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Sintomas de ansiedade e depressão no ambiente acadêmico: um estudo transversal

Síntomas de ansiedad y depresión en el ambiente académico: un estudio transversal

Resumo

Objetivo

Identificar a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão e verificar os fatores sociodemográficos, acadêmicos e de saúde associados à ocorrência desses em estudantes de graduação em Enfermagem.

Métodos

Estudo transversal, realizado em Fortaleza - CE entre os meses de junho a setembro do ano de 2019, com 199 alunos de uma universidade pública, regularmente matriculados no curso. Foi aplicado um questionário sociodemográfico, o Inventário de Depressão de BECK – II, além do Inventário de Ansiedade de BECK. A análise da associação entre as variáveis preditoras e os desfechos foi realizada por meio do teste de Qui-quadrado de Pearson, considerando significância estatística os valores de p menores que 0,05. Os aspectos éticos foram respeitados.

Resultados

A prevalência de sintomas de ansiedade grave e depressão mínima foi de 119 (62%) e 59 (29,6%), respectivamente. Foi observado associação estatística significativa entre sintomas de ansiedade grave e as variáveis: idade até 21 anos, ausência de religião, não heterossexuais, preocupação com o futuro, não ter tempo para lazer e uso de psicotrópicos. Com relação aos sintomas de depressão, percebeu-se associação com as variáveis idade até 21 anos, ausência de tempo para lazer, insatisfação com o tempo de lazer, inatividade física, insônia e uso de psicotrópicos.

Conclusão

Conclui-se que as condições associadas aos sintomas de ansiedade e depressão estiveram mais relacionadas às variáveis acadêmicas e de saúde. Dessa forma, percebe-se a importância de identificar precocemente e traçar estratégias relacionadas aos sintomas observados.

Saúde mental; Ansiedade; Depressão; Estudante de enfermagem

Resumen

Objetivo

Identificar la prevalencia de síntomas de ansiedad y depresión y verificar los factores sociodemográficos, académicos y de salud asociados a estos episodios en estudiantes de Enfermería.

Métodos

Estudio transversal, realizado en Fortaleza, estado de Ceará, entre los meses de junio y septiembre del año 2019, con 199 alumnos de una universidad pública, regularmente matriculados en la carrera. Se aplicó un cuestionario sociodemográfico, el Inventario de Depresión de Beck – II, además del Inventario de Ansiedad de BECK. El análisis de relación entre las variables predictoras y de resultado fue realizado por medio de la prueba χ2 de Pearson, en el que se consideró significación estadística los valores de p menores que 0,05. Los aspectos éticos fueron respetados.

Resultados

La prevalencia de síntomas de ansiedad grave fue de 119 (62 %) y de depresión mínima 59 (29,6 %). Se observó relación estadística significativa entre los síntomas de ansiedad grave y las variables: edad hasta 21 años, ausencia de religión, no heterosexuales, preocupación con el futuro, no tener tiempo de ocio y uso de psicotrópicos. Con relación a los síntomas de depresión, se percibió relación con las variables: edad hasta 21 años, ausencia de tiempo de ocio, insatisfacción con el tiempo de ocio, inactividad física, insomnio y uso de psicotrópicos.

Conclusión

Se concluye que las condiciones asociadas a los síntomas de ansiedad y depresión estuvieron más relacionadas con las variables académicas y de salud. De esta forma, se percibe la importancia de una identificación temprana y la elaboración de estrategias relacionadas con los síntomas observados.

Salud mental; Ansiedad; Depresión; Estudiantes de enfermería

Abstract

Objective

To identify the prevalence of anxiety and depression symptoms and to verify the sociodemographic, academic and health factors associated with their occurrence in undergraduate nursing students.

Methods

This is a cross-sectional study, carried out in Fortaleza - CE between June and September 2019, with 199 students from a public university, regularly enrolled in the course. A sociodemographic questionnaire was applied, the BECK Depression Inventory - II, in addition to the BECK Anxiety Inventory. The analysis of the association between predictor variables and outcomes was performed using Pearson’s chi-square test, considering p-values less than 0.05 as statistically significant. Ethical aspects were respected.

Results

The prevalence of severe anxiety and minimal depression symptoms was 119 (62%) and 59 (29.6%), respectively. A statistically significant association was observed between severe anxiety symptoms and the variables: age up to 21 years, absence of religion, non-heterosexuals, concern about the future, not having time for leisure and psychotropic drug use. Regarding depression symptoms, an association was observed with the variables age up to 21 years, lack of leisure time, dissatisfaction with leisure time, physical inactivity, insomnia and psychotropic drug use.

Conclusion

It is concluded that the conditions associated with anxiety and depression symptoms were more related to academic and health variables. In this way, the importance of early identification and devising strategies related to the symptoms observed is perceived.

