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Implementação de boas práticas em simulação clínica no ensino em enfermagem

Implementación de buenas prácticas de simulación clínica en la enseñanza de enfermería

Resumo

Objetivo

Identificar as necessidades, vantagens, fatores facilitadores e barreiras para a implementação das boas práticas no delineamento da simulação clínica (SC) propostas pela International Nursing Association Clinical Simulation & Learning (INACSL).

Métodos

Utilizou-se o método qualitativo de estudo de caso, fundamentado no Modelo de Difusão de Inovações de Rogers. A coleta de dados foi realizada em uma instituição pública de ensino, por meio de observações de atividades de SC e entrevistas semiestruturadas gravadas com 18 pessoas envolvidas nessas atividades, submetidas à análise de conteúdo.

Resultados

As boas práticas foram consideradas necessárias, pois contribuem para a sistematização do delineamento da SC, ainda, foram consideradas vantajosas, pois podem impactar positivamente na qualidade do cuidado fornecido pelo estudante ao paciente em campo de estágio. O interesse institucional em aprimorar a SC foi considerado um facilitador. No entanto, a ausência de formação metodológica em relação à estratégia de SC, recursos humanos insuficientes para utilizar práticas de ensino novas e indisponibilidade de tempo da equipe para incluir mudanças em suas práticas habituais foram consideradas barreiras para a implementação das boas práticas.

Conclusão

A implementação de boas práticas no delineamento da SC é necessária para que os potenciais benefícios da estratégia sejam usufruídos. O conhecimento sobre a necessidade, vantagem, facilitadores e barreiras contribui para a elaboração de ações baseadas em dados consistentes para a implementação de inovação com efetividade.

Simulação de paciente; Treinamento por simulação; Educação em enfermagem; Ciência da implementação

Resumen

Objetivo

Identificar las necesidades, ventajas, factores facilitadores y barreras para la implementación de las buenas prácticas en el diseño de la simulación clínica (SC) propuestas por la International Nursing Association Clinical Simulation & Learning (INACSL).

Métodos

Se utilizó el método cualitativo de estudio de caso, fundamentado en el Modelo de Difusión de Innovaciones de Rogers. La recopilación de los datos se realizó en una institución pública de enseñanza, por medio de la observación de actividades de SC y de entrevistas semiestructuradas grabadas con 18 personas involucradas en esas actividades, sujetas al análisis de contenido.

Resultados

Las buenas prácticas fueron consideradas necesarias, ya que contribuyen con la sistematización del diseño de la SC. Además, se consideraron beneficiosas ya que pueden impactar positivamente en la calidad del cuidado brindado por el estudiante al paciente en el ámbito de la pasantía. El interés institucional en perfeccionar la SC fue considerado un facilitador. Sin embargo, la ausencia de formación metodológica en lo referente a la estrategia de SC, los recursos humanos insuficientes para utilizar prácticas de enseñanza nuevas y la falta de disponibilidad de tiempo del equipo para incluir cambios en sus prácticas habituales fueron consideradas barreras para la implementación de las buenas prácticas.

Conclusión

La implementación de buenas prácticas en el diseño de la SC es necesaria para poder usufructuar los potenciales beneficios de la estrategia. El conocimiento sobre la necesidad, las ventajas, los facilitadores y las barreras contribuye para la elaboración de acciones basadas en datos consistentes para la implementación de innovación con efectividad.

Simulación de paciente; Entrenamiento simulado; Educación em enfermería; Ciencia de la implementación

Abstract

Objective

To identify the needs, advantages, facilitating factors, and barriers for implementation of best practices in clinical simulation (CS) design, proposed by the International Nursing Association of Clinical and Simulation Learning (INACSL).

Methods

This was a qualitative case study method based on Rogers’ Diffusion of Innovation (DOI) Theory. Data collection was conducted in a public educational institution, by observations of CS activities and semi-structured interviews, recorded, with 18 people involved in these activities, and submitted to content analysis.

Results

Good practices were considered necessary, because they contribute to the systematization of the CS design; they were also considered advantageous, as they can positively impact the quality of care provided by the student to the patient in the clinical training field. The institutional interest in improving CS was a facilitator. However, the lack of methodological knowledge regarding CS strategy, insufficient human resources to use new teaching practices, and the team’s lack of time to include changes in its usual practices were considered barriers to the implementation of good practices.

Conclusion

The implementation of good practices in CS design is necessary for the potential benefits of the strategy to be appreciated. Knowledge about the need, advantage, facilitators, and barriers contributes to the design of actions supported by consistent data for the effective implementation of the innovation.

Patient simulation; Simulation training; Education nursing; Implementation science

Introdução

Uma das estratégias de ensino que vem despertando interesse de educadores em enfermagem é a simulação clínica (SC), que promove o aprendizado por meio da experiência vivenciada em cenários clínicos e de reflexões mobilizadas em sessões de debriefing.(11. Kolb D. Experiential learning: experience as a source of learning and development. New Jersey: Prentice Hall; 1984. 416 p.,22. Kolb A, Kolb D. The Learning way meta-cognitive aspects of experiential learning. Simul Gaming. 2009;40(3):297-327.) Há crescente produção de evidências científicas relacionadas ao delineamento, condução e operacionalização da SC em programas de ensino, constituindo em desafio a atualização frequente de educadores diante do acelerado avanço de conhecimento disponível.

