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Relação entre fragilidade física e síndromes geriátricas em idosos da assistência ambulatorial

Relación entre fragilidad física y síndromes geriátricos en adultos mayores en atención ambulatoria

Resumo

Objetivo

Analisar a correlação entre a condição de fragilidade física e as síndromes geriátricas instabilidade postural, incontinência urinária e insuficiência familiar em pessoas idosas da assistência ambulatorial de geriatria e gerontologia.

Métodos

Estudo quantitativo transversal, desenvolvido com uma amostra de 381 pessoas idosas com 60 anos ou mais. Investigaram-se a condição de fragilidade física e as síndromes da instabilidade postural, incontinência urinária e insuficiência familiar. Os instrumentos de avaliação empregados foram os marcadores do fenótipo de Fried, Escala de Equilíbrio de Berg, International Consultation on Incontinence Questionnaire – Short Form e Adaptation Partneship Growth Affection Resolve, respectivamente. Os dados foram analisados por estatística descritiva, bivariada (p<0,05) e de regressão pelo modelo ordinal.

Resultados

Dos participantes, 56 (14,7%) eram frágeis, 217 (57%) pré-frágeis, 108 (28,3%) não frágeis; 103 (27%) apresentavam incontinência urinária, 98 (25,7%) insuficiência familiar e 62 (16,3%) instabilidade postural. Quanto ao quantitativo de síndromes geriátricas, 183 (48%) pessoas idosas não apresentaram, 139 (36,5%) uma síndrome, 53 (14%) duas, e seis (1,5%) três. Houve associação significativa (p<0,001) com um grau de associação longe de 0 (Cramer’s V = 0,496) e “alta” correlação (Policórica = 0,7) entre fragilidade física e instabilidade postural.

Conclusão

Houve correlação significativa entre fragilidade física e instabilidade postural. Incontinência urinária e insuficiência familiar não se mostraram associadas à fragilidade física, embora a maioria era frágil e pré-frágil.

Idoso fragilizado; Idoso; Síndrome; Equilíbrio postural; Relações familiares; Incontinência urinária; Assistência ambulatorial

Resumen

Objetivo

Analizar la correlación entre la condición de fragilidad física y los síndromes geriátricos: inestabilidad postural, incontinencia urinaria e insuficiencia familiar en adultos mayores de la atención ambulatoria en geriatría y gerontología.

Métodos

Estudio cuantitativo transversal, desarrollado con una muestra de 381 adultos mayores de 60 años o más. Se investigó la condición de fragilidad física y los síndromes de la inestabilidad postural, incontinencia urinaria e insuficiencia familiar. Los instrumentos utilizados para la evaluación fueron los marcadores de fenotipo de Fried, Escala de Equilibrio de Berg, International Consultation on Incontinence Questionnaire – Short Form y Adaptation Partneship Growth Affection Resolve, respectivamente. Los datos se analizaron por estadística descriptiva, bivariante (p<0,05) y de regresión por el modelo ordinal.

Resultados

De los participantes, 56 (14,7 %) eran frágiles, 217 (57 %) pre frágiles, 108 (28,3 %) no frágiles; 103 (27 %) presentaban incontinencia urinaria, 98 (25,7 %) insuficiencia familiar y 62 (16,3 %) inestabilidad postural. Respecto a la cantidad de síndromes geriátricos, 183 (48 %) adultos mayores no presentaron ninguno, 139 (36,5 %) un síndrome, 53 (14 %) dos síndromes y seis (1,5 %) tres síndromes. Hubo asociación significativa (p<0,001) con grado de asociación distante de 0 (Cramer’s V = 0,496) y “alta” correlación (Policórica = 0,7) entre fragilidad física e inestabilidad postural.

Conclusión

Hubo correlación significativa entre fragilidad física e inestabilidad postural. Incontinencia urinaria e insuficiencia familiar no demostraron estar asociadas a la fragilidad física, aunque la mayoría era frágil y pre frágil.

Anciano frágil; Anciano; Síndrome; Equilíbrio postural; Relaciones familiares; Incontinencia urinária; Atención ambulatoria

Abstract

Objective

To analyze the correlation between the condition of physical frailty and the geriatric syndromes, postural instability, urinary incontinence, and family insufficiency in older adults in geriatrics and gerontology outpatient care.

Methods

Quantitative cross-sectional study developed with a sample of 381 older adults 60 years or more. The physical frailty condition and the syndromes of postural instability, urinary incontinence, and family insufficiency were investigated. The evaluation instruments used were Fried’s phenotype markers, Berg Balance Scale, International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form and Adaptability, Partnership, Growth, Affection, Resolve, respectively. Data were analyzed by descriptive, bivariate (p<0.05), and regression statistics by ordinal model.

Results

Among the participants, 56 (14.7%) were frail, 217 (57%) pre-frail, 108 (28.3%) non-frail; 103 (27%) had urinary incontinence, 98 (25.7%) family insufficiency and 62 (16.3%) postural instability. As for the number of geriatric syndromes, 183 (48%) older adults did not present, 139 (36.5%) presented one syndrome, 53 (14%) two, and six (1.5%) three. There was a significant association (p<0.001) with a degree of association far from 0 (Cramer’s V = 0.496) and “high” correlation (Polychoric correlation = 0.7) between physical frailty and postural instability.

Conclusion

There was a significant correlation between physical frailty and postural instability. Urinary incontinence and family insufficiency were not associated with physical frailty, although most were frail and pre-frail.