Mental health; Anxiety; Depression; Nursing students

Introdução

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a proporção global de pessoas com transtorno de ansiedade (TA) e depressão no mundo é de 3,6% e 4,4%, respectivamente. No Brasil, essa proporção se eleva para 9,3% e 5,8%, respectivamente, possuindo a população com o maior número de casos de TA no mundo.(11. World Health Organization (WHO). Depression and other common mental disorders: global health estimates. Geneva: WHO; 2017 [cited 2020 Apr 09]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/254610/1/WHO-MSD-MER-2017.2-eng.pdf
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Segundo a classificação do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V), a ansiedade é uma antecipação da ameaça futura e está relacionada com a vigilância em preparação para perigos futuros e comportamentos constantes de esquiva.(22. Associação de Psiquiatria Americana. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed; 2014. 992 p.) Por sua vez, as síndromes depressivas apresentam o humor triste e o desânimo como elementos mais predominantes.(33. Dalgalarrondo P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2ª ed. Porto Alegre: Artes Médicas Sul; 2008. 520 p.)

Nesse contexto, a ansiedade e a depressão caracterizam-se como condições que podem se manifestar em diversas fases da vida do ser humano, sobretudo na adolescência. Dentre as mudanças ocorridas durante essa fase, ressalta-se a vida universitária. A literatura evidencia que 15 a 25% dos estudantes universitários apresentam algum transtorno psiquiátrico, sendo a maioria TA e depressão.(44. Cassol M, Garcia CS, Garcia EF, Ferreira JA, Tagawa GS, Garcia LA. Transtornos psiquiátricos nos acadêmicos de medicina. Braz J Development. 2021;7(2):99-126.) Observa-se que no meio acadêmico o estudante, ainda muito jovem, depara-se com novas exigências, métodos de ensino, culturas e hábitos que exigirão uma mudança de comportamento que pode levar à vivência de vários conflitos.(55. Rosa CS, Arronqui GV, Lacava RM, Magalhães SM, Goldman RE. Quality of life of undergraduate nursing students: production analysis. Rev Bras Qual Vida. 2012;4(2):38-49.)

Além disso, a preocupação da necessidade de inserção futuramente no mercado de trabalho passa a ser constante, e muitas vezes leva o estudante a vivenciar uma dupla jornada: emprego e carreira acadêmica. O cumprimento de uma carga horária extensa e a participação em diferentes projetos, como grupos de pesquisa, projetos de extensão, monitorias, eventos e cursos, também são fatores estressores que podem levar o estudante a um cansaço físico e mental e, consequentemente, à limitação de tempo livre, tanto para a vida pessoal, quanto para o lazer, o que pode comprometer a qualidade de vida do indivíduo e levar ao aparecimento de sintomas de ansiedade e síndromes depressivas.(66. Freitas AC, Malheiros RM, Lourenço BS, Pinto FF, Souza CC, Almeida AC. Intervening factors in the quality of life of nursing student. J Nurs UFPE Online. 2018;8(12):2376-85.)

Estudos apontam que situações de estresse contínuas relacionadas ao limitado contato com momentos prazerosos podem gerar sentimentos relacionados à ansiedade e depressão, além de influenciar a impulsão de uso de substâncias ilícitas.(77. Borine RC, Wanderley KS, Bassitt DP. Relação entre a qualidade de vida e o estresse em acadêmicos da área da saúde. Est Inter Psicol. 2015;6(1):100-18.,88. Rovida TA, Sumida DH, Santos AS, Moimaz AS, Garbin CA. Estresse e o estilo de vida dos acadêmicos ingressantes em um curso de graduação em Odontologia. Rev ABENO. 2015;15(3):26-34.)

Pesquisa realizada com 205 acadêmicos de enfermagem de uma universidade pública no Nordeste do Brasil com o objetivo de identificar a prevalência de sintomas ansiosos e depressivos evidenciou que 30,2% apresentavam sintomas de depressão. Além disso, mais da metade da amostra referiu apresentar distúrbios de sono e pouco tempo para o lazer, fatores que podem estar interligados com a gravidade de sintomas de depressão e ansiedade. Também houve associação entre o nível de sintomas depressivos e o exercício de atividades laborais, que pode estar relacionado ao esforço físico ou mental empregado para a realização de tais atividades.(99. Fernandes MA, Vieira FE, Silva JS, Avelino FV, Santos JD. Prevalência de sintomas ansiosos e depressivos em universitários de uma instituição pública. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 5):2169-75.)

Entre os estudantes da área da saúde, acredita-se que a prevalência desses sintomas seja maior, devido a fatores ainda pouco elucidados. Todavia, alguns estudos apontam que os estudantes de enfermagem quando comparados aos estudantes de outros cursos possuem fatores adicionais que podem levar ao desenvolvimento de sintomas de ansiedade e depressão devido à insegurança na prática clínica, à falta de habilidade no relacionamento com o paciente, ao medo de cometer erros, ao sofrimento psíquico e à situações em que devem lidar com a iminência de morte.(99. Fernandes MA, Vieira FE, Silva JS, Avelino FV, Santos JD. Prevalência de sintomas ansiosos e depressivos em universitários de uma instituição pública. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 5):2169-75.,1010. Facioli AM, Barros AB, Melo MC, Ogliari IC, Custódio RJ. Depression among nursing students and its association with academic life. Rev Bras Enferm. 2020;73(1):e20180173.)