As boas práticas em SC reúnem evidências científicas em diretrizes para auxiliar educadores no alcance de melhores resultados de aprendizagem em estudantes de enfermagem por meio de atividades realizadas com competência e que levam a um alto desempenho e qualidade no uso da SC.(33. Sittner BJ, Aebersold ML, Paige JB, Graham LL, Schram AP, Decker SI, et al. INACSL standards of best practice for simulation: past, present, and future. Nurs Educ Perspec. 2015;36(5):294-8.,44. Perleth M, Jakubowski E, Busse R. What is ‘best practice’ in health care? State of the art and perspectives in improving the effectiveness and efficiency of the European health care systems. Health Policy. 2001;56:235–50.)

A adoção de boas práticas, como são as de SC, pode corresponder à adoção de inovações. No processo de implementação de uma inovação, é necessário compreender as características do contexto em que se pretende implementar, pois a probabilidade de uma evidência ser implementada com sucesso dependerá da identificação das barreiras e das facilidades que envolvem o processo.(55. Grimshaw JM, Eccles MP, Lavis JN, Hill SJ, Squires JE. Knowledge translation of research findings. Implement Sci. 2012;7(50):1-29.) Ao obter esse mapeamento é possível traçar estratégias para garantir maior efetividade da implementação.(55. Grimshaw JM, Eccles MP, Lavis JN, Hill SJ, Squires JE. Knowledge translation of research findings. Implement Sci. 2012;7(50):1-29.)

O Modelo de Difusão de Inovação de Rogers(66. Rogers EM. Diffusion of innovations. 5th ed. Nova York: Free Press; 2003. 576 p.) abrange os aspectos envolvidos na implementação de uma inovação. Para Rogers(66. Rogers EM. Diffusion of innovations. 5th ed. Nova York: Free Press; 2003. 576 p.) a implementação é um processo pelo qual a inovação é comunicada ao longo do tempo entre os membros de um sistema social e tal modelo propõe medidas para facilitar a implementação, entre elas, que os membros do sistema social conheçam a inovação e tenham clareza das necessidades e vantagens em implementá-la, seus facilitadores e barreiras.(66. Rogers EM. Diffusion of innovations. 5th ed. Nova York: Free Press; 2003. 576 p.)

A International Nursing Association Clinical Simulation & Learning (INACSL)(77. Howard VM. President’s Message. Clin Simul Nurs. 2013;9(6):2.) lançou um conjunto de diretrizes de melhores práticas para apoiar o ensino por SC de qualidade na enfermagem. Entre elas, as melhores práticas para o delineamento,(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.) para os objetivos e resultados de aprendizagem,(1010. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM Outcomes and Objectives. Clin Simul Nurs. 2021;58:40-4.) métodos de facilitação,(1111. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM Facilitation. Clin Simul Nurs. 2021;58:22-6.) para realizar o debriefing,(1212. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM The Debriefing Process. Clin Simul Nurs. 2021;58:27-32.) avaliar o participante,(1313. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM Evaluation of Learning and Performance. Clin Simul Nurs. 2021;58:54-6.) garantir a integridade profissional,(1414. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM Professional Integrity. Clin Simul Nurs. 2021;58:45-8.) desenvolver SC com diferentes profissões(1515. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM Simulation-Enhanced Interprofessional Education. Clin Simul Nurs. 2021;58:49-53.) e por fim, diretrizes para operacionalizar a infraestrutura que envolve a SC.(1616. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM Operations. Clin Simul Nurs. 2021;58:33-9.) A implementação dessas diretrizes pode auxiliar a organização das atividades de SC em programas de ensino.

Entre as inúmeras atividades que envolvem a SC, o delineamento é atividade essencial para garantir os resultados pretendidos pela estratégia.(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.) O delineamento da SC é a definição e planejamento de todos os elementos necessários para a atividade de ensino acontecer. Inclui a definição do objetivo de aprendizagem da atividade, elaboração do caso clínico com as pistas que nortearão o participante a alcançar o objetivo, a elaboração das questões que guiarão o debriefing a fim de conduzir o raciocínio do participante ao alcance dos objetivos de aprendizagem, organização do conteúdo pertinente ao prebriefing, entre outros (Quadro 1).(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.)

