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Papel paterno nas relações familiares: revisão integrativa

Rol paterno en las relaciones familiares: revisión integradora

Resumo

Objetivo

Descrever o papel paterno nas relações familiares.

Métodos

Revisão integrativa da literatura, realizada no mês de setembro de 2020, por meio da consulta no Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior nas bases de dados Directory of Open Access Journals (Doaj), Scientific Electronic Library Online (Scielo), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), SAGE Publishing, Public Library of Science (PLOS), Taylor & Francis Group (tandfonline) utilizando os descritores associados pelos operadores booleanos da seguinte forma: Fathers and Paternity and Family Relations. Foram incluídas produções primárias, publicadas nos anos de 2009 a 2020, considerando a implementação da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem, disponíveis na íntegra, de forma gratuita e excluídos os materiais que não evidenciaram, de forma clara, o papel paterno nas relações familiares. Foram encontrados 1365 materiais científicos e, após a seleção seguindo as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta Analyses, foram incluídos 15 artigos.

Resultados

O papel paterno é descrito por meio de ações de cuidado, educação e provisão dos filhos. O cuidado foi desvelado através de ações voltadas à manutenção da vida, iniciando ainda na concepção e se estendendo durante a infância e adolescência. Nesse ciclo, o pai aparece na condição de educador, sobretudo, a partir do exemplo que conduz os filhos em suas vidas futuras. A provisão, por sua vez, esteve atrelada à garantia da subsistência familiar pela figura paterna.

Conclusão

A compreensão acerca dos papéis poderá direcionar a prática profissional a fim de estimular o envolvimento masculino no acompanhamento do desenvolvimento dos filhos.

Pais; Paternidade; Relações familiares; Relações pais-filhos; Família

Resumen

Objetivo

Describir el rol paterno en las relaciones familiares.

Métodos

Revisión integradora de la literatura, realizada el mes de septiembre de 2020, por medio da consulta al Portal de Periódicos de la Coordinación de Perfeccionamiento de Personal de Nivel Superior en las bases de datos Directory of Open Access Journals (Doaj), Scientific Electronic Library Online (Scielo), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), SAGE Publishing, Public Library of Science (PLOS), Taylor & Francis Group (tandfonline) utilizando los descriptores asociados por los operadores booleanos de la siguiente forma: Fathers and Paternity and Family Relations. Se incluyeron las producciones primarias, publicadas en los años de 2009 a 2020, considerando la implementación de la Política Nacional de Atención Integral a la Salud del Hombre, disponibles en su totalidad, de forma gratuita y excluidos los materiales que no evidenciaron de forma clara, el rol paterno en las relaciones familiares. Se encontraron 1365 materiales científicos y, después de la selección siguiendo las recomendaciones del Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta Analyses, fueron incluidos 15 artículos.

Resultados

El rol paterno se describe por medio de acciones de cuidado, educación y provisión de los hijos. El cuidado se desveló a través de acciones direccionadas al mantenimiento de la vida, iniciando todavía en la concepción y extendiéndose durante la infancia y la adolescencia. En ese ciclo, el padre aparece en la condición de educador, principalmente, a partir del ejemplo que conduce a los hijos en sus vidas futuras. La provisión, a su vez, estuvo vinculada con la garantía de la subsistencia familiar por la figura paterna.

Conclusión

La comprensión sobre los roles podrá direccionar la práctica profesional con la finalidad de estimular la involucración masculina en el acompañamiento del desarrollo de los hijos.

Padre; Paternidad; Relaciones familiares; Relaciones padres-hijo; Familia

Abstract

Objective

To describe the paternal role in family relationships.

Methods

This is an integrative literature review carried out in September 2020, by consulting the Journal Portal of the Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel in the Directory of Open Access Journals (Doaj), Scientific Electronic Library Online (Scielo) databases, Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), SAGE Publishing, Public Library of Science (PLOS), Taylor & Francis Group (tandfonline) using the descriptors associated by the Boolean operators as follows: Fathers and Paternity and Family Relations. Primary productions published from 2009 to 2020 were included, considering the implementation of the Brazilian National Policy for Comprehensive Care for Men’s Health, available in full, free of charge, and materials that did not clearly show paternal role in family relationships. 1,365 scientific materials were found and, after selection following the recommendations of the Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta Analyzes, 15 articles were included.

Results

Paternal role is described through actions of care, education and provision for children. Care was unveiled through actions aimed at maintaining life, starting at conception and extending into childhood and adolescence. In this cycle, the father appears as an educator, above all, based on the example that leads the children in their future lives. The provision, in turn, was linked to the guarantee of family subsistence by the paternal figure.

Conclusion

Understanding the roles can guide professional practice in order to encourage male involvement in monitoring the development of children.

Fathers; Paternity; Family relations; Parent-child relations; Family

Introdução

O papel do pai nas relações familiares passou por muitas transformações ao longo do tempo, sendo ressignificado de acordo com o contexto histórico. Durante muitos anos, as funções paternas e maternas tinham papéis bem definidos, considerando as divisões sociais, onde o espaço doméstico era de responsabilidade das mulheres e o espaço público ligado à figura masculina.(11. Arpini DM, Cúnico SD, Alves AP. Paternidade: O ponto de vista de profissionais que atuam em varas de família. Pensando Fam. 2016;20(1):29–42.)Porém, com as mudanças ocorridas na estrutura familiar a partir do século XX, sobretudo, pela inserção da mulher no mercado de trabalho, o homem deixou de ser o único provedor da família e o papel paterno começou a ser problematizado.(22. Bernardi D. Paternidade e cuidado: “novos conceitos”, velhos discursos. Psicol Rev. 2017; 26(1):59-80.)

