Validade do Índice de Katz para avaliar a dependência em pacientes em tratamento oncológico

Validez del Índice de Katz para evaluar la dependencia de pacientes en tratamiento oncológico

Resumo

Objetivo

Analisar a validade de constructo do Índice de Katz para pacientes com diagnóstico de câncer.

Método

Estudo psicométrico realizado para avaliar as evidências da validade da versão brasileira do Índice de Katz em pacientes com diagnóstico de câncer. Estudo realizado com 691 pacientes hospitalizados entre abril e junho de 2016. Os dados foram analisados por análise fatorial exploratória e confirmatória. A confiabilidade foi avaliada pelo alfa de Cronbach e ômega de McDonald.

Resultado

Os participantes eram em sua maioria mulheres (72,6%), média de idade de 53,7±13,28 anos; 55,3% dos pacientes relataram não precisar de cuidador, e 56,6% não tinham cuidador. Dos 42,5% que precisavam de ajuda, o cuidador predominante foi um familiar (39,6%). A análise fatorial exploratória e confirmatória evidenciou que o Índice de Katz é um instrumento unidimensional, válido e confiável para avaliar a dependência nesta população, com boa variância e sem evidência de multicolinearidade ou necessidade de revisão (KMO=0,89437; teste de Bartlett x² =3337,2 p<0,001; UNICO=0,999, EC=0,974; MIREAL=0,122). O Índice de Katz explica 97,72% do fenômeno e os resultados indicam bom ajuste do modelo, nível aceitável de resíduos e boa confiabilidade (G-H=0,986; α-Cronbach=0,970560; Ω-McDonald=0,971787) para avaliar a independência para atividades de vida diária básicas em pacientes com diagnóstico de câncer.

Conclusão

A versão brasileira do Índice de Katz apresenta excelentes evidências da validade de constructo e confiabilidade, podendo ser utilizada como instrumento clínico para avaliar a dependência de pacientes em tratamento oncológico.

Cancer; Neoplasias; Enfermagem oncológica; Autocuidado; Atividades cotidianas; Psicometria

Resumen

Objetivo

Analizar la validez de constructo del Índice de Katz para pacientes con diagnóstico de cáncer.

Método

Estudio psicométrico realizado para evaluar las evidencias de la validez de la versión brasileña del Índice de Katz de pacientes con diagnóstico de cáncer. Estudio realizado con 691 pacientes hospitalizados entre abril y junio de 2016. Los datos fueron analizados por análisis factorial exploratorio y confirmatorio. La fiabilidad fue evaluada por el alfa de Cronbach y omega de McDonald.

Resultado

Los participantes eran en su mayoría mujeres (72,6 %), edad promedio de 53,7±13,28 años; el 55,3 % de los pacientes relató que no necesitaba cuidador, y el 56,6 % no tenía cuidador. Del 42,5 % que necesitaba ayuda, el cuidador predominante fue un familiar (39,6 %). El análisis factorial exploratorio y confirmatorio evidenció que el Índice de Katz es un instrumento unidimensional, válido y confiable para evaluar la dependencia de esta población, con una buena varianza y sin evidencia de multicolinealidad ni necesidad de revisión (KMO=0,89437; prueba de Bartlett x² =3337,2 p<0,001; UNICO=0,999, EC=0,974; MIREAL=0,122). El Índice de Katz explica el 97,72 % del fenómeno y los resultados indican una buena adaptación del modelo, un nivel aceptable de residuos y buena fiabilidad (G-H=0,986; α-Cronbach=0,970560; Ω-McDonald=0,971787) para evaluar la independencia de AVD básicas en pacientes con diagnóstico de cáncer.

Conclusión

La versión brasileña del Índice de Katz presenta excelentes evidencias de la validez de constructo y fiabilidad, por lo que puede ser utilizada como instrumento clínico para evaluar la dependencia de pacientes en tratamiento oncológico.

Cancer; Neoplasias; Enfermería oncológica; Autocuidado; Actividades cotidianas; Psicometría

Abstract

Objective

To analyze construct validity of the Katz Index for patients with cancer diagnoses.

Methods

Psychometric study, performed to evaluate evidences of validity of the Brazilian version of the Katz Index in patients with cancer diagnoses. The study was conducted in 691 hospitalized patients between April and June 2016. Data was analyzed by Exploratory and Confirmatory Factor Analysis. Reliability was assessed by Cronbach’s Alpha and McDonald’s Ômega.