Quadro 1
Critérios de boas práticas para o delineamento da SC

Em pesquisa recente, foi desenvolvido um guia de boas práticas para a gestão da SC no ensino em enfermagem que forneceu auxílio à prática, aos recursos e aos dados, e ainda, ressaltou o uso da tecnologia e a formação dos profissionais como os mais importantes aspectos para o enfrentamento das principais barreiras encontradas.(1717. Schuelter PI, Tourinho FS, Radünz V, Santos VE, Fermo VC, Barbosa SS. Management in clinical simulation: a proposal for best practices and process optimization. Rev Bras Enferm. 2021;74(Suppl 6):e20200515.) No entanto, ainda não há evidências descritas na literatura sobre a implementação de boas práticas para o delineamento da SC. Na presente pesquisa, o objeto de interesse é a implementação de boas práticas no delineamento da simulação clínica propostas pela INACSL(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.)no ensino de graduação em enfermagem. A instituição de ensino selecionada para o contexto da pesquisa não adota as diretrizes descritas. Considerando a SC como estratégia eficaz para o ensino em enfermagem(1818. Hencklein LC, Silva RL, Campos DG, Spagnol GS, Silva JL, Oliveira Sanfelice CF, et al. Effectiveness of clinical simulation and peer-assisted learning to teaching about the sexuality of people with spinal cord injury. J Neurosci Nurs. 2021;53(5):208-14.,1919. Nascimento JS, Nascimento KG, Oliveira JL, Alves MG, Silva AR, Dalri MC. Clinical simulation for nursing competence development in cardiopulmonary resuscitation: systematic review. Rev Lat Am Enferm. 2020;28:3391.) e a importância de conhecer as condições de um contexto para o estabelecimento de ações prévias para a implementação satisfatória de uma inovação, este estudo explorou as necessidades, vantagens, facilitadores e barreiras para a implementação de boas práticas no delineamento da SC.

Métodos

Trata-se de um estudo de caso único,(2020. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5a ed. Porto Alegre: Bookman; 2015. 320 p.) de abordagem exploratória sobre o delineamento de SC considerando as diretrizes de boas práticas.(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.) Utilizou-se o Modelo de difusão de inovações de Rogers para estruturação deste caso, segundo o qual, ao implementar uma inovação é necessário verificar se os membros do sistema social em questão têm clareza das necessidades e vantagens em implementá-la.(66. Rogers EM. Diffusion of innovations. 5th ed. Nova York: Free Press; 2003. 576 p.)Para este relato da pesquisa utilizaram-se os critérios do Reporting Qualitative Research (COREQ).(2121. Souza VR, Marziale MH, Silva GT, Nascimento PL. Translation and validation into Brazilian Portuguese and assessment of the COREQ checklist. Acta Paul Enferm. 2021;34:eAPE02631.)

O estabelecimento de proposições direciona para algo que deve ser examinado dentro do escopo da pesquisa.(2020. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5a ed. Porto Alegre: Bookman; 2015. 320 p.) Na presente pesquisa as proposições foram: 1) a identificação pelos educadores de que a implementação de boas práticas no delineamento da SC contribui para a elaboração dos objetivos de aprendizagem e alcance dos mesmos; e 2) o uso das boas práticas no delineamento da SC poderá facilitar a sistematização da prática da SC, além de possibilitar a avaliação da efetividade da estratégia no alcance dos objetivos de aprendizagem.

O estudo foi realizado em uma instituição pública, que apresenta um prédio com quatro grandes laboratórios e outras estruturas menores, com ampla quantidade de materiais e equipamentos para atividades de ensino prático. Todos os participantes do estudo fazem uso dos mesmos laboratórios e compartilham da mesma estrutura.

A coleta de dados foi realizada por entrevistas com docentes, pesquisadores, funcionários e estudantes de enfermagem envolvidos em atividades de SC e observação participante com construção de diário de campo a partir de um roteiro sobre necessidades, vantagens, facilitadores e barreiras em implementar as boas práticas.

A inclusão de estudantes foi motivada pelo interesse em apreender a perspectiva daqueles para quem a SC é delineada e oferecida. A pesquisadora que conduziu as entrevistas e observações foi uma das autoras do estudo, doutora com experiência na prática e pesquisa em SC, e que estava inserida no contexto do campo de estudo em atividades de ensino da graduação. Os entrevistados foram esclarecidos quanto aos objetivos e procedimentos do estudo e quanto a gravação das entrevistas. Os que aceitaram participar assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e tiveram suas entrevistas previamente agendadas e realizadas em horário e local convenientes para o participante. As entrevistas foram precedidas de uma apresentação e explicação dos 11 critérios de boas práticas(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.) para delinear a SC centradas na seguinte proposição: “Lembre de uma simulação de que tenha participado e comente de forma livre os 11 critérios de boas práticas”.

Conforme o conteúdo no decorrer das entrevistas, questões foram feitas para compreender as condições para a implementação das diretrizes escolhidas, entre elas: Na sua opinião, por que a implementação das boas práticas relacionadas ao delineamento da SC poderia ser necessária ou vantajosa para o ensino de graduação em enfermagem? Quais seriam os fatores facilitadores para a implementação dos critérios de boas práticas no delineamento da SC? Por que tais fatores contribuiriam para a implementação das boas práticas para delinear atividades de SC? Quais seriam as barreiras para a implementação das boas práticas no delineamento da SC? Por que tais barreiras dificultariam a implementação das boas práticas de delineamento em SC? Quais seriam as barreiras modificáveis? Quais seriam as barreiras críticas?