Frail elderly; Aged; Syndrome; Postural balance; Family relations; Urinary incontinence; Ambulatory care

Introdução

O envelhecimento humano é influenciado por diferentes fatores e experiências no curso de vida e manifesta alterações na dimensão física, mental e psicossocial, que podem levar a um envelhecimento com diminuição de autonomia e independência, no qual está incluído as síndromes da fragilidade física e as geriátricas.(11. Souza DS, Berlese DB, Cunha GL, Cabral SM, Santos GA. Análise da relação do suporte social e da síndrome de fragilidade em idosos. Psic Saúde Doenças. 2017;18(2):420-33.

2. Lee L, Patel T, Hillier LM, Maulkhan N, Slonim K, Costa A. Identifying frailty in primary care: A systematic review. Geriatr Gerontol Int. 2017;17(10):1358-77. Review.
-33. Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Construindo a saúde no curso de vida: conceitos, implicações e aplicação em saúde pública. Washington (DC): OPAS; 2021 [citado 2019 Mar 2]. Disponível em: https://iris.paho.org/bitstream/handle/10665.2/53571/9789275723029_por.pdf?sequence=1&isAllowed=y
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)

Um consenso entre especialistas no International Conference of Frailty and Sarcopenia Research (ICFSR) definiu que a fragilidade se refere a condição clínica de vulnerabilidade, acrescido por estressores internos/externos que podem levar ao declínio funcional ou fazer a transição de condições, ou seja, ser fisicamente ativo pode reverter o desenvolvimento da fragilidade ou pré fragilidade.(44. Dent E, Morley JE, Cruz-Jentoft AJ, Woodhouse L, Rodríguez-Mañas L, Fried LP, et al. Physical Frailty: ICFSR International Clinical Practice Guidelines for Identification and Management. J Nutr Health Aging. 2019;23(9):771-87.)

Um dos meios para identificar essa condição clínica é por intermédio de cinco marcadores biológicos, que constituem o fenótipo da fragilidade, a saber: redução da velocidade da marcha, diminuição da força de preensão manual, perda de peso não intencional, baixo gasto calórico e autorrelato de fadiga/exaustão. A pessoa idosa que apresenta três ou mais marcadores é considerado frágil, um ou dois é pré-frágil e nenhum dos marcadores é identificado como não frágil.(55. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, Seeman T, Tracy R, Kop WJ, Burke G, McBurnie MA; Cardiovascular Health Study Collaborative Research Group. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2001;56(3):M146-56.)

Por sua vez, as síndromes geriátricas são condições clínicas bastante comuns em pessoas idosas que não se enquadram em categorias específicas de doenças e são altamente prevalentes, multifatoriais e associadas a morbidade substancial. A presença dessas condições contribui para o aumento da carga de cuidados, maior incapacidade e pior prognóstico.(66. Ates Bulut E, Soysal P, Isik AT. Frequency and coincidence of geriatric syndromes according to age groups: single-center experience in Turkey between 2013 and 2017. Clin Interv Aging. 2018;13:1899-905.)

As síndromes geriátricas, também denominadas como Grandes Síndromes Geriátricas, abrangem a instabilidade postural, incontinência urinária/esfincteriana, insuficiência familiar, imobilidade, incapacidade cognitiva, iatrogenia e incapacidade comunicativa.(77. Moraes EN, Marino MC, Santos RR. Principais Síndromes Geriátricas. Rev Med Minas Gerais. 2010;20(1):54-66. Review.) O foco do presente estudo está direcionado para três síndromes, a da instabilidade postural, incontinência urinária e insuficiência familiar. Essas síndromes foram selecionadas com base no projeto matriz intitulado “Fragilidade Física e Síndromes Geriátricas em Idosos” e nos resultados dos estudos que integram o projeto.

A instabilidade postural é definida como a incapacidade de integrar as informações sensoriais e determinar as oscilações do corpo na posição ereta durante a manutenção do equilíbrio.(88. Horak FB, Henry SM, Shumway-Cook A. Postural perturbations: new insights for treatment of balance disorders. Phys Ther. 1997;77(5):517-33. Review.) A incontinência urinária é estabelecida como “queixa de qualquer perda involuntária de urina” e não deve ser interpretada como parte natural do envelhecimento.(99. Abrams P, Cardozo L, Fall M, Griffiths D, Rosier P, Ulmsten U, Van Kerrebroeck P, Victor A, Wein A; Standardisation Sub-Committee of the International Continence Society. The standardisation of terminology in lower urinary tract function: report from the standardisation sub-committee of the International Continence Society. Urology. 2003;61(1):37-49. Review.) A insuficiência familiar é um processo psicossocial de construção complexa, fundado no vínculo familiar prejudicado e baixo apoio social. Apresenta como padrão a perda da capacidade da família em promover os cuidados, oferecer apoio, seja pela ausência dos familiares ou por falta de condições.(1010. de Souza A, Pelegrini TS, Ribeiro JH, Pereira DS, Mendes MA. Concept of family insufficiency in the aged: critical literature analysis. Rev Bras Enferm. 2015;68(6):1176-85. Review.)

