Acessibilidade / Reportar erro

Risco de quedas e a síndrome da fragilidade no idoso

Fall risk and the frailty syndrome in older adults

Riesgo de caídas y el síndrome de fragilidad en adultos mayores

Resumo

Objetivo

Analisar o risco de quedas e sua relação com a síndrome da fragilidade e variáveis sociodemográficas em idosos.

Métodos

Estudo transversal, analítico e multicêntrico, desenvolvido em dois hospitais universitários, no período de agosto de 2019 a janeiro de 2020, com 323 idosos, utilizando o Brazil Old Age Schedule (BOAS) para caracterização sociodemográfica, a Morse Fall Scale (MFS) para definição do risco de quedas e a Edmonton Frail Scale (EFS) para identificação da síndrome da fragilidade. Os dados foram analisados por estatística descritiva e inferencial.

Resultados

Houve associação entre o risco de quedas e idosos com idade acima de 70 anos, com mais de quatro doenças preexistentes, sem atividade laboral, com déficit cognitivo, estado geral de saúde ruim, com dependência funcional em cinco a oito atividades, fazendo uso de cinco ou mais medicamentos, com perda de peso, baixo desempenho funcional, humor triste ou deprimido e com a síndrome da fragilidade instalada. Idosos que moram sozinhos, com idade acima de 70 anos, que têm quatro ou mais doenças prévias, com dependência funcional, humor deprimido, que realizam o teste Timed Up and Go (TUG) em um tempo maior que 20 segundos, que utilizam cinco ou mais medicamentos por dia e que esquecem de utilizar esses fármacos têm mais chances para o risco de quedas.

Conclusão

Fatores relacionados ao declínio de funções físicas, psicológicas e mentais nos idosos, e que se encontram exacerbados na síndrome da fragilidade, aumentam o risco para a ocorrência de quedas nessa população.

Envelhecimento; Envelhecimento cognitivo; Idoso fragilizado; Acidentes por quedas; Fragilidade; Fatores de risco; Inquéritos e questionários

Resumen

Objetivo

Analizar el riesgo de caídas y su relación con el síndrome de fragilidad y variables sociodemográficas en adultos mayores.

Métodos

Estudio transversal, analítico y multicéntrico, llevado a cabo en dos hospitales universitarios, durante el período de agosto de 2019 a enero de 2020, con 323 adultos mayores, utilizando el Brazil Old Age Schedule (BOAS) para la caracterización sociodemográfica, la Morse Fall Scale (MFS) para la definición del riesgo de caídas y la Edmonton Frail Scale (EFS) para la identificación del síndrome de fragilidad. Los datos fueron analizados por medio de estadística descriptiva e inferencial.

Resultados

Hubo una relación entre el riesgo de caídas y adultos mayores con edad superior a los 70 años, con más de cuatro enfermedades preexistentes, sin actividad laboral, con déficit cognitivo, estado general de salud malo, con dependencia funcional de cinco a ocho actividades, tomando cinco o más medicamentos, con pérdida de peso, bajo desempeño funcional, humor triste o deprimido y con síndrome de fragilidad instalado. Adultos mayores que viven solos, con edad superior a los 70 años, con cuatro o más enfermedades previas, con dependencia funcional, humor deprimido, que realizan la prueba Timed Up and Go (TUG) en un tiempo superior a 20 segundos, que utilizan cinco o más medicamentos al día y que se olvidan de utilizar esos fármacos tienen más posibilidades de riesgo de caídas.

Conclusión

Factores relacionados con el deterioro de funciones físicas, psicológicas y mentales en adultos mayores y que están exacerbados en el síndrome de fragilidad, aumentan el riesgo de episodios de caídas en esa población.

Envejecimiento; Envejecimiento cognitivo; Anciano frágil; Accidentes por caídas; Fragilidad; Fatores de riesgo; Encuestas y cuestionarios

Abstract

Objective

To analyze fall risk and its relationship with the frailty syndrome and sociodemographic variables in older adults.

Methods

This is a cross-sectional, analytical and multicenter study, carried out in two university hospitals, from August 2019 to January 2020, with 323 older adults, using the Brazil Old Age Schedule (BOAS), for sociodemographic characterization, the Morse Fall Scale (MFS), to define fall risk, and the Edmonton Frail Scale (EFS), to identify the frailty syndrome. Data were analyzed using descriptive and inferential statistics.

Results

There was an association between fall risk and older adults aged over 70 years, with more than four preexisting diseases, without work activity, with cognitive impairment, poor general health status, with functional dependence in five to eight activities, using five or more medications, with weight loss, low functional performance, sad or depressed mood and with the installed frailty syndrome. Older adults who live alone, aged over 70 years, who have four or more previous illnesses, with functional dependence, depressed mood, who perform the Timed Up and Go (TUG) test in a time longer than 20 seconds, who use five or more medications per day and who forget to use these medications are more likely to fall at risk.