As entrevistas foram conduzidas como uma conversa guiada, não rígida,(2222. Rubin HJ, Rubin IS. Qualitative Interviewing: the art of hearing data. 3rd ed. Los Angeles: SAGE Publications; 2012. 288 p.) de forma que os relatos permitiram a obtenção de dados sobre os temas advindos das boas práticas. Os dados da observação direta das atividades no laboratório foram registrados segundo necessidades, vantagens, facilitadores e barreiras em implementar os 11 critérios de boas práticas.(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.)

Onze atividades de SC da graduação foram observadas, dessas, dez de enfermagem clínica envolvendo realização do processo de enfermagem no gerenciamento de problema e raciocínio clínico e uma de saúde mental, envolvendo comunicação.

As entrevistas, que foram transcritas, e as observações diretas foram analisadas pela técnica de Análise de Conteúdo de Bardin (1977)(2323. Bardin L. Análise de conteúdo. 4ª ed. Lisboa: Edições 70; 2011.) a partir de quatro categorias analíticas pré-estabelecidas: necessidades, vantagens, facilitadores e barreiras em implementar as boas práticas no delineamento da SC para identificação das categorias empíricas, as quais foram discutidas segundo as duas primeiras etapas do Modelo de Difusão de Inovação de Rogers e posteriormente feita a triangulação entre os dados advindos das entrevistas e dos dados registrados em diário de campo. Nesse processo utilizou-se o software Web Qualitative Data Analysis (webQDA®)(2424. webQDA®. Software de análise de dados qualitativo. Versão 3.0. Portugal; webQDA®; 2017.) como plataforma de apoio para o gerenciamento e análise dos dados.

Três pesquisadores (um deles em estágio pós-doutoral na instituição, uma aluna de doutorado com experiência em SC vinculada em instituição diferente ao local do estudo e uma pesquisadora da própria instituição, aposentada, que não desenvolve atividades no ensino de graduação), realizaram independentemente as três etapas da análise de conteúdo, online e simultaneamente, no próprio software. Inicialmente, os dados oriundos de 18 entrevistas, que totalizaram 9 horas e 35 minutos de gravação e 11 atividades observadas foram transferidos para o software webQDA(2424. webQDA®. Software de análise de dados qualitativo. Versão 3.0. Portugal; webQDA®; 2017.) por meio da ferramenta “fontes internas” totalizando 29 fontes de dados. Os núcleos de sentido foram identificados e destacados por meio da funcionalidade de “codificação” em cores diferentes para cada pesquisador. Inseriu-se uma definição para cada categoria analítica pré-estabelecida e para as categorias empíricas identificadas para alinhamento das análises interpretativas entre os três pesquisadores. Os pesquisadores também utilizaram a funcionalidade “Diário de bordo” para relatar suas impressões e reflexões diante das análises. Tais ações facilitaram a verificação das interpretações independentes que foram posteriormente discutidas pelos três pesquisadores obtendo-se consenso nos casos de discordância. Para cada trecho em desacordo, os três pesquisadores discutiram e buscaram o consenso na identificação dos núcleos de sentido, categorizações e subcategorizações interpretativas.

Após leitura exaustiva e análise dos dados, 329 trechos de discursos e observações constituíram os núcleos de sentido do estudo, identificados em uma das quatro categorias analíticas pré-estabelecidas organizadas em códigos árvores. Após nova análise dos códigos árvores, 14 categorias empíricas foram identificadas em subcódigos árvores, representadas na figura 1.

Figura 1
Categorias analíticas e empíricas relacionadas à implementação das boas práticas

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob CAAE: 74766517.0.0000.5392 e identificado pelo número do parecer: 2.340.002.

Resultados

O corpo social da instituição envolvido com a SC compreende os funcionários: especialistas de laboratório designados para desenvolvimento de atividades de ensino práticas; docentes, os principais responsáveis pelo delineamento e desenvolvimento das atividades de SC; e servidores técnico-administrativos incumbidos pela organização, armazenamento, manutenção dos materiais/equipamentos e gerenciamento do espaço físico; os pesquisadores: pós-doutorandos, colaboradores no delineamento e condução da SC; os estudantes: pós-graduandos, também colaboradores no delineamento e condução da SC; e por fim, os estudantes de graduação, que são os consumidores finais da atividade.

O número total de profissionais envolvidos nas atividades de SC da presente instituição não é fixo, apresenta variação conforme as disciplinas são ministradas ao longo do ano e conforme distribuição do corpo docente / pesquisadores / pós-graduandos nas disciplinas que fazem uso dessa estratégia de ensino. No presente estudo, o conjunto de profissionais implicado no delineamento e condução da SC são denominados de “equipe de educadores”.

Os pesquisadores e os pós-graduandos realizam colaboração no delineamento e condução das atividades de SC, uma vez que em seus programas de atividades, a participação em práticas de ensino é parte das atribuições. Os estudantes de graduação em enfermagem realizam SC ao longo de todos os anos da grade curricular, porém as atividades concentram-se mais no segundo e terceiro anos da graduação. Todos os participantes do estudo atuam no mesmo contexto social em atividades relacionadas à SC, e estão caracterizados na tabela 1.