Verifica-se a ausência de uma universalidade na definição de paternidade, considerando que existem múltiplas formas de exercê-la.(33. Ribeiro CR, Gomes R, Moreira MC. A paternidade e a parentalidade como questões de saúde frente aos rearranjos de gênero. Cien Saude Colet. 2015;20(11):3589–98.) No campo da saúde, a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), apesar de defender a valorização da paternidade como um aspecto relevante, não apresenta de forma clara o seu conceito e também não aponta caminhos para a sua promoção.(44. Brasil. Política Nacional de Atenção integral à saúde do homem. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009 [citado 2020 out 14]. Disponível em: http://www.unfpa.org.br/Arquivos/saude_do_homem.pdf
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) O mesmo se observa em relação à Rede Cegonha, que defende a valorização da paternidade para a melhoria da assistência ao pré-natal, nascimento e puerpério, porém, não traz as diretrizes para que essa valorização seja alcançada.(55. Universidade Federal do Maranhão. Redes de atenção à saúde: a Rede Cegonha. São Luís: UNA-SUS/UFMA; 2015 [citado 2020 out. 14]. Disponível em: https://ares.unasus.gov.br/acervo/html/ARES/2445/1/UNIDADE_2.pdf
https://ares.unasus.gov.br/acervo/html/A...
)

Historicamente, as investigações sobre paternidade foram analisadas em dois momentos históricos: antes e após o século XX. Antes do século XX, o papel paterno era centrado no poder masculino exercido por meio das funções disciplinadoras e rígidas que lhe era conferido, por ser o único provedor familiar. Posteriormente, após o século XX, influenciado pelo movimento feminista e inclusão da mulher do mercado de trabalho, existe uma tendência a maior participação paterna nas relações familiares e, consequente, reorganização dos papéis.(66. Lamb ME, Pleck JH, Charnov EL, Levine JÁ. Paternal behavior in humans. Am Zool. 1985;25(3):883–94.

7. Pleck JH. Paternal Involvement: levels, sources and consequences. New York: John Wiley & Sons; 1997.
-88. Houzel D. As implicações da parentalidade. In: Solis-Ponton L, organizador. Ser pai, ser mãe, parentalidade: um desafio para o terceiro milênio. São Paulo: Casa do Psicólogo; 2004. p. 47–52.)

Essa alteração do exercício paterno nas relações familiares baseia-se na importância que vem sendo apontada na literatura em relação às crianças/adolescentes e os diversos prejuízos associados à sua ausência para o desenvolvimento infantil. Dentre as repercussões, destacam-se: os conflitos psicológicos e cognitivos, baixo rendimento escolar, distúrbios de comportamento, agressividade, dificuldade em respeitar regras, insegurança, sentimento de inferioridade e rejeição.(99. Trapp EH, Andrade RS. As consequências da ausência paterna na vida emocional dos filhos. Rev Ciênc Contemp. 2017;2(1):45–53.,1010. Knoester C, Petts RJ, Pragg B. Paternity Leave-Taking and Father Involvement among Socioeconomically Disadvantaged U.S. Fathers. Sex Roles. 2019;81(5-6):257–71.) Contudo, mesmo compreendendo essas mudanças, pouco se sabe sobre qual seria o papel que vem sendo exercido pelos pais para que haja a garantia do pleno potencial humano.

Assim, observa-se a necessidade de aprofundamento teórico acerca do papel paterno nas relações familiares, sobretudo, para o pleno desenvolvimento infantil. Almeja-se, dessa forma, que os profissionais da saúde, com ênfase nas enfermeiras atuantes na Atenção Primária à Saúde (APS), possam traçar estratégias de sensibilização masculina para o exercício de uma paternidade mais ativa e imbricada em todos os processos de desenvolvimento de sua prole com foco em relações saudáveis e respeitosas. Sob esta perspectiva, adota-se como objetivo do estudo: Descrever o papel paterno exercido nas relações familiares.

Métodos

Estudo de revisão integrativa da literatura, o qual se propõe ao apontamento de lacunas no conhecimento, direcionando o pesquisador aos temas que necessitam de exploração científica.(1111. Mendes KD, Silveira RC, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2008;17(4):758–64.) O estudo foi realizado conforme as seis etapas preconizadas pelo Revised Standards for Quality Improvement Reporting Excellence (SQUIRE 2.0).(1212. Ogrinc G, Davies L, Goodman D, Batalden P, Davidoff F, Stevens D. SQUIRE 2.0 (Standards for QUality Improvement Reporting Excellence): revised publication guidelines from a detailed consensus process. BMJ Qual Saf. 2016;25(12):986–92.,1313. Brun CN, Zuge SS. Revisão sistemática da literatura: desenvolvimento e contribuição para uma prática baseada em evidências na enfermagem. Lacerda MR, Costenaro RG, organizadoras. Metodologias da pesquisa para a enfermagem e saúde. Porto Alegre: Moriá; 2015. p. 77–98.)