Results

Participants were mostly women (72.6%), with a mean age of 53.7±13.28 years; 55.3% reported that they did not need caregivers, and 56.6% did not have caregivers. Of the 42.5% who need help, predominant caregiver was a relative (39.6%). Exploratory and Confirmatory Factor Analysis evidenced that Katz Index is a unidimensional instrument, valid and reliable to assess dependency in this population, with a good variance and no evidence of multicollinearity or need of revision (KMO=0.89437; x² Bartlett=3337.2 p<0.001; UNICO=0.999, EC=0.974; MIREAL=0.122). Katz Index explains 97.72% of the phenomenon and results indicate good adjustment of the model, acceptable level of residuals and good reliability (G-H=0.986; α-Cronbach=0.970560; Ω-McDonald=0.971787) to assess independence to basic activity daily living in patients with cancer diagnoses.

Conclusion

The Brazilian version of the Katz Index presents excellent evidences of construct validity and reliability in its Brazilian version, and may be used as a clinical instrument to assess dependency of patients on oncology treatment.

Cancer; Neoplasms; Oncology nursing; Self-care; Activities of daily living; Psychometrics

Introdução

O câncer é responsável por mais de 12% de todas as causas globais de morte, representando sete milhões de pessoas por ano. A incidência de neoplasias cresce em todo o mundo, acompanhando o envelhecimento da população e o aumento da expectativa de vida, com 19,3 milhões de novos casos e quase dez milhões de mortes por câncer em 2020.(¹) Trata-se de um problema de saúde pública, principalmente entre os países de renda baixa e média baixa, onde é esperado que, nas próximas décadas, o impacto do câncer na população represente cerca de 80% dos mais de 28,4 milhões de novos casos estimados para o mundo em 2040.(¹,²)

Devido à possibilidade de detecção precoce, avanços no rastreamento e terapias eficazes, as pessoas estão convivendo mais com doenças crônicas como o câncer, bem como com suas consequências. Essa população relata cada vez mais sobrecarga de sintomas, intolerância ao exercício e descondicionamento físico, com possibilidade de limitações funcionais e alterações biopsicossociais.(³,⁴)

O câncer também pode afetar a capacidade de gerenciar atividades da vida diária (AVDs), também descritas como AVDs físicas ou AVDs básicas, as quais compreendem coletivamente as habilidades fundamentais necessárias para gerenciar independentemente as necessidades físicas ou o autocuidado, incluindo alimentação, banho/higiene pessoal, ir ao banheiro/continência, vestir-se e mobilidade ou transferência/deambulação.(⁴-⁶) Em 56% dos pacientes internados com diagnóstico de câncer, os problemas e necessidades identificados estavam relacionados especialmente ao vestir (60%), banho (50%), transferência (40%), higiene pessoal (20%) e alimentação (10%).(⁷)

A definição de AVDs é mais abrangente do que a capacidade de tomada de decisão, mas envolve a possibilidade de realizar de forma independente as habilidades básicas e se envolver no cuidado pessoal,(⁵,⁸) além de ser essencial para viver de forma independente dentro da sociedade.(⁴)

No contexto da ocorrência do câncer, estima-se que um terço dos pacientes adultos tenha dificuldades para execução das AVDs e metade deles necessite de algum auxílio para isso, sendo mobilidade e continência descritas como as AVDs mais afetadas.(⁴,⁹) Além disso, a diminuição da capacidade de executar as AVDs já estava associada com menor qualidade de vida relacionada à saúde, influenciando vários domínios em saúde e bem-estar.(¹⁰) A incapacidade para as AVDs pode ser diferente entre os pacientes, dependendo do tipo de câncer, idade e estágio.(⁹)

Pacientes com câncer avançado em cuidados paliativos podem apresentar maior prevalência de dependência para AVDs. São descritas dificuldades de banho (72,9%), vestir-se (56,9%), ir ao banheiro (55%), transferência (56,6%) e alimentação (38,7%) nessa população.(¹¹)Avaliar as necessidades dos pacientes é um passo essencial para planejar o tratamento do câncer focado no paciente.(¹²)