Conclusion

Factors related to the decline of physical, psychological and mental functions in older adults, which are exacerbated in the frailty syndrome, increase fall risk in this population.

Aging; Cognitive aging; Frail elderly; Accidental falls; Frailty; Risk factors; Surveys and questionnaires

Introdução

O envelhecimento acarreta modificações fisiológicas, bem como alterações funcionais, proporcionando desequilíbrio homeostático e favorecendo a instalação de disfunções.(11. Macena WG, Hermano LO, Costa TC. Alterações fisiológicas decorrentes do envelhecimento. Rev Mosaicum. 2018;15(27):223-36.) A deterioração das diversas funções físicas, sensoriais, perceptivas, cognitivas e musculares estão correlacionadas com o risco de quedas em idosos.(22. Saftari LN, Kwon OS. Ageing vision and falls: a review. J Physiol Anthropol. 2018;37(11):1-14. Review.)

As quedas em pessoas idosas são um grave problema de saúde pública, pois podem resultar em lesões (como hematomas, cortes ou escoriações), fraturas, redução na capacidade funcional, hospitalizações, prejuízos psicológicos (como o medo de sofrer novas quedas), podendo culminar em óbitos.(33. Jiang Y, Xia Q, Zhou P, Jiang S, Diwan VK, Xu B. Falls and Fall-Related Consequences among Older People Living in Long-Term Care Facilities in a Megacity of China. Gerontology. 2020;66(6):523-31.,44. Teixeira DK, Andrade LM, Santos JL, Caires ES. Falls among the elderly: environmental limitations and functional losses. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2019;22(3):e180229.)

No Brasil, a prevalência de quedas em idosos residentes na comunidade alcançou estimativas variando entre 6,5 e 46,9% no período de 2002 a 2019.(55. Elias Filho J, Borel WP, Diz JB, Barbosa AW, Britto RR, Felício DC. Prevalence of falls and associated factors in community-dwelling older Brazilians: a systematic review and meta-analysis. Cad Saude Publica. 2019;35(8):e00115718.) Em países asiáticos, como na Coreia, as taxas de quedas anuais acometendo idosos comunitários variaram de 15,9 a 25,1% entre os anos de 2011 a 2017.(66. Kim T, Choi SD, Xiong S. Epidemiology of fall and its socioeconomic risk factors in community-dwelling Korean elderly. PLoS One. 2020;15(6):e0234787.)

Dentre os fatores frequentemente associados a esses eventos destacam-se a idade avançada, a polifarmácia, as mudanças relacionadas à idade (perda de memória, incontinência, dor e doença crônica, deficiências visual e da marcha) e as condições ambientais (como iluminação deficiente e pisos irregulares).(77. Alabdullgader A, Rabbani U. Prevalence and risk factors of falls among the elderly in Unaizah City, Saudi Arabia. Sultan Qaboos Univ Med J. 2021;21(1):e86-93.) Tais aspectos, quando associados à síndrome da fragilidade, resultam em um aumento no número de quedas, visto que essas duas situações possuem componentes em comum.(88. Bartosch PS, Kristensson J, McGuigan FE, Akesson KE. Frailty and prediction of recurrent falls over 10 years in a community cohort of 75-year-old women. Aging Clin Exp Res. 2020;32(11):2241-50.)

A síndrome da fragilidade caracteriza-se por um estado fisiológico de maior vulnerabilidade a estressores que resulta em uma diminuição das reservas fisiológicas e desregulação de múltiplos sistemas.(99. Fried LP, Ferrucci L, Darer J, Williamson JD, Anderson G. Untangling the concepts of disablity, frailty and comorbidity: implications for improved targeting and care. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2004;59(3):255-63.) Idosos frágeis são mais propensos a apresentarem múltiplas doenças crônicas, insônia, problemas de saúde bucal, distúrbios de equilíbrio/marcha e quedas. Além disso, tendem a utilizar medicamentos que aumentam o risco de quedas e a apresentar dependência em atividades de vida diária.(1010. Lee DR, Santo EC, Lo JC, Weintraub ML, Patton M, Gordon NP. Understanding functional and social risk characteristics of frail older adults: a cross-sectional survey study. BMC Fam Pract. 2018;19(1):170.)