Diante disso, observa-se a necessidade de estudos com acadêmicos de enfermagem, em consonância com as discussões mundiais acerca da importância da Saúde Mental, sobretudo quanto ao surgimento de sintomas de ansiedade e depressão, pois esses estudantes lidam com diversas situações na universidade e na vida pessoal que podem acarretar o surgimento desses sintomas. Além disso, esses estudos podem evidenciar a importância do conhecimento dos fatores sociodemográficos, acadêmicos e de saúde que se associam ao surgimento de sintomas de ansiedade e depressão. Dessa forma, a partir do diagnóstico situacional realizado no presente estudo, pode-se possibilitar o desenvolvimento de estratégias que promovam um ambiente acadêmico sensibilizado às questões de Saúde Mental, que auxiliem os estudantes no enfrentamento das situações pessoais e acadêmicas, e que permitam o cuidado também aos estudantes.

Isto posto, o estudo tem como objetivo identificar a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão e verificar os fatores sociodemográficos, acadêmicos e de saúde associados à ocorrência desses em estudantes de graduação em Enfermagem.

Métodos

Trata-se de um estudo do tipo transversal, realizado em uma universidade pública federal localizada na capital do Ceará, entre os meses de junho a setembro de 2019. A pesquisa foi feita com alunos do curso de enfermagem dessa instituição com o intuito de analisar os fatores sociodemográficos, acadêmicos e de saúde que interferem no surgimento de sintomas de ansiedade e depressão, bem como identificar a prevalência dos sintomas desses distúrbios neste grupo.

A instituição selecionada possui graduação em tempo integral, desde 1976, com duração de cinco anos, e destaca-se pela excelência do ensino ofertado. O ingresso dos alunos ocorre semestralmente, por vestibular, além de transferência entre universidades, mudança de curso e abertura de vagas para graduados, totalizando 40 vagas por semestre.

Utilizou-se a amostragem probabilística, aleatória simples e estratificada. O quantitativo de alunos regulares nos semestres difere devido à evasão, dessa forma a amostra foi proporcional à quantidade de alunos matriculados em cada semestre. Foi realizado sorteio para indicar os participantes do estudo com base em uma lista disponibilizada pela coordenação constando todos os alunos matriculados no curso, por semestre.

Realizou-se cálculo amostral para populações finitas com prevalência de 50%, erro amostral de 5% e nível de significância de 95%, obtendo-se um tamanho amostral de 194 estudantes. Todavia, a fim de abrandar possíveis perdas, foi adotado uma amostra de 199 participantes, contudo apenas 192 estudantes optaram por responder o Inventário de Ansiedade de BECK – BAI.

Quanto aos critérios de inclusão, consistiram nos alunos acima de 18 anos e regularmente matriculados no curso; foram excluídos aqueles impossibilitados de cursar qualquer disciplina, os alunos em regime de licença ou em matrícula institucional.

Anteriormente à coleta dos dados, os pesquisadores aplicaram um pré-teste com 12 estudantes e duas professoras com a finalidade de sanar possíveis dúvidas no questionário, tornando-o mais exequível e adaptado para obtenção dos dados.

As informações foram coletadas por meio de um questionário estruturado, composto por variáveis sociodemográficas, acadêmicas e de saúde, que foram elencadas como variáveis preditoras. Já para a avaliação dos sintomas de ansiedade e depressão, consideradas variáveis desfecho, utilizou-se o Inventário de Ansiedade de BECK – BAI e o Inventário de Depressão de BECK – II. O Inventário de Ansiedade de BECK – BAI(1111. Beck AT, Epstein N, Brown G, Steer RA. An inventory for measuring clinical anxiety: psychometric properties. J Consult Clin Psychol. 1988;56(6):893-7.)foi adaptado por Cunha(1212. Cunha JA. Manual da versão em português das Escalas Beck. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2001. 171 p.)com um alfa de Cronbach variando entre 0,71 a 0,72 e apresenta sintomas comuns à ansiedade, relacionados à última semana. O escore total é identificado pelo somatório dos escores individuais de cada item. Conforme os preceitos da versão em português, os sintomas de ansiedade podem ser estratificados em: ansiedade mínima (até 10 pontos), ansiedade leve (de 11 a 19 pontos), ansiedade moderada (de 20 a 30 pontos) e ansiedade grave (de 31 a 63).

Já o Inventário de Depressão de Beck- II (BDI-II)(1313. Beck AT, Steer RA, Brown GK. Manual for the Beck Depression Inventory-II. San Antonio (TX): Psychological Corporation; 1996.)foi traduzido e validado para o Brasil por Gorenstein(1414. Gorenstein C, Pang WY, Argimon IL, Werlang BS. Manual do Inventário de depressão de Beck-BDI-II. [Adaptado da obra de]. Beck AT, Steer RA, Brown GK. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2011. 171 p.)com um alfa de Cronbach de 0,89 e consiste em 21 grupos de afirmações, com itens de resposta variando de quatro a sete opções, referente ao sentimento na semana vigente e as pontuações variam de 0 a 3 para cada assertiva. O escore máximo é de 63 pontos e a gravidade dos sintomas de depressão pode ser classificada em: nível mínimo (de 0 a 13 pontos), leve (de 14 a 19), moderado (de 20 a 28) e grave (de 29 a 63).