Para a primeira etapa, utilizou-se a estratégia PCC que representa o acrônimo para Problema (P), Conceito (C), Contexto (C) elementos que direcionam a construção da pergunta orientadora da pesquisa, conforme apontado no quadro 1. Com base nessa estruturação, o estudo foi guiado pela seguinte questão: Qual o papel paterno exercido no âmbito das relações familiares?

Quadro 1
Aplicação da estratégia PCC

O levantamento bibliográfico foi realizado no mês de setembro de 2020 por meio de consulta ao Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), o qual disponibiliza mais de 45 mil títulos internacionais com textos completos e 130 bases referenciais. Dentro do portal foram utilizadas as bases Directory of Open Access Journals (Doaj), Scientific Electronic Library Online (Scielo), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), SAGE Publishing, Public Library of Science (PLOS), Taylor & Francis Group (tandfonline). A busca dos termos para pesquisa foi realizada junto aos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e Medical Subject Heading (MeSH). Em seguida, partindo da estratégia PCC, definiu-se a seguinte estratégia de busca: Fathers and Paternity and Family Relations.

Constituíram-se como critérios de inclusão: produções primárias, disponíveis na íntegra, de forma gratuita e publicadas no período de 2009 a 2020, considerando o marco da PNAISH, uma vez que, a partir desta, houve a realização de maiores estudos e um movimento em prol da paternidade ativa. Assim, foram excluídos os artigos duplicados ou que não evidenciavam, de forma clara, o papel paterno nas relações familiares. Cabe destacar que o idioma não foi um critério de exclusão, de modo que todos os estudos que atendiam ao objeto de pesquisa foram selecionados para compor o corpus de análise, independe da língua. No levantamento inicial, foram encontrados 1365 materiais científicos, os quais foram submetidos ao gerenciamento bibliográfico do Mendeley que auxiliou na seleção e leitura dos materiais.

A triagem inicial dos estudos foi realizada por dois revisores de forma independente, seguindo os critérios estabelecidos na pré-seleção. Assim, foram excluídos 1235 estudos por indisponibilidade gratuita e/ou na íntegra, 04 estudos considerados literaturas cinzentas e 02 duplicados, restando 124 estudos. Estes, foram submetidos a leitura dos títulos e resumos, constatando-se que 73 não tinham relação com o objeto de estudo. Os 51 artigos restantes foram submetidos a leitura na íntegra, dos quais 36 não deixavam claro o papel paterno na relação familiar, restando 15 selecionados para a revisão. O processo de identificação e seleção dos estudos seguiu as recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta Analyses (PRISMA) conforme demonstra a figura 1.

Figura 1
Fluxograma de seleção dos estudos

Os materiais componentes do corpus analítico foram organizados em quadro sinóptico criado pelos autores com vistas à extração de informações como referência, nível de evidência e categorias. Estas categorias foram levantadas pelos pesquisadores a partir da leitura exaustiva dos textos e agrupamento das similaridades. Os estudos também foram avaliados e classificados de acordo com o nível de evidência conforme as categorias da Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ), que abarcam seis níveis de acordo com a metodologia empregada.(1414. Agency for Health Care Research and Quality. Quality Improvement and monitoring at your fingertips. Rockville: Agency for Healthcare Research and Quality; 2016 [cited 2016 Oct 22]; Available from: http://www.qualityindicators.ahrq.gov
http://www.qualityindicators.ahrq.gov...
) A interpretação dos achados ocorreu com base no Referencial Teórico de Gênero, com vistas às discussões das masculinidades, relacionando-as ao papel paterno nas relações familiares.

Resultados

Foram analisados 15 artigos publicados entre os anos de 2011 e 2020, sendo a maioria (quatro deles) do ano de 2018. O nível de evidência foi quatro para 11 das publicações, três para dois estudos e um com nível um de evidência. Acerca do papel paterno nas relações familiares, este foi categorizado enquanto cuidador, educador e provedor (Quadro 2).

Quadro 2
Síntese dos artigos incluídos na revisão

Compreende-se o cuidado como as ações desprendidas para manutenção da existência humana, esta, que vai desde a concepção até o fim da vida. Além disso, o cuidado se insere nas relações sociais, onde a presença e a convivência permitem o desenvolvimento, conforme apontam Colliére(1515. Colliére MF. Promover a Vida. Lisboa: Porto, Coimbra; 1999. In: Colliére MF. Cuidar: a primeira arte da vida. Lusociência: Paris; 2001.) e Boff.(1616. Boff L. O cuidado essencial: princípios de um novo ethos. Rev Inclusão Social. 2005; 1(1):28-35.) Na perspectiva paterna, os cuidados elencados nos artigos incluídos nessa revisão versaram por duas perspectivas, a emocional e a física, sendo a primeira em relação ao vínculo afetivo e a segunda atrelada às ações voltadas à alimentação e higiene.