A prevalência geral de fragilidade em idosos brasileiros varia de 6,7 a 74,1%, enquanto nos Estados Unidos esse percentual cai para 14,3%.(1010. Lee DR, Santo EC, Lo JC, Weintraub ML, Patton M, Gordon NP. Understanding functional and social risk characteristics of frail older adults: a cross-sectional survey study. BMC Fam Pract. 2018;19(1):170.,1111. Lourenço RA, Moreira VG, Mello RG, Santos IS, Lin SM, Pinto AL, et al. Brazilian consensus on frailty in older people: concepts, epidemiology and evaluation instruments. Geriatr Gerontol Aging. 2018;12(2):121-35.) Os fatores associados ao risco de fragilidade em idosos incluem as idades mais avançadas, o sexo feminino, o comprometimento cognitivo, o sedentarismo e a desnutrição, demonstrando que as condições de saúde são importantes fatores na determinação desse quadro.(1212. Lins ME, Marques AP, Leal MC, Barros RL. Frailty risk in community-dwelling elderly assisted in Primary Health Care and associated factors. Saúde Debate. 2019;43(121):520-9.)

Desse modo, a reciprocidade entre a síndrome da fragilidade e a ocorrência de quedas é um grande desafio no contexto do envelhecimento, pois a conectividade entre esses dois episódios gera um ciclo em que a fragilidade desempenha um papel significativo na etiologia das quedas, e estas se constituem um preditor para a instalação da fragilidade.(88. Bartosch PS, Kristensson J, McGuigan FE, Akesson KE. Frailty and prediction of recurrent falls over 10 years in a community cohort of 75-year-old women. Aging Clin Exp Res. 2020;32(11):2241-50.)

Nesse sentido, entende-se que a síndrome da fragilidade e o risco de quedas caminham juntos na conjuntura do envelhecimento, impactando consideravelmente na qualidade de vida dos idosos. Portanto, se faz necessária a condução de estudos que identifiquem os fatores que se associam à sobreposição desses agravos, como também subsidiem a propositura de intervenções que proporcionem melhores condições de vida e de saúde nessa população, sobretudo, aqueles mais acometidos.

Diante do exposto, se pressupõe que o risco de quedas se associa à síndrome da fragilidade, bem como a variáveis sociodemográficas em idosos. Portanto, este estudo tem por objetivo analisar o risco de quedas e sua relação com a síndrome da fragilidade e variáveis sociodemográficas em idosos.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal, analítico e multicêntrico, norteado pela iniciativa STROBE, desenvolvido com idosos em dois hospitais universitários no estado da Paraíba. A população do estudo se baseou no número de atendimentos a pessoas com idade maior ou igual a 60 anos, no ano anterior ao da coleta de dados (n=1259). A amostragem (n=323) procedeu-se de forma aleatória, sendo calculada com base na fórmula de população finita para estudos epidemiológicos, com prevalência estimada em 60% e acrescida em 10% para assegurar as perdas. A coleta de dados ocorreu entre agosto de 2019 a janeiro de 2020. Foram incluídos idosos com idade maior ou igual a 60 anos, acompanhados no serviço ambulatorial ou internados em enfermarias dos referidos hospitais. Foram excluídos aqueles com instabilidade hemodinâmica, que não deambulavam e com déficits cognitivo, de comunicação e/ou visual severos, sendo essas condições observadas pelo pesquisador ou informadas pela equipe de saúde no momento da coleta.

Os instrumentos utilizados incluíram: o Brazil Old Age Schedule (BOAS) para delineamento do perfil sociodemográfico; a Morse Fall Scale (MFS) para definição do risco de quedas; e a Edmonton Frail Scale (EFS) para identificação da síndrome da fragilidade. O BOAS inclui aspectos psicológicos, físicos, socioeconômicos e demográficos do idoso.(1313. Veras R, Dutra S. Perfil do idoso brasileiro: questionário BOAS. Rio de Janeiro: UERJ; 2008. 100 p.)Este estudo utilizou as questões referentes ao sexo, idade, estado conjugal, anos de estudo, arranjo de moradia, doenças preexistentes, atividade laboral e renda.

A MFS avalia o risco de queda por meio de seis itens: histórico de quedas; diagnóstico secundário; auxílio na deambulação; terapia endovenosa; marcha; e estado mental. Neste estudo, idosos que apresentaram 24 pontos ou menos foram classificados como sem risco para quedas, sendo considerados com risco para quedas aqueles que apresentaram mais de 25 pontos na escala.(1414. Costa-Dias MJ, Martins T, Araújo F. Study of the cut-off point of the Morse Fall Scale (MFS). Rev Enf Ref. 2014;4(1):63-72.)