Além disso, para promover a reabilitação com independência funcional, é imprescindível melhorar a assistência com profissionais capacitados em avaliação funcional nos serviços oncológicos. Intervenções focadas no funcionamento físico, fadiga e dor têm sido descritas como úteis para melhorar as AVDs, e o Índice de Katz (IK) é uma das ferramentas mais utilizadas para realizar essa avaliação.(⁴,¹³)

A avaliação oncológica abrangente das incapacidades para as AVDs e dos elementos que podem impactar no funcionamento diário é fundamental para o planejar as estratégias de atenção à saúde.(⁹,¹⁴)

Em uma escala de seis itens desenvolvida para avaliar a funcionalidade em pacientes com doenças crônicas, são considerados banho, vestir, ir ao banheiro, transferência, continência e alimentação, com três opções de respostas: 1 – o sujeito realiza a atividade específica sem qualquer auxílio (independente); 0,5 – com assistência parcial (parcialmente dependente); ou 0 – necessita de assistência integral para realizá-la (dependente). Em uma pontuação global de 0 a 6, o IK classifica o tema para cada item e dá uma pontuação total correspondente ao desempenho geral: independente (=6 pontos), parcialmente dependente (3 – 5 pontos) e dependente (< 2 pontos).(⁸,¹⁵-¹⁸)

Considerando o uso do IK em outros grupos(¹⁹) e a necessidade de acessar essa população por meio de instrumentos validados e confiáveis,(²⁰) uma avaliação prévia é essencial para descrever as propriedades psicométricas da escala para seu uso em pacientes com diagnóstico de câncer, levando em consideração o seu potencial para avaliar o nível de dependência e realizar o planejamento assistencial de suporte à saúde entre esses pacientes.

O objetivo do presente estudo foi analisar a validade de constructo do Índice de Katz para pacientes com diagnóstico de câncer.

Métodos

Foi realizado um estudo psicométrico para avaliar as evidências da validade da versão brasileira do IK(¹⁶) em pacientes em tratamento oncológico.

Adotou-se um procedimento de amostragem por conveniência, estimando um mínimo de 20 pacientes para cada um dos itens do Índice de Katz e obtendo uma carga fatorial de 0,30.(²¹) Os critérios de inclusão foram idade igual ou superior a 18 anos; diagnóstico de câncer, independentemente da etiologia ou fase do tratamento, em unidades de ambulatório, internação, quimioterapia e radioterapia; e condições físicas e emocionais satisfatórias para responder ao instrumento de coleta de dados no momento da entrevista.

A coleta de dados foi realizada após a aprovação do protocolo de pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (nº 1.400.151). Todos os participantes assinaram um termo de consentimento por escrito antes da entrevista e receberam informações sobre os objetivos do estudo, como possíveis riscos e benefícios. Todos os procedimentos seguiram a regulamentação brasileira vigente sobre pesquisas envolvendo seres humanos.

Os dados foram coletados em entrevistas presenciais realizadas entre abril e junho de 2016, por auxiliares de pesquisa treinados e sob supervisão do pesquisador responsável, todos estudantes de graduação em enfermagem.

Um formulário de coleta de dados foi preenchido com variáveis sociodemográficas e clínicas, como idade, sexo, estado civil, religião/crenças, ocupação, necessidades de cuidados, presença de cuidador, local do tumor, cirurgia, quimioterapia, radioterapia, período de diagnóstico e terapia, necessidade de suporte de cuidados.

Para o propósito deste estudo, o Índice de Katz foi preenchido pelo participante e as pontuações totais e por cada item da escala foram analisadas.

O Índice de Katz, ou Índice de Atividades da Vida Diária, consiste em uma escala de seis itens desenvolvida para medir o funcionamento físico de pacientes com doenças crônicas.(⁸,¹⁵,¹⁶) Várias teorias e instrumentos de medição foram desenvolvidos desde então. Katz et al. demonstraram que a recuperação do desempenho funcional de seis atividades consideradas básicas no cotidiano de idosos com deficiência (banhar-se, vestir-se, ir ao banheiro, transferir-se, estar continente e comer) foi como a sequência observada no processo de desenvolvimento da criança.(⁸,¹⁵,¹⁶)

Evidências da validade de constructo foram observadas pela análise fatorial. A Análise Fatorial Exploratória (AFE) foi realizada com base na matriz de correlações policóricas dos itens, com método de extração dos Mínimos Quadrados Não Ponderados Robustos (em inglês, Robust Unweighted Least Squares - RULS) e rotação Promin.(²¹)