Nas tabelas, para promover melhor interpretação e utilização dos testes estatísticos, a gravidade dos sintomas de depressão foi organizada em dois grupos sendo um nível mínimo e leve e outro em nível moderado e grave.

A pesquisa apresenta como potencial de confusão o semestre de matrícula do aluno, uma vez que há diferenças entre as vivências pessoais e acadêmicas dos alunos no ciclo teórico e prático. Para minimizá-lo, utilizou essa variável como preditora a fim de identificar associação com os desfechos. Ademais, há de se considerar como potencial de viés o diagnóstico prévio de ansiedade e depressão entre os estudantes selecionados, o momento da coleta de dados realizado ao final do semestre letivo, em que há maior sobrecarga aos estudantes.

A tabulação e o cruzamento das variáveis foram realizados pelo Statistical Package for the Social Sciences - SPSS® versão 23. Para os dados de estatística descritiva, utilizou-se frequência absoluta e relativa. Para a investigação de associação entre as variáveis categóricas foi aplicado o teste de Qui-Quadrado de Pearson e considerou-se significância estatística um p assumindo valor menor do que 0,05.

A pesquisa foi aprovada pelo comitê da Universidade Federal do Ceará com o número de parecer 3.284.038, obedecendo aos princípios da resolução 466/12 estabelecida pelo Conselho Nacional de Saúde.(1515. Brasil. Conselho Nacional de Saúde (CNS). Resolução no 466, de 12 de dezembro de 2012. Brasília (DF): CNS; 2012 [citado 2020 Abr 22]. Disponível em: http://www.conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
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Resultados

O perfil dos participantes com relação à idade houve variação de 17 a 47 anos e o intervalo de 20 a 24 anos representou a maioria dos pesquisados, 137 (68,8%) estudantes. No tocante ao estado civil, a maioria dos estudantes relatou ser solteiro, 183 (92%); os que se consideram não brancos representavam 150 (75,4%) respondentes. A identidade de gênero mais prevalente foi a heterossexual, 164 (82,4%), e ter religião apresentou 167 (83,9%) relatos. Acerca da renda, 112 (63,6%) verbalizaram ter receita maior que dois salários mínimos e 180 (90,5%) afirmaram não possuir emprego. Ademais, o gênero feminino foi o mais prevalente, 164 (82,4%).

No que concerne às variáveis acadêmicas, 190 (95,5%) informaram não ter realizado trancamento de matrícula, dentre os 9 que efetuaram trancamento e 162 (81,4%) responderam que não reprovaram durante o curso. Com relação ao curso, 180 (90,9%) relataram estarem satisfeitos com o curso, apesar de 146 (73,4%) ter dito não possuir tempo para estudar. Quanto às atividades acadêmicas complementares, 165 (82,9%) informaram realizar atividades extras e 107 (54%) não possuíam bolsa acadêmica. Além disso, 183 (92,9%) responderam estarem preocupados com o futuro.

Ademais, ressalta-se que o semestre do aluno foi considerado como potencial de confusão. Dessa forma, 24 (12,1%) dos alunos estavam matriculados no primeiro semestre, 23 (11,6%) no segundo, 23 (11,6%) no terceiro, 21 (10,6%) no quarto, 16 (8%) no quinto, 14 (7%) no sexto, 20 (10,1%) no sétimo, 19 (9,5%) no oitavo, 19 (9,5%) no nono e 20 (10,1%) no décimo, sendo 91 (45,7%) no ciclo básico e 108 (54,3%) no ciclo prático.

Com relação às variáveis de saúde, a maioria relatou ter tempo disponível para o lazer, 170 (85,4%), porém 130 (71,4%) não demonstraram satisfação com esse tempo para o divertimento, 126 (64,3%) relataram não sofrer com insônia.

No que diz respeito aos hábitos de vida, 100 (50,3%) negaram o uso de drogas lícitas. Porém, ao contrário destes, 96 (48,2%) afirmaram o uso de álcool e 3 (1,5%) de cigarro. Ao analisar o uso de droga ilícita, 175 (87,9%) negaram o consumo.

Referente aos sintomas de ansiedade, houve prevalência dos níveis de ansiedade moderada 73 (38%) e 119 (62%) grave e nenhum dos estudantes apresentaram os níveis de ansiedade mínima e leve. Quanto à prevalência de sintomas de depressão, 59 (29,6%) apresentaram o nível mínimo. Os níveis de depressão leve 39 (19,6%), moderada 53 (26,6%) e grave 48 (24,1%) também foram observados nos estudantes.

Na tabela 1 são apresentados os dados referentes à associação entre as variáveis sociodemográficas e os níveis de ansiedade dos estudantes de enfermagem.

Tabela 1
Associação das variáveis sociodemográficas com os níveis de ansiedade dos estudantes de enfermagem

Observou-se sintomas considerados como níveis de ansiedade grave em estudantes com idade até 21 anos (71,4%), participantes sem religião (80,6%) e não heterossexuais (82,9%), com significância estatística. Evidenciou-se maior chance de desenvolver sintomas de ansiedade grave: estudantes com até 21 anos (chance 43% maior), estudantes com religião (2,97 vezes maior), e heterossexuais (3,59 vezes maior).