A EFS investiga a fragilidade a partir de nove domínios, representados por 11 itens: cognição (teste do desenho de um relógio); estado de saúde geral, compreendendo autorrelato de saúde e número de internações no último ano; independência funcional; suporte social; uso de medicamentos, incluindo uso de cinco ou mais medicamentos e esquecimento na utilização dos mesmos; nutrição (recente perda de peso); humor deprimido; continência urinária; e desempenho funcional, avaliado pelo teste Timed Up and Go (TUG).(1515. Rolfson DB, Majumdar SR, Tsuyuki RT, Tahir A, Rockwood K. Validity and reliability of the Edmonton Frail Scale. Age Ageing. 2006;35(5):526-9.,1616. Podsiadlo D, Richardson S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for frail elderly persons. J Am Geriatr Soc. 1991;39(2):142-8.)

Os dados coletados foram digitados e analisados no SPSS, versão 21.0, sendo o risco para quedas determinado como variável dependente do estudo. A síndrome da fragilidade foi dicotomizada (com e sem fragilidade), considerando até 6 pontos como não frágil e de 7 a 17 pontos representando o idoso frágil.(1515. Rolfson DB, Majumdar SR, Tsuyuki RT, Tahir A, Rockwood K. Validity and reliability of the Edmonton Frail Scale. Age Ageing. 2006;35(5):526-9.) Os domínios do instrumento também receberam tratamento analítico. Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva (frequência absoluta e relativa, medidas de tendência central e dispersão) e inferencial (qui-quadrado de Pearson, regressão linear e correlação de Sperman). O modelo de regressão logística com o método backward foi realizado entre as variáveis que apresentaram 20% de associação na análise bivariada, sendo estabelecido o nível de significância de 5% (p-value<0,05) para todas as variáveis.

O presente estudo trata-se de dados parciais do projeto universal intitulado “Instrumentalização da Enfermagem Forense diante do cuidado ao idoso hospitalizado”. O desenvolvimento do estudo atendeu as normas éticas sob o parecer 3.709.600/ Certificado de Apresentação de Apreciação Ética nº 10179719.9.0000.5183.

Resultados

A amostra foi composta por 323 idosos com idade média de 70,8 anos (DP=7,66), 5,9 anos de estudo (DP=5,4) e média de 1,5 doenças preexistentes (DP=1,2). Na análise bivariada é possível observar significância entre o risco de quedas com idade acima de 70 anos (p<0,00), com mais de quatro doenças preexistentes (p=0,02) e sem atividade laboral (p=0,01), conforme apresentado na tabela 1.

Tabela 1
Associação do risco de quedas e as variáveis sociodemográficas dos idosos participantes

Permanecem no modelo de regressão logística as variáveis idade, arranjo de moradia e doenças preexistentes, inferindo que idosos que moram sozinhos, com idade acima de 70 anos, com quatro ou mais doenças prévias apresentam respectivamente 2,82 (IC=1,29-6,13; p<0,00), 1,99 (IC=1,12-6,13; p<0,00) e 3,22 (IC=1,10 – 9,42; p=0,03) mais possibilidade de risco para quedas. O risco de quedas está associado aos domínios da EFS: cognição (p=0,06), estado geral de saúde (p<0,00), independência funcional (p<0,00), uso de medicamentos (p<0,00), nutrição (p=0,04), desempenho funcional (p<0,00), humor deprimido (p<0,00) e a avaliação categórica da fragilidade (p<0,00) (Tabela 2).

Tabela 2
Associação do risco de quedas e as dimensões da EFS dos idosos participantes

No modelo de regressão logística entre o risco de queda e as dimensões da EFS observa-se que idosos com dependência funcional em cinco a oito atividades têm 4,52 (p<0,00) mais probabilidade de risco de queda. Aqueles idosos que utilizam cinco ou mais medicamentos por dia e que esquecem de usar os fármacos apresentam, respectivamente, 2,23 (p<0,00) e 1,92 (p=0,00) mais possibilidade do risco de queda. Enquanto que os idosos que se sentem tristes ou deprimidos e que demoram mais de 20 segundos para o teste TUG apresentam 1,79 (p=0,02) e 2,66 (p<0,00) mais chances para o risco de quedas (Tabela 3).

Tabela 3
Regressão logística da associação do risco de queda e as dimensões da EFS dos idosos participantes

Discussão

O risco para quedas está associado e apresenta maior possibilidade de ocorrência em idosos acima de 70 anos e com diagnóstico de quatro ou mais doenças prévias. Esse risco também se associa a idosos sem atividade laboral, ocorrendo mais possivelmente com aqueles que moram sozinhos.