As correlações policóricas são mais fortes e produzem um melhor ajuste ao modelo teórico quando há violação da suposição de normalidade multivariada dos dados.(²²,²³) O RULS é considerado um método robusto de extração para variáveis de natureza ordinal com dados não normais e controle de resíduos e erros de medição.(²⁴) O Promin é um método de rotação oblíqua que permite a correlação entre os fatores correlacionados.(²⁵,²⁶)

Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) ≥ 0,70 e Índice de Bartlett significativo (p < 0,05) foram considerados para verificar a adequação amostral para análises fatoriais.(²⁷)

A análise paralela (AP), realizada pela técnica de Optimal Implementation of Pararell Analysis, baseada em correlações policóricas foi usada para avaliar a retenção de fatores e quanto da variância das variáveis observadas é explicada pelos fatores, e a Comunalidade foi usada para verificar o quanto a variância de um item pode ser prevista à partir dos demais itens.(²⁵) A AP com intervalo de confiança (IC) de 95% foi usada para garantir soluções mais robustas a fim de identificar o número adequado de fatores a serem extraídos.(²¹,²⁷) O modelo foi aceito se a carga fatorial fosse >0,50, comunalidades >0,40 e variância total explicada pela solução fatorial >60%.(²⁷)

Congruência Unidimensional (UniCo) > 0,95, Variância Comum Explicada (ECV) > 0,85, e Média das Cargas Residuais Absolutas do Item (MIREAL) < 0,30 foram consideradas adequadas para confirmar se o Índice de Katz é uma ferramenta unidimensional. (²⁵,²⁷,²⁸)

A Análise Fatorial Confirmatória (AFC) foi realizada usando média e variância ajustada por meio do método dos mínimos quadrados (WLSMV). O ajuste do modelo foi analisado por meio da inspeção de índices de ajuste, índices de modificação e resíduos correlacionais. A adequação de um bom modelo de ajuste foi não significativa; qui-quadrado (x²>0,05), Índice de Qualidade de Ajuste (GFI) ≥ 0,95, Índice de Qualidade de Ajuste Ajustado (AGFI) ≥ 0,95, Índice de Ajuste Normado (NFI) ≥ 0,95, Índice de Ajuste Comparativo (CFI) ≥ 0,95, Raiz Quadrada Média do Erro de Aproximação (RMSEA) ≤ 0,07, Raiz Quadrada Média Residual (RMSR) < 0,03 e Raiz Quadrada Média Ponderada Residual (WRMR) <1,0.(²⁵)

Para determinar até que ponto o conjunto de variáveis é consistente no que se pretende mensurar, a confiabilidade do constructo foi verificada por meio do alfa de Cronbach e do ômega de McDonald, com boa consistência interna geral se α > 0,70 e Ω > 0,90.(¹⁹) O Katz seria considerado confiável se o índice G-H > 0,80.(²⁸)

Para todos os testes estatísticos, o nível de significância foi de 5%. As análises estatísticas foram realizadas usando IBM SPSS (v.22, SPSS An IBM Company, Chicago, IL) e programa Factor 10.8.04 para Windows 64 bits.

Resultados

A amostra total foi composta por 691 participantes, em sua maioria mulheres (72,6%), média de idade de 53,7±13,28 anos. Houve predominância do ensino fundamental (43,0%). A maioria dos pacientes vivia com companheiro (54,5%), declarou ser da religião católica (49,6%) e estar desempregados (29,8%), seguido de aposentados (27,9%). A maioria dos pacientes (55,3%) relatou não precisar de cuidador e 56,6% não tinha cuidador. Dos 42,5% que necessitavam de ajuda, o familiar era o cuidador predominante (39,6%). Do total de pacientes entrevistados, 315 (45,6%) estavam no serviço de quimioterapia, 181 (26,2%) no ambulatório, 173 (25,0%) na unidade de internação e 22 (3,2%) no serviço de radioterapia. Cerca de 18,0% dos pacientes necessitaram de alguma ajuda para responder às questões. O tumor mais frequente foi no aparelho reprodutor (55,9%), com predomínio do câncer de mama feminino (33,9%), seguido do aparelho digestório (17,7%), com o tumor de estômago (6,3%). Quanto ao tipo de tratamento, 56,1% dos pacientes foram submetidos à cirurgia e 60,8% à quimioterapia. A maioria dos pacientes apresentou diagnóstico (74,4%) e tempo de tratamento (54,0%) superior a seis meses.