Estudos nacionais e internacionais apontam que é significativa a prevalência das síndromes geriátricas em idosos. O estudo desenvolvido na China, examinou a prevalência de síndromes geriátricas em 2.618 idosos. Da amostra, 75,3% apresentaram alguma síndrome geriátrica e a fragilidade esteve presente em 14,1% dos idosos.(1111. Cheung JT, Yu R, Wu Z, Wong SY, Woo J. Geriatric syndromes, multimorbidity, and disability overlap and increase healthcare use among older Chinese. BMC Geriatr. 2018;18(1):147.) No Brasil, foram analisados 813 prontuários para avaliar o perfil de fragilidade da população, das pessoas idosas consideradas frágeis, 65,5% apresentam associação com instabilidade postural, 60,5 incontinências urinária e 21,2% insuficiência familiar.(1212. Cintra MT, Guimarães FF, Souza CT, Luz FS, Murta ED, Bicalho MA, et al. Fragilidade em idosos atendidos em um ambulatório de geriatria medida pela escala visual de fragilidade. Geriatr Gerontol Aging. 2019;13:17-23.) Os resultados evidenciam a necessidade da identificação precoce das síndromes, implementação de ações preventivas e intervenções dirigidas aos idosos.(1111. Cheung JT, Yu R, Wu Z, Wong SY, Woo J. Geriatric syndromes, multimorbidity, and disability overlap and increase healthcare use among older Chinese. BMC Geriatr. 2018;18(1):147., 1212. Cintra MT, Guimarães FF, Souza CT, Luz FS, Murta ED, Bicalho MA, et al. Fragilidade em idosos atendidos em um ambulatório de geriatria medida pela escala visual de fragilidade. Geriatr Gerontol Aging. 2019;13:17-23.)

Estabelecer as relações entre fragilidade física e as síndromes geriátricas fornece direção e sentido aos profissionais de enfermagem gerontológica para as intervenções precoces, particularmente, em pessoas idosas consideradas robustas, assim como, para intervir e acompanhar àquelas que se apresentem frágeis e pré-frágeis. O intento é prevenir o declínio funcional das pessoas idosas, e desse modo manter a autonomia e a independência deles.

Diante do exposto, o estudo apresenta como objetivo: analisar a correlação entre a condição de fragilidade física e as síndromes geriátricas instabilidade postural, incontinência urinária e insuficiência familiar em pessoas idosas da assistência ambulatorial de geriatria e gerontologia.

Métodos

Trata-se de um estudo de corte transversal correlacional realizado em um Ambulatório de Geriatria e Gerontologia (AGG) do município de São José dos Pinhais/PR, região metropolitana de Curitiba/PR (Brasil). O AGG presta atendimento integral a população idosa com 60 anos ou mais, usuária do Sistema Único de Saúde (SUS).

O recrutamento das pessoas idosas ocorreu aleatoriamente durante a espera deles para a consulta médica no AGG. Foram fixados cartazes na entrada do AGG, com o intento de divulgar a pesquisa e estimular as pessoas idosas à participação. Enquanto esperavam a consulta foram convidados, individualmente, e receberam informações prévias sobre a pesquisa, os testes, os objetivos e os aspectos éticos relacionados ao estudo. As pessoas idosas que aceitaram participar foram encaminhadas a uma sala privada do ambulatório e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

A coleta de dados ocorreu entre outubro de 2016 e março de 2017. Participaram do estudo pessoas idosas com 60 anos ou mais, ambos os sexos, provenientes da Atenção Primária à Saúde. Quatro pesquisadores previamente treinados realizaram a coleta. As entrevistas e testes tiveram uma duração de aproximadamente 40 minutos.

A amostra foi definida por cálculo amostral a partir da população de pessoas idosas de São José dos Pinhais/PR (36.648), no ano de 2015.(1313. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). População estimada 2015. Rio de Janeiro: IBGE; 2015 [citado 2016 Abr 8]. Disponível em: http://ftp.ibge.gov.br/Estimativas_de_Populacao/Estimativas_2015/estimativa_2015_TCU_20160211.pdf
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)Considerou-se o índice de confiança de 95% (IC:95%), nível de significância de 5% (α=0,05), erro amostral de 5 pontos percentuais e acrescido 8% por possíveis perdas ou recusas. Inicialmente, a amostra foi constituída por 411 pessoas idosas. Após a aplicação dos critérios, houve a exclusão de 29 participantes e uma recusa. Desse modo, a amostra final foi constituída por 381 pessoas idosas.

Estabeleceram-se como critérios de inclusão: estar com 60 anos ou mais; comparecer à consulta programada no AGG; apresentar capacidade cognitiva, conforme resultado da aplicação do Mini Exame do Estado Mental – MEEM.(1414. Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. “Mini-mental state”. A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr Res. 1975;12(3):189-98.) Delimitaram-se os seguintes critérios de exclusão das pessoas idosas: ser fisicamente incapaz de realizar os testes propostos (cadeirantes, amputação de membros superiores e inferiores); estar em tratamento para distúrbios do equilíbrio, em uso de antivertiginosos.

O Mini Exame do Estado Mental - MEEM foi empregado para o rastreio da cognição das pessoas idosas.(1414. Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. “Mini-mental state”. A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr Res. 1975;12(3):189-98.) A pontuação total do MEEM vai de zero a trinta, e foram adotados os pontos de corte de acordo com a escolaridade: 13 pontos para analfabetos, 18 pontos para aqueles com escolaridade baixa e média (um a oito anos incompletos de estudo), e 26 pontos para escolaridade alta (oito ou mais anos de estudo).(1515. Bertolucci PH, Brucki SM, Campacci SR, Juliano Y. O Mini-Exame do Estado Mental em uma população geral. Impacto da escolaridade. Arq Neuropsiquiatr. 1994;52(1):1-7.)