Estudo observacional brasileiro relata maior prevalência e associação da ocorrência de quedas entre idosos com 70 anos ou mais.(1717. Carvalho MS, Martins P, Santos FS, Queiroz DT. Falls in community dwelling elderly assisted by a family health strategy in the municipality of São Leopoldo: prevalence and associated factors. Acta Fisiatr. 2021;28(4):259-67.) Supõe-se que o declínio avançado nas funções físicas, sensoriais e cognitivas resultantes do envelhecimento contribuam para esse desdobramento.

A relação encontrada do risco para quedas em idosos sem atividade laboral é igualmente evidenciada em um estudo coreano com 31.684 participantes. Idosos com ocupação laboral tendem a apresentar menores riscos de quedas, pois apresentam melhor capacidade para realizar as atividades diárias. Além disso, possuem mais oportunidades de interação social, podendo evitar o isolamento e a depressão.(66. Kim T, Choi SD, Xiong S. Epidemiology of fall and its socioeconomic risk factors in community-dwelling Korean elderly. PLoS One. 2020;15(6):e0234787.)Estes fatores podem reduzir os riscos para quedas nesses indivíduos.

Este mesmo estudo também associa o risco de quedas ao arranjo de moradia, indicando que os idosos que moram sozinhos apresentam maior risco para tais eventos.(66. Kim T, Choi SD, Xiong S. Epidemiology of fall and its socioeconomic risk factors in community-dwelling Korean elderly. PLoS One. 2020;15(6):e0234787.)Esse fato pressupõe que as pessoas que compartilham a moradia com o idoso podem minimizar os riscos domiciliares de quedas, como o uso de roupas e calçados inadequados, presença de tapetes, pisos irregulares, ambientes desorganizados, objetos espalhados pelo chão e animais soltos.(44. Teixeira DK, Andrade LM, Santos JL, Caires ES. Falls among the elderly: environmental limitations and functional losses. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2019;22(3):e180229.)

A presença de múltiplas doenças crônicas constitui outra associação importante, ratificando os dados evidenciados em uma pesquisa desenvolvida na Finlândia, em que idosos com cinco doenças crônicas apresentam 11,7 maior possibilidade de quedas, uma vez que padrões de multimorbidades são associados à presença de incapacidade.(1818. Immonen M, Haapea M, Similä H, Enwald H, Keränen N, Kangas M, et al. Association between chronic diseases and falls among a sample of older people in Finland. BMC Geriatr. 2020;20:225.,1919. Schmidt TP, Wagner KJ, Schneider IJ, Danielewicz AL. Padrões de multimorbidade e incapacidade funcional em idosos brasileiros: estudo transversal com dados da Pesquisa Nacional de Saúde. Cad Saude Publica. 2020;36(11):e00241619.)

Dentre esses padrões, a depressão é compreendida como um dos fatores preditores da fadiga severa, agravando as condições físicas e, consequentemente, limitando as atividades diárias.(1919. Schmidt TP, Wagner KJ, Schneider IJ, Danielewicz AL. Padrões de multimorbidade e incapacidade funcional em idosos brasileiros: estudo transversal com dados da Pesquisa Nacional de Saúde. Cad Saude Publica. 2020;36(11):e00241619.) Nessa perspectiva, estudo transversal brasileiro refere que idosos com sintomas depressivos apresentam maiores chances de sofrerem quedas em comparação aos que não possuem tais sintomas. Sabendo que as quedas corporais resultam da interação entre fatores físicos bem como fatores contextuais, os sintomas depressivos tornam-se um fator de risco para quedas em idosos.(2020. Fontanela LC, Souza LF, Leopoldino AO, Danielewicz AL, Avelar NC. A Escala de Depressão Geriátrica pode ser usada para rastrear quedas em idosos da comunidade?. Acta Fisiatr. 2021;28(1):43-8.)

A associação do declínio cognitivo e a ocorrência de quedas corrobora com estudo transversal brasileiro, demonstrando que o comprometimento cognitivo pode influenciar na ocorrência de quedas recorrentes em idosos.(2121. Fallaci IV, Fabrício DM, Alexandre TD, Chagas MH. Association between falls and cognitive performance among community-dwelling older people: a cross-sectional study. Sao Paulo Med J. 2022;140(3):422-9.) É sabido que o declínio cognitivo se associa à limitação nas atividades de vida diária, em que idosos dependentes nestas atividades apresentam cinco vezes maior chance de déficit cognitivo.(2222. Santos BP, Amorim JS, Poltronieri BC, Hamdan AC. Association between functional disability and cognitive deficit in hospitalized elderly patients. Cad Bras Ter Ocup. 2021;29:e2101.)Assim sendo, o comprometimento cognitivo está associado ao declínio funcional, que por sua vez, predispõe à ocorrência de quedas. Nesse sentido, estudo transversal brasileiro destaca que quanto maior a dependência funcional, maior será o risco de quedas, corroborando com os achados do presente estudo.(2323. Paula JG, Gonçalves LH, Nogueira LM, Delage PE. Correlation between functional independence and risk of falls in older adults at three long-term care facilities. Rev Esc Enferm USP. 2020;54:e03601.)