Análise fatorial exploratória

Não houve dados ausentes. Todas as opções de resposta foram endossadas (mín. = 1 máx. = 3), mostrando a distribuição em toda a gama potencial de respostas. A assimetria (1,864 – 2,693) e curtose (1,765 – 5,654) para todos os itens atenderam aos requisitos distributivos para realizar a AFE e a AFC usando a máxima verossimilhança.

Os resultados da AFE para identificar o modelo estrutural do Índice de Katz para avaliar a dependência em pacientes em tratamento oncológico levam a evidências de estrutura do constructo, com aproximadamente 115 casos por item.

O Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) = 0,89437 e o teste de esfericidade de Bartlett = 3337,2 (p < 0,001) mostraram a adequação da amostra para a análise fatorial.

A análise paralela realizada por matrizes de correlação policórica indicou que o instrumento é unidimensional e explica 96,72% do fenômeno. Os valores de UniCo (0,999), ECV (0,974) e MIREAL (0,122) corroboram a evidência de estrutura do constructo para um instrumento unidimensional de medida de saúde. As cargas fatoriais são as descritas na tabela 1.

Tabela 1
Solução fatorial do Índice de Katz (n=691)

Variável	Solução fatorial
	Fator 1	Comunalidade
1 Comer	0,958	0.919
2 Continência	0.954	0.911
3 Transferência	0.982	0.964
4 Ir ao banheiro	0.974	0.949
5 Vestir-se	0.778	0.605
6 Banhar-se	0.876	0.767

A solução fatorial indicou carga fatorial maior que 0,50 para todos os itens, com altos valores de comunalidades (> 0,95).

Análise fatorial confirmatória

Há excelente evidência de ajuste de um modelo unidimensional, conforme indicado na tabela 2.

Tabela 2
Análise Fatorial Confirmatória do Índice de Katz (n=691)

	valores	valor p
x2	16,681	0,056
GFI	1.000
AGFI	0.999
NNFI	0.998
CFI	0.999
RMSEA (Intervalo de Confiança 95%)	0.035 (0.01-0.05)
RMSR	0,018
WRMR	0,026

• x² - Teste qui-quadrado; GFI - Goodness of Fit Index; AGFI - Índice de Qualidade de Ajuste Ajustado; NNFI - Índice de Ajuste Não Normado; CFI - Índice de Ajuste Comparativo; RMSEA – Raiz Quadrada Média do Erro de Aproximação; RMSR - Raiz Quadrada Média Residual; WRMR - Raiz Quadrada Média Ponderada Residual

Todos os resultados indicam um bom ajuste do modelo e um nível residual aceitável para avaliar a independência para AVD básica em pacientes com diagnóstico de câncer usando o Índice de Katz. Assim, o instrumento apontou excelente índice G-H 0,986, e boa confiabilidade para alfa de Cronbach = 0,97 e Ômega de McDonald = 0,97.

Discussão

Os resultados demonstraram que o Índice de Katz para pacientes com diagnóstico de câncer tem grande evidência de validade e confiabilidade de constructo. As evidências de validade foram confirmadas pela AFE e AFC, métodos estatísticos multivariados recomendados na literatura especializada para o desenvolvimento e validação de teorias e mensurações psicológicas. A AFE indica a unidimensionalidade de uma estrutura bem definida e a AFC confirmou que o instrumento na escala de três pontos se ajusta ao modelo hipotético.(²⁵,²⁷)

Investigar se um questionário mede um constructo latente é de interesse dos pesquisadores, uma vez que a mensuração psicossocial tem papel fundamental em diversas avaliações clínicas e estudos de pesquisa, como educação, psicologia, ciência comportamental e saúde.(²⁹,³⁰) Além disso, é relevante para interpretar adequadamente os resultados e fazer inferências válidas sobre o fenômeno.(²⁹)

A análise psicométrica indica que a versão brasileira do IK é válida e confiável para avaliar a dependência nesta população em um instrumento unidimensional, com boa variância, sem evidência de multicolinearidade ou necessidade de revisão.(²⁵)

Estudos relatam que entre um terço e metade dos adultos com câncer vivenciam alterações em seu estado funcional, com dificuldade ou necessidade de auxílio para realizar AVDs básicas e instrumentais, de acordo com o tipo de tumor e seu estágio.(⁴,³¹-³⁴) Esse constructo é essencial para avaliar as deficiências e planejar a reabilitação do paciente com foco na independência funcional, uma vez que consiste em uma importante dificuldade e/ou incapacidade,(⁴) com dificuldades para sua avaliação.