A educação no âmbito familiar, praticada pelos pais e expressa na literatura, diz respeito à educação informal, pois não é desempenhada por órgãos de ensino. Através dela, os estudos mostraram que os pais atuam por meio do exemplo, como um modelo a ser seguido, além de prestar orientações quanto à religião e por meio do acompanhamento escolar. Essas ações contribuem para o desenvolvimento do ser social, uma vez que a educação perpassa por aspectos objetivos e subjetivos, o que, na infância e adolescência, ocorre, em sua maioria, através da família.(1717. Gonh MG. Educação não-formal, participação da sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas. Ensaio. 2006;14(50):27–38.,1818. Coelho L, Pisoni S. Vygotsky: sua teoria e a influência na educação. Rev e-Ped-FACOS. 2012. 2012;2(1):144-52.)

Já a provisão se refere a um papel social que vem sendo atribuído historicamente ao homem, de modo que o mesmo deva garantir a subsistência da família e assim foi reportado na literatura, quanto ao sustento financeiro.

Discussão

As limitações deste estudo concentram-se nas fragilidades metodológicas dos estudos incluídos, devendo considerar a potencialidade de viés. Além disso, apesar do grande número que versa sobre o papel paterno, a maioria dá ênfase na criação dos meninos, deixando as meninas sob responsabilidade das mulheres.

De acordo com a literatura científica selecionada, o papel paterno nas relações familiares foi expresso por meio de ações de cuidado que devem ocorrer desde o momento da concepção, o que inclui o acompanhamento durante o pré-natal.(2626. Kuruçırak Ş, Kulakaç Ö. The experiences and involvements of fathers during 4-12 months of their children’s lives: a mixed method study. Türkiye Halk Sağlığı Derg. 2014;12(2):113-26.,3333. Studnicki P. Less Oedipus, more Telemachus: the framing of fatherhood in international press. Church. Commun Cult. 2018;3(2):152–73.) Esse contexto de cuidado já é preconizado pelo Ministério da Saúde, o qual apresenta a importância do envolvimento masculino no planejamento reprodutivo e também no pré-natal.(3434. Brasil. Guia do pré-natal do parceiro para profissionais de saúde. Rio de Janeiro: Ministério da Saúde; 2016 [citado 2020 Out 14]. Disponível em: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2018/01/guia_PreNatal.pdf
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) Nesse ínterim, a PNAISH, no seu eixo de paternidade e cuidado, sinaliza para o termo Pré-Natal do Parceiro, incluindo, de forma ativa, a participação do homem no processo gestacional que, além de auxiliar na prevenção de doenças, se propõe no fortalecimento de vínculos familiares.

Embora este seja um debate recente e a inserção paterna nas atividades de cuidado ainda seja um desafio, a literatura científica faz um paralelo dos impactos para saúde materna e infantil. Estudo realizado nos Estados Unidos da América, o qual foi incluído nesta revisão, aponta que a não participação paterna no período gestacional, está relacionada com o baixo peso ao nascer. Após o nascimento, os achados na literatura também revelaram que a ausência de cuidado da figura paterna pode desencadear comportamento de risco na esfera reprodutiva, tais como: início precoce da vida sexual e riscos associados.(3030. Sheppard P, Garcia JR, Sear R. A not-so-grim tale: how childhood family structure influences reproductive and risk-taking outcomes in a historical U.S. Population. PLoS One. 2014 Mar;9(3):e89539.) Por outro lado, a atuação enquanto cuidador foi expressa, nos estudos, como associada a benefícios para o bebê, no que tange a segurança emocional e ausência de problemas na infância.(2828. Opondo C, Redshaw M, Savage-McGlynn E, Quigley MA. Father involvement in early child-rearing and behavioural outcomes in their pre-adolescent children: evidence from the ALSPAC UK birth cohort. BMJ Open. 2016;6(11):e012034–012034.)

Já na saúde materna, dois estudos apontaram para a relação entre o cuidado paterno e o alívio da depressão pós-parto.(2828. Opondo C, Redshaw M, Savage-McGlynn E, Quigley MA. Father involvement in early child-rearing and behavioural outcomes in their pre-adolescent children: evidence from the ALSPAC UK birth cohort. BMJ Open. 2016;6(11):e012034–012034.,2929. Merklinger-Gruchala A, Jasienska G, Kapiszewska M. Paternal investment and low birth weight – The mediating role of parity. PLoS One. 2019;14(1):e0210715.) Deste modo, o cuidado paterno é retratado na literatura como fator benéfico não só para a criança, mas também para a mãe, o que sinaliza para a necessidade de reforçar o envolvimento dos pais.

Esse papel, que traz benefícios na esfera física e emocional, esteve presente na literatura científica na forma de cuidado emocional. Estudo A9, realizado com 64 pais canadenses, revelou que estes se preocupam em estar presentes emocionalmente com as crianças, o que proporcionou o estabelecimento de laços e vínculo afetivo.(2727. Creighton GM, Brussoni M, Oliffe JL, Han C. Picturing Masculinities: Using Photoelicitation in Men’s Health Research. Am J Men Health. 2017;11(5):1472–85.) Essa aproximação emocional permite aos pais a percepção de situações-problema, permitindo-lhes a capacidade de auxiliar na resolução, uma vez que estabelecem relações de amizade e intimidade, o que facilita a comunicação.(2222. Eskandari N, Simbar M, Vadadhir A, Baghestani AR. Design and evaluation of the psychometric properties of a paternal adaptation questionnaire. Am J Men Health. 2018;12(6):2018–28.) Nessa esfera, o papel paterno é interpretado por aquele pai que está emocionalmente presente e pode intervir na vida das crianças.