O estado de saúde e o número de medicamentos utilizados pelo idoso também elevam as chances de quedas nesses indivíduos, podendo ser explicado pelo aumento possível da ocorrência de efeitos colaterais e interações medicamentosas, como resultado da polifarmácia.(2424. Sharif SI, Al-Harbi AB, Al-Shihabi AM, Al-Daour DS, Sharif RS. Falls in the elderly: assessment of prevalence and risk factors. Pharm Pract (Granada). 2018;16(3):1206.)

No entanto, o esquecimento do uso de medicações ainda não é um fator bem estudado no contexto do risco para quedas. Possivelmente essa omissão esteja relacionada à disfunção cognitiva, e não diretamente à privação de um efeito medicamentoso específico.

A autopercepção de saúde negativa também se associa à ocorrência de quedas, em consonância com estudo transversal brasileiro.(2525. De Sousa-Araújo IV, C Gomes N, Santos-Nascimento J, Neves Romanato Ribeiro CC, Dos Santos Tavares DM. Queda entre idosos: preditores e distribuição espacial. Rev Salud Publica (Bogota). 2019;21(2):187-194.) Essa associação parece estar indiretamente relacionada à ocorrência da síndrome da fragilidade em idosos, visto que, foi observado que o estado geral da saúde influencia na determinação da fragilidade nessa população.(2626. Araújo Júnior FB, Machado IT, Santos-Orlandi AA, Pergola-Marconato AM, Pavarini SC, Zazzetta MS. Frailty, profile and cognition of elderly residents in a highly socially vulnerability area. Cien Saude Colet. 2019;24(8):3047-55.) Considerando essa premissa e sabendo que a investigação do estado geral de saúde inclui o número de internações sofridas pelo idoso, estudo transversal com 1.750 idosos revela associação entre fragilidade e o registro de internação hospitalar nos últimos seis meses, bem como com a ocorrência de quedas no último ano.(2727. Maia LC, Moraes EN, Costa SM, Caldeira AP. Fragilidade em idosos assistidos por equipes da atenção primária. Cien Saude Colet. 2020;25(12):5041-50.)

O mau estado nutricional dos idosos vem sendo discutido em decorrência da sua alta prevalência em indivíduos que apresentam quedas.(2828. Conzade R, Phu S, Vogrin S, Bani Hassan E, Sepúlveda-Loyola W, Thorand B, et al. Changes in nutritional status and musculoskeletal health in a geriatric post-fall care plan setting. Nutrients. 2019;11(7):1551.) Estudo de coorte prospectivo evidenciou que 46% dos idosos com elevado risco para quedas possuem alto risco de desnutrição.(2929. Eckert C, Gell NM, Wingood M, Schollmeyer J, Tarleton EK. Malnutrition risk, rurality, and falls among community-dwelling older adults. J Nutr Health Aging. 2021;25(5):624-27.) Essa associação possivelmente se verifica pela presença concomitante da sarcopenia, causando disfunção musculoesquelética, que pode favorecer a ocorrência de quedas.

No entanto, indivíduos com incrementos no estado nutricional não são associados à melhora na velocidade da marcha através do teste TUG.(2828. Conzade R, Phu S, Vogrin S, Bani Hassan E, Sepúlveda-Loyola W, Thorand B, et al. Changes in nutritional status and musculoskeletal health in a geriatric post-fall care plan setting. Nutrients. 2019;11(7):1551.)Por outro lado, considerando que o TUG é uma ferramenta para medida da mobilidade física de idosos frágeis, fornecendo informações sobre o equilíbrio, velocidade da marcha e capacidade funcional, está significativamente associado ao risco de quedas, uma vez que a redução na velocidade da marcha mostra relação com episódios de quedas em idosos, especialmente os longevos.(1616. Podsiadlo D, Richardson S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for frail elderly persons. J Am Geriatr Soc. 1991;39(2):142-8.,3030. Lenardt MH, Setoguchi LS, Betiolli SE, Grden CR, Sousa JA, Lourenço TM. Gait speed and occurrence of falls in the long-lived elderly. Rev Min Enferm. 2019;23:e1190.)