Para a coleta de dados foram utilizados: questionário sociodemográfico, os marcadores do fenótipo da fragilidade física, a Escala de Equilíbrio de Berg, o International Consultation on Incontinence Questionnaire – Short Form e o Adaptation Partneship Growth Affection Resolve (APGAR de família). O questionário sociodemográfico foi constituído pelas variáveis de interesse como sexo, idade, estado civil, escolaridade, raça e rendimento familiar mensal. O instrumento foi elaborado e adaptado segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE.(1616. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo 2000: características da população e dos domicílios: resultados do Universo. Rio de Janeiro: IBGE; 2020. [citado 2016 Fev 5]. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=785
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)

A avaliação da fragilidade física foi realizada por meio dos marcadores do fenótipo de fragilidade (autorrelato de fadiga/exaustão, perda de peso não intencional, redução do nível de atividade física/e ou baixo gasto calórico, diminuição da velocidade da marcha e da força de preensão manual). As pessoas idosas frágeis são aquelas que apresentam três ou mais marcadores, pré-frágeis com um ou dois ou não frágeis na ausência de marcadores.(55. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, Seeman T, Tracy R, Kop WJ, Burke G, McBurnie MA; Cardiovascular Health Study Collaborative Research Group. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2001;56(3):M146-56.)

A força de preensão manual foi mensurada em quilograma/força (Kgf) por meio de dinamômetro hidráulico da marca Jamar®, o idoso realizou três preensões, intercaladas por um minuto; em seguida, registraram-se os três valores. Para cada pessoa idosa, os valores foram ajustados conforme sexo e Índice de Massa Corpórea (IMC). Os valores que incluíram o quintil mais baixo foram considerados marcadores de fragilidade.(55. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, Seeman T, Tracy R, Kop WJ, Burke G, McBurnie MA; Cardiovascular Health Study Collaborative Research Group. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2001;56(3):M146-56.) Para verificar a velocidade da marcha (m/s), o idoso foi orientado a caminhar um percurso de 4,6 metros, de forma habitual. Realizou-se os ajustes de acordo com o sexo e a altura, os valores no menor quintil foram marcadores de fragilidade.(55. Fried LP, Tangen CM, Walston J, Newman AB, Hirsch C, Gottdiener J, Seeman T, Tracy R, Kop WJ, Burke G, McBurnie MA; Cardiovascular Health Study Collaborative Research Group. Frailty in older adults: evidence for a phenotype. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2001;56(3):M146-56.)

O equilíbrio postural foi avaliado pela Escala de Equilíbrio de Berg – EEB,(1717. Berg KO, Maki BE, Williams JI, Holliday PJ, Wood-Dauphinee SL. Clinical and laboratory measures of postural balance in an elderly population. Arch Phys Med Rehabil. 1992;73(11):1073-80.)traduzida e validada no Brasil.(1818. Miyamoto ST, Lombardi Junior I, Berg KO, Ramos LR, Natour J. Brazilian version of the Berg balance scale. Braz J Med Biol Res. 2004;37(9):1411-21.) A EEB tem como objetivo identificar as capacidades e limitações para manutenção do equilíbrio durante as atividades comuns à vida diária. Os escores <45 indicam alterações no equilíbrio e maior risco de quedas.(1717. Berg KO, Maki BE, Williams JI, Holliday PJ, Wood-Dauphinee SL. Clinical and laboratory measures of postural balance in an elderly population. Arch Phys Med Rehabil. 1992;73(11):1073-80.)

Por sua vez, a incontinência urinária foi avaliada por meio do questionário International Consultation on Incontinence Questionnaire -58416 Short Form - ICIQ-SF, traduzido e validado no Brasil.(1919. Tamanini JT, Dambros M, D’Ancona CA, Palma PC, Rodrigues Netto Jr N. Validation of the “International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form” (ICIQ-SF) for Portuguese. Rev Saude Publica. 2004;38(3)1-6.) O questionário é simples e breve, composto por quatro perguntas, as quais avaliam o impacto da incontinência urinária na qualidade de vida e qualifica a perda urinária de pessoas de ambos os sexos.(1919. Tamanini JT, Dambros M, D’Ancona CA, Palma PC, Rodrigues Netto Jr N. Validation of the “International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form” (ICIQ-SF) for Portuguese. Rev Saude Publica. 2004;38(3)1-6.)

Para a avaliação da funcionalidade familiar foi aplicado o questionário Adaptation Partneship Growth Affection Resolve (APGAR de Família),(2020. Smilkstein G. The family APGAR: a proposal for a family function test and its use by physicians. J Fam Pract. 1978;6(6):1231-9.)traduzido e validado para o Brasil,(2121. Duarte YA, Domingues MA. Família, rede de suporte social e idosos: instrumentos de avaliação. São Paulo: Blucher; 2020. 244 p.) com a finalidade de avaliar a síndrome da insuficiência familiar, que classifica as pessoas idosas com: boa funcionalidade familiar, moderada ou elevada disfunção familiar.(2020. Smilkstein G. The family APGAR: a proposal for a family function test and its use by physicians. J Fam Pract. 1978;6(6):1231-9.,2121. Duarte YA, Domingues MA. Família, rede de suporte social e idosos: instrumentos de avaliação. São Paulo: Blucher; 2020. 244 p.)

O instrumento avalia a funcionalidade familiar em cinco domínios: adaptação, companheirismo, desenvolvimento, afetividade e resolução.(1818. Miyamoto ST, Lombardi Junior I, Berg KO, Ramos LR, Natour J. Brazilian version of the Berg balance scale. Braz J Med Biol Res. 2004;37(9):1411-21.) Para cada pergunta a resposta é descrita em uma escala baseada no padrão da Escala de Likert: raramente (0), às vezes (1) e quase sempre (2) e realiza-se a soma dos resultados. Interpreta-se como boa funcionalidade familiar os escores entre 7 a 10 pontos, moderada entre 5 a 6 pontos e elevada escores entre 0 e 4 pontos.(2020. Smilkstein G. The family APGAR: a proposal for a family function test and its use by physicians. J Fam Pract. 1978;6(6):1231-9.)

