostrou que apenas os homens que vivem sozinhos têm risco aumentado de serem frágeis, enquanto as mulheres não. ( 2828. Kojima G , Taniguchi Y , Kitamura A , Fujiwara Y . Is living alone a risk factor of frailty? A systematic review and meta-analysis . Ageing Res Rev . 2020 ; 59 : 101048 . ) Dessa forma, pode-se inferir que os dados por gênero da revisão se assemelham aos deste estudo, no sentido de que a maior parte da amostra da presente investigação se constituiu de mulheres. Vale ainda ressaltar que os autores da revisão sistemática e metanálise apontam que não são conhecidos os mecanismos aos quais morar sozinho e fragilidade estão associados. ( 2828. Kojima G , Taniguchi Y , Kitamura A , Fujiwara Y . Is living alone a risk factor of frailty? A systematic review and meta-analysis . Ageing Res Rev . 2020 ; 59 : 101048 . ) O que se sabe é que idosos que vivem sozinhos correm mais risco de isolamento, solidão e depressão. Assim, a fragilidade social aumenta as chances de se desenvolver fragilidade física. ( 2929. Makizako H , Shimada H , Doi T , Tsutsumimoto K , Hotta R , Nakakubo S , et al . Social frailty leads to the development of physical frailty among physically non-frail adults: a four-year follow-up longitudinal cohort study . Int J Environ Res Public Heal . 2018 ; 15 ( 3 ): 490 . )

A fragilidade é decorrente de alguns fatores, sendo eles de cunho biológico, psicológico, cognitivo e social, os quais resultam do processo de envelhecimento fisiológico e da presença de patologias. ( 33. Augusti AC , Falsarella GR , Coimbra AM . Analysis of frailty syndrome in primary care - Cross sectional study . Rev Bras Med Fam Comunidade . 2017 ; 12 ( 39 ): 1 - 9 . , 3030. Maia LC , Moraes EN , Costa SM , Caldeira AP . Fragilidade em idosos assistidos por equipes da atenção primária . Cienc Saude Colet . 2020 ; 25 ( 12 ): 5041 - 50 . ) Diante dessa perspectiva, neste estudo, idosos com maior número de morbidades apresentaram maior propensão para o desenvolvimento de fragilidade, o que vai ao encontro do achado de outro estudo. ( 2626. Farías-Antúnez S , Fassa AG . Frailty prevalence and associated factors in the elderly in Southern Brazil, 2014 . Epidemiol Serv Saude . 2019 ; 28 ( 1 ): e2017405 . ) Além disso, neste estudo, um maior número de morbidades apresentou associação positiva com a fragilidade. Parkinson, demência e depressão foram as doenças que se associaram positivamente. Esse achado ressalta a necessidade de intervenções de enfermagem voltadas para prevenção de doenças cognitivas e emocionais e o quanto se deve abordar esse tema tão importante da saúde mental da pessoa idosa. Estudo realizado em Minas Gerais com 360 idosos também apresentou associação estatística (p=0,00) entre depressão e presença de fragilidade utilizando a Escala de Fragilidade de Edmonton. ( 3131. Silva PO , Aguiar BM , Vieira MA , Costa FM , Carneiro JA . Prevalência de sintomas depressivos e seus fatores associados em idosos atendidos por um centro de referência . Rev Bras Geriatr Gerontol . 2019 ; 22 ( 5 ): e190088 . ) Já estudo feito em Pelotas (RS) apresentou associação da presença de fragilidade com Parkinson (p=0,007), ( 2626. Farías-Antúnez S , Fassa AG . Frailty prevalence and associated factors in the elderly in Southern Brazil, 2014 . Epidemiol Serv Saude . 2019 ; 28 ( 1 ): e2017405 . ) e estudo de coorte com 150 pacientes acima de 80 anos conduzido na Inglaterra também identificou associação entre a fragilidade, verificada pela Escala de Fragilidade de Edmonton, com alta coexistência de comorbidades (p=0,005), especialmente doença coronariana (p=0,02). ( 3232. Qayyum S , Rossington JA , Chelliah R , John J , Davidson BJ , Oliver RM , et al . Prospective cohort study of elderly patients with coronary artery disease: impact of frailty on quality of life and outcome . Open Hear . 2020 ; 7 ( 2 ): e001314 . ) A hipertensão, apesar de ser a doença mais prevalente na amostra estudada, não teve significância estatística, quando associada à fragilidade, diferentemente de estudo realizado com idosos de um ambulatório de geriatria e gerontologia do Distrito Federal, que mostrou associação da hipertensão com o maior risco de apresentar fragilidade. ( 2727. Pinheiro HA , Mucio AA , Oliveira LF . Prevalence and factors associated with the frailty syndrome in older adults in the Brazilian Federal District . Geriatr Gerontol Aging . 2020 ; 14 ( 1 ): 8 - 14 . )