A tabela 2 apresenta a associação das variáveis acadêmicas e clínicas com os níveis moderados e graves de ansiedade dos estudantes de enfermagem.

Tabela 2
Associação das variáveis acadêmicas e clínicas com os níveis de ansiedade dos estudantes de enfermagem

Constatou-se sintomas de nível de ansiedade grave relacionada à preocupação com o futuro, falta de tempo para lazer e uso de psicotrópicos, com significância estatística. A chance para o desenvolvimento de sintomas com nível de ansiedade grave foi 22% maior entre estudantes que apresentaram preocupação com o futuro, quase 9 vezes maior entre os que não apresentaram tempo para o lazer e 35% maior nos participantes que alegaram fazer uso de psicotrópicos. A tabela 3 apresenta o resultado das associações entre as variáveis sociodemográficas e os níveis de depressão dos estudantes de enfermagem.

Tabela 3
Associação das variáveis sociodemográficas com os níveis de depressão dos estudantes de enfermagem

Percebeu-se mais sintomas de depressão grave em estudantes com até 21 anos, com significância estatística. Evidenciou-se que os estudantes com até 21 anos de idade possuíram 41% mais chances de desenvolver sintomas classificados como nível de depressão grave. Em relação aos demais dados, não foram encontradas associações significativas. Na tabela 4 são apresentadas as variáveis acadêmicas e clínicas e sua associação com a depressão mínima e leve e moderada e grave dos estudantes de enfermagem.

Tabela 4
Associação das variáveis acadêmicas e clínicas com os níveis de depressão dos estudantes de enfermagem

Verificou-se sintomas de depressão moderada e grave entre estudantes que não tinham tempo para o lazer, que não se sentiam satisfeitos com o tempo de lazer, que não praticavam atividade física, que possuíam insônia e que faziam uso de psicotrópicos, com significância estatística em todas essas associações. Os estudantes que relataram não ter tempo para o lazer apresentaram 3,6 vezes mais chance de desenvolver sintomas de depressão moderada e grave, além de 3 vezes mais chance de surgir entre aqueles que relataram não se sentirem satisfeitos com o tempo disponível para o lazer, bem como chance 90% maior entre os que não praticavam atividade física. Além disso, aqueles com quadro de insônia, demonstraram 41% mais chance de desenvolver sintomas de depressão moderada e grave e os que fazem uso de psicotrópicos possuem 30% mais chance de desenvolver sintomas de depressão na sua forma moderada e grave.

Discussão

No presente estudo foi observada prevalência de sintomas de ansiedade grave em 62% dos estudantes e 50,7% de sintomas de depressão moderados e graves. A alta frequência de universitários com sintomas de sofrimento psicológico, pode estar relacionada, frequentemente, com a mudança de estilo de vida ao adentrarem no ensino superior, com a intensificação da carga horária de estudo, o aumento da exigência pela família e sociedade e, em alguns casos, o distanciamento do núcleo familiar e social.(99. Fernandes MA, Vieira FE, Silva JS, Avelino FV, Santos JD. Prevalência de sintomas ansiosos e depressivos em universitários de uma instituição pública. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 5):2169-75.)

Essa é uma problemática referenciada em todo mundo. Os graduandos enfrentam diariamente circunstâncias que podem se constituir fatores estressores e possíveis gatilhos para angústia e sofrimento mental. Corroborando com a pesquisa, estudo realizado com estudantes universitários na Tailândia encontrou prevalência de depressão em 19%-50% e ansiedade em 26%-69% entre os pesquisados.(1616. Musumari PM, Tangmunkongvorakul A, Srithanaviboonchai K, Techasrivichien T, Suguimoto SP, Ono-Kihara M, et al. Grit is associated with lower level of depression and anxiety among university students in Chiang Mai, Thailand: a cross-sectional study. PLoS One. 2018;13(12):e0209121.)

Na Nova Zelândia, pesquisadores identificaram a presença de sintomas de depressão e ansiedade, respectivamente, em 17,3% e 19,7% dos 1292 graduandos que participaram;(1717. Samaranayake CB, Arroll B, Fernando AT 3rd. Sleep disorders, depression, anxiety and satisfaction with life among young adults: a survey of university students in Auckland, New Zealand. N Z Med J. 2014;127(1399):13-22.) bem como estudo realizado com 506 estudantes de universidades públicas da Malásia mostrou presença de depressão moderada e severa em 37,2% e ansiedade moderada e grave em 63% dos universitários.(1818. Shamsuddin K, Fadzil F, Ismail WS, Shah SA, Omar K, Muhammad NA, et al. Correlates of depression, anxiety and stress among Malaysian university students. Asian J Psychiatr. 2013;6(4):318-23.) Já no Brasil, pesquisa realizada com 292 estudantes da área da saúde de uma faculdade de Minas Gerais, observou sintomas de depressão e ansiedade em 52,3% e 41,1% dos participantes, respectivamente.(1919. Lelis KC; Brito RV, Pinho S, Pinho L. Sintomas de depressão, ansiedade e uso de medicamentos em universitários. Rev Port Enfermagem Saúde Mental. 2020;23;9-14.)