O cuidado, entretanto, não se deteve apenas em questões do campo emocional, mas foi expressa por interação no campo físico. As ações de limpar, cozinhar, dar banho e trocar fraldas são elementos que aparecem associados a manutenção da integridade das crianças.(2020. Salami IA, Okeke CI. Absent fathers’ socio-economic status and perceptions of fatherhood as related to developmental challenges faced by children in South Africa. S Afr J Child Educ. 2018;8(1):a522.,2525. Trillingsgaard T, Maimburg RD, Simonsen M. The Family Startup Program: study protocol for a randomized controlled trial of a universal group-based parenting support program. BMC Public Health. 2015;15(1):409.,2626. Kuruçırak Ş, Kulakaç Ö. The experiences and involvements of fathers during 4-12 months of their children’s lives: a mixed method study. Türkiye Halk Sağlığı Derg. 2014;12(2):113-26.,2828. Opondo C, Redshaw M, Savage-McGlynn E, Quigley MA. Father involvement in early child-rearing and behavioural outcomes in their pre-adolescent children: evidence from the ALSPAC UK birth cohort. BMJ Open. 2016;6(11):e012034–012034.) Somado a isso, essa atenção perpassa pelo dever de dar segurança, garantindo que as necessidades básicas sejam atendidas, o que inclui a condição de saúde. Deste modo, um dos estudos, A4, apontou que os pais se preocupam em acompanhar os infantojuvenis durante as consultas de rotina e eventuais doenças durante a infância.(2222. Eskandari N, Simbar M, Vadadhir A, Baghestani AR. Design and evaluation of the psychometric properties of a paternal adaptation questionnaire. Am J Men Health. 2018;12(6):2018–28.) Frente a isso, ser pai guarda relação com ações de cuidado para com a prole.

Essas ações expressam um modelo de paternidade que vem buscando mudanças no processo de interação pais-crianças ou ainda sendo formado na atualidade. Um dos estudos, A13, realizado na Noruega, aponta para o termo “pais modernos” sugerindo que, mesmo aqueles que tiveram influências de pais menos envolvidos, expressam o desejo de participação na vida das crianças/adolescentes, todavia, muitas vezes, este é impedido por outras responsabilidades atribuídas socialmente ao homem.(3131. Håpnes T, Rasmussen B. Policies and practices of family friendliness. time and employment relations in knowledge work. Nord J Working Life Stud. 2011;1(2):39.)

Desafios e potencialidades para o exercício da paternidade ativa podem ser observados na medida em que barreiras sociais, institucionais, políticas e educacionais ainda permanecem expressivas na organização das sociedades.(3535. Santos WP, Ferreira JA, Freitas FB. As implicações do processo de paternidade para o comportamento masculino. Rev APS. 2018;21(2):291–9.) Como exemplo, é possível citar a limitação da Lei de Licença Paternidade no Brasil e a ausência da oferta de iniciativas que envolvam a figura do pai na criação das crianças e na realização das atividades domésticas.(3636. Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal. Nesse Dia dos Pais, a hora é de festejar – e de assumir mais responsabilidades. Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal; 2020. Disponível em: https://www.fmcsv.org.br/pt-BR/dia-dos-pais-hora-festejar-assumir-responsabilidades/
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) Tal cenário favorece a manutenção da posição paterna como coadjuvante, pouco presente, e, em alguns contextos, atém mesmo, como irresponsável, o que requer o estímulo à paternidade ativa por meio da valorização do vínculo, interação nas tarefas educacionais das crianças e estímulo à terem mais tempo para participação das etapas de crescimento e desenvolvimento de sua prole.

Desse modo, uma revisão dos marcadores estruturantes do lugar simbólico e prático da paternidade deve ser realizada nas sociedades. Além disso, chama-se a atenção para a superação de fatores limitantes a fim de que uma paternidade verdadeiramente ativa e responsável se torne uma realidade social cotidiana. Um reflexo dessas limitações ocorre com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) do Brasil, que não consegue dar conta dessa necessidade emergencial.

Já em relação aos pais mais novos, estudo nacional, realizado com adolescentes, sinaliza que, para esse público, a descoberta da paternidade gera reflexões acerca da sua responsabilidade quanto ao cuidado com as crianças/adolescentes no tocante às práticas de saúde e revelou que, ao pensar nessa construção futura, os homens não referem o cuidado enquanto um dos seus papéis, atribuindo tal função à mulher.(3232. Page SJ, Kam-Tuck Yip A. The gendering of heterosexual religious young adults’ imagined futures. J Contemp Relig. 2019;34(2):253–73.) Nesse sentido, mesmo com o espaço que as mulheres adquiriram, ainda cabe a elas conciliar trabalho e atividades domésticas, sobretudo no cuidado às crianças. Nesse bojo, estudo norueguês, A13, com homens e mulheres trabalhadores(as) de empresas de ciência e tecnologia, aponta que, embora exista uma política de flexibilização da carga horária para melhorar os vínculos familiares, são as mulheres que, em sua maioria, utilizam o benefício.(3131. Håpnes T, Rasmussen B. Policies and practices of family friendliness. time and employment relations in knowledge work. Nord J Working Life Stud. 2011;1(2):39.) Deste modo, assumir funções de cuidado, por parte dos homens, não é uma realidade e, muitas vezes, sobrecarrega as mulheres que não têm poder de escolha entre trabalho e maternidade.