A independência para realizar as AVDs é uma preocupação dos pacientes e identificada como uma necessidade de suporte para os cuidados, apesar de não receber tanta atenção em alguns casos, como para o diagnóstico de câncer de pulmão, sendo motivo de frustração.(³⁵) Essas atividades também têm sido estudadas como uma possibilidade da terapia ocupacional para melhorar o desempenho dos pacientes e a satisfação com o cenário oncológico.(³⁶)

Nesse contexto, são necessários métodos para avaliar evidências de validade das informações. O Índice de Katz provou ser válido e confiável em populações com diferentes condições crônicas de diferentes locais do mundo,(¹⁹,³⁷,³⁸) o que indica estabilidade de sua estrutura. A avaliação da evidência de seu índice validade em pacientes em tratamento oncológico fornece novas evidências de validade de estrutura.

A literatura indica que ferramentas unidimensionais podem ter capacidade limitada para identificar aspectos de força ou necessidade e ser adaptadas às necessidades individuais do cliente em alguns constructos.(³⁹) A unidimensionalidade tem se mostrado como uma boa qualidade do IK, pois ele é de fácil utilização e possui boas evidências de validade, confiabilidade e replicabilidade, como também observado pelos resultados de AFE, AFC e índice G-H neste estudo.

Demonstrou-se também o interesse em utilizar esta ferramenta para avaliar pacientes com câncer, com possibilidade de investigar sintomas e necessidades dos pacientes em vários tipos de câncer com a mesma ferramenta de medição de saúde.(⁴,⁴⁰-⁴²)

Como as alterações nas AVD em pacientes com câncer podem ocorrer em diferentes níveis e há poucos estudos descrevendo higiene pessoal, deambulação e transferências como as áreas mais afetadas, bem como preditoras de qualidade de vida e mortalidade, a validação de um instrumento que forneça dados confiáveis confirma a implicação deste estudo para a prática clínica.

Em uma estrutura de escala de seis itens, o IK indica ser uma boa opção, uma vez que ferramentas de mensuração em versões curtas podem aliviar a carga de pacientes com condições crônicas, aumentando as taxas de resposta.

Conclusão

A versão brasileira do Índice de Katz apresenta excelentes evidências de validade e confiabilidade de constructo como instrumento clínico unidimensional que pode ser utilizado para avaliar a dependência de pacientes em tratamento oncológico.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