Em relação aos dados sociodemográficos observou-se associação significativa entre indivíduos com idade até 21 anos, sem religião e de outras orientações sexuais com sintomas de ansiedade grave. Esse resultado difere do encontrado em um estudo realizado em Recife com 154 estudantes de Enfermagem, no qual não se encontrou associação significativa entre a ansiedade e a idade.(2020. Carvalho ST, Moura ST, Silva MR, Silva FI, Santos CM, Gonçalves SA, et al. Comparison of trace and state of anxiety among nursing students. Saude Colet. 2021;11(60):4762-73.) Todavia, a presença de religião mostrou-se significativa evidenciando fator protetor para o desfecho supracitado, pois a religião está associada a menores taxas de suicídio, depressão, abuso de substâncias, entre outros.(2121. Koenig HG. Religion, spirituality, and medicine: research findings and implications for clinical practice. South Med J. 2004;97(12):1194-200.)

Estudantes jovens, sem crença religiosa e com orientação não heterossexual podem apresentar maior vulnerabilidade e dificuldade de adaptação a mudanças cotidianas como as que acontecem no ambiente acadêmico. Em revisão integrativa que pesquisou a ansiedade em minorias sexuais, encontrou que, além deste ser um grupo com presença de maiores níveis de ansiedade e outros tipos de sofrimento mental, o surgimento da ansiedade tem forte relação com a falta de suporte e o estigma da sociedade, família e amigos.(2222. Francisco LC, Barros AC, Pacheco MS, Nardi AE, Alves VM. Ansiedade em minorias sexuais e de gênero: uma revisão integrativa. J Bras Psiquiatria. 2020;69(1):48-56.)

Em referência às variáveis acadêmicas e clínicas notou-se associação significativa entre preocupação com o futuro, falta de tempo para o lazer e uso de psicotrópicos com sintomas de ansiedade grave. Da mesma forma, estudo realizado com 476 estudantes da saúde em Fortaleza/CE encontrou associação significativa entre preocupação com o futuro e quadro de ansiedade.(2323. Leão AM, Gomes IP, Ferreira MJ, Cavalcanti LP. Prevalência e fatores associados à depressão e ansiedade entre estudantes universitários da área da saúde de um grande centro urbano do nordeste do Brasil. Rev Bras Educ Médica. 2018;42(4):55-65.)

A importância de se ter metas e desejos para o futuro é um fator importante para evitar o sofrimento mental. Pesquisa realizada com 417 estudantes de Enfermagem de uma universidade na Irlanda encontrou que 60,4% dos participantes não possuíam objetivos claros quanto ao futuro e ao seu papel na universidade sendo esse um fator preditor para desenvolvimento de sintomas de depressão e outros tipos de transtornos mentais.(2424. Horgan A, Sweeney J, Behan L, McCarthy G. Depressive symptoms, college adjustment and peer support among undergraduate nursing and midwifery students. J Adv Nurs. 2016;72(12):3081-92.)

A intensa carga horária curricular, a sobrecarga de atividades extracurriculares e os horários inconstantes refletem também na falta de oportunidade de lazer e recreação, o que potencializa o estresse psicológico no ambiente universitário e é somado a estressores psicossociais como a distância de casa, dificuldades financeiras e a separação da família.(2525. Fawzy M, Hamed SA. Prevalence of psychological stress, depression and anxiety among medical students in Egypt. Psychiatry Res. 2017;255:186-94.) Ademais, o semestre que os alunos estão matriculados, podendo ser subdividido em ciclo básico ou prático, também pode ser considerado gatilho para o desencadeamento de sintomas de ansiedade e depressão, visto a alta carga emocional demandada na execução da assistência de enfermagem, de certa forma avaliada pelo docente, pelo paciente e pela família. Esses dados corroboram com um estudo realizado com acadêmicos de enfermagem de uma instituição pública do Piauí que identificou associação significativa entre os níveis de sintomas depressivos e as poucas horas destinadas ao lazer.(99. Fernandes MA, Vieira FE, Silva JS, Avelino FV, Santos JD. Prevalência de sintomas ansiosos e depressivos em universitários de uma instituição pública. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 5):2169-75.)

Concordando com o presente estudo, que encontrou associação entre o uso de psicotrópicos e a presença de sintomas de ansiedade graves, pesquisa realizada com 2.575 acadêmicos dos cursos de farmácia da França encontrou prevalência de 12,7% de uso de psicotrópicos entre os participantes da pesquisa, e estudantes que utilizavam esses tipos de medicações possuíam maiores níveis de estresse, ansiedade e depressão.(2626. Balayssac D, Pereira B, Darfeuille M, Cuq P, Vernhet L, Collin A, et al. Use of psychotropic medications and illegal drugs, and related consequences among french pharmacy students - SCEP study: a nationwide cross-sectional study. Front Pharmacol. 2018;9:725.)