Torna-se imprescindível avançar na compreensão acerca da corresponsabilização paterna na relação materna e infantil, para a garantia da paternidade ativa. Isso se dá a partir da consolidação dos seus pilares constituintes, possibilitando-as ser mais saudáveis, equitativas, não violentas, responsáveis, promotoras do bem-estar de si, de suas famílias de forma equânime nas relações de gênero.(3737. PROMUNDO. A Situação da paternidade no Brasil: Tempo de agir: 2019. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: https://promundo.org.br/wp-content/uploads/2019/08/relatorio_paternidade_promundo_06-3-1.pdf
https://promundo.org.br/wp-content/uploa...
) e com inscrições pautadas na afetividade, especialmente no engajamento com o ciclo gravídico-puerperal, na relação pai-bebê e no atendimento às demandas imediatas por cuidado.(3838. Santos CVM, Antúnez AEA. Paternidade afetivamente inscrita: modalidades de interação na relação pai-bebê. Arq Bras Psicol. 2018(70):1224-38.) Sob esta perspectiva, faz-se necessária a mitigação de antigos estigmas que se reatualizam acerca da paternidade e que reforçam as desigualdades de gênero,(3737. PROMUNDO. A Situação da paternidade no Brasil: Tempo de agir: 2019. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: https://promundo.org.br/wp-content/uploads/2019/08/relatorio_paternidade_promundo_06-3-1.pdf
https://promundo.org.br/wp-content/uploa...
) assim como, da transformação de referenciais arcaicos dos modelos de família, o que torna o exercício paterno uma a situação desfavorável, o que impede o advento de uma “nova paternidade”,(3838. Santos CVM, Antúnez AEA. Paternidade afetivamente inscrita: modalidades de interação na relação pai-bebê. Arq Bras Psicol. 2018(70):1224-38.) como vem ocorrendo no Brasil.

Esse conceito, pautado no patriarcado, não dialoga com o dever exposto em leis de proteção ao público infantojuvenil. O estatuto da criança e do adolescente traz em seu artigo 4º que é dever da família, comunidade e sociedade garantir acesso à saúde, educação, alimentação, lazer e outros.(3939. Brasil. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília (DF): Diário Oficial da União; 1990. [citado 2021 Mar 28]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm
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) Corroborando, estudo incluído na revisão traz que o papel do pai aparece como dever civil de guardar, proteger, alimentar, educar, treinar, administrar e representar os menores.(3333. Studnicki P. Less Oedipus, more Telemachus: the framing of fatherhood in international press. Church. Commun Cult. 2018;3(2):152–73.) Legalmente, as funções de cuidado estão atribuídas à família e não apenas a mãe, mas a divisão social de gênero faz com que os homens estejam distantes do cuidado aos infantes.

O cuidado se entrelaça nas ações educativas, com as quais o pai assume o papel de educador. Essa educação pode advir pelo modelo a ser seguido, a partir do exemplo, o que direciona a construção do caráter e da autonomia. Os estudos incluídos apontam que o exemplo é percebido na reprodução de comportamentos, uma vez que crianças, sobretudo meninos, tendem a seguir e construir suas identidades pautadas no modelo masculino apresentado por seus pais.(2727. Creighton GM, Brussoni M, Oliffe JL, Han C. Picturing Masculinities: Using Photoelicitation in Men’s Health Research. Am J Men Health. 2017;11(5):1472–85.,2828. Opondo C, Redshaw M, Savage-McGlynn E, Quigley MA. Father involvement in early child-rearing and behavioural outcomes in their pre-adolescent children: evidence from the ALSPAC UK birth cohort. BMJ Open. 2016;6(11):e012034–012034.,3333. Studnicki P. Less Oedipus, more Telemachus: the framing of fatherhood in international press. Church. Commun Cult. 2018;3(2):152–73.) Neste processo, descendente de pai para filho, é identificada a aprendizagem de importantes funções paternas a serem desenvolvidas futuramente, tais como o cuidado, amor, proteção e provisão, conforme o estudo A2.(2020. Salami IA, Okeke CI. Absent fathers’ socio-economic status and perceptions of fatherhood as related to developmental challenges faced by children in South Africa. S Afr J Child Educ. 2018;8(1):a522.) Estudo brasileiro com homens autores de violência, aponta para a reprodução de comportamentos violentos em homens que experienciaram esse agravo durante a infância.(4040. de Magalhães JR, Gomes NP, Campos LM, de Camargo CL, Estrela FM, Couto TM. Expressão da violência intrafamiliar: história oral de adolescentes. Texto Contexto Enferm. 2017;26(4): e1730016.)Nesse sentido, o modelo de pai apresentado na infância constrói a identidade do indivíduo e pode influenciar nas suas ações.