Os dados foram organizados no programa computacional Microsoft Excel® 2007. Analisaram-se os dados mediante estatística descritiva, com distribuição de frequência absoluta e relativa das variáveis categóricas nominais e ordinais, de associação bivariada entre variáveis categóricas nominais (teste de Qui-quadrado) e entre variável categórica nominal e ordinal (teste de Kruskal-Wallis), com nível de significância estatística considerado de p≤0,05. Para a análise da força da associação foi empregado o cálculo do coeficiente de contingência de Cramer’s V e Correlação Policórica entre a fragilidade física e as síndromes geriátricas. A interpretação do valor do coeficiente de Cramer’s V e Correlação Policórica varia de 0 a 1, os valores mais altos indicam maior associação e relação mais forte.(2222. Cramér H. Mathematical methods of statistics. 9th ed. New Jersey: Princeton University Press; 1946. 575 p.) O software utilizado foi o R CORE TEAM.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná, sob parecer CEP/SD 1.755.394 e CAAE: 58954016.1.0000.0102.

Resultados

Dos 381participantes houve predomínio de pessoas idosas do sexo masculino (n=193; 50,7%), na faixa etária entre 60 e 100 anos, com maior percentual (n=188; 49,3%) de pessoas idosas entre 60 a 69 anos, casados (n=251; 65,9%), da raça branca (n=310; 81,4%), com renda familiar de até dois salários mínimos (n=328; 86,1%), e com escolaridade de 1 a 4 anos de estudos (n=206; 54,1%).

Quanto à fragilidade física, 56 (14,7%) pessoas idosas foram classificadas como frágeis, 217 (57%) pré-frágeis e 108 (28,3%) não frágeis. Em relação às síndromes geriátricas avaliadas, 103 (27%) apresentaram incontinência urinária, 98 (25,7%) insuficiência familiar, 62 (16,3%) instabilidade postural.

Na tabela 1 observa-se a distribuição da frequência relacionada à fragilidade física e às síndromes geriátricas. Das três síndromes geriátricas avaliadas, houve associação significativa entre fragilidade física e instabilidade postural (p < 0,001), a maioria das pessoas idosas com instabilidade postural foi considerado frágil (58,9%). Verificou-se correlação mediana entre fragilidade física e a instabilidade postural de acordo com o coeficiente de V-Crame’s (Cramer’s V = 0,496), com um grau de associação longe de 0, e “alta” correlação (Policórica = 0,701) da instabilidade postural com a fragilidade física.

Tabela 1
Distribuição da frequência, associação e correlação entre as síndromes geriátricas e a condição de fragilidade física das pessoas idosas

Nota-se que não houve associação significativa entre insuficiência familiar e fragilidade (p=0,129). Todavia, verifica-se que a maioria das pessoas idosas com insuficiência familiar se encontrava nas condições de fragilidade (28,6%) e pré-fragilidade (28,6%). Quanto às variáveis incontinência urinária e fragilidade também não houve associação significativa (p=0,336), porém as pessoas idosas que apresentavam incontinência urinária foram classificadas como pré-frágeis (30,0%). Observa-se na tabela 2 a distribuição de frequência, associação e correlação entre o número de síndromes geriátricas e a condição de fragilidade física das pessoas idosas.

Tabela 2
Distribuição da frequência, associação e correlação entre o número de síndromes geriátricas e a condição de fragilidade física das pessoas idosas

Das 381 pessoas idosas, 183 (48%) não apresentaram qualquer das três síndromes geriátricas, 139 (36,5%) uma, 53 (14%) duas, e seis (1,5%) dos participantes apresentaram as três síndromes geriátricas simultâneas. Houve associação significativa entre o número de síndromes geriátricas e a condição de fragilidade física, (p= 0,001), embora se constate baixa força de correlação entre o número de síndromes geriátricas e a condição de fragilidade física (Cramer’s V=0,20). A condição de fragilidade que obteve maior distribuição de síndromes (duas) foi a das pessoas idosas pré-frágeis (62,3%), seguida pelas frágeis, 33,3% delas com três síndromes, 26,4% duas síndromes geriátricas.

Discussão

Das síndromes avaliadas a instabilidade postural, incontinência urinária e insuficiência familiar, houve associação significativa (p<0,001) com um grau de associação (Cramer’s V = 0,496) e “alta” correlação (Policórica = 0,7) entre fragilidade física e instabilidade postural. A incontinência urinária e insuficiência familiar por sua vez não apresentaram associação e correlação com a fragilidade.

A condição de fragilidade física em pessoas idosas apresenta grande variabilidade, com dependência para a população avaliada e os contextos em que as investigações foram realizadas. Estudo longitudinal que utilizou a base de dados do Saúde, Bem-Estar e Envelhecimento (SABE) avaliou 1.399 pessoas idosas da comunidade, dos quais 8,5% eram frágeis, 41,5% pré-frágeis, 50% não frágeis.(2323. Duarte YA, Nunes DP, Andrade FB, Corona LP, Brito RP, Santos JL, et al. Frailty in older adults in the city of São Paulo: prevalence and associated factors. Rev Bras Epidemiol. 2018;21(Suppl 2):e180021.)Esses percentuais diferem do presente estudo em virtude das distintas características das amostras, o estudo SABE foi desenvolvido com pessoas idosas da comunidade e este estudo em contexto ambulatorial, neste são maiores as possibilidades de se encontrarem pessoas idosas frágeis (14,7% frágeis, 57% pré-frágeis, 28,3% não frágeis).