Tabela 1
Caracterização dos participantes do estudo

Nas entrevistas notou-se que parte dos entrevistados desconheciam as boas práticas no delineamento da SC e manifestaram apreciação positiva ao conhecê-las, exemplificado nas falas abaixo:

“Bom, vou ser sincera, eu não conhecia o texto que você me falou, eu também não conhecia essas boas práticas, gostei de ouvir essas boas práticas de você...” (Entrevistado 11)

Necessidades

Sistematização do delineamento da SC

Identificou-se que o uso das boas práticas no delineamento da SC fornece diretrizes em linguagem padronizada que pode facilitar o trabalho em equipe; pode auxiliar na realização do delineamento de forma sistematizada e garantir a inclusão de elementos relevantes para a efetividade de sua condução. Tais necessidades foram evidenciadas nas falas a seguir:

“Vantajoso é, e necessário também [implementar as boas práticas], eu acho que criar essa estrutura onde todos os laboratórios oferecidos sejam de baixa, média, ou eventualmente de alta fidelidade tenham uma construção semelhante, e que todo mundo saiba que isso se partilha e todos os processos que vão ser desenvolvidos no laboratório partem disso [das boas práticas], acho que podemos criar processos mais razoáveis, mais fortalecidos.” (Entrevistado 1)

“....ajuda a focar, a dimensionar e a implementar também a simulação de forma mais sistemática para que não fique uma coisa, “vou fazer o que eu acho...” entendeu?” (Entrevistado 3)

Acompanhamento do alcance dos objetivos de aprendizagem decorrentes da SC

Essa subcategoria trata da implementação das boas práticas como recurso para auxiliar o delineamento de avaliação do alcance dos objetivos de aprendizagem fruto da estratégia. A fala a seguir exemplifica tal achado:

“ [simulação sem avaliação] Perde o sentido do objetivo que a gente pretende com o aluno. Vou fazer a simulação, mas de repente a gente nem sabe se atingiu o objetivo.” (Entrevistada 3)

Aprimoramento da qualidade do delineamento da SC

O desenvolvimento da prática de ensino fundamentada em evidências, por meio do uso das boas práticas, vem sendo uma demanda do corpo social da instituição de ensino que almeja o aprimoramento de suas práticas, destacado nas falas a seguir:

“Então temos que ter a seriedade de dizer assim, ‘eu faço simulação seguindo esse e esse critério’, respaldado naquilo que tem sido estudado como melhores práticas, que tem sido já testado em outras instituições, e testar aqui se funciona, se não funciona publica e fala, “não, aqui funcionou de outro jeito”, e a gente faz de outra forma. Mas não tem um de debruçamento sobre a estratégia em si, sobre ensino, a gente não tem um grupo que estuda isso e que possa talvez assim melhorar na questão do design mesmo de cada aula.” (Entrevistado 5)

Nas boas práticas publicada recentemente recomenda-se que o debriefing seja realizado em um ambiente confortável para a efetividade da reflexão. Tal necessidade em implementar as boas práticas é notada na fala da estudante:

“Eu achei um pouco chato a formação da sala, sabe. Porque havia partes que não dava visão da professora. E você está atento, porém não está vendo” ...” eu notei que eu perdia o foco em alguns momentos porque eu estava mais ouvindo a voz do que olhando diretamente para a pessoa [professora]” (Entrevistado 15)

Vantagem

Qualidade do cuidado fornecido ao paciente em campo de estágio

Uma manifestação de vantagem na implementação das boas práticas foi o possível impacto positivo na qualidade do cuidado fornecido pelo estudante ao paciente em campo de estágio, pela fala:

“Eu acho que a principal vantagem é eu colher o fruto lá com o aluno, saindo mais bem preparado. A gente participa dos estágios com os alunos...então à beira leito com paciente, eles têm muita dificuldade. Eu acho que se a gente tivesse um ensino simulado dessa maneira, com esse cuidado no preparo da estratégia a gente não teria tanta dificuldade com aluno à beira leito com paciente, e mais ainda, o próprio paciente se beneficiaria...” (Entrevistado 5).

Facilitadores

Interesse institucional

Essa subcategoria refere-se ao interesse da instituição em realizar a simulação da forma mais efetiva, e as boas práticas vêm oferecer suporte para concretizar tal interesse. Exemplificado na fala a seguir:

“.... Porque, por exemplo, a gente vê que tem hoje a vontade de implementar, tanto é que nosso departamento está tendo um plano de metas, a simulação...”( Entrevistado 3)

Conhecimento clínico dos educadores

O reconhecimento da importância do objetivo para elaboração do cenário e a experiência clínica expressiva das educadoras são considerados facilitadores para implementar as boas práticas. A clareza quanto aos objetivos influenciará o êxito da atividade e a qualidade das informações clínicas impactará na fidelidade conceitual recomendada.