Vale ressaltar que, apesar do uso de medicamentos e dos sintomas de ansiedade graves estarem relacionados, é possível observar que uma parcela dos participantes do presente estudo apresentou os mesmos sintomas de ansiedade, porém não utilizam nenhuma medicação. Diante disso, a não adesão medicamentosa ao tratamento é um desafio para os profissionais de saúde e pode resultar no agravamento do quadro e comprometer a qualidade de vida dos acadêmicos, já que a busca por um tratamento psicológico, seja ele medicamentoso ou não, ainda é negligenciada pela população em geral.(1919. Lelis KC; Brito RV, Pinho S, Pinho L. Sintomas de depressão, ansiedade e uso de medicamentos em universitários. Rev Port Enfermagem Saúde Mental. 2020;23;9-14.)

Quanto aos sintomas depressivos moderados e graves investigados, no que diz respeito à sua associação com os dados sociodemográficos, observou-se associação significativa com a idade até 21 anos. Esses dados vão ao encontro de uma pesquisa realizada com 181 estudantes de uma universidade federal brasileira, que encontrou maiores níveis de sintomas depressivos nos estudantes de 17-20 anos, com prevalência de 87,14%.(2727. Krefer L, Vayego AS. Prevalência de sintomas depressivos em estudantes universitários. Cad Bras Saúde Mental. 2019;11(28):170-81.) Esse fator pode estar relacionado, possivelmente, com o contexto social em que esses jovens universitários estão inseridos. Ao adentrarem no ensino superior, esse novo ambiente interpessoal os incita a assumirem mais responsabilidades, sendo que os primeiros 12 meses do curso, em que geralmente se concentram os alunos mais jovens, são aqueles que mais contribuem para aumentar os níveis de estresse e ansiedade.(2828. Moxham LJ, Fernandez R, Kim B, Lapkin S, Ten Ham-Baloyi W, Al Mutair A. Employment as a predictor of mental health, psychological distress, anxiety and depression in Australian pre-registration nursing students. J Prof Nurs. 2018;34(6):502-6.) Apesar disso, o semestre em curso não se mostrou significante para a ocorrência de sintomas de ansiedade e depressão.

No tocante aos dados acadêmicos e os níveis de depressão, pode-se pontuar a associação significativa entre a ausência de tempo de lazer e a insatisfação com tempo de lazer com sintomas dos níveis de depressão moderados e graves. Esses dados estão em consonância com estudo realizado em uma universidade federal do nordeste do Brasil que analisou sintomas de ansiedade e depressão em alunos do curso de enfermagem e evidenciou a relação entre o pouco tempo de lazer e a presença de sintomas depressivos nos universitários.(99. Fernandes MA, Vieira FE, Silva JS, Avelino FV, Santos JD. Prevalência de sintomas ansiosos e depressivos em universitários de uma instituição pública. Rev Bras Enferm. 2018;71(Suppl 5):2169-75.)

Além disso, a falta de tempo de lazer também está relacionada a outras formas de sofrimento mental, como foi evidenciado em estudo com 168 universitários, que encontrou relação entre essa variável e a presença de sintomas de síndrome de Burnout.(2929. Moura G, Brito M, Pinho L, Reis V, Souza L, Magalhães T. Prevalência e fatores associados à síndrome de burnout entre universitários: revisão de literatura. Psicol Saúde Doenças. 2019;20(2):300-18.) A insônia, a falta de tempo de lazer e a inatividade física são aspectos relacionados à maior prevalência de depressão entre os estudantes. A falta de tempo de lazer e descanso pode gerar problemas como fadiga, irritabilidade e falta de atenção. Por outro lado, esse tempo livre é uma maior oportunidade para convívio social, diminuindo o estresse e aumentando o grau de satisfação e felicidade.(3030. Toti TG, Bastos FA, Rodrigues P. Fatores associados à ansiedade e depressão em estudantes universitários do curso de Educação Física. Rev Saúde Física Mental. 2018;6(2):21-30.)

A prática de atividade física regular também se associou significativamente com a presença de sintomas de depressão, de forma que o sedentarismo estava relacionado a níveis moderados e graves de depressão. Resultados semelhantes foram encontrados em um estudo que analisou níveis de ansiedade e depressão em universitários do curso de educação física, no qual os alunos que não praticavam nenhum tipo de atividade possuíam níveis maiores de depressão.(3030. Toti TG, Bastos FA, Rodrigues P. Fatores associados à ansiedade e depressão em estudantes universitários do curso de Educação Física. Rev Saúde Física Mental. 2018;6(2):21-30.) A prática regular de algum exercício físico é reconhecida por diminuir os níveis de ansiedade e consequentemente os sintomas depressivos, melhorar a qualidade de vida, além de contribuir com a redução de riscos relacionados a doenças cardiovasculares e gastrointestinais.(3131. Guedes AF, Rodrigues VR, Pereira CO, Sousa MN. Prevalência e correlatos da depressão com características de saúde e demográficas de universitários de medicina. Arq Cien Saude. 2019;26(1):47-50.)