Essa variabilidade de prevalência da fragilidade pode também estar relacionada ao curso de vida dos indivíduos, condições clínicas, questões sociodemográficas e ambientais. Quando comparadas as prevalências com dados de outros países, leva-se em conta as diferenças genéticas e o nível de desenvolvimento humano, visto que os países subdesenvolvidos apresentam maior percentual de pessoas idosas com fragilidade física.(1010. de Souza A, Pelegrini TS, Ribeiro JH, Pereira DS, Mendes MA. Concept of family insufficiency in the aged: critical literature analysis. Rev Bras Enferm. 2015;68(6):1176-85. Review.,2424. Siriwardhana DD, Hardoon S, Rait G, Weerasinghe MC, Walters KR. Prevalence of frailty and prefrailty among community-dwelling older adults in low-income and middle-income countries: a systematic review and meta-analysis. BMJ Open. 2018;8(3):e018195.)

Em Londres, uma revisão sistemática com metanálise objetivou analisar as pesquisas realizadas sobre a prevalência de fragilidade e pré-fragilidade entre pessoas idosas da comunidade em países de baixa e média renda e estimar a prevalência conjunta de fragilidade e pré-fragilidade. Foram selecionadas 7.057 citações, compuseram o corpus da revisão 56 estudos, a fragilidade variou de 3,9% (China) a 51,4% (Cuba) e a prevalência de pré-fragilidade variou de 13,4% (Tanzânia) a 71,6% (Brasil).(2424. Siriwardhana DD, Hardoon S, Rait G, Weerasinghe MC, Walters KR. Prevalence of frailty and prefrailty among community-dwelling older adults in low-income and middle-income countries: a systematic review and meta-analysis. BMJ Open. 2018;8(3):e018195.)

No entanto, apesar das diferenças entre os contextos, cenários e países em que as pesquisas foram realizadas, a condição de pré-fragilidade mostra-se prevalente nos estudos citados, o que reforça a importância e necessidade de identifica-la entre as pessoas idosas.

Neste estudo as síndromes analisadas atingiram percentuais significativos, 27% das pessoas idosas apresentaram incontinência urinária, 25,7% instabilidade postural e 16,3% insuficiência familiar. Os percentuais são ainda mais significativos quando se consideram os desfechos negativos dessas síndromes, como os relacionados aos aspectos psicossociais das pessoas idosas.(2525. Leirós-Rodríguez R, Romo-Pérez V, García-Soidán JL. Prevalence of urinary incontinence and its relation with sedentarism in Spain. Actas Urol Esp. 2017;41(10):624-30.,2626. Closs VE, Ziegelmann PK, Gomes I, Schwanke CH. Frailty and geriatric syndromes in elderly assited in primary health care. Acta Sci Heal Sci. 2016;38(1):9-18.)

Estudo nacional desenvolvido em Belo Horizonte (MG) avaliou 813 prontuários de pessoas idosas atendidas no contexto ambulatorial, e as síndromes mostraram valores superiores ao presente estudo. A instabilidade postural atingiu mais da metade das pessoas idosas (55,1%), a incontinência urinária com percentual ainda mais expressivo (57%), e a insuficiência familiar foi observada em 26,7% das pessoas idosas.(1212. Cintra MT, Guimarães FF, Souza CT, Luz FS, Murta ED, Bicalho MA, et al. Fragilidade em idosos atendidos em um ambulatório de geriatria medida pela escala visual de fragilidade. Geriatr Gerontol Aging. 2019;13:17-23.)

Em Pontevedra (ES), estudo de base populacional foi desenvolvido com uma amostra constituída por 8.146 pessoas idosas, com o objetivo de determinar a prevalência de incontinência urinária (IU) na população idosa de ambos os sexos e identificar uma possível relação entre hábitos de atividade física. Detectou-se a presença dessa síndrome em 15% das mulheres e 11,6% dos homens. A IU foi relacionada a aspectos comportamentais, como a atividade física. Em pessoas idosas que praticavam atividade física observou-se uma redução na prevalência da IU.(2525. Leirós-Rodríguez R, Romo-Pérez V, García-Soidán JL. Prevalence of urinary incontinence and its relation with sedentarism in Spain. Actas Urol Esp. 2017;41(10):624-30.)

Quanto à instabilidade postural, nos Estados Unidos da América a pesquisa efetuada com o banco de dados do Health Interview Survey em Ann Arbor/Michigan analisou a prevalência e os tipos de tontura na população americana. Entre os 74.236 participantes, 33,4 milhões de indivíduos relataram problemas com tontura ou desequilíbrio no último ano.(2727. Kerber KA, Callaghan BC, Telian SA, Meurer WJ, Skolarus LE, Carender W, et al. Dizziness symptom type prevalence and overlap: a US Nationally Representative Survey. Am J Med. 2017;130(12):1465.e1-e9.) Para alguns autores o equilíbrio postural também está associado aos músculos antigravitacionais, especialmente aos dos membros inferiores. Estes músculos sofrem declínios acelerados quando estão inativos durante o lazer e a atividade física doméstica, ocasionando o risco de queda, tendo como resultado para a pessoa idosa a perda da independência, uma vez que em idosos frágeis, o menor distúrbio postural pode causar uma queda.(2828. Paillard T. Methods and strategies for reconditioning motor output and postural balance in frail older subjects prone to falls. Front Physiol. 2021;12:700723. Review.)