Tal construção não ocorre de maneira isolada e sem intencionalidade, mas possui características daquilo que são consideradas como importantes para os pais. Nesse sentido, o estudo A4 aponta que a crença dos pais é ensinada aos infantes, conduzindo-os na mesma religião e assim, perpetuando os valores familiares. Além disso, a educação ofertada pelos pais ocorre moldada em aspectos socioculturais e políticos, de modo que assim como os pais foram educados sobre determinadas crenças, seus descendentes também serão e seus ensinamentos estão sob determinados entendimentos que se relacionam à religião.

A educação construída por um exemplo, carregado de diversas outras construções, tem como objetivo preparar o indivíduo a fazer escolhas. Estudos A9 e A10, realizados no Canadá e Inglaterra, revelam que os pais atrelam a educação à uma formação de qualidade de modo a direcionar para o sucesso em diversas áreas da vida, além de promover o desenvolvimento pleno, o que inclui o preparo para o mundo do trabalho.(2727. Creighton GM, Brussoni M, Oliffe JL, Han C. Picturing Masculinities: Using Photoelicitation in Men’s Health Research. Am J Men Health. 2017;11(5):1472–85.-2828. Opondo C, Redshaw M, Savage-McGlynn E, Quigley MA. Father involvement in early child-rearing and behavioural outcomes in their pre-adolescent children: evidence from the ALSPAC UK birth cohort. BMJ Open. 2016;6(11):e012034–012034.) No estudo de Studnicki, A15, autores apontam que as escolhas profissionais podem estar baseadas naquilo que o pai tem de expectativas para sua(eu) filha(o) ou ainda construídas de acordo com o julgamento positivo ou negativo que o genitor detém.(3333. Studnicki P. Less Oedipus, more Telemachus: the framing of fatherhood in international press. Church. Commun Cult. 2018;3(2):152–73.) Deste modo, a educação paterna influencia a caminhada que a criança/adolescente vai seguir em sua vida.

Para tanto, é necessário o envolvimento paterno nas questões educacionais a fim de buscar uma melhor qualidade de vida. Para Trillingsgaard e colaboradores, no estudo A7,(2525. Trillingsgaard T, Maimburg RD, Simonsen M. The Family Startup Program: study protocol for a randomized controlled trial of a universal group-based parenting support program. BMC Public Health. 2015;15(1):409.) acompanhar o desenvolvimento escolar é benéfico para o processo de aprendizagem das crianças e dos adolescentes. Corroborando, estudo estadunidense acrescenta que existe uma relação positiva entre o desenvolvimento das crianças e adolescentes por toda a vida e o envolvimento dos pais em questões educacionais voltadas para atividades escolares, lazer, desempenho acadêmico, profissional e, inclusive, quando adulto, a preocupação com a formação da família.(99. Trapp EH, Andrade RS. As consequências da ausência paterna na vida emocional dos filhos. Rev Ciênc Contemp. 2017;2(1):45–53.) Esse envolvimento foi apontado por pesquisa sueca que revela o papel paterno no processo educativo com a responsabilidade de participar das reuniões escolares.(2121. Malmquist A, Andersson S, Salomonsson J. Life finds a way: young adults with lesbian mothers reflect on their childhood prior to legal recognition of same-sex parents in sweden. Front Psychol. 2020;11:690.) Nos estudos de Eskandari, em A4,(2222. Eskandari N, Simbar M, Vadadhir A, Baghestani AR. Design and evaluation of the psychometric properties of a paternal adaptation questionnaire. Am J Men Health. 2018;12(6):2018–28.) essa interação paterna com a escola do filho possibilita uma maior compreensão sobre as necessidades das crianças e dos adolescentes. Quer seja com o objetivo futuro ou não, o pai também tem o papel de acompanhar a educação.

A participação paterna no desenvolvimento educacional ocorre mediante ao acompanhamento da prole não só nas questões escolares, como também no tocante à educação de gênero. Nesse ínterim, observam-se diferenças no manejo educacional voltado às meninas e aos meninos. Em que pese a formação das crianças do gênero masculino, desde tenra idade, lhes são ensinados constructos que se ancoram na construção social da masculinidade.(2020. Salami IA, Okeke CI. Absent fathers’ socio-economic status and perceptions of fatherhood as related to developmental challenges faced by children in South Africa. S Afr J Child Educ. 2018;8(1):a522.,2323. Ataide S. Rupturas y continuidades en los roles y relaciones de género. Estudio sobre las experiencias y expectativas familiares y laborales de los hijos e hijas de la migración boliviana en Salta (Argentina). Migr Publicación del Inst Univ Estud sobre Migr. 2019; (47):35–59.) Tais atributos guardam relação com as construções socioculturais de gênero que determinam os papéis para homens e mulheres.(4141. Scott J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educ Real. 1995;20(2):71–99.)