A aplicação do Miniexame do Estado Mental indicou que a maioria dos idosos que se apresentavam frágeis tinha também défice cognitivo, corroborando achado da literatura. ( 3333. Pereira RR , Silva CR , Vasconcelos SC , Braga LA , Monteiro EA , Pontes ML . Cognition and frailty in community-dwelling elderly . Cogitare Enferm . 2019 ; 24 : e60578 . ) Estudo realizado em área rural do Equador com 252 idosos (60 anos ou mais) utilizando a Escala de Fragilidade de Edmonton, para avaliar fragilidade, e a Montreal Cognitive Assessment , para a avaliação do declínio cognitivo, reforçou a relação entre as duas variáveis. ( 3434. Brutto OH , Mera RM , Zambrano M , Sedler MJ . Influence of frailty on cognitive decline: a population-based cohort study in rural Ecuador . J Am Med Dir Assoc . 2019 ; 20 ( 2 ): 213 - 6 . ) Mais uma vez, destaca-se a necessidade de intervir precocemente por meio de ações preventivas do declínio do sistema funcional da cognição, como estímulo à leitura e convívio social, desempenho de atividade de terapêuticas ocupacionais e atividade física, avaliações periódicas pela equipe, dentre outras ações, visando evitar a fragilidade.

A adesão a plano de saúde e a frequência das visitas domiciliares não apresentaram associação significativa com a fragilidade. Entretanto, a visita domiciliar exclusiva como forma de atendimento associou-se com a fragilidade. Isso porque os idosos mais frágeis, em sua maioria, recebiam apenas a visita domiciliar como forma de atendimento, confirmando dados da literatura segundo os quais idosos mais frágeis demandam mais cuidados por parte dos serviços de saúde, e a visita domiciliar é uma modalidade de atendimento que facilita o acesso do indivíduo à saúde. ( 3030. Maia LC , Moraes EN , Costa SM , Caldeira AP . Fragilidade em idosos assistidos por equipes da atenção primária . Cienc Saude Colet . 2020 ; 25 ( 12 ): 5041 - 50 . , 3535. Silva RM , Brasil CC , Bezerra IC , Figueiredo ML , Santos MC , Gonçalves JL , et al . Challenges and possibilities of health professionals in the care of dependent older adults . Cienc Saude Colet . 2021 ; 26 ( 1 ): 89 - 98 . ) Assim, salienta-se a importância da formação profissional pautada nas necessidades da população que irá atender visando à promoção, à prevenção, ao tratamento e à reabilitação do idoso.

Ainda, foi encontrada uma lacuna na literatura sobre estudos que abordassem o número de visitas domiciliares que os idosos recebem dos profissionais da saúde quando vinculados à Atenção Domiciliar da APS. A portaria que redefine a Atenção Domiciliar no âmbito do SUS ( 77. Brasil . Ministério da Saúde . Portaria n° 825, de 25 de abril de 2016. Redefine a Atenção Domiciliar no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e atualiza as equipes habilitadas . Brasília (DF) : Ministério da Saúde ; 2016 [ citado 2021 Ago 17 ]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2016/prt0825_25_04_2016.html
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) não estabelece o número de visitas para a AD1. Contudo, este é um dado importante a ser estudado, para que se possa compreender se aqueles que mais necessitam de cuidados estão sendo priorizados nos serviços de saúde, realizando intervenções quando necessário e evitando a agudização de problemas de saúde e internações.

A presente pesquisa apresenta subsídio para os profissionais que atuam na AD1 sobre a necessidade de identificar a prevalência de fragilidade e o nível de funcionalidade familiar. A partir dessas informações, um plano de cuidados pode ser elaborado com o objetivo de retardar o aparecimento ou minimizar a fragilidade, além de intervir nos fatores associados. Além disso, este estudo norteia a criação de intervenções e melhorias no cuidado prestado a idosos e para seus cuidadores/familiares.

As limitações deste estudo estão relacionadas à população específica, o que não permitiu a generalização dos resultados, e ao fato de ser um estudo transversal, não sendo possível estabelecer relações de causa e efeito.

Conclusão

A maior parte dos idosos da amostra era frágil e apresentava boa funcionalidade familiar. Receber visita domiciliar exclusiva como forma de atendimento apresentou associação significativa com a fragilidade. A funcionalidade familiar não apresentou associação estatisticamente significativa com as variáveis analisadas. A fragilidade esteve associada com maior faixa etária, número de morbidades, presença de cuidador, morar sozinho e presença de défice cognitivo. A Atenção Domiciliar tipo 1 possui potencial estratégico, pois identifica necessidades precocemente e fortalece os vínculos e a rede de apoio formal e informal, ampliando o acesso à saúde dentro da Atenção Primária. Logo, o conhecimento acerca das características e do contexto no qual a população de idosos e seus cuidadores estão inseridos torna-se fundamental, à medida que a equipe da Atenção Domiciliar tipo 1 possa avaliar e acompanhar esses sujeitos, implementando intervenções direcionadas a essa população e, consequentemente, garantindo o atendimento precoce, efetivo e de qualidade.

Agradecimentos

Ao Fundo de Incentivo à Pesquisa e Eventos do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (FIPE/HCPA), n° 160580.

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Paula Hino (https://orcid.org/0000-0002-1408-196X) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    16 Abr 2021
  • Aceito
    15 Out 2021
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
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