Quanto à disfunção familiar, o estudo conduzido pela Rede de Vigilância à Saúde da pessoa idosa (REVISI) em Goiânia (GO) analisou a prevalência e os fatores associados à disfuncionalidade familiar (APGAR Familiar), bem como a capacidade funcional da comunidade idosa. Foram investigadas 934 pessoas idosas, e os resultados indicaram percentual semelhante ao encontrado no presente estudo, 18,1% apresentaram disfunção familiar.(2929. Vera I, Lucchese R, Nakatani AY, Sadoyama G, Bachion MM, Vila VS. Fatores associados à disfuncionalidade familiar em idosos não institucionalizados. Texto Contexto Enferm. 2015;24(2):494-504.)

No caso da insuficiência familiar, apesar de não apresentar associação com a fragilidade (p=0,129), verificou-se que a disfuncionalidade familiar está mais presente em pessoas idosas frágeis e pré-frágeis (28,6%), ou seja, o grau de fragilidade física entre as pessoas idosas corresponde ao nível de disfunção familiar. Esse resultado reforça a necessidade de novos estudos que possam avaliar a associação entre causa e efeito, os quais forneçam evidências sobre a causalidade. Essa síndrome foi relatada recentemente, de modo que ainda são necessários ensaios com testagem para validar instrumentos próprios, que forneçam acurácia no reconhecimento e avaliação da disfunção familiar nas pessoas idosas.

Das três síndromes avaliadas, a instabilidade postural mostrou associação estatística com a fragilidade física (p < 0,001), com um grau de correlação longe de 0 (Cramer’s V = 0,496), o que significa moderada relação.(2222. Cramér H. Mathematical methods of statistics. 9th ed. New Jersey: Princeton University Press; 1946. 575 p.)

Os resultados apresentados corroboram à necessidade de avaliar a fragilidade física na prática clínica de enfermagem gerontológica, uma vez que se apresenta como um fator de risco importante para o desenvolvimento da instabilidade postural. Assim como, a incontinência urinária e insuficiência familiar que não apresentaram associação, embora foram observados percentuais altos que exigem acompanhamento.

Em Porto Alegre (RS), o estudo com 521 pessoas idosas objetivou associar a condição de fragilidade às síndromes geriátricas. Os resultados mostram que a frequência de instabilidade postural (autorrelato) foi de 36,5%, e houve associação significativa entre fragilidade e instabilidade postural (p= 0,004).(2626. Closs VE, Ziegelmann PK, Gomes I, Schwanke CH. Frailty and geriatric syndromes in elderly assited in primary health care. Acta Sci Heal Sci. 2016;38(1):9-18.) Outro estudo realizado no norte da Tailândia investigou a eficácia de um programa de exercícios multicomponentes na fragilidade, desempenho físico (força de preensão manual, Escala de Equilíbrio de Berg (BBS), teste Timed Up and Go (TUG) e VO 2 Máx.), biomarcadores sanguíneos (Interleucina -6 (IL-6) e proteína C reativa (PCR)) em idosos frágeis. Observou-se interação significativa para escores de BBS, TUG e fragilidade (p <0,001).(3030. Sadjapong U, Yodkeeree S, Sungkarat S, Siviroj P. Multicomponent exercise program reduces frailty and inflammatory biomarkers and improves physical performance in community-dwelling older adults: a randomized controlled trial. Int J Environ Res Public Health. 2020;17(11):3760.)

A síndrome da instabilidade postural é preditora de quedas, um dos eventos que leva à internação hospitalar de pessoas idosas e, frequentemente, ao óbito. A associação significativa entre instabilidade postural e fragilidade fornece um novo olhar para os cuidados gerontológico dessas pessoas idosas. Inicia-se pela necessidade da avaliação da pessoa idosa, em todos os contextos de atenção à saúde, mediante instrumentos que detectem com precisão a fragilidade física e a instabilidade postural.

No presente estudo não houve associação significativa entre fragilidade física e incontinência urinária (p=0,336), no entanto, dados divergentes foram encontrados na literatura. Em Porto Alegre (RS), um estudou avaliou a incontinência urinária pelo autorrelato com base no índice de Katz, e observou-se associação significativa entre incontinência urinária e pessoas idosas frágeis (p=0,004).(2626. Closs VE, Ziegelmann PK, Gomes I, Schwanke CH. Frailty and geriatric syndromes in elderly assited in primary health care. Acta Sci Heal Sci. 2016;38(1):9-18.)

Em Taiwan, estudo transversal realizado com 440 pessoas idosas avaliou a prevalência de incontinência urinária e a associação com fragilidade em homens com 80 anos ou mais. Observou-se que a incontinência urinaria estava independentemente associada à fragilidade (Odds Ratio [OR] = 2,1; intervalo de confiança de 95% [IC]: 1,2-3,6; p=0,012).(3131. Wang CJ, Hung CH, Tang TC, Chen LY, Peng LN, Hsiao FY, et al. Urinary incontinence and its association with frailty among men aged 80 years or older in Taiwan: a cross-sectional study. Rejuvenation Res. 2017;20(2):111-7.) Dados semelhantes foram observados na China, em estudo transversal que investigou os fatores associados à fragilidade em 587 pessoas idosas, em que a incontinência urinária se mostrou associada à condição de fragilidade (p<0,001).(3232. Wei Y, Cao Y, Yang X, Xu Y. Investigation on the frailty status of the elderly inpatients in Shanghai using the FRAIL (fatigue, resistance, ambulation, illness, and loss) questionnaire. Medicine (Baltimore). 2018;97(18):e0581.)Por ser uma desordem vesical angustiante e incapacitante, a incontinência urinária tem grande impacto no domínio da restrição e participação social, interferindo na qualidade do cotidiano das pessoas idosas.

Apesar das síndromes da incontinência urinária e insuficiência familiar não mostrarem associação com a fragilidade física, vale ressaltar que ambas interferem na condição de fragilidade, visto que as pessoas idosas pré-frágeis e frágeis apresentaram piora da disfunção familiar e maior prevalência de incontinência urinária.