Referências

• ¹
  Sung H, Ferlay J, Siegel RL, Laversanne M, Soerjomataram I, Jemal A, et al. Global Cancer Statistics 2020: GLOBOCAN Estimates of Incidence and Mortality Worldwide for 36 Cancers in 185 Countries. CA Cancer J Clin. 2021;71(3):209-49.
• ²
  Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Estimativa 2020: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2019 [citado 2021 Jan 31]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/estimativa
  » https://www.inca.gov.br/estimativa
• ³
  Gallasch CH, Alexandre NM, Esteves SC, Pérez-Júnor EF, Faria MG, Oliveira EB et al. Mental Functioning of Workers with Cancer Diagnosis by Brazilian Version of the Work Role Functioning Questionnaire-WRFQ-Br. Health. 2016;8:1495-505.
• ⁴
  Neo J, Fettes L, Gao W, Higginson IJ, Maddocks M. Disability in activities of daily living among adults with cancer: a systematic review and meta-analysis. Cancer Treat Rev. 2017;61:94-106.
• ⁵
  Mlinac ME, Feng MC. Assessment of Activities of Daily Living, Self-Care, and Independence. Arch Clin Neuropsychol. 2016;31(6):506–16.
• ⁶
  Edemekong PF, Bomgaars DL, Sukumaran S, Levy SB. Activities of Daily Living. [Updated 2021 Sep 26]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2021 [cited 2021 Jan 31]. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK470404/
  » https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK470404/
• ⁷
  Lindahl-Jacobsen L, Hansen DG, Wæhrens EE, la Cour K, Søndergaard J. Performance of activities of daily living among hospitalized cancer patients. Scand J Occup Ther. 2015;22(2):137-46.
• ⁸
  Katz S, Ford AB, Moskowitz RW, Jackson BA, Jaffe MW. Studies of illness on the aged. The index of ADL: a standardized measure of biological and psychological function. JAMA. 1963;185:914-9.
• ⁹
  Blackwood J, Karczewski H, Huang MH, Pfalzer L. “Katz activities of daily living disability in older cancer survivors by age, stage, and cancer type”. J Cancer Surviv. 2020;14(6):769-78.
• ¹⁰
  Lyu W, Wolinsky FD. The Onset of ADL Difficulties and Changes in Health-Related Quality of Life. Health Qual Life Outcomes. 2017;15(1):217.
• ¹¹
  Amano K, Maeda I, Morita T, Baba M, Miura T, Hama T, et al. C-reactive protein, symptoms and activity of daily living in patients with advanced cancer receiving palliative care. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2017;8(3):457-65.
• ¹²
  Allgar VL, Chen H, Richfield E, Currow D, Macleod U. Psychometric properties of the needs assessment tool-progressive disease cancer in U.K. Primary Care. J Pain Symptom Manage. 2018;56(4):602-12.
• ¹³
  Funch A, Kruse NB, la Cour K, Peoples H, Waehrens EE, Brandt Å. The association between having assistive devices and activities of daily living ability and health-related quality of life: an exploratory cross-sectional study among people with advanced cancer. Eur J Cancer Care (Engl). 2019;28(3):e13002.
• ¹⁴
  Ćwirlej-Sozańska A, Wiśniowska-Szurlej A, Wilmowska-Pietruszyńska A, Sozański B. Determinants of ADL and IADL disability in older adults in southeastern Poland. BMC Geriatr. 2019;19(1):297.
• ¹⁵
  Katz S. Assessing self-maintenance: activities of daily living, mobility, and instrumental activities of daily living. J Am Geriatr Soc. 1983;31(12):721-7. Review.
• ¹⁶
  Lino VT, Pereira SE, Camacho LA, Ribeiro Filho ST, Buksman S. Cross cultural adaptation of the Independence in Activity Daily Living Index (Katz Index). Cad Saude Publica. 2008;24:103-12.
• ¹⁷
  Katz S, Downs TD, Cash HR, Grotz RC. Progress in development of the index of ADL. Gerontologist. 1970;10(1):20-30.
• ¹⁸
  Wallace M, Shelkey M. Monitoring functional status in hospitalized older adults. Am J Nurs. 2008;108(4):64-71; quiz 71-2. Review.
• ¹⁹
  Ferretti-Rebustini RE, Balbinotti MA, Jacob-Filho W, Rebustini F, Suemoto CK, Pasqualucci CA, et al. Validity of the Katz Index to assess activities of daily living by informants in neuropathological studies. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(6):946-52.
• ²⁰
  Pascoe L, Edvardsson D. Benefit finding in adult cancer populations: psychometric properties and performance of existing instruments. Eur J Oncol Nurs. 2014;18(5):484-91. Review.
• ²¹
  Timmerman ME, Lorenzo-Seva U. Dimensionality assessment of ordered polytomous items with parallel analysis. Psychol Methods. 2011;16(2):209-20.
• ²²
  Choi J, Kim S, Chen J, Dannels S. A comparison of maximum likelihood and bayesian estimation for polychoric correlation using monte carlo simulation. J Educ Behav Statistics. 2011;36(4):523–49.