“Eu acho que facilita muito a gente ter a clareza do objetivo do cenário, e a experiência também para trazer os dados clínicos, para conseguir transportar isso para um ambiente de simulação.” (Entrevistado 5)

“....eu que tive uma experiência em emergência, a outra que teve em UTI, a outra que teve em centro cirúrgico, eu acho que isso é um facilitador, que daí a gente troca as experiências, não só pela parte teórica do que a gente está estudando, para pôr em prática aquilo e poder passar o mais fiel possível.” (Entrevistado 3)

Realização de cursos em simulação

As experiências em delinear a SC por meio de cursos em simulação são facilitadoras pois promovem a compreensão da necessidade em estruturar diversos aspectos, como o uso de ator e elaboração do cenário facilitando a implementação dos critérios no delineamento da SC, como citado abaixo:

“Então foi bem interessante o curso, porque como a gente discutiu muitos casos diferentes e muitos grupos rodando esses casos, vendo coisas que desandavam e tudo, a gente conseguiu contemplar um número grande de fatores que estavam mal previstos, mal colocados. Isso me ajudou muito na hora de definir o caso [real].” (Entrevistado 11)

Recursos materiais disponíveis

A disponibilidade de equipamentos e materiais é um facilitador para elaboração de cenários por oferecer uma gama de opções e contribuir para a fidelidade física, exemplificado nas falas abaixo:

“...a escola já captou muito recurso por programas da ...., então o parque de equipamento que a gente tem de manequim é uma loucura de grande. Não é pouca coisa que a escola já pôs no laboratório, já investiu para esse laboratório...” (Entrevistado 11)

Barreiras

Recursos humanos insuficientes

O número reduzido de docentes dificulta a implementação de práticas novas no processo de trabalho. Representado na fala a seguir:

“A gente tem uma perda consistente de docentes, provavelmente a unidade com maior perda da Universidade [Nome da Universidade] inteira sem reposição, e não tem perspectiva de reposição, então nós estamos sofrendo para conseguir manter funções mínimas, criar coisas novas ainda que não sejam novas, ainda que a gente tenha essas iniciativas, talvez a gente sofra um pouquinho...”(Entrevistado 1)

Ainda, o número insuficiente de profissionais dificulta a utilização de todos os critérios de boas práticas no delineamento da SC.

“...então recursos humanos para nós é muito difícil, porque poderíamos fazer simulações muito melhores se tivéssemos mais pessoas, mas como não temos, às vezes fica muito pesado para uma pessoa só pensar em tudo e a gente acaba fazendo o que consegue..”(Entrevistado 10)

Indisponibilidade de tempo para o trabalho em equipe

A equipe de ensino está envolvida em inúmeras atribuições dificultando a disponibilidade do profissional para o trabalho em conjunto, gerando uma barreira, pois nem sempre é possível contar com a disponibilidade necessária das pessoas e dos serviços para realização da atividade.

“...eu acho que as coisas começam a ficar difíceis quando a gente tem que compartilhar uma série de coisas com uma equipe que tá envolvida em mais um montão de outras coisas...” (Entrevistado 1)

Outra barreira é o tempo insuficiente para incluir no delineamento da SC o processo de validação das informações clínicas. Muitas vezes esse procedimento é realizado, mas não é incluído formalmente no delineamento ou documentado. A fala a seguir evidencia tal achado:

“Nem sempre a gente consegue validar o que a gente planejou e aqui a gente não consegue melhorar. Muitas vezes porque a gente não tem tempo mesmo.” (Entrevistado 3).

Necessidades emergenciais

Notou-se ainda, a dificuldade em implementar uma inovação, pois as necessidades emergenciais estão frequentemente exigindo atenção.

“...realizar uma simulação como a gente aprendeu, estamos há muito tempo pensando em fazer, até mesmo projeto, implementar, e muitas vezes sempre vai ficando de lado, porque a gente fica apagando incêndio...”. (Entrevistado 3)

É importante ressaltar que a indisponibilidade de tempo e as necessidades emergenciais são barreiras que podem ser consideradas facetas de “recurso humano insuficiente”. No presente estudo elas foram consideradas barreiras independentes pois acredita-se que mesmo com um número suficiente de educadores pode se ter um processo de trabalho com demandas emergenciais e indisponibilidade de tempo para implementação de inovações. No entanto, são necessários estudos para verificar como tais barreiras se associam.

Ausência de conhecimento metodológico sobre a estratégia

Este tópico constitui uma barreira para implementar as boas práticas, na medida em que o conhecimento sobre as teorias de aprendizagem que embasam a SC é essencial para dar sentido à adesão às boas práticas.

“...eu nunca fiz curso disso [simulação clínica], eu fui aprendendo junto com as pessoas que já faziam ou tinham algum conhecimento, entende? Então eu acho que isso também precisa melhorar.” (Entrevistado 14)

“...isso [teoria e estrutura da SC] não está muito claro para nós, seguimos caminhos mais intuitivos, com alguns conhecimentos teóricos, porém eu acho que muito superficiais.” (Entrevistado 14)

“... E capacitar cada vez mais. Eu acho que essas barreiras são conhecimento e recursos humanos mesmo, eu acho.” (Entrevistado 9)