Outro aspecto clínico analisado foi a insônia, apresentando associação significativa entre sua presença e sintomas que classificam níveis aumentados de depressão. Esse fator vai ao encontro de outros estudos que observaram correlação entre sintomas depressivos e a ausência do sono em estudantes de cursos da área da saúde, sendo apontados também a dificuldade para dormir, padrão de sono irregular e inatividade física.(2323. Leão AM, Gomes IP, Ferreira MJ, Cavalcanti LP. Prevalência e fatores associados à depressão e ansiedade entre estudantes universitários da área da saúde de um grande centro urbano do nordeste do Brasil. Rev Bras Educ Médica. 2018;42(4):55-65.,3131. Guedes AF, Rodrigues VR, Pereira CO, Sousa MN. Prevalência e correlatos da depressão com características de saúde e demográficas de universitários de medicina. Arq Cien Saude. 2019;26(1):47-50.) Um ciclo vigília-sono adequado também é responsável pela manutenção de um estilo de vida saudável e manutenção do bem estar, fator esse que influenciará no aproveitamento e no rendimento acadêmico do aluno.

O presente estudo encontrou associação significativa entre o uso de psicotrópicos e sintomas de depressão moderada e grave. Estudo realizado na Paraíba, Brasil, observou que quase 40% dos estudantes de medicina fizeram uso de algum medicamento por motivos relacionados à graduação e ao ambiente universitário e relacionou esse achado e o abuso de drogas à presença de sintomas de depressão.(3131. Guedes AF, Rodrigues VR, Pereira CO, Sousa MN. Prevalência e correlatos da depressão com características de saúde e demográficas de universitários de medicina. Arq Cien Saude. 2019;26(1):47-50.) Ademais, em estudo com 292 alunos dos cursos da área da saúde da cidade de Minas Gerais verificou-se associação entre o uso de psicotrópicos e a presença de sintomatologia de ansiedade e depressão e o afastamento das práticas laborais por parte dos estudantes.(1919. Lelis KC; Brito RV, Pinho S, Pinho L. Sintomas de depressão, ansiedade e uso de medicamentos em universitários. Rev Port Enfermagem Saúde Mental. 2020;23;9-14.)

Na África do Sul, estudo realizado com 473 estudantes do curso de medicina de uma universidade encontrou que 36,4% e 45,9% dos estudantes possuíam sintomas indicativos de risco para depressão e ansiedade, respectivamente, e que um quarto de todos os estudantes (28,1%) faziam uso de alguma medicação psicotrópica. Desses, 16,1% utilizavam algum psicotrópico para depressão e 12,1% para ansiedade.(3232. Van der Walt S, Mabaso WS, Davids EL, De Vries PJ. The burden of depression and anxiety among medical students in South Africa: A cross-sectional survey at the University of Cape Town. S Afr Med J. 2019;110(1):69-76.)

O tratamento medicamentoso dos sofrimentos mentais e a busca por apoio psicológico e psiquiátrico ainda é permeado de resistências e preconceitos por parte dos estudantes da área da saúde, frequentemente por questões como medo e insegurança de demonstrar fragilidade diante da sociedade.(1919. Lelis KC; Brito RV, Pinho S, Pinho L. Sintomas de depressão, ansiedade e uso de medicamentos em universitários. Rev Port Enfermagem Saúde Mental. 2020;23;9-14.) Este fator é uma barreira ao cuidado em saúde mental, uma vez que a não procura de tratamento pelos futuros profissionais influenciará em sua qualidade de vida podendo resultar na piora da sintomatologia e das condições clínicas.

O estudo apresenta algumas limitações, quais sejam: a captação dos instrumentos de coleta de dados ser realizada por pares, o que pode levar constrangimento no preenchimento correto das informações, a extensão dos instrumentos utilizados, o que poderia ocasionar desatenção do participante, e o fato dos questionários serem autoaplicáveis, gerando incompletude de algumas informações.

Conclusão

Percebe-se a partir do presente estudo a alta prevalência de sintomas de ansiedade e depressão entre os universitários, principalmente nos níveis moderados e graves e a sua associação com diversas variáveis, sendo elas características pessoais, da vida acadêmica e saúde. No tocante à ansiedade foi possível observar a influência da pouca idade, ausência de religião, orientação sexual não heterossexual, preocupação com o futuro, falta de tempo para o lazer e uso de psicotrópicos com presença de sintomatologia grave. De forma semelhante, os sintomas de níveis de depressão moderada e grave foram associados com baixa idade, falta de tempo para o lazer e sua insatisfação, insônia, sedentarismo e uso de psicotrópicos. A existência de fatores que se relacionam com os sintomas de ambos os transtornos pode ser explicada por representarem desfechos com sintomas semelhantes e muito prevalentes no ambiente acadêmico.

Os achados contribuem para elucidar a problemática da saúde mental no ambiente acadêmico, porém, novas pesquisas precisam ser realizadas a fim de aprofundar essa temática, identificando outras questões associadas a ansiedade e depressão, como a ideação suicida, o uso de psicotrópicos não prescritos e o impacto dessa problemática na qualidade de vida desses alunos. Ademais, poderá sensibilizar os atores envolvidos a discutir a importância da Saúde Mental dos acadêmicos de Enfermagem, visando uma melhoria no ensino-aprendizagem, formando profissionais mais preparados para os diversos ambientes e a vivência das situações no mercado de trabalho.

Agradecimentos

Programa de Educação Tutorial/Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)/Ministério da Educação (MEC).

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Thiago da Silva Domingos (https://orcid.org/0000-0002-1421-7468) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    27 Abr 2021
  • Aceito
    10 Dez 2021
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
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