A associação do risco de quedas com a síndrome da fragilidade corrobora com outros estudos já realizados. Estudo transversal brasileiro descreve que 65,2 a 66,7% dos idosos considerados frágeis apresentam risco de queda.(3131. Giacomini SB, Fhon JR, Rodrigues RA. Frailty and risk of falling in the older adult living at home. Acta Paul Enferm. 2020;33:eAPE20190124.) Revisão sistemática conclui que idosos com marcadores de fragilidade têm 33 a 51% mais chances de cair de forma recorrente.(3232. Jehu DA, Davis JC, Falck RS, Bennett KJ, Tai D, Souza MF, et al. Risk factors for recurrent falls in older adults: a systematic review with meta-analysis. Maturitas. 2021;144:23-8.) Dessa forma, a prevenção da instalação da síndrome da fragilidade no idoso pode evitar a ocorrência de quedas nesse segmento populacional.

O presente estudo apresenta como limitação o delineamento transversal, não possibilitando estabelecer relação de causalidade e avaliação longitudinal do fenômeno. No entanto, é capaz de realizar associações e comparações, permitindo identificar fatores associados.

Os resultados apontados podem contribuir para ampliar o conhecimento sobre a relação do risco de quedas com a síndrome da fragilidade e variáveis sociodemográficas em idosos, favorecendo a identificação dessas associações na prática assistencial a fim de minimizar os impactos desses agravos na saúde da população idosa.

Conclusão

O risco de quedas se associa a fatores relacionados ao declínio de funções físicas, psicológicas e mentais nos idosos, e que se encontram exacerbados na síndrome da fragilidade.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão de financiamento através do Edital Universal nº 28/2018, sob o processo nº 424604-2018-3, bem como pela Chamada de Produtividade UFPB 03/2020 (projeto PVG13127-2020).