Fragmentação de atividades

No contexto em estudo, as SC são realizadas para complementar o conteúdo de disciplinas. Uma disciplina é conduzida por diversos docentes que ministram aulas teóricas e quando há necessidade de conteúdo prático, especialistas de laboratório elaboram e conduzem as SC. E frequentemente, tais conteúdos não são elaborados/discutidos em conjunto. Tal fragmentação pode ser considerada barreira uma vez que o delineamento dos objetivos de aprendizagem estão atrelados aos conteúdos ministrados pelas diferentes estratégias. A fala a seguir demonstra tal afirmação:

“Não porque o que foi preparado poderia ser, porque é o mesmo tema, mas não é uma coisa elaborada em conjunto, dizendo que essa estratégia começa com um material didático, uma aula teórica e ela termina numa simulação clínica. ...Então existe uma desconexão às vezes entre essas três coisas, que é para acontecer. Então o que seria para ser um conjunto com o mesmo objetivo de aprendizagem, eles acabam sendo coisas fragmentadas” (Entrevistado 5).

Espaço físico inadequado e atores indisponíveis

Apesar dos recursos materiais serem considerados facilitadores, houve manifestações indicando a falta de espaço físico apropriado como barreira para a implementação das boas práticas no delineamento da SC.

A ausência de atores profissionais constitui-se barreira para implementar as boas práticas, pois a oferta de recursos para elaboração de cenários configura-se limitada, o que reduz possibilidades de ampliação de cenários e desmotivação de docentes. O uso de atores pode trazer qualidade ainda maior para a fidelidade do cenário. Representado na fala a seguir:

“...Eu acho que dificulta sim, várias coisas, eu acho que conseguir os atores é uma dificuldade...” (Entrevistado 11)

“...E a estrutura do laboratório também, para nós não é muito fácil, porque é isso. Simula mais um ambiente hospitalar, não é o contexto que a gente trabalha [contexto da saúde mental], então a gente tenta adaptar com o que temos.” (Entrevistado 13)

Discussão

O estudo confirmou a proposição de que os educadores consideram a implementação de boas práticas no delineamento da SC necessária para a elaboração e acompanhamento dos objetivos de aprendizagem. Os dados indicaram que parte dos participantes não conheciam as boas práticas em questão. Acredita-se que nem todos os envolvidos na prática da SC conseguem manter-se atualizados no assunto. Estratégias que permitam atualização contínua dos envolvidos no delineamento da SC precisam ser consideradas na gestão dos programas de ensino.

Para os estudantes, as boas práticas poderão contribuir para a realização do debriefing em ambiente aconchegante, o que poderá facilitar o processo de reflexão.

A necessidade das boas práticas para a sistematização, padronização da prática, delineamento de objetivos de aprendizagem claramente definidos e a inclusão de método de avaliação foram identificadas no presente estudo. Em relato de caso norte-americano(2525. Rutherford-Hemming T, Lioce L, Durham CF. Implementing the standards of best practice for simulation. Nurse Educator. 2015;40(2):96-100.) também considerou as diretrizes de boas práticas uma estrutura para fornecer terminologia padronizada. Ainda, especialistas em SC relatam que o delineamento dos objetivos de aprendizagem serão “ferramentas” norteadoras para o alcance dos resultados.(88. INACSL Standards Committee. Healthcare simulation standards of best practiceTM simulation design. Clin Simul Nurs. 2021;58:14-21.,99. INACSL Standards Committee. INACSL standards of best practice: SimulationSM Design da Simulação. Clin Simul Nurs. 2016;12(S):5-12.) Outros estudos(1313. INACSL Standards Committee. Healthcare Simulation Standards of Best PracticeTM Evaluation of Learning and Performance. Clin Simul Nurs. 2021;58:54-6.,2525. Rutherford-Hemming T, Lioce L, Durham CF. Implementing the standards of best practice for simulation. Nurse Educator. 2015;40(2):96-100.) também mencionaram a necessidade de inserir métodos de avaliações no delineamento da atividade. Atualmente há instrumento que mensura a efetividade da SC, como o Simulation Effectiveness Tool- Modified (SET-M).(2626. Bergamasco EC, Cruz DA. Simulation effectiveness tool modified (SET-M): adaptation and validation for Brazil. Rev Lat Am Enferm. 2021;29:3437.,2727. Leighton K, Ravert P, Mudra V, Macintosh C. Updating the simulation effectiveness tool: item modifications and reevaluation of psychometric properties. Nurs Educ Perspect. 2015;36(5):317-23.)

Em estudo que utilizou a técnica survey para investigar o conhecimento e a implementação das boas práticas em SC por 68 indivíduos provenientes de 30 estados diferentes dos Estados Unidos da América, dos quais 80% eram educadores acadêmicos e os demais técnicos em SC, indicou que a maioria dos sujeitos (85%) apresentava algum conhecimento sobre as boas práticas, 75% indicaram terem lido sobre elas e 58,2% revelaram adota-las como uma estrutura para o ensino de simulação em suas instituições.(2828. Rutherford-Hemming T, Lioce L. Utilization of the standards of best practice simulation: a descriptive study. J Nurs Educ Pract. 2016;6(3):1-5.) No entanto, 20% dos profissionais que relataram conhecimento consistente sobre as boas práticas não as utilizam em suas práticas. Segundo o autor, esse resultado é consequência de não estarem integradas nos manuais de políticas e procedimentos das instituições.(2828. Rutherford-Hemming T, Lioce L. Utilization of the standards of best practice simulation: a descriptive study. J Nurs Educ Pract. 2016;6(3):1-5.)