Considerando que a construção de amizades, durante a infância e adolescência, se estabeleça, em sua maioria, na escola e comportamentos não binários são tidos como desviantes, sobretudo quando a educação se pautou em modelos religiosos, os estudos apontam para a escolha de amizades por parte dos pais. Em um dos estudos, A4,(2222. Eskandari N, Simbar M, Vadadhir A, Baghestani AR. Design and evaluation of the psychometric properties of a paternal adaptation questionnaire. Am J Men Health. 2018;12(6):2018–28.) os autores sinalizam que os pais devem ter o cuidado de escolher amigos que os infantojuvenis devem se relacionar, considerando que as amizades apresentam importância no ciclo vital dos indivíduos. Isso pode guardar relação com o fato das amizades levarem a caminhos que não condizem com os ensinamentos paternos e, dessa forma, direcionar os pais a tal atitude. Cabe destacar que, embora os pais possuam autoridade sobre as crianças, é preciso repensar atitudes educativas que não sejam violentas e impositivas.

As escolhas não se detêm às amizades, mas podem fazer parte do direcionamento profissional. Estudo A4 aponta que na vida adulta, os pais têm o papel de direcionar os meninos/homens ao trabalho braçal, considerando esta atividade inerente ao masculino e reforçando os estereótipos de gênero.(2222. Eskandari N, Simbar M, Vadadhir A, Baghestani AR. Design and evaluation of the psychometric properties of a paternal adaptation questionnaire. Am J Men Health. 2018;12(6):2018–28.) Além disso, um outro estudo da revisão, A5, revela que o pai auxilia sua prole para o sucesso de sua carreira acadêmica, inclusive o ajudando financeiramente até que ele se estabilize na profissão.(2323. Ataide S. Rupturas y continuidades en los roles y relaciones de género. Estudio sobre las experiencias y expectativas familiares y laborales de los hijos e hijas de la migración boliviana en Salta (Argentina). Migr Publicación del Inst Univ Estud sobre Migr. 2019; (47):35–59.)

A provisão financeira também apareceu fortemente na literatura como um dos papéis atrelados à figura paterna desde o período gravídico puerperal, adolescência até à vida adulta. Observou-se no estudo A11, realizado na Polônia, repercussões negativas para as crianças quando os homens restringem o fornecimento de alimentação materna, o que impacta na nutrição do feto e, consequente, no crescimento infantil.(2929. Merklinger-Gruchala A, Jasienska G, Kapiszewska M. Paternal investment and low birth weight – The mediating role of parity. PLoS One. 2019;14(1):e0210715.) Nesse sentido, estudo A6, norueguês, destaca que a ausência de uma fonte de renda segura é um obstáculo na criação dos infantojuvenis, o que desponta a valorização desse atributo,(2424. Kaldager Hart R. Earnings and first birth probability among Norwegian men and women 1995-2010. Demogr Res. 2015;33:1067–104.) desvelando uma preocupação de pais adolescentes para a manutenção da família marcada pela busca por atividades laborais.(1919. Frare J. Maternity and paternity: the view of the teenage couple. Rev Bras Prom Saúde, 2014; 27(1):101-8.)

No que tange a fase adulta, observou-se que o papel social da provisão dificulta e, muitas vezes, sacrifica o tempo de cuidado e educação com os filhos, o que é exposto, inclusive, pela diferença de tempo destinado à licença no nascimento dos filhos.(3131. Håpnes T, Rasmussen B. Policies and practices of family friendliness. time and employment relations in knowledge work. Nord J Working Life Stud. 2011;1(2):39.) Cabe destacar que este atributo social apresenta repercussões tanto positivas quanto negativas para a vida dos filhos, devendo ser refletida para uma mudança individual e política.

Percebe-se que a inclusão da paternidade como um dos eixos a serem trabalhados na PNAISH, ainda se trata de uma questão política, sem real intencionalidade de participação paterna, uma vez que não deixa claro as definições e como deve ser realizada esta promoção.(44. Brasil. Política Nacional de Atenção integral à saúde do homem. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009 [citado 2020 out 14]. Disponível em: http://www.unfpa.org.br/Arquivos/saude_do_homem.pdf
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) Deste modo, este é um tema que ainda precisa ser bastante difundido e trabalhado pelos profissionais de saúde e educação para uma melhor compreensão da paternidade ativa na modernidade.

Conclusão

Na síntese do conhecimento produzido, o papel paterno é descrito por meio de ações de cuidado, educação e provisão dos filhos. A compreensão acerca dos papéis a serem exercidos pelos homens para o desempenho de uma paternidade responsável poderá direcionar a prática profissional das enfermeiras e demais profissionais de saúde e da educação no sentido de estimular o envolvimento masculino no acompanhamento do desenvolvimento dos filhos. Esse estímulo à paternidade ativa pode ser feito através dos programas já existentes no âmbito da Estratégia Saúde da Família, dentre eles, o Planejamento Sexual e Reprodutivo, Pré-Natal, inclusive o pré-natal do parceiro, Puericultura, além do Programa Saúde na Escola que visa estabelecer uma parceria entre os setores da saúde, educação e família para a promoção da saúde infantojuvenil. Deste modo, ações nesses espaços podem se dar através da criação de grupos e de tecnologias cuidativas que promovam o vínculo dos pais na primeira infância. Além disso, urge que sejam fortalecidas as ações de educação em saúde que tenham foco na paternidade ativa, bem como estruturação de linhas de cuidado que objetivem reforçar o envolvimento de homens no cuidado e educação da prole.

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Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Alexandre Pazetto Balsanelli (https://orcid.org/0000-0003-3757-1061) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    14 Out 2020
  • Aceito
    2 Ago 2021
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
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