• ²³
  Gaskin CJ, Happell B. On exploratory factor analysis: a review of recent evidence, an assessment of current practice, and recommendations for future use. Int J Nurs Stud. 2014;51(3):511-21. Review.
• ²⁴
  Morata-Ramírez MA, Holgado-Tello FP. Construct validity of likert scales through confirmatory factor analysis: a simulation study comparing different methods of estimation based on pearson and polychoric correlations. IJSSS. 2013;1(1)54-61.
• ²⁵
  Hair Jr JF, Black WC, Babin BJ, Anderson RE. Multivariate data analysis, 8th ed. Pearson, London; 2018. 785 p.
• ²⁶
  Lorenzo-Seva U, Ferrando PJ. Robust Promin: a method for diagonally weighted factor rotation. Liberabit. 2019;25(1):99-106.
• ²⁷
  Watkins MW. Exploratory factor analysis: a guide for best practice. J Black Psychol. 2018;1-18.
• ²⁸
  Ferrando PJ, Lorenzo-Seva U. Assessing score determinacy, measurement quality, and closeness to unidimensionality in exploratory item factor analysis. Educ Psychol Meas. 2017;78:1-19.
• ²⁹
  Liao M, Jiao H. Book review. Psychometrika. 2019;84(1):323-6.
• ³⁰
  Segal BD, Braun T, Gonzalez R, Eliott MR. Tests of matrix structure for construct validation. Psychometrika. 2019;84(1):65-83.
• ³¹
  Singh R, Ansinelli H, Katz H, Jafri H, Gress T, Tirona MT. Factors associated with functional decline in elderly female breast cancer patients in appalachia. Cureus. 2018;10(5):e2612.
• ³²
  van Abbema D, van Vuuren A, van den Berkmortel F, van den Akker M, Deckx L, Buntinx F, et al. Functional status decline in older patients with breast and colorectal cancer after cancer treatment: a prospective cohort study. J Geriatr Oncol. 2017;8(3):176-84.
• ³³
  Tabata A, Kanai M, Horimatsu T, Tsuboyama T, Matsushima K, Kato T. Changes in upper extremity function, ADL, and HRQoL in colorectal cancer patients after the first chemotherapy cycle with oxaliplatin: a prospective single-center observational study. Support Care Cancer. 2018;26(7):2397-405.
• ³⁴
  Haj Mohammad N, De Rooij S, Hulshof M, Ruurda J, Wijnhoven B, Erdkamp F, et al. Activities of daily living and quality of life during treatment with neoadjuvant chemoradiotherapy and after surgery in patients with esophageal cancer. J Surg Oncol. 2016;114(6):684-90.
• ³⁵
  Maguire R, Papadopoulou C, Kotronoulas G, Simpson MF, McPhelim J, Irvine L. A systematic review of supportive care needs of people living with lung cancer. Eur J Oncol Nurs. 2013;17(4):449-64. Review.
• ³⁶
  Udovicich A, Edbrooke L, Brown T. Achieving patient-centred goals in oncology: a retrospective analysis of a domestic activities of daily living group. British J Occup Ther. 2020;83(12):1-7.
• ³⁷
  Azad A, Mohammadinezhad T, Taghizadeh G, Lajevardi L. Clinical assessment of activities of daily living in acute stroke: Validation of the Persian version of Katz Index. Med J Islam Repub Iran. 2017;31:30.
• ³⁸
  Sharifi F, Alizadeh-Khoei M, Saghebi H, Angooti-Oshnari L, Fadaee S, Hormozi S, et al. Validation study of ADL-Katz Scale in the Iranian elderly nursing home. Ageing Inter. 2017;43:508-23.
• ³⁹
  Packer TL, Fracini A, Audulv Å, Alizadeh N, van Gaal BG, Warner G, et al. What we know about the purpose, theoretical foundation, scope and dimensionality of existing self-management measurement tools: a scoping review. Patient Educ Couns. 2018;101(4):579-95. Review.
• ⁴⁰
  Ivanova JI, Mytelka DS, Duh MS, Birnbaum HG, Cummings AK, San Roman AM, et al. Evaluating the utility of existing patient-reported outcome scales in novel patient populations with pancreatic cancer, lung cancer, and myeloproliferative neoplasms using medicare current beneficiary survey data. Patient. 2013;6(3):189-200.
• ⁴¹
  Khoei MA, Akbari ME, Sharifi F, Fakhrzadeh H, Larijani B. ation and validation of the activities of daily living scale with Iranian elderly cancer patients treated in an oncology unit. Asian Pac J Cancer Prev. 2013;14(5):2731-7.
• ⁴²
  Oort Q, Taphoorn MJ, Sikkes SA, Uitdehaag BM, Reijneveld JC, Dirven L. Evaluation of the content coverage of questionnaires containing basic and instrumental activities of daily living (ADL) used in adult patients with brain tumors. J Neurooncol. 2019;143(1):1-13.

Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Edvane Birelo Lopes De Domenico (https://orcid.org/0000-0001-7455-1727) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Ago 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  07 Jun 2021
• Aceito
  07 Dez 2021