A ausência de associação estatística entre fragilidade física e a incontinência urinária e insuficiência familiar está relacionada ao quantitativo reduzido de relato das pessoas idosas para ambas as síndromes. Observa-se, frequentemente, por parte de pessoas mais idosas um certo constrangimento para expor e confirmar a sintomatologia de determinadas doenças, como as relacionadas ao sistema urinário, e assim como para relatar questões familiares. O desconhecimento sobre o processo fisiológico de envelhecimento e as possibilidades de cuidados e tratamentos restringem o relato dessas síndromes.

Quanto ao número de síndromes, os resultados mostraram maior prevalência de pessoas idosas na categoria pré-frágil (57%), em contrapartida, observa-se variação entre o quantitativo de não frágeis e frágeis, conforme aumenta o número de síndromes geriátricas. O menor quantitativo de pessoas idosas atingiu aqueles com três síndromes simultâneas, no entanto, quanto maior o número de síndromes, maior a frequência relativa de pacientes nas condições pré-frágil e frágil, totalizando 71,7%. O estudo realizado na Suíça, com 85 idosas, observou que a maioria delas (91,2%) apresentou pelo menos uma síndrome geriátrica, com um número médio de três suspeitas de síndromes por pessoas idosas.(3333. Mueller YK, Monod S, Locatelli I, Büla C, Cornuz J, Senn N. Performance of a brief geriatric evaluation compared to a comprehensive geriatric assessment for detection of geriatric syndromes in family medicine: a prospective diagnostic study. BMC Geriatr. 2018;18(1):72.)

A relação entre o número de síndromes e fragilidade também foi descrita no estudo desenvolvido em Porto Alegre (RS). Foram avaliadas cinco síndromes geriátricas, o declínio cognitivo, a instabilidade postural, a incontinência urinária/fecal, a polifarmácia e a imobilidade. O predomínio do número de síndromes geriátricas foi de duas (26,8%), valor superior ao presente estudo (14%). Houve associação entre fragilidade e três das cinco síndromes geriátricas: declínio cognitivo (p=0,025), instabilidade postural (p= 0,004) e polifarmácia (p=0,031).(2626. Closs VE, Ziegelmann PK, Gomes I, Schwanke CH. Frailty and geriatric syndromes in elderly assited in primary health care. Acta Sci Heal Sci. 2016;38(1):9-18.)

A identificação de síndromes geriátricas pelos profissionais enfermeiros pode contribuir para cuidados mais efetivos às pessoas idosas, uma vez que o acúmulo dessas síndromes acentua os riscos de mortalidade, assim como incapacidade funcional, baixo peso e condições depressivas.(3434. Huang CC, Lee JD, Yang DC, Shih HI, Sun CY, Chang CM. Associations between geriatric syndromes and mortality in community-dwelling elderly: results of a national longitudinal study in Taiwan. J Am Med Dir Assoc. 2017;18(3):246-51. Erratum in: J Am Med Dir Assoc. 2017;18(4):365.) Estudos apontam que o envelhecimento acompanhado de fragilidade física e das síndromes geriátricas torna as pessoas idosas mais vulneráveis aos eventos negativos e resulta na maior probabilidade de adoecimento, elevado número de hospitalizações e maior dependência.(22. Lee L, Patel T, Hillier LM, Maulkhan N, Slonim K, Costa A. Identifying frailty in primary care: A systematic review. Geriatr Gerontol Int. 2017;17(10):1358-77. Review.,3535. Pereira AA, Borim FS, Neri AL. Absence of association between frailty index and survival in elderly Brazilians: the FIBRA study. Cad Saude Publica. 2017;33(5):e00194115.)À vista disso, o rastreamento e a identificação precoce dessas síndromes são essenciais, fornecem indicativos para a necessidade de cuidados específicos, antes que desfechos negativos se instalem, e para intervenções efetivas durante a gestão de cuidados gerontológicos.

O estudo mostrou algumas limitações quanto às discussões dos resultados em razão do déficit de literatura sobre a relação entre fragilidade física e síndromes geriátricas e os estudos desenvolvidos no contexto ambulatorial. Essas limitações reforçam a necessidade da realização de novos estudos sobre a temática bem como daqueles que permitem avaliar a associação entre causa e efeito, como os estudos longitudinais de coorte, os quais fornecem evidências sobre a causalidade dessas síndromes.

Conclusão

Houve associação e correlação significativa entre fragilidade física e instabilidade postural. A presença de instabilidade postural determinou maior correlação da pessoa idosa ser categorizada como frágil ou pré-frágil. Uma vez que a instabilidade postural leva a eventos de queda em pessoas idosas, considera-se fundamental a avaliação desta condição em idosos fragilizados na assistência ambulatorial. Os resultados destacam alertas primordiais para avaliação e prática clínica mais efetiva da enfermagem gerontológica ao apontarem para as relações da fragilidade física com as síndromes da incontinência urinária, insuficiência familiar e instabilidade postural. Todas essas síndromes apresentam desfechos negativos importantes quando não se presta atenção a elas no atendimento à saúde da pessoa idosa. Para tanto, exige-se que as unidades ambulatoriais de geriatria e gerontologia possuam estruturas disponíveis, que asseguram instrumentos próprios para a avaliação efetiva da fragilidade física pela equipe de enfermagem e a capacitação para tal sondagem.

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Paula Hino (https://orcid.org/0000-0002-1408-196X) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    06 Jul 2021
  • Aceito
    11 Abr 2022
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
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