Referências

  • 1
    Macena WG, Hermano LO, Costa TC. Alterações fisiológicas decorrentes do envelhecimento. Rev Mosaicum. 2018;15(27):223-36.
  • 2
    Saftari LN, Kwon OS. Ageing vision and falls: a review. J Physiol Anthropol. 2018;37(11):1-14. Review.
  • 3
    Jiang Y, Xia Q, Zhou P, Jiang S, Diwan VK, Xu B. Falls and Fall-Related Consequences among Older People Living in Long-Term Care Facilities in a Megacity of China. Gerontology. 2020;66(6):523-31.
  • 4
    Teixeira DK, Andrade LM, Santos JL, Caires ES. Falls among the elderly: environmental limitations and functional losses. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2019;22(3):e180229.
  • 5
    Elias Filho J, Borel WP, Diz JB, Barbosa AW, Britto RR, Felício DC. Prevalence of falls and associated factors in community-dwelling older Brazilians: a systematic review and meta-analysis. Cad Saude Publica. 2019;35(8):e00115718.
  • 6
    Kim T, Choi SD, Xiong S. Epidemiology of fall and its socioeconomic risk factors in community-dwelling Korean elderly. PLoS One. 2020;15(6):e0234787.
  • 7
    Alabdullgader A, Rabbani U. Prevalence and risk factors of falls among the elderly in Unaizah City, Saudi Arabia. Sultan Qaboos Univ Med J. 2021;21(1):e86-93.
  • 8
    Bartosch PS, Kristensson J, McGuigan FE, Akesson KE. Frailty and prediction of recurrent falls over 10 years in a community cohort of 75-year-old women. Aging Clin Exp Res. 2020;32(11):2241-50.
  • 9
    Fried LP, Ferrucci L, Darer J, Williamson JD, Anderson G. Untangling the concepts of disablity, frailty and comorbidity: implications for improved targeting and care. J Gerontol A Biol Sci Med Sci. 2004;59(3):255-63.
  • 10
    Lee DR, Santo EC, Lo JC, Weintraub ML, Patton M, Gordon NP. Understanding functional and social risk characteristics of frail older adults: a cross-sectional survey study. BMC Fam Pract. 2018;19(1):170.
  • 11
    Lourenço RA, Moreira VG, Mello RG, Santos IS, Lin SM, Pinto AL, et al. Brazilian consensus on frailty in older people: concepts, epidemiology and evaluation instruments. Geriatr Gerontol Aging. 2018;12(2):121-35.
  • 12
    Lins ME, Marques AP, Leal MC, Barros RL. Frailty risk in community-dwelling elderly assisted in Primary Health Care and associated factors. Saúde Debate. 2019;43(121):520-9.
  • 13
    Veras R, Dutra S. Perfil do idoso brasileiro: questionário BOAS. Rio de Janeiro: UERJ; 2008. 100 p.
  • 14
    Costa-Dias MJ, Martins T, Araújo F. Study of the cut-off point of the Morse Fall Scale (MFS). Rev Enf Ref. 2014;4(1):63-72.
  • 15
    Rolfson DB, Majumdar SR, Tsuyuki RT, Tahir A, Rockwood K. Validity and reliability of the Edmonton Frail Scale. Age Ageing. 2006;35(5):526-9.
  • 16
    Podsiadlo D, Richardson S. The timed “Up & Go”: a test of basic functional mobility for frail elderly persons. J Am Geriatr Soc. 1991;39(2):142-8.
  • 17
    Carvalho MS, Martins P, Santos FS, Queiroz DT. Falls in community dwelling elderly assisted by a family health strategy in the municipality of São Leopoldo: prevalence and associated factors. Acta Fisiatr. 2021;28(4):259-67.
  • 18
    Immonen M, Haapea M, Similä H, Enwald H, Keränen N, Kangas M, et al. Association between chronic diseases and falls among a sample of older people in Finland. BMC Geriatr. 2020;20:225.
  • 19
    Schmidt TP, Wagner KJ, Schneider IJ, Danielewicz AL. Padrões de multimorbidade e incapacidade funcional em idosos brasileiros: estudo transversal com dados da Pesquisa Nacional de Saúde. Cad Saude Publica. 2020;36(11):e00241619.
  • 20
    Fontanela LC, Souza LF, Leopoldino AO, Danielewicz AL, Avelar NC. A Escala de Depressão Geriátrica pode ser usada para rastrear quedas em idosos da comunidade?. Acta Fisiatr. 2021;28(1):43-8.
  • 21
    Fallaci IV, Fabrício DM, Alexandre TD, Chagas MH. Association between falls and cognitive performance among community-dwelling older people: a cross-sectional study. Sao Paulo Med J. 2022;140(3):422-9.
  • 22
    Santos BP, Amorim JS, Poltronieri BC, Hamdan AC. Association between functional disability and cognitive deficit in hospitalized elderly patients. Cad Bras Ter Ocup. 2021;29:e2101.
  • 23
    Paula JG, Gonçalves LH, Nogueira LM, Delage PE. Correlation between functional independence and risk of falls in older adults at three long-term care facilities. Rev Esc Enferm USP. 2020;54:e03601.
  • 24
    Sharif SI, Al-Harbi AB, Al-Shihabi AM, Al-Daour DS, Sharif RS. Falls in the elderly: assessment of prevalence and risk factors. Pharm Pract (Granada). 2018;16(3):1206.
  • 25
    De Sousa-Araújo IV, C Gomes N, Santos-Nascimento J, Neves Romanato Ribeiro CC, Dos Santos Tavares DM. Queda entre idosos: preditores e distribuição espacial. Rev Salud Publica (Bogota). 2019;21(2):187-194.
  • 26
    Araújo Júnior FB, Machado IT, Santos-Orlandi AA, Pergola-Marconato AM, Pavarini SC, Zazzetta MS. Frailty, profile and cognition of elderly residents in a highly socially vulnerability area. Cien Saude Colet. 2019;24(8):3047-55.
  • 27
    Maia LC, Moraes EN, Costa SM, Caldeira AP. Fragilidade em idosos assistidos por equipes da atenção primária. Cien Saude Colet. 2020;25(12):5041-50.
  • 28
    Conzade R, Phu S, Vogrin S, Bani Hassan E, Sepúlveda-Loyola W, Thorand B, et al. Changes in nutritional status and musculoskeletal health in a geriatric post-fall care plan setting. Nutrients. 2019;11(7):1551.
  • 29
    Eckert C, Gell NM, Wingood M, Schollmeyer J, Tarleton EK. Malnutrition risk, rurality, and falls among community-dwelling older adults. J Nutr Health Aging. 2021;25(5):624-27.
  • 30
    Lenardt MH, Setoguchi LS, Betiolli SE, Grden CR, Sousa JA, Lourenço TM. Gait speed and occurrence of falls in the long-lived elderly. Rev Min Enferm. 2019;23:e1190.
  • 31
    Giacomini SB, Fhon JR, Rodrigues RA. Frailty and risk of falling in the older adult living at home. Acta Paul Enferm. 2020;33:eAPE20190124.
  • 32
    Jehu DA, Davis JC, Falck RS, Bennett KJ, Tai D, Souza MF, et al. Risk factors for recurrent falls in older adults: a systematic review with meta-analysis. Maturitas. 2021;144:23-8.

Editado por

Editor Associado (Avaliação pelos pares): Paula Hino (https://orcid.org/0000-0002-1408-196X) Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    04 Abr 2022
  • Aceito
    19 Dez 2022
Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo R. Napoleão de Barros, 754, 04024-002 São Paulo - SP/Brasil, Tel./Fax: (55 11) 5576 4430 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: actapaulista@unifesp.br