Em revisão da literatura, que identificou barreiras relacionadas à qualidade do ensino enfrentadas por professores acadêmicos,(2929. Carbone A, Drew S, Ross B, Ye J, Phelan L, Lindsay K, et al. A collegial quality development process for identifying and addressing barriers to improving teaching. Higher Educ Res Development. 2019;38(7):1356-70.) a falta de tempo foi tema recorrente e refere-se a demandas concorrentes de ensino e pesquisa, deixando pouco tempo para reflexão, inovação e interação. As alocações de carga de trabalho acadêmica limitam o tempo para desenvolver o uso eficaz de inovações institucionais, como estratégias de aprendizado aprimoradas pela tecnologia.(2929. Carbone A, Drew S, Ross B, Ye J, Phelan L, Lindsay K, et al. A collegial quality development process for identifying and addressing barriers to improving teaching. Higher Educ Res Development. 2019;38(7):1356-70.,3030. Gregory MS, Lodge JM. Academic workload: the silent barrier to the implementation of technology-enhanced learning strategies in higher education. Distance Educ. 2015;36(2):210-30.) No presente estudo, a indisponibilidade de tempo da equipe de educadores também foi identificada como uma barreira para a implementação das boas práticas, pois a aceitação e implementação de uma inovação na prática de trabalho pressupõe disponibilidade de tempo para considerar, refletir sobre a inovação e para desenvolver novos conhecimentos e habilidades necessários a sua incorporação.

Estudo sobre inovação em simulação reuniu quinze especialistas que enfatizaram que o objetivo da educação baseada em simulação não é introduzir a mais recente tecnologia em treinamento, mas desenvolver profissionais prontos para liderar a aprendizagem experiencial.(3131. Bryant K, Aebersold ML, Jeffries PR, Kardong-Edgren S. Innovations in simulation: nursing leaders’ exchange of best practices. Clin Simul Nurs. 2020;41:33-40.) A ausência de conhecimento metodológico principalmente das teorias que sustentam o aprendizado experiencial por meio da SC foi a barreira crítica evidenciada no presente estudo. Conhecer as teorias e métodos que sustentam a SC como estratégia de aprendizagem experiencial é fundamental para que os educadores elaborem argumentos e desenvolvam atitudes favoráveis à implementação das boas práticas em SC. Essa é uma barreira considerada modificável, assim como a barreira “fragmentação de atividades”. As demais barreiras, na opinião das autoras, foram consideradas não modificáveis a curto e médio prazo: recursos humanos insuficientes, indisponibilidade de tempo, necessidades emergenciais e espaço físico inadequado e atores indisponíveis.

A percepção de necessidades, vantagens, facilitadores e barreiras para a adoção de inovações é influenciada por fatores contextuais que podem não ser compartilhados por diferentes locais. Por essa razão, uma das limitações deste estudo é que a transferabilidade dos resultados para outras instituições deve ser cautelosa. Outra limitação a considerar é que o fato de o entrevistador / observador do estudo estar inserido na instituição pode ter influenciado a análise e interpretação dos dados. No entanto, buscou-se controlar essa limitação por meio da análise dos dados por mais dois pesquisadores independentes que acessaram apenas as transcrições das entrevistas que estavam desidentificadas.

Conclusão

Este estudo permitiu identificar que a implementação de boas práticas no delineamento da SC é percebida por docentes, técnicos e estudantes envolvidos em SC como necessária para sistematizar e aprimorar o delineamento da SC, bem como para acompanhar o alcance de objetivos de aprendizagem estabelecidos para as SC. As vantagens da adoção dessas boas práticas são percebidas como a possibilidade de promover a qualidade do cuidado oferecido aos pacientes pelos estudantes nos campos de estágio. Questões de ordem estrutural, como a escassez de recursos humanos e limitações de espaço físico; de ordem gerencial, como a fragmentação de atividades; e conhecimento metodológico insuficiente da estratégia foram indicados como barreiras à implementação das boas práticas no delineamento da SC. Por outro lado, o interesse institucional, o sólido conhecimento clínico dos educadores, os recursos materiais disponíveis e a realização de cursos sobre simulação pelos educadores foram percebidos como facilitadores à implementação das boas práticas em SC. A SC é estratégia de ensino promissora para a formação e educação permanente dos profissionais de saúde e a adoção de boas práticas para seu planejamento, operacionalização e avaliação requer o envolvimento de todos que, de alguma forma, participam da SC. Conhecer as concepções que esses participantes têm sobre as boas práticas fornece referências para as decisões no processo de implementação de boas práticas no uso da SC nos programas de ensino de enfermagem.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior – Brasil (CAPES) – código de financiamento 001.

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Edvane Birelo Lopes De Domenico (https://orcid.org/0000-0001-7455-1727) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    3 Fev 2021
  • Aceito
    25 Abr 2022
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